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Parecer 8/2002, de 4 de Outubro

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Texto do documento

Parecer 8/2002. - Proposta de lei relativa ao regime jurídico do desenvolvimento e qualidade do ensino superior. - I - Apreciação na generalidade. - 1 - A leitura da exposição de motivos que é apresentada com a intenção de explicitar os fundamentos e objectivos da proposta de lei não é, em si mesma, suficientemente esclarecedora, uma vez que parece ter-se orientado pelo desejo de identificar múltiplos aspectos em que importa repensar o ensino superior, em Portugal, exprimindo sobre muitos deles algumas ideias impressivas que, facilmente, recolhem amplo consenso.

Simplesmente, nessa multiplicidade de referências, torna-se difícil surpreender qualquer hierarquia de interesse ou prioridade política, susceptível de indiciar as referidas finalidades e objectivos da proposta de lei.

Mais expressiva, a este respeito, foi a apresentação da referida proposta ao plenário do CNAVES, por parte do Ministro da Ciência e do Ensino Superior, na qual enunciou três intenções subjacentes à iniciativa legislativa:

a) Apoiar projectos de qualidade;

b) Promover o desenvolvimento do ensino superior com base na "qualidade avaliada";

c) Reforçar o crédito dos diplomas do sistema de ensino superior português a nível internacional.

2 - Estas referências tornam clara a ideia de associar a "qualidade ao desenvolvimento" na designação da própria proposta de lei, assumindo o claro entendimento de que qualquer perspectiva de "desenvolvimento do ensino superior" só tem sentido e significado útil enquanto se realizar com respeito da "qualidade" inerente à sua própria condição.

Significa isto que se pretende afastar, em definitivo, qualquer hipótese de crescimento em que o binómio "qualidade versus quantidade" se desequilibre em favor do último termo, como todos reconheceremos, sem dificuldade, ter acontecido em alguns períodos da evolução do ensino superior nas últimas duas décadas, no nosso país.

3 - Deste entendimento decorre, naturalmente, uma intenção de definir e aplicar "critérios relativos à política nacional para o ensino superior que se prendem com a organização da rede escolar, em especial da rede pública, e a avaliação da qualidade", tal como é expresso, circunstancialmente, nas próprias palavras da exposição de motivos.

No entanto, este enunciado de aparente simplicidade, suscita interrogações diversas, tanto no que respeita à definição como à aplicação dos "critérios" nele referidos.

4 - Começando pelo processo de "definição", tornam-se pertinentes as seguintes interrogações:

a) Como se orienta a definição dos critérios que se prendem com a organização da rede pública?

b) Nessa definição é ponderada a moldura estrutural de um sistema binário, em que coexistem duas modalidades de ensino conceptualmente distintas?

c) Em qualquer dos casos, os critérios definidos para a rede pública são inteiramente transferíveis para aplicação aos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo?

4.1 - No que respeita à primeira questão, o regime jurídico do desenvolvimento e qualidade do ensino superior, adiante designado apenas por regime jurídico, nos seus artigos 6.º e 7.º, estabelece como critérios dominantes de criação de estabelecimentos susceptíveis de integrar a rede pública:

i) A existência de condições ambientais (instalações, equipamentos, etc.) com qualidade e dignidade exigíveis à condição dos cursos que vão ministrar;

ii) A disponibilidade de um corpo docente devidamente qualificado, dentro de parâmetros habilitacionais adequados ao conjunto de funções que lhe incumbe desempenhar;

iii) A indução de trabalho científico associado aos cursos ministrados, em actividades de investigação e ou prestação de serviços à comunidade;

iv) A garantia de "indiscutível relevância social" das actividades realizadas.

Como comentário imediato, pode dizer-se que estes quatro critérios são, tradicionalmente, os que orientam qualquer decisão relativa à criação de estabelecimentos públicos de ensino. No entanto, numa apreciação mais cuidada, não pode deixar de referir-se que eles terão de ser compaginados com outras preocupações susceptíveis de conferir coesão à rede pública global, entre as quais se salientam:

a) Uma tendencial equidade geográfica, necessariamente orientada para a superação, de factores culturais e económicos condicionantes do desenvolvimento regional;

b) Uma partilha equilibrada entre as duas modalidades de ensino que configuram o sistema binário de ensino superior em Portugal, solicitando de cada uma o contributo mais ajustado à sua matriz formativa.

O que acaba de ser referido conduz ao entendimento de que os trabalhos de elaboração da rede pública de ensino superior, suportando-se embora em parâmetros de base nacional, susceptíveis de definir grandes linhas de desenvolvimento estratégico, devem associar-lhes elementos de base regional que exprimam singularidades capazes de influenciar as soluções desejáveis para cada região.

No entanto, esta preocupação não pode, em caso algum, cair numa lógica de atomização institucional, deixando que cada estabelecimento de ensino, nos seus programas de actividade, ignore o que se passa em seu redor e, nessa medida, se divorcie dos programas dos estabelecimentos congéneres de proximidade.

4.2 - No que se refere à ponderação da coexistência dos ensinos universitário e politécnico - bem necessária a uma racionalização da oferta, como já se disse -, o regime jurídico apresentado, estranhamente, apresenta duas ideias essenciais de sentido oposto:

a) Por um lado - e muito bem -, defende idêntica dignidade entre o ensino universitário e o ensino politécnico, no que respeita ao seu posicionamento perante a tutela, em matéria de apreciação de cursos para funcionamento, remetendo ambos os casos para o acto de "registo";

b) Por outro, condicionada pela Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), mantém a limitação do ensino politécnico em matéria de "concessão de graus académicos", não perspectivando segundo uma visão de futuro o desfecho das evoluções em curso.

A este respeito, não pode deixar de dizer-se que o regime jurídico, enfermando de uma estranha definição das duas modalidades de ensino, tende a perpetuar uma visão ultrapassada do ensino politécnico.

E, importa dizê-lo, exprimir esta visão numa proposta de lei apresentada no ano de 2002 corresponde a um desfasamento da realidade que se torna necessário superar.

4.3 - No que se refere à transposição dos critérios definidos para a rede pública para aplicação aos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, o regime jurídico defende um princípio salutar e que se regista com satisfação: o princípio da paridade, entre o ensino público e o ensino não público, em matéria de requisitos condicionantes das deliberações relativas ao "reconhecimento oficial de estabelecimentos" ou "registo de cursos".

No entanto, para que o princípio tenha validade plena, torna-se necessário que a sua "leitura" seja feita, em cada caso, em conformidade com a realidade que está a ser tratada.

Ao dizer isto, estamos concretamente a referir-nos ao critério que foi enunciado como "garantia de indiscutível relevância social das actividades realizadas".

Desde logo, há que referir que seria desejável clarificar o conceito de "relevância social", pois ele deverá ser encarado numa perspectiva sócio-económica ou cultural e, também, numa visão não só de curto prazo mas igualmente prospectiva.

Na verdade, torna-se importante evitar que o sistema de ensino superior se torne, por um lado, escravo do mercado de trabalho e, por outro, cativo do presente.

Mas, para além disso, deveremos interrogar-nos sobre se compete ao Estado decidir sobre a relevância social de actividades desenvolvidas por entidades privadas.

No caso presente, é certo que ao Estado não pode ser indiferente o futuro dos alunos que procuram o ensino particular e cooperativo para frequentar cursos de ensino superior, devendo chamar a atenção para o carácter, mais ou menos aleatório, das expectativas que os motivaram para essa procura.

Significará isto que, com esta base, se torna legítimo ao Estado não autorizar o funcionamento de um curso que considere não apresentar "inequívoca relevância social"?

Na resposta que queira dar-se a esta questão, importa ter em atenção que o Estado não intervém na relação que se estabelece entre os estudantes e o estabelecimento que ministra o curso, pois não apoia aqueles no nível do que faz com os alunos do ensino público nem se dispõe a ajudar este na tentativa de organizar um qualquer outro curso alternativo.

5 - Tratada que foi a definição dos critérios relativos à organização da rede de ensino superior, passamos a abordar a questão da sua "aplicação".

Na lógica do regime jurídico, a aplicação dos critérios suporta-se na actividade do Conselho Nacional do Ensino Superior, criado pelo artigo 41.º do regime jurídico, como "órgão específico de consulta do Ministro da Ciência e do Ensino Superior".

Na verdade, o n.º 3 do artigo 6.º, o n.º 5 do artigo 7.º e o n.º 2 do artigo 14.º conferem a esse Conselho a possibilidade de elaborar pareceres, para decisão ministerial, relativos aos requisitos de composição do corpo docente e de condições ambientais susceptíveis de possibilitar a criação e funcionamento de estabelecimentos de ensino superior, enquanto o n.º 2 do artigo 43.º lhe atribui competência para se pronunciar sobre outros aspectos relevantes para o mesmo efeito, concretamente:

"a) Necessidades do País em quadros qualificados e as correspondentes prioridades de desenvolvimento do ensino superior;

b) Articulação entre o ensino universitário e o ensino politécnico;

c) Articulação entre o ensino superior público e o ensino superior não público;

d) Articulação entre o desenvolvimento do ensino superior e a política de ciência;

e) Articulação entre o ensino superior e a vida empresarial."

Como se verifica, seria no âmbito das competências do Conselho Nacional do Ensino Superior que iria, eventualmente, situar-se o campo de decisão fundamental que orientaria o funcionamento e evolução do sistema, o que, aliás, é confirmado pelo n.º 3 do citado artigo 43.º, quando se estabelece que "o Conselho Nacional do Ensino Superior deve, ainda, ser ouvido relativamente à criação e ao reconhecimento de novos estabelecimentos de ensino superior".

6 - As referências feitas ao posicionamento da Conselho Nacional do Ensino Superior, como suporte essencial da racionalização e regulação do funcionamento do sistema de ensino superior, suscita algumas observações de natureza diversa que se torna necessário evidenciar.

6.1 - A primeira, de natureza técnica, relaciona-se com a dúvida que a estrutura do Conselho levanta relativamente à capacidade de elaboração dos pareceres e, sobretudo, dos estudos que se enquadram no âmbito das suas competências.

Na verdade, alguns dos estudos previstos, como os que se relacionam com a identificação das "necessidades do País em quadros qualificados" a partir dos quais se estabelecem as "correspondentes prioridades de desenvolvimento do ensino superior", exigem especializações técnicas não necessariamente garantidas pela composição do Conselho.

Assim sendo, para que o Conselho possa funcionar em condições de assegurar credibilidade aos seus pareceres terá de ser-lhe associado um corpo técnico devidamente habilitado para os objectivos que se pretendem.

6.2 - A segunda, de natureza metodológica, tem que ver com a perspectiva segundo a qual são encarados os processos de laboração dos pareceres do Conselho.

Na verdade, do articulado do regime jurídico não se descortina qual a preferência entre duas hipóteses possíveis de intervenção do Conselho na apreciação das propostas originárias das entidades instituidoras ou dos próprios estabelecimentos de ensino:

a) Emitir opinião sobre sua validade com base em estudos promovidos pelo próprio Conselho; ou

b) Emitir essa opinião com base em estudos facultados pelas entidades proponentes que considere fidedignos.

A nosso ver, esta segunda hipótese é em mais fecunda, pois corresponde a uma lógica de responsabilização das entidades proponentes, atribuindo-lhes o "ónus da prova" da validade das propostas apresentadas, deixando para o Conselho apenas um juízo sobre a fidedignidade do estudos apresentados e, bem assim, o enquadramento das propostas no referencial de requisitos estabelecidos para a sua aceitação.

Num processo desta natureza, pode até incluir-se a oportunidade de apreciação dos mecanismos de auto-regulação institucional e, também, de processos de "regulação de proximidade" que possam ter sido desenvolvidos.

Significa isto que a "regulação central", para além da ponderação de parâmetros estratégicos de âmbito nacional, assume como papel dominante a formulação de juízos sobre os citados mecanismos de "auto-regulação" e "regulação de proximidade", reservando-se uma missão de coordenação e articulação global.

6.3 - A terceira, de natureza temporal, tem que ver com a recusa de uma atitude estática, por parte do Conselho, na apreciação das propostas sobre os quais tenha de emitir parecer.

Esta posição estática corresponde a uma lógica de apreciação casuística, contrariando uma evidência técnica incontornável: a expectativa de um desenvolvimento estratégico do ensino superior, para que possa consolidar-se, aconselha a que o funcionamento dos estabelecimentos de ensino se faça com base em programas plurianuais, devidamente calendarizados, em que sejam definidos os objectivos da formação, tanto no que respeita aos domínios científicos dos cursos a desenvolver como no que concerne aos referenciais quantitativos a atingir.

Significa isto que se deve dar preferência a uma lógica defendida, para os estabelecimentos públicos, no n.º 3 do artigo 10.º, em que se associa o financiamento, por parte do Estado, a um processo contratual cuja base de referência é o designado "plano de desenvolvimento da instituição aprovado pela tutela".

Trata-se de uma posição que, em termos futuros, deve orientar as relações entre o Estado e cada uma das instituições, pois só assim será possível antever a evolução do sistema de ensino superior, qualquer que seja o nível geográfico de apreciação, e, nessa medida, oferecer uma dimensão prospectiva e dinâmica à actividade desenvolvida.

Aliás, as leis de autonomia são claras a este respeito, quando orientam os mecanismos de gestão institucional pela expectativa de planos de actividade plurianuais, ainda que susceptíveis de revisões aconselhadas pelas tendências de evolução social.

É que, como facilmente se compreende, será sempre difícil avançar no tempo, enquanto a lógica funcional assumida tiver a velocidade do dia-a-dia...

6.4 - A quarta, de natureza conceptual, tem que ver com o papel desempenhado pelo sistema nacional de avaliação no processo global de regulação do ensino superior.

O articulado do regime jurídico concede ao sistema nacional de avaliação um papel dominante nessa regulação, fazendo depender dos resultados por ele obtidos consequências várias, em que se salientam as de teor negativo, como sejam a "revogação" ou a "suspensão" da autorização de funcionamento ou de reconhecimento de interesse público dos estabelecimentos ou cursos por eles ministrados.

Sem colocar quaisquer reservas a estas e outras consequências decorrentes das actividades de avaliação, importa dizer que a sua ligação ao processo global de regulação é sempre estabelecida a posteriori; no entanto, não pode ignorar-se que este processo tem uma base essencial "apriorística", coincidente com a autorização de criação ou reconhecimento oficial dos estabelecimentos de ensino e do funcionamento dos cursos por eles ministrados.

Na verdade, essas autorizações suportam-se, por um lado, no reconhecimento da missão institucional dos estabelecimentos e, por outro, no cumprimento de um conjunto de requisitos de qualidade previamente definidos, em si mesmo indutores de uma expectativa de desempenho qualitativamente exigente.

E é na confirmação (ou não...) dessa expectativa que o sistema nacional de avaliação vai actuar, verificando se o requisitos de qualidade se mantêm e se traduzem num desempenho institucional susceptível de apreciação positiva.

Quer isto dizer que a função reguladora do sistema nacional de avaliação é, no horizonte temporal em que surge, complementar da regulação apriorística e, naturalmente, orienta os seus juízos e qualidade tendo sempre em atenção os objectivos propostos para a missão institucional e o referencial de critérios que determinaram a autorização de funcionamento dos estabelecimentos ou dos cursos.

Ao dizer-se isto, tem-se em mente uma referência do Ministro da Ciência e do Ensino Superior, ao declarar que não dispunha de dispositivos legais que permitissem uma intervenção reguladora.

E o que se pretende deixar claro é, apenas, a ideia de que o sistema nacional de avaliação pode contribuir para essa actuação reguladora no que respeita ao sistema já em funcionamento; no entanto, será bom que, em qualquer processo de crescimento, a regulação apriorística funcione criteriosamente, deixando abertas todas as expectativas possíveis de qualidade acrescida.

6.5 - A quinta observação, de natureza sistémica, tem que ver com o papel, mais ou menos dominante que queira atribuir-se ao Conselho Nacional do Ensino Superior.

Aceitando-se a sua existência, como órgão consultivo do ministro da tutela - situação essa que lhe confere um carácter de provisoriedade associado à confiança que lhe mereça - não pode deixar de recordar-se que existem outras instâncias de consulta obrigatória e, necessariamente, susceptíveis de contributos enriquecedores: são os casos do CRUP, do CISP, da APESP, do CNAVES e do CNE.

É certo que o regime jurídico não afasta a hipótese de envolvimento destas entidades nas decisões; mas é sabido que a existência de um órgão específico junto do Ministro e por ele presidido pode, a todo o tempo, tornar-se dominante.

E, no entanto, todos os outros órgãos referidos têm posicionamentos na lógica do sistema que lhes conferem, em aspectos específicos, capacidade acrescida de exprimir opinião e, inclusivamente, poder negocial, que deve ser contemplado.

Uma referência especial deve ser feita em relação ao CNE, não só pela sua ligação directa à Assembleia da República, mas também porque a sua composição lhe confere a possibilidade de favorecer a intervenção dos diferentes parceiros interessados na actividade educativa, com a vantagem de não circunscrever a sua actividade ao ensino superior.

E esta é uma questão importante, pois o funcionamento e o desenvolvimento do ensino superior não pode desligar-se do que se passa com os outros segmentos do sistema educativo, por motivos relacionados com o equilíbrio global deste sistema e, também, pelas relações de mútua dependência entre o ensino superior e, pelo menos, o ensino secundário, na certeza de que essa dependência tem um prolongamento descendente até à "educação pré-escolar".

7 - Na multiplicidade de aspectos relativos ao ensino superior que a exposição de motivos exprime, ainda que sem caracterizar o que é dominante, como já se disse, há uma ideia recorrente que importa assinalar, relacionada com a afirmação de que "o processo de qualificação do ensino superior passa obrigatoriamente pela realização plena da combinação 'ensino-investigação-criação cultural', potenciando sinergias entre as três valências".

O interesse desta referência não tem que ver, naturalmente, com qualquer sentido inovador que ela apresente, mas sim com a indução de uma reflexão que, eventualmente, o CNAVES poderá promover.

Trata-se de, ao reconhecer que a prática de investigação é, obrigatoriamente, um dos "campos de apreciação" a incluir na avaliação de cursos, de unidades funcionais ou de instituições, será natural que nos interroguemos sobre se deve manter-se o sistema dual de avaliação - do ensino e da investigação -, tanto mais quando, agora, a ciência e o ensino superior têm a tutela do mesmo ministro.

É certo que têm sido diferentes as lógicas que orientam uma e outra das avaliações em causa, mas a intenção agora expressa de culminar a avaliação de cursos ou instituições com uma "classificação de mérito" vem aproximá-las, e, nessa medida, deixar campo aberto à reflexão sugerida.

8 - A terminar a apreciação na generalidade, importa dizer que, sendo feliz, como já se disse, a ideia de associar a "qualidade" ao "desenvolvimento do ensino superior", seria desejável que se clarificassem os objectivos de referência para esse desenvolvimento, uma vez que ele não vale só por si, nem pode ser indiferente ao que o País dele espera.

A exposição de motivos deixa transparecer algumas ideias a esse respeito, mas tende a virar-se demasiado para o interior do sistema, na expectativa de lhe proporcionar melhorias necessárias, como que se satisfazendo com o "assegurar que o ensino superior seja reconhecido pela sua qualidade cultural, científica e técnica e pela realização escolar e sucesso profissional dos seus estudantes".

Reconhece-se que já seria bastante, mas não pode deixar de recordar-se o objectivo estratégico fixado em 2000 na Cimeira de Lisboa do Conselho da Europa dos Quinze para os próximos 10 anos: fazer da União Europeia a economia, baseada no conhecimento, mais competitiva e dinâmica, capaz de um crescimento sustentável, com mais e melhores empregos e mais coesão social.

Ora, perante este desafio da União, ganha maior acuidade o esforço que Portugal tem de fazer para superar o da "convergência real", sendo certo que o sucesso desse esforço se situa, em grande parte, no reforço e na capacidade de intervenção do "potencial humano" que formos capazes de construir.

E é aí que o ensino superior tem um papel dominante a desempenhar, fazendo alianças criativas entre a ciência, a tecnologia e a cultura, em termos susceptíveis de mobilizar a inteligência nacional ao serviço de uma causa comum.

Não é só uma questão económica que está em causa, pois ao impulso necessário à criação de riqueza tem de associar-se o culto dos valores que preservam a nossa identidade nacional, o que vem aumentar os níveis de responsabilidade das instituições de ensino superior na procura dos caminhos do futuro.

II - Apreciação na especialidade. - A) Proposta de lei - artigo 5.º - A primeira nota a referir é a de que, por força da proposta de nova redacção do n.º 2 do artigo 5.º da Lei 38/94, de 11 de Novembro, fica também alterado o n.º 2 do artigo 8.º do Decreto-Lei 205/98, de 11 de Julho.

De seguida, estranha-se que, na nova redacção do n.º 2, tenha sido retirado o adjectivo "continuada" à actividade de avaliação susceptível de proporcionar aplicação de medidas, o que parece indiciar uma intenção de actuação imediata, sem esperar que as instituições tomem a iniciativa de corrigir aspectos negativos identificados em qualquer primeiro processo de avaliação.

Com a reserva decorrente da opção preferencial que mantemos por uma "avaliação continuada", ainda que com oportunidade temporal garantida, consideram-se como razoáveis as medidas referidas nas alíneas a), c) e d) da nova redacção do citado n.º 2 do artigo 5.º da Lei 38/94, desde que sejam salvaguardados os direitos e as expectativas dos alunos envolvidos.

Já em relação à medida referida na alínea e) - encerramento das instituições -, afigura-se que ela só deverá decorrer de processos de avaliação institucional indiciadores de situação inaceitável ou, em alternativa, de esgotamento funcional por aplicação das medidas referidas nas três alíneas anteriores.

Passando aos n.os 3 e 4, considera-se ser necessário clarificar o conceito de "acreditação" neles referido, desfazendo possíveis equívocos ou ambiguidades.

É certo que a leitura do texto, ao fazê-lo coincidir com a "atribuição de uma classificação de mérito", parece apontar para uma lógica de "acreditação académica"; no entanto, não pode ignorar-se que existem processos de "acreditação profissional" de cursos, suscitando dúvidas sobre as vantagens do recurso à mesma designação.

Assim sendo, talvez fosse preferível falar, apenas, de "classificações de mérito", em que o plural aparece para exprimir a possibilidade de, no campo do mérito reconhecido, existirem diferentes níveis distintos de graduação de mérito.

Ainda a respeito da utilização do termo "acreditação", vale a pela estabelecer um paralelismo com o que se passa com a chamada "acreditação de acções", no âmbito da formação contínua ou da formação especializada de professores, nas quais estão igualmente envolvidas as instituições de ensino superior.

A referida acreditação de acções precede sempre a realização das mesmas, até porque é uma condicionante obrigatória dessa realização. Quer isto dizer que o processo de acreditação consiste na apreciação apriorística de uma proposta da qual consta a caracterização da acção em curso e a identificação de um conjunto de requisitos que lhe estão associados - relacionados, designadamente, com os seus objectivos, a relevância desses objectivos, a qualificação dos formadores e as metodologias de realização - a partir das quais se torna possível antever a expectativa de um desenvolvimento da acção em condições de exigência qualitativa bastante.

Transferindo esta lógica para a realização de cursos no ensino superior, em esforço de coerência interna desejável, o processo de acreditação acaba por coincidir com a aprovação dos cursos pelos órgãos institucionais competentes e consequente registo, ele também condicionante do funcionamento desses cursos com expectativas de qualidade garantida.

Assim sendo, ao falar-se de acreditação em sequência de processos de avaliação acaba por conferir-se-lhe o significado preciso de renovação de acreditação ou "acreditação renovada" ou, ainda, "acreditação definitiva", como algumas vezes se refere, ainda que o termo "definitiva" seja sempre excessivo pelo carácter de intemporalidade que sugere.

Dito isto, reforça-se a ideia de que, em vez de acreditação de cursos (ou instituições), com o significado de acreditação académica de que vimos falando, melhor seria falar apenas de classificações de mérito, quando se pretende exprimir o resultado de uma avaliação.

Em síntese, a posição terminológica que se defende, numa posição de coerência, é a seguinte:

a) O termo "acreditação" corresponde a uma apreciação apriorística de cumprimento de um conjunto de requisitos previamente fixados, os quais deixam a expectativa de "desempenhos" com exigência qualitativa bastante.

Neste sentido:

Na acreditação académica estão em causa desempenhos relacionados com a realização de cursos e outras actividades por parte dos estabelecimentos de ensino, razão pela qual aquela acreditação reveste, por vezes, a fórmula de "autorização de funcionamento";

Na acreditação profissional estão em causa os desempenhos de natureza profissional por parte dos diplomados dos diversos cursos, razão pela qual aquela acreditação pode incidir directamente sobre o curso em causa ou sobre cada um dos diplomados, em particular;

b) A expressão "classificação de mérito" resulta de uma "avaliação" de actividades já realizadas, num período determinado, e exprime um juízo sobre a qualidade dessas actividades, com base na ponderação de diferentes "factores" condicionantes ou, se se preferir, de "diversos campos de apreciação" susceptíveis de influenciar essa qualidade.

Obviamente, a uma classificação de mérito positiva deve corresponder, naturalmente, uma renovação da acreditação anterior, tanto no plano académico como no plano profissional, se a questão se tornar pertinente.

Não sendo de manter a designação de acreditação de cursos ou instituições, com o significado de classificações de mérito, o importante é definir os critérios que orientara a atribuição dessa classificação.

O regime jurídico nada refere a esse respeito, o que é perfeitamente natural, uma vez que essa deve ser uma competência própria do CNAVES, desde logo porque é ele que define os campos de apreciação que orientam os diversos processos de avaliação.

E, como é evidente, os critérios que podem determinar uma classificação de mérito só podem nascer da ponderação ou combinação das referências classificativas dos diferentes campos de apreciação, salvaguardando a recusa em abrir qualquer possibilidade de criação de um algoritmo susceptível de proporcionar a elaboração de um ranking de instituições ou de cursos homónimos.

Num outro aspecto, ao falar-se de acreditação de cursos e de acreditação de instituições, nada se diz sobre a interligação entre ambas, quando parece evidente que não podem ser inteiramente dissociadas.

Note-se que não se trata de resultados de processos de avaliação idênticos, uma vez que, na avaliação de cursos está em causa a qualidade (ou as qualidades) que eles exprimem, enquanto na avaliação institucional o que está em causa são as condições ambientais, estruturais e organizacionais que favorecem ou induzem qualidade nas actividades que são desenvolvidas.

Por isso mesmo, reconhece-se que o articulado do regime jurídico não poderia ir mais longe, deixando ao sistema nacional de avaliação a reflexão a fazer da ligação entre a avaliação de cursos e a avaliação institucional.

Relativamente ao n.º 5, em que se prevê a "homologação" ministerial para a acreditação de cursos e de instituições, considera-se que se trata de uma posição que envolve grande delicadeza.

Na verdade, sabendo-se que em matérias desta natureza não estão em causa procedimentos legais que associem a homologação à verificação de conformidade com esses procedimentos, a hipótese de homologação só pode ser entendida como a validação dos resultados da avaliação.

E, a ser assim, a homologação ministerial põe em causa, no plano interno, a autonomia e imparcialidade da entidade avaliadora, ela própria objecto de homologação prévia, indiciadora de que actua em nome do Estado.

Mas também no plano externo a homologação se torna insustentável, pois é sabido que as entidades avaliadoras, constituídas em agências nacionais de avaliação, perdem a possibilidade de se integrar em agências europeias se a sua actividade não for inteiramente independente dos governos.

Novo texto proposde 21 de Novembro

(artigo 1.º da proposta de lei relativa ao regime jurídico do desenvolvimento e qualidade do ensino superior)

"Artigo 5.º

[...]

1 - [...]

2 - Os resultados da avaliação continuada das instituições de ensino superior, se consolidadamente negativos, podem ainda determinar a aplicação das seguintes medidas:

a) Redução ou suspensão do financiamento público quando as instituições não aplicarem as recomendações;

b) Suspensão do registo de cursos;

c) Revogação do registo de cursos;

d) Revogação do reconhecimento de graus;

e) Encerramento das instituições.

3 - Na aplicação das medidas previstas no número anterior, acautelar-se-ão sempre os direitos e legítimas expectativas dos alunos envolvidos."

B) Regime jurídico da qualidade e desenvolvimento do ensino superior. - Artigo 1.º - Seria desejável clarificar o âmbito da atribuição expressa na alínea c), ao mesmo tempo que se deveria ponderar se a igualdade de oportunidades não deveria estender-se à fruição de uma educação sucedida.

Por outro lado, no plano jurídico-formal, considera-se ser necessário cotejar o disposto no artigo 1.º com o disposto no n.º 2 do artigo 2.º, numa tentativa de distinguir as atribuições do Estado das competências do governo, a menos que, por constituir um repositório de princípios constantes, da Constituição da República (CRP) e da LBSE, se opte pela eliminação daquele.

Artigo 2.º, n.º 2. - Deve notar-se que o simples registo dos estatutos dos estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo, exigido na alínea d) do n.º 2, tem de ser precedida da averiguação da conformidade dos mesmos à lei, como decorre do n.º 3 do artigo 5.º, o que lhe confere uma lógica de homologação.

Por outro lado, no plano jurídico-formal, seria interessante proceder a uma categorização das competências expressas nas diferentes alíneas, em si mesmo muito diferentes, exprimindo as correspondentes a cada categoria em números separados do mesmo artigo.

Artigo 3.º - Para além da necessidade de distinção entre requisitos relativos ao ensino universitário e ao ensino politécnico, em correspondência à diferente matriz conceptual e formativa, era importante referir a igualdade de requisitos para efeitos de "instituição de estabelecimentos de ensino" e de "funcionamento de cursos conferentes de grau", prevenindo o desenvolvimento dos artigos 14.º e 27.º

Artigo 4.º - Julga-se necessário oferecer uma redacção mais consistente e articulada aos n.os 1, 2 e 3, clarificando os cursos e outras actividades formativas ministradas pelos estabelecimentos de ensino, relevando a perspectiva de encarar essas actividades num processo de oferta formativa ao longo da vida.

Nesse sentido, não parece pertinente a referência de que é o Estado que incentiva a educação ao longo da vida, pois esta intenção deve decorrer da lógica programática dos próprios estabelecimentos de ensino.

Pela sua importância, os aspectos referidos nos n.os 5 e 6 talvez merecessem a dignidade de artigo autónomo, no qual - aí sim - se deveria inscrever a ideia de incentivos do Estado para favorecer os mecanismos de associação institucional.

Num outro aspecto, nestas hipóteses de associação interinstitucional, não devem afastar-se soluções que incluam, para além dos estabelecimentos de ensino, outras entidades, designadamente associações empresariais e organismos culturais.

Como referência final, talvez seja de repensar o título do artigo, pois dele se retém, com maior ou menor clareza, a missão institucional dos estabelecimentos de ensino superior.

Artigo 5.º - Actualmente, os estabelecimentos públicos de ensino superior gozam, expressa ou implicitamente, de autonomia patrimonial (cf. LAP, artigo 1.º, n.º 3, LAU, artigo 10.º, e Decreto-Lei 252/97, artigos 13.º e seguintes), razão pela qual se não vê motivo para a sua omissão no n.º 1.

Do mesmo modo, também não há qualquer referência à autonomia disciplinar, o que é estranho, a menos que se trate de um lapso.

Quanto ao n.º 4, também não deve ignorar-se que, para além dos planos, também os relatórios de actividades se mostram imprescindíveis conforme o atesta, nomeadamente para efeitos de atribuição de financiamento às universidades, o disposto, conjugadamente, nos artigos 14.º, n.º 1, alínea a), 25.º, alínea b), e 28.º, n.º 2, alínea e), todos da LAU.

Por outro lado, nem neste ponto nem em nenhum outro consta referência alguma materializando uma norma como a do artigo 17.º, n.º 2, da Lei 26/2000, de 23 de Agosto, na parte em que a autonomia dos estabelecimentos de ensino superior público não deve prejudicar o exercício dos poderes de tutela necessários para manter ou restaurar a normalidade institucional.

Artigos 6.º e 7.º - Do n.º 6 do artigo 6.º consta que tanto o estabelecimento não integrado como o instituto universitário ministram ensino numa só área científica, sendo que no segundo são professados cursos diferentes. Parece, pois, que se está perante um conceito muito amplo da área científica.

Como já se disse, aparece muito estranha a definição entre "universidades" e "escolas politécnicas", situando-se na ausência de transmissão cultural por parte destas últimas, quando se sabe que, por exemplo, a maioria das escolas artísticas são politécnicas.

Reconhece-se que é necessário um esforço de distinção entre o ensino universitário e o ensino politécnico, mas a solução encontrada tende a ser mais ambígua que a referida na LBES e, sobretudo, incompatível com a preocupação cultural que deve enformar todo o ensino superior.

Em nosso entender, a abordagem destes dois artigos deveria orientar-se para a definição das tipologias de estabelecimentos de ensino superior, encarando as hipóteses de:

Universidades;

Institutos universitários;

Institutos politécnicos;

Escolas universitárias e escolas politécnicas não integradas.

Desta forma, talvez se evitasse o equívoco, constante nos n.os 2 e 3 do artigo 7.º, em que se mantém a ideia de que a "unidade base" do ensino politécnico é a escola superior e não o instituto, contrariando uma tendência de aproximação da lógica institucional das duas modalidades de ensino.

É certo que o n.º 4, evidenciando alguma desarmonia em relação ao disposto no n.º 2, não fecha as portas à referida aproximação das lógicas institucionais das universidades e dos institutos politécnicos, mas sem assumir uma clara opção a esse respeito, como o fazia a Lei 26/2000 (artigos 5.º e 7.º), agora tendencialmente revogada.

O n.º 4 do artigo 7.º mantém a posição redutora de outorga ao ensino politécnico da capacidade de ministrar, exclusivamente, cursos conferentes dos graus académicos de bacharel ou licenciado.

Reconhecendo-se que se trata de uma posição insustentável a curto prazo, até como consequência do Processo de Bolonha, não se vê vantagem em exprimi-la numa lei que, na sua finalidade essencial, tende a apostar no futuro.

Por outro lado, as competências referidos no n.º 3 do artigo 6.º e no n.º 5 do artigo 7.º, para serem devidamente exercidas, exigem um conhecimento profundo da situação do sistema e do potencial mínimo disponível em cada domínio científico, o que aconselha a que, pelo menos, o CLAVES seja ouvido em razão da imagem evolutiva que vai recolhendo do que se passa nas diferentes instituições e cursos ministrados.

Artigo 8.º - O texto sugere duas observações distintas que, no entanto, convergem numa mesma intenção:

a) Uma, relacionada com a circunstância de se referir a conselhos científicos de estabelecimentos de ensino susceptíveis de integrar unidades orgânicas de diferentes domínios específicos. Nessa hipótese, pareceria razoável que esses conselhos científicos apresentassem uma composição que, integrando um mínimo de dois terços de doutores, admitisse a possibilidade de neles participarem outros elementos cujo contributo, para uma visão alargada dos problemas a tratar, poderia ser bastante enriquecedor;

b) Outra, relacionada com a existência no ensino politécnico de professores recrutados em concursos de provas públicas, ao abrigo do disposto nos artigos 7.º, n.º 2, e 18.º, ambos do Estatuto da Carreira Docente do Ensino Superior Politécnico (ECDESP), aprovado pelo Decreto-Lei 185/81, de 1 de Julho.

Não disporão de dignidade científica bastante para integrarem o órgão científico, sendo certo que, ex vi do artigo 35.º da LAP, integram de pleno direito tal órgão?

Dito de outro modo: pelo menos, não serão de respeitar os direitos adquiridos por esses docentes, através da consagração de dispositivo transitório adequado?

Artigo 10.º - Estão postos em causa, quanto ao ensino público, aspectos centrais das bases do financiamento aprovadas pela Lei 113/97, de 16 de Setembro, nomeadamente no que respeita aos seus artigos 6.º a 9.º, o que, por conseguinte, e conforme já se assinalou, mostra que a proposta em presença, carecerá, na matéria, de ser complementada por instrumento normativo adequado.

De todo o modo, certamente que a prestação de contas referida no n.º 1 não se confinará à elaboração e apresentação dos planos previstos no artigo 5.º, n.º 4.

O n.º 2 limita-se a reproduzir, adaptado, o artigo 11.º, n.º 4, da LAU.

O n.º 3, inovando com a referência à ideia de contratualização e omitindo a menção nos "limites das disponibilidades orçamentais", corresponde ao artigo 11.º, n.º 1, da LAU. Não obstante a referência a tais limites já constar do artigo 1.º, alínea j), do RJDQES, está-se em querer, tanto pelo ora aqui exposto como pelo que então ficou dito com relação ao artigo 1.º, que melhor seria que essa referência constasse do presente n.º 3.

Artigo 11.º - Na alínea a) do n.º 2, onde se lê "bolsas de estudo" deve ler-se "atribuição de bolsas de estudo".

Merece reparo a falta de menção aos deficientes, bem como a não consagração da garantia da não exclusão do sistema por incapacidade financeira (cf. artigo 15.º, n.º 2, da Lei 113/97, de 6 de Setembro).

Mas a grande questão deste artigo coloca-se a respeito do n.º 3, em que se garante a persistência da margem de sombra relativa a uma das questões essenciais do sistema de ensino superior em Portugal: o tratamento diferenciado que, em matéria de acção social, é oferecido aos alunos do ensino público e aos do ensino não público, se aceitarmos que esse tratamento releva, em exclusivo, da relação entre o Estado e os cidadãos.

O problema é de base constitucional e, por isso mesmo, talvez fosse oportuno iniciar um debate descomplexado sobre a pertinência da gratuitidade de serviços públicos essenciais, sobretudo nos casos em que o Estado não dispõe de condições para dar resposta total à procura espontânea desses serviços.

Artigo 13.º - No n.º 1, tratando-se dos estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo, não bastava o "reconhecimento do interesse público" [cf. artigos 2.º, n.º 1, alínea b), e 9.º]? Para quê falar, também, em autorização?

Por sua vez, no n.º 3, ao falar-se da qualidade do ensino leccionado, deve pretender-se dizer "ensino a leccionar", o que remete para a apreciação de "expectativas de funcionamento", de que já se falou neste parecer.

Artigo 14.º - A redacção das alíneas constantes do n.º 1 carece de ser revista, pois que, por exemplo, na alínea a) o que está em causa é a "validade de projecto educativo, científico e cultural próprio" e na alínea b) é a "disponibilidade de instalação e recursos [...]".

Relativamente ao n.º 2, remete-se para a observação feita a propósito do n.º 3 do artigo 6.º e do n.º 5 do artigo 7.º, em que se defende um posicionamento privilegiado do CNAVES para se poder pronunciar.

O n.º 3, parecendo resolver um problema crucial de "reserva de designação", merece, pela sua importância, ser tratado em artigo autónomo, em que se considerem medidas transitórias para os variados casos de abuso terminológico já existentes.

Artigo 15.º - Importa ter em conta que a proibição aqui vertida não pode nem deve conduzir à inviabilização da dispersão geográfica permitida na LBSE, artigo 40.º, n.º 6.

Artigo 17.º - É preceito cujos destinatários são os estabelecimentos não públicos e que, portanto, se encontra, em termos sistemáticos, desinserido, ao abrir um capítulo da "rede dos estabelecimentos públicos do ensino superior".

Artigo 18.º - Nada a opor se, por "estabelecimento público" se entender universidades, institutos politécnicos ou escolas não integradas, universitárias ou politécnicas, com exclusão, portanto, das unidades orgânicas.

A menos que subjacentemente esteja o propósito de se proceder à derrogação dos dispositivos autonómicos vigentes na matéria.

Artigo 19.º - Surpreendente e incoerentemente, depois de, no n.º 1, se fazer depender a concretização da vicissitude da prévia autorização do governo - o que está em sintonia com o disposto, para as universidades, nos artigos 25.º, alínea e), e 28.º, n.º 2, alínea c), e, para os institutos politécnicos, nos artigos 23.º, n.º 2, alínea d), e 7.º, n.º 2, alínea d) -, acaba por se dizer que a criação, transformação e fusão (e a extinção?) reveste a forma de decreto-lei. Ou seja: cria-se, no fim, aquilo que se começou por autorizar!

Assim se aponta para a rigidificação de um procedimento que não vinha suscitando problemas de ordem minimamente séria, emprestando-lhe um formalismo manifestamente excessivo e que se perfila como bem mais atentatório para a autonomia dos estabelecimentos que o vazado nos artigos 18.º e 19.º da Lei 26/2000.

Artigo 20.º - Parece mais curial - o próprio articulado o mostra - que a epígrafe seja "Extensões e unidades orgânicas territorialmente separadas".

Artigo 21.º - Não sendo possível qualquer observação ao texto, uma vez que remete para medidas posteriores a solução dos problemas da racionalização, importa apenas deixar a prevenção de que não se pode encarar essa solução numa perspectiva estática nem fundamentalista, pois cada caso tem contornos específicos que devem ser ponderados.

Reitera-se que, quanto às unidades orgânicas, o artigo aponta no sentido do alargamento da esfera de poderes tutelares.

Mais: uma vez que, em ordem à aprovação das medidas de racionalização, não está prevista a audiência de algum órgão dos estabelecimentos visados, seguir-se-ia que, por exemplo, uma decisão de integração ou fusão pudesse ser tomada sem qualquer participação das instituições interessadas - hipótese em que se não acredita por configurar um cenário que, pelo menos desde o Estatuto da Instrução Universitária (artigo 1.º, n.º 1), aprovado pelo Decreto 18 717, de 27 de Julho de 1930, se encontra juridicamente excluído.

Artigos 22.º e 23.º - Consagram, com base na existência de uma frequência diminuta de estudantes, a aplicação de medidas restritivas a estabelecimentos e cursos públicos que não sejam votados ao ensino da música e das artes, sem que se vislumbre qualquer necessidade, ou, até, vantagem, de repartir tal matéria por dois artigos. De resto, a epígrafe de qualquer deles pouco ou nada esclarece, face, inclusive, à designação dada ao próprio capítulo de que fazem parte.

De todo o modo, constituem, como os do anterior artigo 21.º, medidas inovadoras, se bem que, mais uma vez, no sentido da compressão da autonomia das instituições ou, o que é o mesmo, dito de outro modo, no sentido do reforço dos poderes tutelares, corporizando propósitos claramente centralizadores.

O importante, no entanto, será o conteúdo da expressão "casos devidamente justificados", constante do n.º 2 do artigo 22.º e do n.º 3 do artigo 23.º, pois não pode ignorar-se que ao ensino superior incumbe uma função de dinamização cultural e de indução de conhecimento novo, gerador de progresso social, a qual pode conduzir ao lançamento de cursos com procura reduzida.

Artigos 25.º e 26.º - O registo dos cursos tende a revestir carácter geral, deixando de estar confinado ao ensino superior universitário público (cf. Decreto-Lei 155/89, de 11 de Maio), onde vem funcionando como condição de eficácia do acto de criação.

Relativamente ao ensino superior particular e cooperativo, o Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei 16/94, de 22 de Janeiro, socorre-se, para o efeito, da figura da autorização, que, portanto, é ultrapassada, em afinação correcta de paridade com o ensino público.

Artigo 27.º - À luz do que, sobre o pedido de registo, já se contém no n.º 1 do artigo 26.º, por que motivo não referir de uma só vez e num só lugar que o processo é instituído, apreciado e decidido em termos a definir por portaria do Ministro da Ciência e do Ensino Superior?

Artigo 31.º - Trata-se de matéria actualmente prevista e regulada nos artigos 4.º e 5.º do Decreto-Lei 296-A/98, de 25 de Setembro.

Artigo 32.º - Generaliza-se - e bem -, com carácter obrigatório, o regime de unidades de crédito cuja utilização o Decreto-Lei 173/80, de 29 de Maio, começou por permitir no âmbito das universidades públicas, procurando-se com tal medida dar resposta, nomeadamente, a problemas de ordem supranacional.

Artigo 33.º - Sem uma clarificação de competências, torna-se difícil apreciar a ligação que o n.º 2 estabelece entre o "sistema de avaliação" e o "sistema de fiscalização assente na Inspecção-Geral da Ciência e do Ensino Superior".

De todo o modo, sempre se aceitará que a saída do ensino superior do Ministério da Educação, operada pela Lei Orgânica do XV Governo Constitucional, aprovada pelo Decreto-Lei 120/2002, de 3 de Maio, possa contribuir para explicar o aparecimento desta nova Inspecção.

Artigo 34.º - No n.º 1, seria conveniente referir que a informação a prestar respeitaria a "rede de dados" prevista pelo sistema nacional de avaliação.

Artigo 35.º - O texto do artigo deixa alguma perplexidade: está a referir-se à Lei 38/94, de 21 de Novembro, mesmo quando a proposta de lei anuncia uma alteração do seu artigo 5.º? Aceita-se que a resposta seja afirmativa, em atenção, desde logo, ao facto de tal artigo 5.º ser o único que é ou deve considerar-se objecto de alteração e, bem assim, à circunstância de ser prática corrente quanto a instrumentos normativos da natureza do ora em análise a alusão a "diploma próprio", não no plano do direito a constituir, mas no sentido de significar referência a diploma já existente, regulando individualizadamente a matéria em causa.

Artigo 36.º - Reitera-se aqui quanto na matéria se disse a propósito da apreciação do artigo 1.º da proposta de lei, artigo com o qual se visa alterar a redacção do artigo 5.º da Lei 38/94, de 11 de Novembro.

Acrescenta-se apenas que o receio de ligação das agências de avaliação ao poder político se acentua pela hipótese de uma segunda avaliação, que o n.º 4 consagra, acolhendo uma solução que tem o risco de ser duplamente perversa, enquanto susceptível de condicionar os avaliadores, risco que será afastado se, em alternativa, se instituir um sistema de contradita clarificadora, decerto mais eficiente e capaz de minimizar o aparecimento de problemas melindrosos.

Artigo 37.º - Não é fácil um juízo sobre este artigo sem que, por um lado, seja clarificado o conceito de "plano de estudos" e, por outro, definido o horizonte temporal da acreditação desse plano de estudos.

Aliás, entende-se mal que uma "classificação de mérito" de um curso, envolvendo aspectos múltiplos, possa isolar-se para um desses aspectos, ainda que relevante.

Mais uma vez se está perante um caso de ambiguidade conceptual ou de falta de rigor no plano dos conceitos.

Artigo 39.º - Compreende-se a intenção do artigo, face à ideia impressiva que existe de que, por um lado, nem sempre a denominação dos cursos corresponde aos respectivos conteúdos e, por outro, a sua organização curricular nem sempre apresenta uma lógica conceptual de evidente clareza.

No entanto, ao legislar com base nessa ideia impressiva, importa tomar consciência de que se está a colocar em causa o exercício das autonomias científica e pedagógica outorgadas às instituições de ensino superior, ainda que o texto proposto ressalve a audição das "estruturas representativas" dessas instituições.

A nosso ver, quaisquer observações sobre esta matéria devem ser resultantes não de "ideias impressivas" mas, sim, de processos de avaliação consolidados, revestindo a forma de "recomendações" dirigidas directamente às instituições envolvidas.

Isto não invalida, obviamente, a possibilidade e até a necessidade de legislar sobre a duração dos cursos - até na sequência do Processo de Bolonha -, e, com especial pertinência, sobre a conveniência de a organização curricular dos cursos incluir uma "componente obrigatória" e outra "facultativa", estabelecendo, porventura, limites mínimos para a primeira dessas componentes.

Trata-se, aliás, de uma lógica convergente com a adopção de "sistema de créditos" como base dessa organização curricular.

Artigo 40.º - Reitera-se, quanto à nova Inspecção-Geral, o comentário formulado a propósito do artigo 33.º

Artigos 41.º a 47.º - Institui-se o Conselho Nacional do Ensino Superior, disciplinando-o e regulando-o em termos que, sob o ponto de vista literal, pouco diferem dos utilizados, aquando da criação do Conselho do Ensino Superior, pelo Decreto-Lei n.º421/93, de 28 de Dezembro.

Reiterando tudo o que foi dito na "apreciação na generalidade", acrescenta-se apenas que não se descortina motivo nem para a existência de disparidades na representação do CRUP e do CCISP [artigo 44.º, n.º 1, alíneas b) e c)] nem para a imposição aos estudantes dos termos a que deve obedecer a designação do seu representante (alínea h), por, neste caso, se tratar de matéria exclusivamente respeitante à organização associativa daqueles.

Artigo 48.º - Trata-se de artigo onde, para além das acumulações se procura também regular matéria de incompatibilidades (n.os 1 e 2), razão pela qual se deveria alterar a respectiva epígrafe.

Com relação ao n.º 1, parece poder concluir-se que a "acumulação" proibida é em estabelecimentos diferentes, sob pena de se pôr em causa o disposto, quanto à percepção de suplementos devidos pelo exercício de cargos de gestão escolar, no Decreto-Lei 388/90, de 10 de Dezembro.

Sobre os n.os 1 e 2, anotar-se-á que se trata de preceitos inspirados, em termos de fonte próxima, no artigo 17.º, n.º 5, alíneas a) e b), da Lei 26/2000, se bem que consagrando, relativamente a esta, regime bem mais permissivo em matéria de incompatibilidades, uma vez que se permite não apenas a acumulação de funções de gestão na escola, como funções em órgão científico de outra, como também que os docentes em tempo integral de uma escola pública possam, por acumulação, assegurar o exercício de cargos de direcção ou gestão em órgãos colegiais de estabelecimentos não públicos.

Decididamente, importa repensar todo este universo de possibilidades, pois será de todo inconveniente que um mesmo nome sirva para tentar "credibilizar" diversos estabelecimentos...

Quanto ao n.º 4, é patente que não pode querer dizer aquilo que efectivamente diz. O que, decerto, se quer ali referir é que o serviço docente prestado no ensino não público não pode ser superior a metade do número de horas de aulas efectivamente assegurada pelo interessado no ensino público.

Aprovado, por unanimidade, em 19 de Setembro de 2002, na 42.ª reunião plenária do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior.

O Presidente, Adriano Moreira.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2057978.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1930-08-02 - Decreto 18717 - Ministério da Instrução Pública - Direcção Geral do Ensino Superior e das Belas Artes

    Aprova o Estatuto da Instrução Universitária, constante do presente diploma. O estatuto estabelece a organização e administração das universidades de Coimbra, de Lisboa e do Porto, cujo governo pertence à assembleia geral, ao senado universitário e ao reitor. Define a constituição, eleição e competências (pedagógicas, administrativas e disciplinares) daqueles órgãos. Estabelece igualmente a organização e administração das faculdades e escolas universitárias, cujo governo pertence aos respectivos conselhos e (...)

  • Tem documento Em vigor 1980-05-29 - Decreto-Lei 173/80 - Ministério da Educação e Ciência

    Institucionaliza o regime de créditos nas universidades.

  • Tem documento Em vigor 1981-07-01 - Decreto-Lei 185/81 - Ministério da Educação e Ciência

    Aprova o Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico.

  • Tem documento Em vigor 1989-05-11 - Decreto-Lei 155/89 - Ministério da Educação

    Estabelece normas quanto à criação, alteração, suspensão e extinção de cursos nas universidades.

  • Tem documento Em vigor 1990-12-10 - Decreto-Lei 388/90 - Ministério da Educação

    Aprova o regime de suplementos para os titulares dos cargos de gestão de estabelecimentos de ensino superior.

  • Tem documento Em vigor 1994-01-22 - Decreto-Lei 16/94 - Ministério da Educação

    Aprova o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo.

  • Tem documento Em vigor 1994-11-21 - Lei 38/94 - Assembleia da República

    Estabelece as bases do Sistema de Avaliação e Acompanhamento das Instituições de Ensino Superior Universitário e de Ensino Superior Politécnico, públicas e privadas.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-16 - Lei 113/97 - Assembleia da República

    Define as bases do financiamento do ensino superior público. Cria o Fundo de Apoio ao Estudante, dotado de personalidade jurídica e de autonomia administrativa e financeira.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-26 - Decreto-Lei 252/97 - Ministério das Finanças

    Adopta medidas de desenvolvimento e aprofundamento da lei da autonomia das universidades no plano de gestão de pessoal, orçamental e patrimonial.

  • Tem documento Em vigor 1998-07-11 - Decreto-Lei 205/98 - Ministério da Educação

    Estabelece as regras necessárias à concretização do sistema global de avaliação e os princípios a que deve obedecer a constituição das entidades representativas das instituições de ensino superior universitário e politécnico, públicas e não públicas. Dispõe sobre a constituição e funcionamento dos conselhos de avaliação. Cria o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior e regula as suas atribuições, funcionamento e composição.

  • Tem documento Em vigor 1998-09-25 - Decreto-Lei 296-A/98 - Ministério da Educação

    Fixa o regime de Acesso e Ingresso no Ensino Superior.

  • Tem documento Em vigor 2000-08-23 - Lei 26/2000 - Assembleia da República

    Aprova a organização e ordenamento do ensino superior.

  • Tem documento Em vigor 2002-05-03 - Decreto-Lei 120/2002 - Presidência do Conselho de Ministros

    Aprova a orgânica do XV Governo Constitucional.

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