A indústria preparadora dessa classe de vinhos preocupava-se com a falta de um diploma legal que, atento ao condicionalismo actual e a uma conjuntura em franca e favorável evolução, impusesse regras de equilíbrio de direitos e obrigações e de saudável concorrência com base numa perfeita definição dos produtos e correspondentes técnicas de fabrico, bem como em satisfatórias formas de apresentação e de defesa da qualidade.
2. Admitiu-se que chegara a oportunidade de legislar sobre tal matéria; mas reconheceu-se também que o assunto, pela sua projecção e complexidade, implicava estudo prévio, extenso e profundo, que contemplasse todos os múltiplos aspectos a ele ligados, impondo-se por isso os órgãos técnicos competentes e as actividades mais directamente ligadas ao produto e à sua economia. Isto porque se não pretendia fazer uma simples compilação legislativa. Desejava-se ir mais longe, adoptando-se conceitos que, sem se poderem considerar originais, são agora pela primeira vez explìcitamente formulados e incluídos na nossa legislação vinícola e que se espera seja em breve possível estender a outras classes de vinhos dada a conveniência, dia a dia mais forte, de harmonizar as formas de comercialização com a política de, qualidade dos produtos, prestígio das marcas de origem, designações e marcas comerciais, levando em conta as obrigações de carácter internacional assumidas pelo País.
3. A prossecução dos objectivos apontados pressupunha uma nítida distinção, que o presente diploma consagra, entre vinhos espumantes, ou espumantes naturais, e os vinhos espumosos gasificados - que embora incluídos numa mesma classe, caracterizada pela produção de espuma abundante e persistente provocada por forte desprendimento de anidrido carbónico quando se procede à abertura dos recipientes em que foram contidos, são produtos muito diferentes, quer pela técnica de preparação a que se recorre, quer pelo seu valor intrínseco e comercial.
Impunha-se, por isso, que tal distinção fosse devidamente acautelada, o que se pensa ter conseguido mediante a inserção neste diploma de disposições adequadas.
4. A par deste aspecto, outros mereceram especial cuidado: a capacidade de venda anual pelas entidades preparadoras passa a ser função da existência total verificada em data oportuna, com o que se visa impor por forma indirecta, mas prática, um estágio que assegurando o afinamento da qualidade do produto não facilite aventuras comerciais que a ninguém aproveitam; o uso de um tipo de garrafa, que é o tradicional, devidamente experimentado já no que respeita, por exemplo, à sua resistência mecânica, fica reservado para a classe dos vinhos espumantes e espumosos;
estabelecem-se regras apertadas pelo que respeita à confecção dos rótulos e outros elementos exteriores das garrafas, na busca de uma disciplina que salvaguarde e esclareça o consumidor e prestigie a actividade preparadora e o produto.
5. Outra disposição inovadora é a que limita o número de marcas comerciais a usar por cada preparador armazenista ou exportador. Não se desconhecem possíveis incompreensões ou até reacções em face de tal limitação, mas a excessiva variedade de marcas comerciais obriga a que se tomem medidas disciplinadoras que, tudo o aconselha, deverão ser igualmente, e em breve, aplicadas a outros vinhos. O culto pela multiplicidade de marcas é um preconceito comercial sem justificação no passado, errado no presente e inadmissível num futuro em que os produtos e a sua apresentação devem satisfazer a certas exigências de divulgação e propaganda genérica. Tem por isso que ser contrariado e, ao fazê-lo, confia-se em que a actividade preparadora esclarecida não só aceita como até deseja as medidas adoptadas em tal sentido.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º Os vinhos especiais caracterizados pela produção de espuma abundante e persistente resultante de forte desprendimento de anidrido carbónico quando se procede à abertura das garrafas que os contêm, classificam-se em duas categorias:
a) «Vinhos espumantes naturais», quando preparados pelos métodos clássicos de segunda fermentação em garrafa ou outro recipiente fechado;
b) «Vinhos espumosos gasificados», quando na sua preparação se tenha recorrido à incorporação de qualquer quantidade de anidrido carbónico sob pressão.
Art. 2.º É obrigatória a inscrição nos rótulos das garrafas, em caracteres bem visíveis, das designações referidas no artigo anterior.
Art. 3.º Além da designação «vinho espumante natural», far-se-á menção, nos rótulos das garrafas, do processo de fabrico, mediante a inscrição, em caracteres bem visíveis, dos seguintes dizeres:
a) «Fermentação em garrafa», quando se trate de vinho espumante natural obtido por fermentação em garrafa.
Estes dizeres podem ser substituídos ou completados pela expressão «método champanhês»;
b) «Fermentação em cuba fechada», quando o vinho espumante natural tiver sido preparado pelo processo de fermentação em recipientes fechados de grande capacidade.
Art. 4.º A designação «vinho espumoso gasificado» deverá ser inscrita em caracteres do mesmo corpo e tipo; a dimensão destes caracteres não poderá ser inferior a metade da do maior corpo utilizado no rótulo.
Art. 5.º Em quaisquer facturas, letreiros, anúncios, etiquetas, embalagens e material de propaganda respeitante aos vinhos especiais de que trata este diploma, devem figurar sempre e por forma absolutamente correcta as designações e indicações individualizadoras da categoria e processo de fabrico, referidas nos artigos 1.º e 3.º deste diploma.
Art. 6.º - 1. As características analíticas a que deverão obedecer os vinhos espumantes naturais e os vinhos espumosos gasificados serão, além das que vierem a ser fixadas em regulamento, as seguintes:
a) Força alcoólica mínima 11ºC;
b) Acidez volátil corrigida, expressa em ácido acético, máxima 1,2 g/l;
c) Pressão mínima referida a 20ºC:
Lida no afrómetro, 4 atmosferas;
Lida no manómetro, 3 atmosferas.
d) Anidrido sulfuroso total, máximo:
Nos vinhos espumantes naturais, 100 mg/l;
Nos vinhos espumosos gasificados, 200 mg/l.
2. Quanto às demais características e em tudo que não seja objecto de regulamentação especial, devem os vinhos espumantes naturais e espumosos gasificados obedecer ao disposto no artigo 14.º do Decreto-Lei 35846, de 2 de Setembro de 1946.
Art. 7.º - 1. Para o engarrafamento dos vinhos espumantes naturais é obrigatório o uso de garrafas de tipo tradicional, embora de capacidade variável, as quais poderão também ser utilizadas para os vinhos espumosos gasificados.
2. Este tipo tradicional de garrafa não pode ser utilizado no engarrafamento de quaisquer outras bebidas.
3. Além das iniciais referentes a cada fabricante de garrafas, nestas deve ser marcada, em relevo, a capacidade total, expressa em centilitros, admitindo-se uma tolerância de 2 por cento.
As entidades preparadoras dos vinhos são responsáveis pela capacidade indicada.
Art. 8.º - 1. Fica reservado exclusivamente para as garrafas dos vinhos espumantes naturais e espumosos gasificados o emprego da rolha tradicional de cortiça com formação de cabeça ou topo de «cogumelo», devendo na rolha e na respectiva placa de cobertura ser marcado o nome da firma preparadora.
2. Nos vinhos espumosos gasificados a cápsula ou cobertura do gargalo, incluindo a gargantilha, não poderá descer mais de 3 cm, a contar do topo da garrafa.
Art. 9.º - 1. Só poderão dedicar-se à preparação dos vinhos espumantes naturais e dos vinhos espumosos gasificados as empresas singulares ou colectivas que possuam instalações apropriadas, reúnam as indispensáveis condições técnicas de laboração a determinar em regulamento e sejam titulares do necessário alvará.
2. A mesma empresa não poderá dedicar-se à preparação de vinhos espumantes naturais e de vinhos espumosos gasificados nem à preparação dos dois tipos de vinhos a que se referem as alíneas a) e b) do artigo 3.º 3. As instalações destinadas à preparação de vinhos espumantes naturais não podem servir senão para esse fim e nelas não pode existir qualquer aparelho de gasificação.
Art. 10.º - 1. É também condição indispensável para o exercício da actividade preparadora a que se refere o artigo antecedente a constituição e manutenção em cave ou armazém privativos das seguintes existências mínimas permanentes:
a) Vinhos espumantes naturais engarrafados - 50000 l;
b) Vinhos espumosos gasificados engarrafados - 20000 l e uma reserva de vinho base para tal fim de 50000 l.
2. Nenhuma firma preparadora de vinhos espumantes naturais poderá vender anualmente mais de 50 por cento da sua existência total engarrafada, verificada no ano anterior.
Art. 11.º - 1. A venda de vinhos espumantes naturais ou de vinhos espumosos gasificados só poderá ser feita sob marcas comerciais devidamente registadas pelas firmas preparadoras desses vinhos na Repartição da Propriedade Industrial, devendo figurar obrigatòriamente nos rótulos das garrafas a indicação da firma e a localização da sua sede, com menção destacada da palavra «Portugal».
2. Em todo o território nacional cada firma preparadora não poderá usar mais de seis marcas.
Art. 12.º - 1. Os armazenistas ou exportadores que sejam preparadores de vinhos espumantes naturais ou de vinhos espumosos gasificados só poderão comercializar os vinhos que estejam habilitados a preparar.
2. Nenhuma firma poderá usar para qualquer das categorias de vinhos indicadas nos artigos 1.º e 3.º rótulos com designativos de marca ou aspecto que possam provocar confusão com vinhos da outra categoria.
Art. 13.º - 1. Para o efeito do disposto nos artigos anteriores, a cada marca deverá corresponder um rótulo individualizado, entendendo-se que correspondem a marcas distintas os rótulos que, contendo embora um mesmo designativo de marca, apresentem outros elementos complementares, aspecto gráfico, forma ou cor diferentes.
2. Não se consideram elementos diferenciadores de marcas as simples indicações de «bruto», «seco», «doce» ou quaisquer outras para esclarecimento do consumidor quanto às características dos respectivos vinhos, mesmo quando inscritas nos rótulos com esse propósito.
Art. 14.º - 1. A fiscalização do cumprimento do disposto neste diploma, no que respeita às suas normas gerais e ao disposto nos artigos 10.º e 15.º, incumbe, especialmente, à Junta Nacional do Vinho.
2. Para efeito da fiscalização a efectuar na área das regiões demarcadas, a Junta delegará a competência fiscalizadora nos respectivos organismos vitivinícolas regionais.
Art. 15.º - 1. A armazenagem e o movimento de preparação e de venda dos vinhos espumantes naturais ou espumosos gasificados ficam sujeitos ao regime de fiscalização e conta corrente.
2. Os engarrafamentos dos vinhos espumantes naturais de fermentação em garrafa só poderão ser efectuados com prévio conhecimento dos serviços de fiscalização.
Para tanto, deverão os interessados fazer a comunicação do engarrafamento de cada lote com uma antecedência de pelo menos, dez dias. Na comunicação respeitante ao último engarrafamento deverá mencionar-se esta circunstância.
3. Para efeitos de inscrição na conta corrente, a contagem das garrafas terá de ser efectuada antes da adição do licor de expedição, na presença dos serviços de fiscalização.
4. A inscrição na conta corrente dos vinhos espumantes naturais de fermentação em cuba fechada só poderá ser efectuada após contagem das garrafas realizada na presença dos serviços de fiscalização, requerida para o efeito pela firma preparadora.
A contagem e inscrição na conta corrente poderá ainda ser efectuada sempre que a fiscalização o entenda conveniente.
5. As contagens, para efeito de verificação da conta corrente, bem como da existência mínima a que se refere a alínea a) do artigo 10.º, serão feitas normalmente no decurso de Janeiro e Agosto, sem prejuízo de quaisquer outras que a fiscalização julgue necessárias.
6. O movimento das contas correntes dos vinhos espumosos gasificados será efectuado pela própria firma preparadora, fazendo-se a sua verificação, bem como a das existências mínimas a que se refere a alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, sempre que a fiscalização o considere conveniente.
7. Para plena eficiência da fiscalização a efectuar, é obrigatória a aposição nas garrafas de um selo de modelo uniforme, mas de cor diferente, conforme as categorias dos vinhos, o qual será fornecido pelos respectivos serviços em condições a fixar.
8. Independentemente da assistência fiscalizadora prevista neste diploma, as firmas produtoras ficam sujeitas à fiscalização geral dos vinhos.
Art. 16.º As disposições do Decreto-Lei 41204, de 24 de Julho de 1957, são aplicáveis à preparação e julgamento das infracções previstas neste diploma, bem como à graduação da responsabilidade dos seus agentes e ao destino das multas e das mercadorias apreendidas.
Art. 17.º Considera-se género alimentício avariado todo o vinho espumante natural ou vinho espumoso gasificado que não satisfaça ao preceituado na alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º Art. 18.º Constitui delito de falsificação de géneros alimentícios a preparação, armazenagem ou depósito, venda ou exposição para venda de vinhos espumantes naturais que não satisfaçam ao preceituado na alínea d) do n.º 1 do artigo 6.º Art. 19.º Constituem contravenções por falta de características legais as infracções ao disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 6.º e ainda em relação aos vinhos espumosos gasificados a infracção ao disposto na alínea d) do mesmo número.
Art. 20.º O uso ilegítimo ou indevido das designações previstas no artigo 1.º ou das inscrições referidas no artigo 3.º e a infracção ao preceituado no artigo 9.º, n.os 1 e 2, constituem contravenção punível nos termos do artigo 29.º do Decreto-Lei 41204, de 24 de Julho de 1957.
Art. 21.º A infracção ao disposto no n.º 3 do artigo 9.º constitui contravenção punível com a multa de 1000$00 a 10000$00 e com a apreensão e perda dos respectivos aparelhos.
Art. 22.º Consideram-se infracções disciplinares contra a economia nacional, sendo como tais puníveis pelos organismos competentes, os eventos que se traduzam na inobservância dos seguintes preceitos:
a) Artigo 4.º;
b) Artigo 7.º;
c) Artigo 8.º;
d) Artigo 10.º;
e) Artigo 11.º, n.os 1 e 2;
f) Artigo 12.º, n.os 1 e 2;
g) Artigo 15.º n.os 2, 3, 4, 6 e 7;
h) Artigo 23.º, n.º 1;
i) Artigo 24.º, n.os 1 e 2;
j) Artigo 25.º, n.os 3 e 4;
l) Artigo 27.º;
Art. 23.º - 1. As empresas singulares ou colectivas que, à data da publicação deste diploma, empreguem simultâneamente mais do que um dos processos a que se referem as alíneas a) e b) do artigo 3.º, ficam obrigadas a comunicar, no prazo de 60 dias, à Direcção-Geral dos Serviços Industriais, o processo que pretendem adoptar e indicar as existências que possuem de cada um dos vinhos cuja preparação abandonam. Estas existências ficarão em regime de conta corrente especial até ao seu total esgotamento.
2. A Direcção-Geral dos Serviços Industriais comunicará à Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais e à Junta Nacional do Vinho as alterações sofridas por força deste artigo.
Art. 24.º - 1. As firmas que não sejam preparadoras de vinhos espumantes naturais ou espumosos gasificados e que presentemente se dediquem ao comércio destes vinhos com marcas próprias poderão continuar a usá-las, até ao máximo de três, correspondendo a cada uma delas o vinho de uma única firma preparadora. Neste caso deverá figurar na rolha, placa de cobertura e rótulo o nome desta firma.
2. Não é admissível a cedência ou transmissão das marcas a que se refere o n.º 1.
Art. 25.º - 1. É concedido o prazo de dois anos e de um ano para todos os preparadores dos vinhos referidos, respectivamente, nas alíneas b) do artigo 1.º e a) e b) do artigo 3.º procederem às alterações impostas por este diploma.
2. É igualmente concedido o prazo de dois anos para o cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 7.º 3. A venda dos vinhos já engarrafados e a utilização dos rótulos já existentes serão permitidas durante o prazo de um ano, devendo contudo ser aposta nas garrafas uma gargantilha, contra-rótulo ou sobrecarga no próprio rótulo com todas as indicações prescritas neste diploma.
4. Nas garrafas já em poder dos comerciantes, torna-se obrigatória, no prazo de 180 dias, a aposição no rótulo, por forma destacada e bem visível, de todas as indicações prescritas neste diploma.
Art. 26.º É também concedido o prazo de um ano para cumprimento do estabelecido em relação ao uso das marcas comerciais, e a que se referem especialmente os artigos 11.º, 12.º e n.º 1 do artigo 24.º Art. 27.º É obrigatório, para efeitos de fiscalização e registo, enviar à Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais e à Junta Nacional do Vinho doze exemplares dos rótulos de cada uma das marcas actuais e das que venham a ser usadas após a publicação deste diploma.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 7 de Dezembro de 1962. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior - João de Matos Antunes Varela - António Manuel Pinto Barbosa - Mário José Pereira da Silva - Fernando Quintanilha Mendonça Dias - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - Eduardo de Arantes e Oliveira - Adriano José Alves Moreira - Manuel Lopes de Almeida - José do Nascimento Ferreira Dias Júnior - Carlos Gomes da Silva Ribeiro - José João Gonçalves de Proença - Henrique de Miranda Vasconcelos Martins de Carvalho - João Mota Pereira de Campos - Samuel Rodrigues Sanches.
Para ser presente à Assembleia Nacional.