Decreto-Lei 49/89
de 22 de Fevereiro
A actividade parabancária de financiamento de aquisições a crédito tem vindo a assumir uma importância crescente, tornando imperioso, tal como já aconteceu relativamente às compras em grupo, proceder à sua regulamentação, em articulação com outras formas de financiamento da aquisição de bens ou serviços.
Na mesma linha de orientação definida pela Portaria 466-A/87, de 3 de Junho, que fixou o novo regime de vendas a prestações, importa assegurar que o desenvolvimento desta actividade se processe de acordo com os grandes objectivos macroeconómicos, nomeadamente a moderação do consumo e a manutenção das tendências desinflacionárias.
Apesar de prosseguir objectivos comuns - facilitar o acesso ao consumo de bens ou serviços -, o sistema agora criado difere substancialmente, quer das compras em grupo, reguladas pelo Decreto-Lei 393/87, de 31 de Dezembro, quer das vendas a prestações, pelo que se considera oportuno caracterizar sumariamente cada um deles, de forma a que o público adquirente e as empresas vendedoras conheçam claramente o quadro legal em que podem defender os seus legítimos interesses.
No regime de vendas a prestações a relação creditícia estabelece-se directamente entre o vendedor e o comprador, enquanto nas compras em grupo e nas aquisições a crédito são criadas instituições parabancárias que têm por finalidade estabelecer a intermediação entre compradores e vendedores.
Mas entre as sociedades administradoras de compras em grupo (SACEG) e as sociedades financeiras para aquisições a crédito (SFAC), criadas pelo presente diploma, há também evidentes diferenças que importa destacar desde já, porque enquanto as primeiras se limitam a gerir fundos comuns constituídos por grupos de pessoas, designadas por participantes, mediante a entrega de prestações periódicas de natureza pecuniária, por forma que cada um dos participantes venha a adquirir os bens ou serviços a que se reportar o contrato, já as segundas, sendo meros intermediários financeiros, prosseguem a actividade de financiamento, ao fornecedor ou ao adquirente, da aquisição a crédito de bens ou serviços.
Finalmente, assegura-se a protecção dos consumidores, não só pela fixação de condições e requisitas de acesso à actividade, mas também pelo estabelecimento de regras de liquidez e solvabilidade e ainda pelas funções de supervisão que este diploma atribui ao Banco de Portugal.
Foi ouvido o Banco de Portugal.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º Constitui objecto do presente diploma a regulamentação da constituição e funcionamento das empresas que prossigam a actividade de financiamento da aquisição de bens ou serviços a crédito.
Art. 2.º As sociedades financeiras para aquisições a crédito, neste diploma designadas abreviadamente por SFAC, são instituições parabancárias que têm por objecto exclusivo:
a) O financiamento da aquisição a crédito de bens ou serviços, nomeadamente sob a forma de:
Concessão de crédito directo ao fornecedor ou ao adquirente;
Desconto ou outras formas de negociação de títulos de crédito;
Prestação de garantias;
Antecipação de fundos sobre créditos de que sejam cessionárias as SFAC;
b) A prestação de serviços directamente relacionados com as formas de financiamento referidas na alínea anterior, nomeadamente a simples gestão de créditos.
Art. 3.º - 1 - Às SFAC é especialmente vedado:
a) O exercício directo de qualquer actividade agrícola, industrial ou comercial que exceda o seu próprio objecto;
b) O financiamento da aquisição de imóveis, e bem assim da aquisição de bens ou serviços cuja venda a prestações não seja permitida ou que não respeite os requisitos legais estabelecidos para essa venda, designadamente quanto ao desembolso inicial e ao prazo para pagamento total;
c) A aquisição de acções próprias e de acções ou partes de capital de instituições de crédito ou parabancárias, salvo autorização do Ministro das Finanças, a prestar por despacho, ouvido o Banco de Portugal;
d) A aceitação de depósitos, não incluindo no conceito de depósitos as entregas por conta;
e) A aquisição de imóveis, para além dos necessários às suas instalações próprias.
2 - Quando a aquisição dos bens referidos nas alíneas c) e e) do número anterior for consequência da cobrança de dívidas de terceiros, devem as SFAC proceder à respectiva alienação no prazo de seis meses, tratando-se de acções, ou de um ano, tratando-se de imóveis.
Art. 4.º - 1 - A actividade própria das SFAC não pode ser desenvolvida por qualquer outra entidade, com excepção das instituições de crédito e de outras instituições parabancárias em cujo objecto expressamente se integre a mesma actividade.
2 - O disposto no número anterior abrange a realização de operações e a prestação de serviços no âmbito da actividade comercial, ou outra, da entidade financiadora, desde que a comercialização dos bens ou serviços não seja feita directamente por essa entidade.
Art. 5.º - 1 - As SFAC constituem-se sob a forma de sociedade anónima.
2 - As SFAC devem ter realizado, na data da constituição, um capital social mínimo, a fixar por portaria do Ministro das Finanças, que não poderá ser inferior a 500 milhões de escudos.
3 - As SFAC só podem constituir-se depois de os seus accionistas fazerem prova da realização do capital da sociedade.
Art. 6.º - 1 - A autorização para a constituição das SFAC será concedida mediante portaria do Ministro da Finanças.
2 - Sem prejuízo do que neste diploma se estabelece, a constituição e as condições de funcionamento das SFAC, bem como a abertura das respectivas filiais, sucursais e agências, regem-se, com as necessárias adaptações, pelo disposto no Decreto-Lei 23/86, de 18 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 116/86, de 27 de Maio, exceptuando-se, no entanto, o preceituado nos seus artigos 3.º, n.os 1 e 4, 8.º, 10.º, n.os 3 e 4, 11.º, n.º 2, 19.º, 22.º, n.os 2 e 3, 24.º, n.os 3 e 4, 39.º, 40.º e 40.º-A.
3 - O Ministro das Finanças pode ordenar, por despacho, a imediata cessação da actividade própria das SFAC, quando exercida sem autorização, nomeando para o efeito uma comissão liquidatária, sendo aplicável neste caso o processo de liquidação das instituições parabancárias previsto no Decreto-Lei 30689, de 27 de Agosto de 1940, sem prejuízo de outras medidas e sanções previstas na lei.
Art. 7.º Aos membros dos órgãos de administração e fiscalização das SFAC, bem como aos accionistas que detenham mais de 20% do capital das mesmas sociedades, é vedado possuir participação no capital, pertencer em nome próprio ou em representação de outrem aos órgãos sociais ou desempenhar quaisquer funções noutras SFAC.
Art. 8.º As SFAC ficam sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, incumbindo a este emitir as directivas necessárias a essa supervisão e estabelecer eventuais obrigações específicas de carácter contabilístico e estatístico.
Art. 9.º Por aviso do Banco de Portugal poderão ser definidas as relações a observar pelas SFAC na composição e relação de rubricas do activo, do passivo e da situação liquida entre si ou com certas espécies de operações, podendo também fixar-se:
a) Limites e formas de cobertura das responsabilidades efectivas perante terceiros;
b) Limites à emissão de obrigações;
c) Limites à realização de operações com uma só entidade.
Art. 10.º Verificando-se alguma situação de desequilíbrio susceptível de afectar o regular funcionamento de uma SFAC ou de perturbar as condições normais dos mercados monetário e financeiro, poderão ser tomadas, em relação à mesma sociedade, as providências extraordinárias previstas para os bancos comerciais e de investimento.
Art. 11.º As SFAC regem-se pelas normas do presente diploma, pela legislação aplicável ao conjunto das instituições parabancárias e ainda, subsidiáriamente, pelas disposições que regulam a actividade das instituições de crédito, com as necessárias adaptações.
Art. 12.º - 1 - As entidades que, à data da publicação do presente diploma, exerçam a actividade nele regulada devem promover as diligências necessárias para, no prazo de seis meses a contar da data de entrada em vigor deste diploma, se adaptarem ao novo regime.
2 - Fica vedada às entidades referidas no número anterior a actividade própria das SFAC se, findo o prazo referido no mesmo número, não tiverem sido promovidas as adaptações devidas.
3 - O disposto no número anterior não obsta ao cumprimento pontual dos contratos celebrados,
4 - Às entidades existentes cujo requerimento venha a ser indeferido fica igualmente vedado o exercício de actividade própria das SFAC, a partir da data da notificação do indeferimento, aplicando-se-lhes o disposto no n.º 3 do presente artigo.
Visto e aprovado em Conselhos de Ministros de 12 de Janeiro de 1989. - Aníbal António Cavaco Silva - Miguel José Ribeiro Cadilhe - Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Promulgado em 9 de Fevereiro de 1989.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 9 de Fevereiro de 1989.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.