Decreto-Lei 293/89
de 2 de Setembro
A Reserva Natural da Berlenga, criada pelo Decreto-Lei 264/81, de 3 de Setembro, abrange uma área total de 1063 ha, sendo constituída por um ecossistema de características únicas na região atlanto-mediterrânica, e engloba a única reserva marinha da costa continental portuguesa.
A sua área emersa é constituída pelo conjunto das ilhas e ilhéus que formam o arquipélago das Berlengas, cuja área é de 78 ha, abrangendo a sua área imersa as águas que envolvem a ilha maior até à batimétrica dos 30 m, com uma superfície de 985 ha.
Dado o seu enorme interesse científico, desde há vários anos que as populações vegetais e animais da Reserva Natural da Berlenga têm vindo a ser alvo de intensos estudos cuja relevância é indiscutível, na medida em que as modernas teorias evolutiva e ecológica se baseiam sobretudo em conhecimentos adquiridos no estudo de ecossistemas insulares.
Quanto à reserva marinha da Berlenga, a mesma apresenta também um grande interesse científico pelo facto de as suas particularidades geomorfológicas lhe conferirem características biológicas excepcionais que permitem prever a existência eventual de mecanismos de especiação eficientes, em especial no que respeita a alguns organismos bênticos.
É, pois, fundamental a sua conservação, dado constituir uma zona tampão relativamente à área emersa da reserva, para além de ser também importante para a preservação das colónias de aves marinhas de inestimável valor que povoam o arquipélago das Berlengas, pois que abriga os seus recursos básicos imediatos, que são os povoamentos litorais adjacentes.
Numa área pequena, com o declive de escarpas que caracteriza a ilha da Berlenga, a inexistência de restrições ao distúrbio dos povoamentos intermareais pode levar a uma redução significativa dos efectivos de organismos fixos, cuja recuperação é lenta e difícil, e a consequências nefastas quer para as aves quer para outros organismos que dependem do intermareal.
Está provado que num ecossistema com a fragilidade do que constitui a Reserva Natural da Berlenga são as actividades humanas descontroladas que constituem o principal factor responsável pela sua degradação.
Atendendo aos aspectos atrás referidos e tendo em conta os acordos e recomendações internacionalmente aceites, é, pois, da maior importância a actualização da legislação em vigor quanto à Reserva Natural da Berlenga.
Pretende-se, pois, dar cumprimento às Resoluções n.os 73 (30) e 76 (17) do Comité de Ministros do Conselho da Europa, em particular no que diz respeito às medidas preventivas de qualquer intervenção artificial susceptível de alterar o aspecto, a composição e evolução da natureza, para além de, ainda de acordo com as mesmas resoluções, regulamentar a preservação da ocupação humana tradicional, condicionando-a, contudo, ao cumprimento dos objectivos conservacionistas.
Verificando-se a necessidade de se estabelecerem os mecanismos legais que possibilitem a efectiva preservação da fauna e flora da Reserva Natural da Berlenga, o que passa, desde logo, pela definição da capacidade de carga humana da reserva, e na medida em que para tal não são suficientes as limitações até agora propostas, é necessário introduzir alterações à legislação em vigor quanto à Reserva Natural da Berlenga.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º Os artigos 6.º-A, 9.º e 10.º do Decreto-Lei 264/81, de 3 de Setembro, passam a ter a seguinte redacção:
Art. 6.º-A. Na área da reserva marinha são proibidas as seguintes actividades:
a) Fazer caça submarina;
b) Praticar a pesca desportiva, excepto com as artes ou utensílios usados na pesca à linha - «cana» e «fio de mão»;
c) A apanha de algas e de qualquer invertebrado marinho, em particular de moluscos, equinodermes e crustáceos, à excepção do Polybius henslowi, vulgarmente conhecido por «pilado»;
d) O mergulho recreativo na área localizada entre as «Buzinas» e a «Pedra Negra», no período compreendido entre 1 de Fevereiro e 1 de Julho;
e) O trânsito ou permanência de qualquer embarcação a uma distância inferior a 50 m da linha de costa, na área localizada entre as «Buzinas» e a «Pedra Negra», no período compreendido entre 1 de Fevereiro e 1 de Julho, excepto se estiver a exercer a pesca comercial nos termos do n.º 1 do artigo 6.º-B;
f) A utilização de amplificadores de som para o exterior, a partir das embarcações;
g) A prática de motonáutica competitiva.
Art. 9.º - 1 - Sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro, as infracções ao disposto no presente diploma constituem contra-ordenação punível com coimas:
a) Mínima de 5000$00 e máxima de 50000$00, a violação do disposto no n.º 1 do artigo 4.º;
b) Mínima de 5000$00 e máxima de 100000$00, a violação do disposto no artigo 5.º;
c) Mínima de 25000$00 e máxima de 150000$00, a violação do disposto no artigo 6.º;
d) Mínima de 50000$00 e máxima de 200000$00, a violação do disposto no artigo 6.º-A;
e) Mínima de 5000$00 e máxima de 20000$00, a violação do disposto no artigo 6.º-D;
f) Mínima de 50000$00 e máxima de 200000$00, a violação do disposto no artigo 8.º
2 - Quando aplicadas às pessoas colectivas, e em caso de dolo, o montante das coimas referidas nas alíneas a), b), c), d) e f) do número anterior poderá elevar-se até ao décuplo.
3 - A negligência é sempre punível.
4 - A aplicação da coima prevista na alínea f) do n.º 1 não prejudica a obrigação de o infractor demolir as obras ou trabalhos efectuados e de repor o estado anterior à infracção, sem que por esse facto tenha direito a qualquer indemnização ou retribuição.
5 - Se o infractor, tendo sido notificado, não demolir as obras ou trabalhos efectuados no prazo que lhe for assinalado por carta registada com aviso de recepção, o director da Reserva ou a autoridade marítima territorialmente competente mandará proceder à demolição coerciva ou às obras necessárias para a reposição do estado anterior, apresentando ao infractor a relação das despesas para cobrança voluntária ou recorrendo à cobrança coerciva, se necessário.
6 - Sem prejuízo da informação devida a outras entidades nos termos da lei, a autoridade marítima dará também conhecimento das decisões ao director da Reserva.
Art. 10.º - 1 - ...
2 - ...
3 - A instrução dos processos de contra-ordenações previstos neste diploma é da competência dos serviços locais do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza e das autoridades marítimas.
4 - Finda a instrução, serão os processos remetidos ao presidente do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza ou às entidades referidas na alínea a) do artigo 23.º do Decreto-Lei 278/87, de 7 de Julho, a quem compete a aplicação das coimas, sem prejuízo da possibilidade de delegação de tal competência.
5 - O disposto no número anterior não prejudica a competência em razão da matéria para aplicação de coimas pela autoridade marítima na sua área de jurisdição.
Art. 2.º São aditados os artigos 6.º-B, 6.º-C e 6.º-D ao Decreto-Lei 264/81, de 3 de Setembro, com a seguinte redacção:
Art. 6.º-B. As restrições ao exercício da pesca comercial na área da reserva marinha serão fixadas por portaria dos Ministros do Planeamento e da Administração do Território e da Agricultura, Pescas e Alimentação, nos termos do Decreto-Lei 278/87, de 7 de Julho.
Art. 6.º-C - 1 - Compete ao director da Reserva, ouvido o conselho geral:
a) Regulamentar anualmente o acesso por terra aos pesqueiros das ilhas e ilhéus em que a actividade humana possa fazer perigar a estabilidade das populações animais ou vegetais indígenas;
b) Interditar ou condicionar o acesso a áreas específicas da reserva parcial, para preservar a estabilidade das populações vegetais ou animais indígenas, seja qual for a capacidade da carga definida anualmente.
2 - Compete ao membro do Governo responsável pela área do ambiente, sob proposta do director da Reserva, definir, mediante portaria, o número de indivíduos que, para além dos que podem legalmente exercer a pesca na área da reserva, constituem a capacidade de carga humana da Reserva Natural da Berlenga, tendo em conta a sensibilidade dos seus ecossistemas.
3 - São excluídos do cômputo da capacidade de carga todos os indivíduos que possuam residência habitual na área da Reserva.
Art. 6.º-D. Em toda a área emersa da Reserva Natural da Berlenga é proibida a utilização de aparelhos de amplificação sonora e receptores de radiodifusão, excepto quando:
a) Usados no interior de edifícios, desde que não sejam audíveis do exterior;
b) Usados com objectivos estritamente militares ou de sinalização sonora de auxílio à navegação.
Art. 3.º É revogado o Decreto-Lei 219/87, de 29 de Maio.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 6 de Julho de 1989. - Aníbal António Cavaco Silva - Eugénio Manuel dos Santos Ramos - Luís Francisco Valente de Oliveira - Joaquim Fernando Nogueira - Jorge Manuel de Oliveira Godinho.
Promulgado em 17 de Agosto de 1989.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 22 de Agosto de 1989.
Pelo Primeiro-Ministro, Eurico Silva Teixeira de Melo.