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Acórdão 326/2015, de 29 de Julho

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Sumário

Não julga inconstitucional a norma do artigo 15.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Lei n.º 54/2005, de 15 de novembro, na redação conferida pela Lei n.º 78/2013, de 21 de novembro, quando interpretada no sentido de a obrigatoriedade da prova a efetuar pelos autores se reportar a data anterior a 31 de dezembro de 1864

Texto do documento

Acórdão 326/2015

Processo 718/14

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1 - O Representante do Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Comarca de Ponte da Barca recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei 28/82, de 15 de novembro, na sua atual redação (doravante, "LTC"), da decisão proferida por aquele Tribunal, em 7 de maio de 2014, que recusou a aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade material, da norma constante do artigo 15.º, n.º s 1 e 2, alínea a), da Lei 54/2005, de 15 de novembro, "quando interpretada no sentido da obrigatoriedade da prova a efetuar pelos autores se reportar a data anterior a 31 de dezembro de 1864".

2 - O recorrido intentou ação declarativa de simples apreciação, sob a forma de processo sumário, contra o Estado Português, representado pelo Ministério Público, peticionando que fosse declarado legítimo proprietário dos três prédios rústicos identificados no artigo 1.º da petição inicial, por haver adquirido o respetivo direito de propriedade por meio de usucapião. Sobre esta pretensão, ajuizou o Tribunal Judicial da Comarca de Ponte da Barca o seguinte:

«[...]

Veio o autor peticionar ao Tribunal a declaração de que é proprietário dos prédios que identificou na petição inicial e fá-lo ao abrigo da Lei 54/2005, de 15 de novembro, com a finalidade de obstar à presunção de dominialidade pública dos referidos prédios, por confrontarem com a margem do rio Lima.

Alega o réu que tem a seu favor uma presunção iuris tantum da titularidade do domínio público hídrico sobre as margens do rio Lima, que decorre do disposto nos arts. 15.º da Lei 54/2005, de 15 de novembro e que sobre tais prédios não é possível a aquisição por usucapião.

Vejamos.

De acordo com o artigo 84.º, n.º 1, alínea a) da Constituição da República Portuguesa, pertencem ao domínio público as águas territoriais com o seu leito e os fundos marinhos contíguos, bem como os lagos, lagoas e cursos de água navegáveis e flutuáveis, com os respetivos leitos.

A Lei 54/2005 veio delimitar quais os recursos hídricos que integram o domínio público e aqueles que, ao invés, pertencem a particulares.

Assim, nos termos do artigo 2.º, o domínio público hídrico compreende o domínio público marítimo, o domínio público lacustre e fluvial, e ainda o domínio público das restantes águas.

O domínio público marítimo, que inclui as águas costeiras e territoriais, as águas interiores sujeitas à influência das marés, bem como os respetivos leitos, fundos marinhos e margens, pertence sempre ao Estado, nos termos do disposto nos arts. 3.º e 4.º Já o domínio público lacustre e fluvial compreende cursos de água navegáveis ou flutuáveis, com os respetivos leitos, e ainda as margens pertencentes a entes públicos (artigo 5.º, alínea a)) - sublinhado nosso.

E, de acordo com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, entende-se por margem uma faixa de terreno contígua ou sobranceira à linha que delimita o leito das águas, sendo que, de acordo com o n.º 3 do citado preceito legal, a margem das restantes águas navegáveis ou flutuáveis tem a largura de trinta metros.

O regime atualmente consagrado no artigo 15.º, n.º 1, da Lei 54/2005 estabelece que o reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de leitos e margens públicos passa a ser efetuado pelos Tribunais e não pela Administração Pública. Estabelecendo, ainda, um prazo para o exercício do direito de ação judicial para reconhecimento da propriedade privada (1 de julho de 2014), sob pena de caducidade do referido direito.

Na verdade, são os tribunais e não a Administração a resolver, de acordo com o direito, os conflitos concretos da composição de interesses quanto à natureza pública ou privada das coisas. Assim, sempre que os particulares pretenderem ver reconhecida a propriedade privada sobre parcelas de leitos e margens públicos, caberá aos tribunais resolver as questões de direito que envolvam a qualificação da natureza dos bens (sobre esta matéria, cf., com interesse, o Acórdão da Relação do Porto de 15.07.1991).

[...]

Em primeiro lugar, cabe desde já fazer referência ao que tem sido decidido pelo Tribunal Constitucional sobre esta matéria. Importa destacar o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 353/2004, em que se sindicava o que havia sido decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 14 de maio de 2003, no qual, para se poder concluir que o terreno em questão não integrava o domínio público hídrico do Estado, teve de se afirmar que "a interpretação das disposições conjugadas das normas dos artigos 3.º, n.º 2 e 5, ambos do Decreto-Lei 468/71, feita pelo Sr. Juiz a quo, no sentido de que, por via dessas disposições legais, a dominialidade do terreno em causa passou automaticamente para o Estado, é inconstitucional, por violar o disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa".

Por outro lado, da análise do artigo 15.º, n.º 1, do citado diploma legal, constata-se uma presunção juris tantum de dominialidade de tais terrenos, impondo aos interessados o ónus da prova que os mesmos lhe pertencem.

Estamos perante uma presunção ilidível e, assim sendo, podem os interessados fazê-lo através da prova de justo título ou título legítimo de aquisição, entre outros, os expressamente indicados no artigo 1316.º do Código Civil: contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação e acessão. Trata-se, porém, de uma enumeração exemplificativa, como resulta da utilização, na parte final do artigo, da fórmula "e demais modos previstos na lei" [...].

O n.º 1 do artigo 15.º exige assim uma prova documental relativamente a tais terrenos, sendo que estabelece a data anterior a 31 de dezembro de 1864, ou seja, os particulares têm de provar que tais terrenos eram objeto de propriedade privada, através de título legítimo, antes dessa data.

O n.º 2 do artigo 15.º, ao contrário do que acontece com o n.º 1, não exige a prova documental, o que significa que, em princípio, são aceites todos os meios de prova admitidos em direito (prova documental, testemunhal, pericial, por inspeção judicial ou através de presunções), salvo a prova por confissão, visto a lei prescrever expressamente a sua inadmissibilidade "se recair sobre factos relativos a direitos indisponíveis" (artigo 354.º, alínea b) do Código Civil), e o domínio público é, por definição, indisponível.

Relativamente ao n.º 3 do citado preceito legal, onde se afasta o regime da prova estabelecidos nas situações anteriores, reporta-se tal preceito às situações de desafetação (facto jurídico pelo qual uma coisa é distraída do regime da dominialidade a que se encontra sujeita, passando à categoria de coisa do domínio privado [...] e aos bens pertencentes ao domínio privado do Estado, sobre os quais é possível a aquisição por usucapião.

É nosso entendimento que a exigência de prova documental que remonte a data anterior a 31 de dezembro de 1864 (cerca de 150 anos atrás) se trata de uma prova diabólica, pois os proprietários veem-se a braços com uma exigência muito difícil, ou mesmo impossível de cumprir, correndo sérios riscos de perderem as suas propriedades a favor do Estado.

[...]

Posto isto, cumpre desde já referir que é nosso entendimento que, tanto a obrigatoriedade de prova documental que remonte a data anterior a 31.12.1864, que consta do n.º 1 do artigo 15.º da Lei 54/2005, como a obrigatoriedade de prova que remonte a data anterior a 31.12.1864, que consta da alínea a), do n.º 2 do mesmo preceito legal, é manifestamente inconstitucional, por violação do direito fundamental à propriedade, que consta do artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa.

Por este motivo, e independentemente da análise do caso concreto que passaremos a efetuar infra, desde já consignamos a nossa recusa de aplicabilidade do art. 15.º, n.º 1 e 2, alínea a) do referido diploma legal, quando interpretado no sentido da obrigatoriedade da prova a efetuar se reportar a data anterior a 31 de dezembro de 1864.

Vertendo as considerações teóricas tecidas sobre o caso concreto, constata-se ter resultado provado que o autor adquiriu os prédios melhor identificados nos pontos 1), 3) e 6) dos factos provados, por partilha extrajudicial da herança do seu pai, Manuel Tomás de Souto Gonçalves, em fevereiro de 1978.

Tais prédios confrontam a norte com o Rio Lima e pelas áreas que os mesmos possuem, é possível concluir que se ocupam os trinta metros a que o artigo 11.º, n.º 3 da Lei 54/2005 faz referência: as margens do rio.

Por outro lado, relativamente aos prédios descritos nos pontos 1) e 3), constata-se que já existiam proprietários anteriores ao pai do autor (pese embora, da consulta das certidões do registo predial não consigamos aferir uma data concreta, relativamente a essas transmissões de propriedade). O prédio descrito sob o ponto 1), foi adquirido pelo pai do autor ao Padre Alberto dos Reis, e o descrito no ponto 3), pese embora resulte do registo predial a aquisição por usucapião pelo autor, o certo é que tem uma apresentação anterior, da qual resulta que estava inscrito a favor de João Souto (que pelo sobrenome, e fazendo apelo às regras da experiência comum, se presume tratar de familiar do autor), que o adquiriu a Francisco Joaquim de Matos.

Assim sendo, mesmo antes de 1978, já os imóveis descritos nos autos se encontravam na posse do autor e dos seus antecessores e eram objeto de propriedade particular, antes da transmissão dos mesmos ao autor.

O modo como o direito de propriedade entre na esfera jurídica do sujeito, é regulado nos artigos 1316.º seguintes do CC, relativos à aquisição da propriedade.

O legislador não diferenciou a aquisição do direito de propriedade, de acordo com a tradicional distinção doutrinal, entre os modos de aquisição derivada e originária.

[...]

Incumbe, por isso, ao autor a prova do seu direito de propriedade e, para tanto, não basta que exiba um título translativo, havendo ainda necessidade de demonstrar que o direito já existia no transmitente, o que poderá exigir a demonstração da existência de uma das formas de aquisição originária.

[...]

No caso concreto, o autor beneficia da presunção derivada do registo de propriedade nos termos do estipulado pelo artigo 7.º do Código de Registo Predial. Com efeito, nos termos desse preceito legal, "o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define". E tal como já foi referido supra, beneficia ainda da posse pública, pacífica e de boa-fé relativamente aos imóveis que confrontam com as margens do Rio Lima e acima identificados, pois resultou provado que até, aproximadamente, o ano de 1995, tinha os prédios acima mencionados verbalmente o Libório Cerqueira Rodrigues, que de então para cá, tem cedido gratuitamente o gozo temporário do primeiro daqueles prédios, "Campo do Rio", em parte a este Libório Rodrigues e, noutra parte, ao Município de Ponte da Barca que nele tem instalado o horto municipal e que, antes de 1978 já esse prédio (assim como os outros dois prédios) se encontrava na posse dos seus antecessores (vide escritura de partilhas em conjugação com as certidões do registo predial juntas aos autos).

Quanto aos outros dois prédios, sitos no lugar do Casal, tem o Autor procedido, após a cessação do arrendamento, ao seu cultivo direto, designadamente plantando árvores e fruto, tais como laranjeiras, limoeiros, cerejeiras, pessegueiros e macieiras, bem como consentindo na implantação, pela Câmara Municipal de Ponte da Barca, de um troço da ecovia junto ao rio Lima. Em todos os três prédios referidos, tem, também, o Autor procedido a melhoramentos, nomeadamente mediante o pagamento das respetivas licenças e alvarás de entidades públicas como a EDP, Direção Regional do Ambiente e do Ordenamento do Território - Norte e Câmara Municipal de Ponte da Barca.

É o autor que paga o respetivo IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) relativamente a tais prédios, agindo à vista e com conhecimento da generalidade das pessoas, sem a mínima oposição de quem quer que seja e, por isso, em termos absolutamente pacíficos, de forma continuada e sem qualquer interrupção e com a isenção e a convicção de exercer um próprio direito de propriedade sobre tais prédios.

Nestes termos, entendemos que o autor é proprietário dos prédios em causa nos autos, tendo adquirido os mesmos por aquisição derivada (escritura pública de partilha extrajudicial da herança do seu pai) e, ainda, por aquisição originária através da usucapião. Não desconhecemos que os prédios que pertencem ao domínio público do Estado não podem ser adquiridos por usucapião. Todavia, tal como já deixámos consignado supra, e naquele que veio a ser o entendimento do Tribunal Constitucional "a dominialidade dos terrenos em causa não passa automaticamente para o Estado". Isto é, tendo o proprietário a seu favor a presunção decorrente do registo (artigo 350.º, n.º 1, do CC), inverte-se o ónus da prova. Daí que possamos concluir que o autor não adquiriu três prédios pertencentes ao domínio público do Estado por usucapião; adquiriu, sim, três prédios que se encontravam no âmbito da propriedade privada dos seus antecessores, por usucapião e por aquisição derivada de partilha extrajudicial.

Pelo exposto, face à prova que foi produzida e pese embora não tenhamos chegado a data anterior a 1864, dúvidas não nos restam de que o autor é dono e legítimo proprietário dos prédios em causa nos autos, tanto pela aquisição derivada do título - escritura pública de partilha extrajudicial - como pela aquisição originária decorrente do preenchimento dos requisitos da usucapião, o que se declara.

[...]»

3 - O Ministério Público concluiu as suas alegações da seguinte forma:

«[...]

O Ministério Público interpôs recurso obrigatório, para este Tribunal Constitucional, do teor da douta sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Ponte da Barca, "nos termos do artigo 280.º n.º 1 alínea a) e n.º 3 da Constituição da República Portuguesa e artigos 70 n.º 1 alínea a) e 72 n.º 1 alínea a) e n.º 3 da Lei 28/82 de 15.11, com as alterações decorrentes da Lei 143/85 de 26.11; Lei 85/89 de 7.9; Lei 88/95 de 1.9; e Lei 13-A/98 de 26.2 (esta última retificada por Decl. Rect. 10/98 de 23.5)".

58 - Este recurso vem interposto "[...] do despacho da Mma. Juíza que recusou a aplicação do disposto nos artºs 15.º n.º 1 e n.º 2 alínea a) da Lei 54/2005 de 15 de novembro "quando interpretada no sentido da obrigatoriedade da prova a efetuar pelos autores, se reportar a data anterior a 31 de dezembro de 1864".

59 - O parâmetro constitucional cuja violação é invocada, embora não expressamente identificado, quer no requerimento de interposição de recurso, quer no segmento decisório da sentença recorrida é, segundo resulta da fundamentação desta última:

"o direito fundamental à propriedade, que consta do artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa".

60 - A Mm.ª Juiz "a quo" sustentou a sua decisão sobre a inconstitucionalidade das normas identificadas, no decidido pelo Tribunal Constitucional, no seu douto Acórdão 353/2004; no defendido pelo Sr. Juiz Desembargador Manuel António do Carmo Bargado, num texto produzido no âmbito do Curso de Pós-Graduação em Direito Administrativo do Mar; e na evidência de que a prova imposta por tais normas é "muito difícil, ou mesmo impossível de cumprir".

61 - Analisados os fundamentos invocados, apura-se que o citado aresto do Tribunal Constitucional decidiu não conhecer da matéria similar à que é objeto dos presentes autos; que o texto do Sr. Juiz Desembargador, embora abordando a temática da possível inconstitucionalidade dos preceitos jurídicos objeto dos presentes autos, não o faz quanto à mesma dimensão, nem relativamente às mesmas normas jurídicas ínsitas em tais preceitos; e que o terceiro argumento aduzido carece de qualquer fundamentação.

62 - Em face do apurado, e considerando os fundamentos lógico-jurídicos expendidos na douta sentença recorrida, não se verifica que as normas jurídicas ínsitas nos n.os 1 e 2, alínea a), do artigo 15.º, da Lei 54/2005, de 15 de novembro, violem o disposto no artigo 62.º, da Constituição da República Portuguesa.

63 - Ainda assim, procurámos apurar se, nalguma outra perspetiva não considerada pela Mm.ª Juiz "a quo", poderão, as normas legais desaplicadas, na dimensão em que o foram, violar o direito fundamental à propriedade privada.

64 - Contudo, analisado o quadro jurídico estabelecido pela referida Lei 54/2005, de 15 de novembro, e atendendo, simultaneamente, à evolução legislativa da matéria em discussão, constatámos que, não só as normas jurídicas escrutinadas não têm por objeto possíveis litígios sobre a titularidade de bens suscetíveis de apropriação privada, mas, igualmente, que os marcos temporais legalmente estabelecidos não são arbitrários, que a prova exigida não é insensata, e que o direito constitucional à propriedade privada não se encontra violado.

65 - Efetivamente, a exigência, para obtenção do reconhecimento de propriedade sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis, por parte de particular, da prova documental de que tais terrenos eram, por título legítimo, objeto de propriedade particular ou comum, antes de 31 de dezembro de 1864, ou se se tratar de arribas alcantiladas, antes de 22 de março de 1868, não é arbitrária ou injustificada, uma vez que se reporta às datas a partir das quais aqueles imóveis passaram a estar fora do comércio jurídico sendo, nessa medida, inusucapíveis.

66 - Consequentemente, na medida em que as exigências fixadas pela Lei 54/2005, de 15 de novembro, não determinam qualquer ablação arbitrária de um direito anteriormente adquirido (o verdadeiro objeto probatório), limitando-se a regular a prova possível de um direito de propriedade que, se não tivesse sido obtido antes de 31 de dezembro de 1864 (ou de 22 de março de 1868, conforme os casos), já não poderia ser adquirido pelo reivindicante, ou por qualquer antepossuidor, comprova-se a inexistência de violação do direito constitucional à propriedade privada, com assento no n.º 1, do artigo 62.º, da Constituição da República Portuguesa, por parte das normas jurídicas ínsitas no artigo 15.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Lei 54/2005, de 15 de novembro.

67 - Por força do ora explanado, não deverá ser declarada a inconstitucionalidade das normas contidas no artigo 15.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Lei 54/2005, de 15 de novembro, por violação do direito à propriedade privada, com assento no artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa, devendo, consequentemente, ser concedido provimento ao presente recurso.

[...]»

Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentação

A. Delimitação do objeto do recurso

4 - O objeto do presente recurso de constitucionalidade é integrado pelas normas constantes do artigo 15.º, n.º 1 e 2, alínea a), da Lei 54/2005, de 15 de novembro, na redação conferida pela Lei 78/2013, de 21 de novembro.

As normas em crise têm a seguinte redação:

«[...]

Artigo 15.º

Reconhecimento de direitos adquiridos por particulares sobre parcelas de leitos e margens públicos

1 - Quem pretenda obter o reconhecimento da sua propriedade sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis pode obter esse reconhecimento intentando a correspondente ação judicial junto dos tribunais comuns até 1 de julho de 2014, devendo, para o efeito, provar documentalmente que tais terrenos eram, por título legítimo, objeto de propriedade particular ou comum antes de 31 de dezembro de 1864, ou, se se tratar de arribas alcantiladas, antes de 22 de março de 1864.

2 - Sem prejuízo do prazo fixado no número anterior, observar-se-ão as seguintes regras nas ações a instaurar nos termos desse número:

a) Presumem-se particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação aos quais, na falta de documentos suscetíveis de comprovar a propriedade dos mesmos nos termos do n.º 1, se prove que, antes daquelas datas, estavam na posse em nome próprio de particulares ou na fruição conjunta de indivíduos compreendidos em certa circunscrição administrativa;

b) [...]

3 - [...]»

[...]»

De acordo com o tribunal recorrido, as referidas normas, quando interpretadas no sentido de que a obrigatoriedade da prova a efetuar se reporta a data anterior a 31 de dezembro de 1864, violam o "direito fundamental à propriedade", consagrado no artigo 62.º da Constituição (doravante, "CRP"), por se tratar de uma "prova diabólica", traduzida numa exigência de difícil ou mesmo impossível cumprimento por parte dos proprietários, que assim correm sérios riscos de perderem as suas propriedades a favor do Estado. Ou seja, o artigo 15.º, n.os 1 e 2, alínea a), consagra, no entender do tribunal recorrido, uma presunção de dominialidade relativamente a certos terrenos, impondo aos interessados o ónus da prova de que os mesmos lhe pertencem ou de que se encontram na sua posse desde 1864.

B. Enquadramento da questão de constitucionalidade

5.1 - Nos termos da alínea a), do n.º 1, do artigo 84.º da CRP, pertencem ao domínio público, entre outros bens, «as águas territoriais com os seus leitos e fundos marinhos contíguos, bem como os lagos, lagoas e cursos de água navegáveis ou flutuáveis, com os respetivos leitos». Trata-se de uma disposição que assenta na convicção de que as águas, pela sua importância e afetação públicas, devem estar fora do comércio jurídico privado e de que são, portanto, inalienáveis, impenhoráveis e imprescritíveis.

Na verdade, o domínio público hídrico, na medida em que se ache funcionalmente ligado à "circulação" de bens, pessoas e ideias, diz respeito a coisas tidas por vitais para a comunidade, ou seja, dotadas de um «grau de utilidade pública primordial», circunstância que explica a integração dominial de que são objeto na generalidade dos ordenamentos jurídicos (cf., neste sentido, José Pedro Fernandes, "Domínio Público", Dicionário Jurídico da Administração Pública, Volume IV, pp. 166 e ss.).

Nos termos da alínea f) do mesmo dispositivo constitucional, o conjunto das coisas públicas integra ainda «outros bens como tal classificados por lei». De acordo com a doutrina nacional, isto significa que há bens que são declarados dominiais pela CRP, e cuja declaração de dominialidade não pode ser revogada por lei ordinária: são os bens dominiais por natureza, herdeiros das antigas res communes omnium; e há bens que são dominiais por serem assim declarados por lei, e cuja dominialidade está, portanto, na disponibilidade do legislador ordinário: são os bens dominiais por determinação legal [cf. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, Volume II, 9.ª edição (reimpressão), 1980, p. 897; João Caupers, Introdução ao Direito Administrativo, Lisboa, Âncora, 2013, 11.ª edição, pp. 184/185].

Contudo, a doutrina chama a atenção para que esta margem de manobra legislativa não é absoluta ou irrestrita, carecendo a "dominialização" de outros bens para além dos enunciados no artigo 84.º da CRP de uma justificação válida à luz dos interesses constitucionalmente protegidos e do princípio da proporcionalidade. Com efeito, o domínio público está associado a um regime jurídico de direito público derrogatório da propriedade privada - o que, naturalmente, não é inócuo do ponto de vista jurídico-constitucional, sobretudo no quadro de uma economia de mercado. Assim se explica que, subjacente à sujeição legal de uma dada categoria de bens ao domínio público e à consequente afirmação da propriedade pública sobre a mesma, devam estar fundamentos que atestem a indispensabilidade ou, pelo menos, a elevada conveniência dessa subordinação à satisfação de certo interesse público, tendo em conta que o legislador dispõe de meios alternativos para a consecução desse escopo, tais como as servidões administrativas e outras restrições de utilidade pública (cf. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª edição revista e atualizada, 2007, pp. 1004, Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, 2006, p. 81 e ss., e José Pedro Fernandes, ob. cit., p. 179).

5.2 - Ora, as margens de águas públicas não integram, à luz da CRP, o domínio público por natureza. A sua classificação legal como dominiais surgiu com o artigo 2.º do Decreto Régio de 31 de dezembro de 1864, que incluiu no domínio público imprescritível os portos de mar e praias e os rios navegáveis e flutuáveis, com as suas margens, os canais de valas, os portos artificiais e as docas existentes ou que de futuro se construíssem (cf. Diogo Freitas do Amaral/José Pedro Fernandes, Comentário à Lei dos Terrenos do Domínio Hídrico, Coimbra Editora, 1978, p. 100). Segundo a doutrina, a atribuição de caráter dominial às praias - e, acrescentamos, às margens de cursos de água navegáveis e flutuáveis - implicou, tão-somente, a incorporação no domínio público dos terrenos marginais que já pertenciam ao domínio privado do Estado. Por outras palavras, «a lei não teve manifestamente em vista reduzir de um golpe à propriedade pública todos os terrenos das praias, incluindo os que estivessem na propriedade privada dos particulares» [cf. Afonso Rodrigues Queiró, "As praias e o domínio público (Alguns problemas controvertidos)", Revista de Legislação e de Jurisprudência, n.os 3258, 3259 e 3260, 1964, p. 337].

Os diplomas que se seguiram, concretamente, o Decreto 8 de 5 de dezembro de 1982, o Regulamento dos Serviços Hidráulicos, de 19 de dezembro de 1892, o Decreto 5.787 - III, de 10 de maio de 1919, vulgarmente conhecido como "Lei das Águas", e o Decreto-Lei 12445, de 29 de setembro de 1926, não continham uma disposição semelhante à que viria a constar do artigo 8.º do Decreto-Lei 468/71, de 5 de novembro, e do artigo 15.º da Lei 54/2005, de 15 de novembro, ou seja, não tratavam especificamente o tema do reconhecimento de propriedade privada sobre margens de águas públicas.

Na verdade, o artigo 7.º do Decreto 8 de 1892 dispunha que as direções e circunscrições procederiam à classificação e demarcação de cada uma das bacias hidrográficas, procedimento que permitiria saber «quais os lagos, lagoas, valas, canais, esteiros e correntes de água navegáveis e flutuáveis, e como tal públicos», e ainda «qual a largura que deverão ter as faixas de terreno destinadas a constituir as margens dessas correntes, canais, valas, lagos ou lagoas». Concluída a demarcação e classificação de qualquer bacia hidrográfica seriam os interessados chamados a examinar a referida classificação e a apresentar as suas reclamações, as quais, depois de apreciadas, permitiriam a afixação, «nos lugares mais públicos da região hidráulica», de um resumo dos atos praticados (cf. os artigos 1.º a 7.º do Regulamento dos Serviços Hidráulicos). A par destas classificações, previam aqueles diplomas que houvesse lugar a «classificações parciais», a pedido dos interessados ou dependentes de um juízo de oportunidade por parte do Governo, que implicavam a especificação, na parte respetiva às águas navegáveis ou flutuáveis, das superfícies marginais pertencentes ao Estado, das pertencentes aos particulares e da área aproximada de cada uma (cf. artigo 8.º do Regulamento dos Serviços Hidráulicos).

A presunção de dominialidade das margens de águas públicas ficaria definitivamente esclarecida com a aprovação do Decreto-Lei 468/71. Este, que definia margem como sendo «a faixa de terreno contígua ou sobranceira à linha que limita o leito das águas» (cf. artigo 3.º, n.º 1), determinava, no artigo 5.º, o seguinte:

«Consideram-se do domínio público do Estado os leitos e as margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis, sempre que tais leitos ou margens lhe pertençam, e bem assim os leitos e margens das águas não navegáveis nem flutuáveis que atravessem terrenos públicos do Estado.»

A doutrina entendia que este normativo condicionava a recondução das margens ao domínio público à verificação simultânea de dois requisitos - pertença ao Estado e conexão com águas públicas - estando estas águas elencadas, à época, no artigo 1.º da "Lei das Águas" (cf., neste sentido, Diogo Freitas do Amaral/José Pedro Fernandes, ob. cit., p. 101 e ss.; a conexão com águas públicas é, com mais rigor, designada por Ana Raquel Moniz "conexão funcional» - O Domínio Público. O Critério e o Regime Jurídico da Dominialidade, Coimbra, Almedina, 2005, p.191).

Esta dominialidade seria reiterada mais tarde, no artigo 4.º, alíneas a) e b), do Decreto-Lei 477/80, de 15 de outubro, diploma que criou o inventário geral do património do Estado, no qual se estatui que integram o domínio público do Estado «as águas territoriais com os seus leitos, as águas marítimas interiores com os seus leitos e margens e a plataforma continental», e ainda «os lagos, lagoas e cursos de água navegáveis com os respetivos leitos e margens e, bem assim, os que por lei forem reconhecidos como aproveitáveis para produção de energia elétrica ou para irrigação».

Em matéria de reconhecimento da propriedade privada sobre estes terrenos, explicou-se no preâmbulo do Decreto-Lei 468/71 o seguinte (o itálico é nosso):

«[...]

Já quanto ao reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de leitos ou margens públicas se tocou num aspeto mais relevante, que, sem envolver modificação profunda do direito vigente, beneficia contudo num ponto importante, aliás, com inteira justiça, os proprietários particulares: quando se mostre terem ficado destruídos por causas naturais os documentos anteriores a 1864 ou a 1868 existentes em arquivos ou registos públicos, presumir-se-ão particulares os terrenos em que relação aos quais se prove que, antes de 1 de dezembro de 1892, eram objeto de propriedade ou posse privadas. Aliviando deste modo o peso do ónus da prova imposto aos interessados, vai-se ao encontro da opinião que se tem generalizado no seio da Comissão do Domínio Público Marítimo, dada a grande dificuldade, em certos casos, de encontrar documentos que inequivocamente fundamentem as pretensões formuladas à Administração Dominial.

Não pode, no entanto, esquecer-se que esta orientação, baseada em princípios gerais firmemente assentes na nossa ordem jurídica - o princípio da não retroatividade das leis e o princípio do respeito pelos direitos adquiridos - não deverá prejudicar, na prática, os interesses gerais da coletividade, em razão dos quais, precisamente, se foi criando e se mantém na titularidade do Estado o domínio público hídrico.

[...]»

Em consonância, dispunha-se, no artigo 8.º daquele diploma legal (o itálico é nosso):

«[...]

Artigo 8.º

(Reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de leitos ou margens públicos)

1 - As pessoas que pretendam obter o reconhecimento da sua propriedade sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis devem provar documentalmente que tais terrenos eram, por título legítimo, objeto de propriedade particular, ou comum antes de 31 de dezembro de 1864 ou, se se tratar de arribas alcantiladas, antes de 22 de março de 1862.

2 - Na falta de documentos suscetíveis de comprovar a propriedade dos terrenos nos termos do n.º 1 deste artigo, presumir-se-ão particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação aos quais se prove que, naquelas datas, estavam na posse em nome próprio de particulares ou na fruição conjunta de indivíduos compreendidos em certa circunscrição administrativa.

3 - Quando se mostre que os documentos particulares anteriores a 1864 ou a 1868, conforme os casos, se tornaram ilegíveis ou foram destruídos por incêndio ou facto semelhante ocorrido na conservatória ou registo competente, presumir-se-ão particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação aos quais se prove que, antes de 1 de dezembro de 1892, eram objeto de propriedade ou posse privadas.

[...]»

Como se vê, o legislador nacional admitiu a persistência dos direitos de propriedade privada sobre parcelas de leitos ou margens de águas públicas, isto é, águas pertencentes ao domínio público hídrico, mas estabeleceu, na senda do que vinha propondo a Comissão do Domínio Público Marítimo, uma presunção ilidível de dominialidade. Por outras palavras, fez impender sobre o particular o ónus de provar a titularidade da propriedade sobre tais parcelas de terreno e de, assim, as subtrair ao domínio público hídrico a que, de outro modo, pertenceriam, por força do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei 468/71 (cf., neste sentido, Diogo Freitas do Amaral/José Pedro Fernandes, ob. cit., p. 124).

5.3 - A Lei 16/2003, de 4 de junho, que reviu, atualizou e unificou o regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico, não trouxe, quanto a esta matéria, quaisquer alterações de relevo. Seguiu-se a Lei 54/2005, de 15 de novembro, onde se destacam, desde logo, os artigos 2.º a 5.º, que dispõem sobre a composição do domínio público hídrico, integrado pelo domínio público marítimo, lacustre e fluvial, bem como pelo domínio público sobre as restantes águas.

Nos termos do artigo 3.º, o domínio público marítimo, que pertence ao Estado (cf. o artigo 4.º), compreende (o itálico é nosso):

«[...]

a) As águas costeiras e territoriais;

b) As águas interiores sujeitas à influência das marés;

c) O leito das águas costeiras e territoriais e das águas interiores sujeitas à influência das marés;

d) Os fundos marinhos contíguos da plataforma continental, abrangendo toda a zona económica exclusiva;

e) As margens das águas costeiras e das águas interiores, sujeitas à influência das marés;

[...]»

Já o domínio público lacustre e fluvial integra, nos termos do artigo 5.º daquele diploma (na versão atual, dada pela Lei 34/2014, de 19 de junho):

«[...]

a) Cursos de águas navegáveis ou flutuáveis, com os respetivos leitos, e ainda margens pertencentes a entes públicos, nos termos do artigo seguinte;

b) Lagos e lagoas navegáveis ou flutuáveis, com os respetivos leitos, e ainda margens pertencentes a entes públicos, nos termos do artigo seguinte;

c) Cursos de água não navegáveis nem flutuáveis, com os respetivos leitos e margens, desde que localizados em terrenos públicos, ou os que por lei sejam reconhecidos como aproveitáveis para fins de utilidade pública, como a produção de energia elétrica, irrigação ou canalização de água para consumo público;

d) Canais e valas navegáveis ou flutuáveis, ou abertos por entes públicos, e as respetivas águas;

e) Albufeiras criadas para fins de utilidade pública, nomeadamente produção de energia elétrica ou irrigação, com os respetivos leitos;

f) Lagos e lagoas não navegáveis ou flutuáveis, com os respetivos leitos e margens, formados pela natureza em terrenos públicos;

g) Lagos e lagoas circundados por diferentes prédios particulares ou existentes dentro de um prédio particular, quando tais lagos e lagoas sejam alimentados por corrente pública;

h) Cursos de água não navegáveis nem flutuáveis nascidos em prédios privados, logo que as suas águas transponham, abandonadas, os limites dos terrenos ou prédios onde nasceram ou para onde foram conduzidas pelo seu dono, se no final forem lançar-se no mar ou em outras águas públicas;

[...]»

A diferença de redação entre o artigo 5.º do Decreto-Lei 468/71 e o artigo 5.º da Lei 54/2005 resulta de, nos termos do artigo 6.º desta última, o domínio público lacustre não pertencer necessária e exclusivamente ao Estado, mas também às regiões autónomas e, em certos casos, aos municípios e às freguesias. Trata-se de reconhecer que o domínio público fluvial e lacustre, ao contrário do que sucede com o domínio público marítimo, não integra o chamado domínio público necessário do Estado (cf., sobre o tema do domínio público marítimo, os Acórdãos n.os 402/88, 330/90 e 131/2003, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).

O legislador incumbe a administração de proceder à criação de um registo das águas do domínio público e de tornar acessíveis e públicas as faixas do território que, de acordo com a legislação em vigor, correspondem aos leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis (cf. o artigos 9.º, n.os 3 e 20.º da Lei 54/2005. Estes instrumentos - que nunca foram aprovados - permitiriam determinar a navegabilidade e flutuabilidade dos cursos de água e, por conseguinte, a potencialidade dominial das respetivas margens, visto que o regime probatório enunciado no artigo 15.º da Lei 54/2005 só vale para as margens de águas públicas navegáveis ou flutuáveis.

Embora a atual lei não defina expressamente estes conceitos, aceita-se que uma corrente navegável é aquela que for «acomodada à navegação com fins comerciais, de barcos de qualquer forma, construção e dimensões» e que uma corrente flutuável é «aquela por onde estiver efetivamente em costume fazer derivar objetos flutuantes, com fins comerciais» (a definição consta do artigo 8.º do Decreto 5787-IIII, de 10 de maio de 1919, revogado pelo artigo 29.º da Lei 54/2005, mas é utilizada no Guia de Apoio sobre a titularidade dos recursos hídricos, elaborado pelo Departamento do Litoral e Proteção Costeira, e disponível em http://www.apambiente.pt/).

A propósito destes conceitos, é legítimo questionar - porque particularmente relevante para o presente caso - qual o momento em que os cursos de água navegáveis e flutuáveis ingressam no domínio público. De acordo com a doutrina nacional, esse momento pode ser um ou vários de entre os seguintes: i) vigência de um preceito legal que inclua toda uma classe de coisas na categoria do domínio público (classificação); ii) declaração de que certa e determinada coisa pertence a essa classe; iii) afetação dessa coisa à utilidade pública (cf. Marcello Caetano, ob. cit., p. 921, e, em sentido próximo, José Pedro Fernandes, ob. cit., p. 184).

Não há na doutrina consenso em torno desta matéria (cf. Diogo Freitas do Amaral, "Classificação", Dicionário Jurídico da Administração Pública, p. 440, e Marcello Caetano, ob. cit., p. 922). No entanto, a posição dominante vai no sentido de que as águas públicas navegáveis ou flutuáveis, ingressando no domínio público hídrico a partir do momento em que se dá a respetiva qualificação legal, reclamam, por vezes, um ato de classificação, ato esse que terá natureza meramente declarativa (ou não constitutiva) - destinando-se tão somente a "dissipar as dúvidas" existentes acerca do caráter dominial de certa coisa (cf. Diogo Freitas do Amaral, ob. cit., p. 441, e José Pedro Fernandes, ob. cit., p. 184).

5.4 - A compreensão do exato sentido e alcance do artigo 15.º da Lei 54/2005, supra transcrito, reclama o recurso ao elemento histórico, retirado da exposição de motivos anexa à Proposta de Lei 19/X. Aí se esclarece que, em matéria de reconhecimento de propriedade privada, a intenção legislativa foi a de impedir que a proteção dos direitos privados pudesse gerar a «instabilidade permanente da base dominial», estabelecendo-se, por conseguinte, «um limite temporal razoável, em 2014, para a reivindicação de tais direitos», tendo em conta que a possibilidade de reconhecimento constava já do Decreto-Lei 468/71.

«[...]

[...]»

O preceito sofreria as modificações introduzidas pela Lei 78/2013, de 21 de novembro, que alargou o prazo para a propositura da ação judicial de reconhecimento da propriedade privada, fixando-o em 1 de julho de 2014. Na exposição de motivos da Proposta de Lei 349/XII/2.ª, elencam-se as razões que estiveram subjacentes a tal alargamento, entre elas as dificuldades sentidas pelos particulares nas ações atinentes ao reconhecimento do direito de propriedade privada:

«[...]

Uma interpretação a contrario da presente norma resulta que quem não intentar a supra mencionada ação judicial dentro do prazo (até mesmo por simples desconhecimento) ou quem a intentar mas não lograr fazer esta verdadeira probatio diabolica, verá perdida a sua propriedade a favor do Estado, sem que haja lugar a qualquer tipo de compensação.

Impõe-se, assim, a necessária ponderação sobre uma alteração legislativa, permitindo atenuar os efeitos negativos de um processo moroso e complexo de prova da titularidade, devendo o legislador desencadear todos os mecanismos que confiram maior segurança jurídica à confirmação do título de propriedade, seja ao privado, seja ao próprio Estado, enquanto pessoa de bem.

[...]»

5.5 - A redação do artigo 15.º foi novamente alterada pela Lei 34/2014, de 19 de junho, passando aquele a preceituar o seguinte:

«[...]

Artigo 15.º

(Reconhecimento de direitos adquiridos por particulares sobre parcelas de leitos e margens públicos)

1 - Compete aos tribunais comuns decidir sobre a propriedade ou posse de parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis, cabendo ao Ministério Público, quando esteja em causa a defesa de interesses coletivos subjacentes à titularidade dos recursos dominiais, contestar as respetivas ações, agindo em nome próprio.

2 - Quem pretenda obter o reconhecimento da sua propriedade sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis deve provar documentalmente que tais terrenos eram, por título legítimo, objeto de propriedade particular ou comum antes de 31 de dezembro de 1864 ou, se se tratar de arribas alcantiladas, antes de 22 de março de 1868.

3 - Na falta de documentos suscetíveis de comprovar a propriedade nos termos do número anterior, deve ser provado que, antes das datas ali referidas, os terrenos estavam na posse em nome próprio de particulares ou na fruição conjunta de indivíduos compreendidos em certa circunscrição administrativa.

4 - Quando se mostre que os documentos anteriores a 1864 ou a 1868, conforme os casos, se tornaram ilegíveis ou foram destruídos, por incêndio ou facto de efeito equivalente ocorrido na conservatória ou registo competente, presumir-se-ão particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação aos quais se prove que, antes de 1 de dezembro de 1892, eram objeto de propriedade ou posse privadas.

5 - O reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de águas navegáveis ou flutuáveis pode ser obtido sem sujeição ao regime de prova estabelecido nos números anteriores nos casos de terrenos que:

a) Hajam sido objeto de ato de desafetação do domínio público hídrico, nos termos da lei;

b) Ocupem as margens dos cursos de água previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 5.º, não sujeitas à jurisdição dos órgãos locais da Direção-Geral da Autoridade Marítima ou das autoridades portuárias;

c) Estejam integrados na zona urbana consolidada como tal definida no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, fora da zona de risco de erosão ou de invasão do mar, e se encontrem ocupados por construção anterior a 1951, documentalmente comprovado.

[...]»

A justificação deste novo regime jurídico, que eliminou a fixação de prazo para a propositura da ação de reconhecimento da propriedade privada sobre margens de águas públicas, pode encontrar-se na Exposição de Motivos do Projeto de Lei 557/XII/3.ª:

«[...]

Neste contexto, justifica-se, por isso, repor a possibilidade de os titulares do direito de propriedade sobre parcelas de terrenos de leitos e margens de águas navegáveis e flutuáveis anterior a 31 de dezembro de 1864 ou, no caso de arribas alcantiladas, a 22 de março de 1868 instaurarem, a todo o tempo, as ações judiciais para reconhecimento dos seus direitos. Por outro lado, constata-se que a exigência de prova de propriedade privada reportada às datas atrás referidas pode revelar-se, em certos casos, excessiva. Trata-se, nomeadamente do caso de terrenos situados em zonas urbanas consolidadas com construção anterior a 1951 (data a partir da qual passou a ser genericamente exigido, pelo Regulamento Geral das Edificações Urbanas, o licenciamento municipal de construções dentro dos perímetros urbanos e nas zonas rurais de proteção) quando situados fora de zona de risco, que constitui a preocupação fundamental deste regime, ou das margens de águas interiores não sujeitas à jurisdição marítima, pois é nestas últimas que incidem com maior acuidade os valores da segurança de pessoas e bens e da proteção da natureza e do ambiente, subjacentes à tutela da dominialidade: nestes casos, mostra-se adequada a dispensa de prova da propriedade anterior a 1864 ou 1868.

[...]»

6 - A problemática do reconhecimento da propriedade privada sobre margens de águas públicas é comum a outros sistemas jurídicos de base romanística.

No ordenamento jurídico espanhol, por exemplo, destaca-se a aprovação da Ley de Costas (Ley 22/1988, de 28 de julio), que, em consonância com o disposto no artigo 132.º, n.º 2, da Constituição Espanhola, forçou a inclusão da zona marítimo-terrestre e das praias no domínio público estadual, visando travar a utilização intensiva e abusiva da faixa litoral. Naturalmente que essa inclusão gerou problemas de conformidade com outro preceito da Constituição Espanhola - o artigo 33.º, n.º 3, que veda a expropriação sem indemnização - mas a estes deram resposta as várias disposições transitórias previstas na Ley de Costas, (algumas delas seguidas de perto pelo legislador português).

Essas disposições consistiram, por um lado, em transformar aqueles que fossem titulares de um direito de propriedade sobre bens dominiais, reconhecido por decisão judicial transitada, em concessionários de uso privativo do domínio público, por um período de trinta anos, prorrogáveis por outros trinta, funcionando aquela conversão como uma compensação para efeitos do artigo 33.º, n.º 3, da Constituição Espanhola. Por outro lado, permitiu-se que os terrenos dotados de aproveitamento urbanístico consolidado em conformidade com a legislação em vigor mantivessem tal aproveitamento, desde que respeitadas certas regras.

Em todo o caso, cumpre dizer que, mesmo após a declaração de dominialidade introduzida pela Constituição espanhola, os tribunais continuaram a admitir a propriedade privada sobre enclaves situados na zona marítimo-costeira, sujeitando-a, no entanto, a um regime de prova bastante duro, que passava por exigir dos particulares a prova da titularidade do direito de propriedade em momento anterior à Ley de Puertos, de 1880 (cf., sobre o tema, Ana Raquel Moniz, ob. cit. 2005, pp. 184-187, e ainda, na doutrina espanhola, M. Rodriguez González, "Reconocimiento de titularidades privadas en el dominio público maritimo-terrestre. Alcance y limites", Revista de Administración Pública, n.º 146, mayo-agosto, 1998, pp. 225-248, e Jose Luis Meilán Gil, "El dominio público natural y la legislación de costas", Revista de Administración Pública, n.º 139, enero-abril, 1996, pp. 7-47).

7 - A solução portuguesa é, atento este enquadramento, um tanto ou quanto equívoca.

Desde logo porque, ao contrário do que sucede no ordenamento constitucional espanhol, a CRP optou por não declarar a dominialidade de todas as margens de águas públicas, costeiras ou não costeiras - aumentando, por conseguinte, a margem de conformação do legislador ordinário nesta matéria.

Depois, porque o legislador português, ao contrário do seu congénere espanhol, optou por admitir expressamente a existência de margens de propriedade pública e de margens de propriedade privada, condicionando a segunda a um regime de prova muito exigente, sob pena de tais margens se considerarem públicas e, por conseguinte, dominiais (cf. o artigo 5.º da Lei 54/2005). Dito de outro modo, porventura mais consonante como o pensamento legislativo, tolera-se o direito de propriedade privada sobre margens de águas públicas, muito embora tendo presente que, na falta de comprovação daquele direito, o relevo dos terrenos para o interesse público alavanca necessariamente a sua dominialidade, ou seja, a assunção da conveniência de uma afetação e destino públicos, e, logo, a recondução à propriedade de entes públicos.

Este regime jurídico persegue, como se perceciona, um equilíbrio entre, por um lado, o princípio do respeito pelos direitos adquiridos dos particulares, e, por outro, a conveniência de que as margens de águas públicas, por condicionarem a utilização dessas águas, integrem o domínio público, ou seja, estejam sujeitas um regime especial de direito público caracterizado por um reforço das medidas de proteção das coisas que o integram.

Por isso, mesmo quando o particular logre comprovar o seu direito de propriedade sobre margens de águas públicas, o legislador dispõe de diversos mecanismos para instituir a eventual afetação pública desses terrenos, tais como o direito de preferência em caso de alienação forçada ou voluntária, a expropriação e a constituição de servidões administrativas (cf. os artigos 16.º e 21.º, da Lei 54/2005).

Entretanto, com a alteração promovida pela Lei 34/2014, de 19 de junho, o reconhecimento da propriedade privadas sobre margens de águas públicas deixou de estar sujeito a qualquer prazo, infirmando a teleologia ínsita à Lei 54/2005, de 15 de novembro, que foi a de evitar a "instabilidade permanente da base dominial".

C. Apreciação da questão de constitucionalidade

8 - O teor da decisão recorrida e os fundamentos nela usados para rejeitar a aplicação da norma contida no artigo 15.º, n.º 1 e 2, alínea a), da Lei 54/2005 exigem um cotejo deste normativo com o conteúdo do direito de propriedade privada, consagrado no artigo 62.º da CRP, e do direito de acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, vertido no artigo 20.º da lei fundamental.

Aquele preceito que integra o título III, o chamado "catálogo dos direitos económicos, sociais e culturais". No entanto, constituindo a propriedade um pressuposto da autonomia das pessoas, é abundante a jurisprudência constitucional que reconhece natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias de algumas dimensões deste direito (cf., entre outros, os Acórdãos n.os 329/99, 517/99, 134/2004, 159/2007, e 421/2009, disponíveis em www.tribunalconsttucional.pt). Como se explica no Acórdão 421/2009:

«[...]

Que assim é demonstra-o, afinal, a própria história do constitucionalismo, em que a defesa da propriedade ocupou sempre um lugar central: no plano individual, contra as investidas arbitrárias dos poderes públicos no património de cada um; no plano coletivo, quanto à própria possibilidade da existência de uma sociedade civil diferenciada do Estado, e assente autonomamente na apropriação privada de uma ampla gama de bens que permita o estabelecimento de relações económicas à margem do poder político.

[...]»

Sendo certo que nem todas as dimensões do direito de propriedade devem beneficiar do regime específico dos direitos, liberdades e garantias, é indiscutível que isso deve suceder pelo menos quanto a uma dessas dimensões - precisamente, o direito de não ser privado da sua propriedade, salvo por razões de utilidade pública e tão-só com base em lei e mediante o pagamento de uma justa indemnização (cf. o artigo 62.º, n.º 2, da CRP). Eis, de acordo com a jurisprudência, o "eixo central" do radical subjetivo presente no direito de propriedade (cf. os Acórdãos n.os 329/1999 e 421/2009). A ratio do n.º 2 do artigo 62.º da CRP é, pois, o princípio da igualdade perante os encargos públicos, de acordo com o qual o sacrifício grave e especial imposto a um particular - seja por via de requisição, expropriação ou de outro ato ablativo - deve ser compensado pela comunidade (cf. o Acórdão 491/2002, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).

Contudo, o apuramento do que seja um sacrifício grave e especial do direito de propriedade de um particular está longe de ser tarefa fácil, porquanto, a par da dimensão subjetiva já densificada, o artigo 62.º da CRP consagra igualmente uma importante dimensão institucional e objetiva, que tem por destinatário o legislador ordinário. Esta outra dimensão assaca ao legislador a tarefa de compaginar a regulação do direito de propriedade com todos os imperativos constitucionais que nele se projetam (v.g., o direito à habitação, o ordenamento do território, a proteção da saúde pública), isto é, no contexto global da lei fundamental. Mesmo na ausência de uma referência expressa a essa tarefa, a jurisprudência constitucional vem repetidamente confirmando que o n.º 1 do artigo 62.º traz implícita uma cláusula legal de conformação social da propriedade (cf., entre outros, os Acórdãos n.os 617/2007 e 421/2009).

Dois exemplos bastarão, crê-se, para ilustrar a diversa natureza dos atos legislativos com efeitos sobre o direito de propriedade privada. No Acórdão 480/2014 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), ao analisar uma norma que excluía a indemnização aquando da constituição de servidões militares, o Tribunal esclareceu (o itálico é nosso):

«[...]

Se se entender que, por força desse ato, ao particular é imposto um sacrifício grave e especial que merece reparação, de acordo com as exigências decorrentes do princípio da igualdade de todos perante os encargos públicos, a aplicação ao caso do disposto no n.º 2 do artigo 62.º da CRP encontra-se valorativamente justificada. Contudo, e uma vez que a afetação legal do direito de propriedade pode traduzir-se em outra coisa que não a imposição ao particular de um sacrifício grave e especial - pode traduzir-se antes na mera conformação legal da propriedade, através da delimitação genérica do seu conteúdo e limites - importa antes do mais qualificar a lei que impõe a servidão, de modo a que se saiba se dos seus efeitos decorre a ablação indemnizável do direito ou apenas a estrita conformação legal do mesmo.

Se se concluir por esta última hipótese, ao caso será aplicável o n.º 1 do artigo 62.º da CRP, e não o disposto no seu n.º 2.

[...]»

Ao aplicar o critério eleito no caso concreto, o Tribunal apurou que «não se estaria, de todo em todo, perante a subtração de uma concreta posição jurídica, garantida pela CRP, para a realização de um fim de interesse público determinado», sustentando que a instituição das servidões militares consubstanciaria ainda uma limitação ao jus aedificandi meramente conformadora ou reguladora do direito de propriedade, ainda integrada no mandato que a Constituição endereça ao legislador ordinário nos termos do n.º 1 do artigo 62.º da CRP.

No Acórdão 491/2002 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), escrutinando a validade constitucional do artigo 490.º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais, que consagrava o instituto da venda forçada de partes ou participações sociais detidas por sócios minoritários, o Tribunal Constitucional sustentou o seguinte entendimento:

«[...]

Poderá ainda dizer-se, relativamente às dimensões do artigo 62.º da Constituição da República que avultam relativamente à definição desta espécie de elementos "conformativos" de cada tipo de "propriedade" que, dentre as várias dimensões nele discerníveis, a que sobressai como atingida não é (ou não será tanto) a "garantístico-subjetiva" (expressa, máxima e nuclearmente, no direito à não desapropriação), mas antes, a de "garantia de instituto" - dimensão, esta outra, que redunda na imposição, dirigida ao legislador e a todos os poderes constituídos, de assegurarem a existência da "propriedade privada", nas suas múltiplas manifestações, enquanto elemento necessariamente integrante e determinante da ordem jurídica infraconstitucional.

[...]»

9 - Naturalmente que, pairando sobre a propriedade privada a "hipoteca social" imposta pelo sistema de valores constitucionais, sobressaem igualmente, na jurisprudência constitucional, os conflitos com o regime do domínio público, até pela importância que esta matéria detém no quadro da organização económica do Estado.

Neste plano destaca-se, desde logo, o Acórdão 659/99 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), em que estava em causa uma norma que previa que os titulares de passagens de nível sobre bens dominiais deveriam comprovar a constituição da servidão perante o Caminho de Ferro e mediante título suficiente, considerando-se extintas as servidões relativamente às quais tal prova não lograsse realizar-se (cf. o artigo 26.º, n.º s 3 e 4, do Decreto-Lei 156/81, de 9 de junho). Na sua análise, o Tribunal começou por esclarecer que a norma em causa não se afigurava restritiva de um direito real de gozo (a servidão de passagem), formulando, para tanto, o seguinte raciocínio (o itálico é nosso):

«[...]

É pedida a comprovação do título constitutivo para que o direito de servidão de passagem possa garantir ao seu titular um outro direito que oneraria o domínio público. Caso a comprovação não seja realizada, não se pode dizer que se operou uma extinção de um direito de servidão nesse momento, pois não se chegou a demonstrar a sua existência [...]. Tratar-se-ia, portanto, de um prazo de caducidade para a prova da existência de um direito de servidão de passagem, a fim de ser concedido um novo direito de passagem sobre o domínio público.

[...]»

Não assumindo natureza restritiva, a norma escrutinada revelava-se, ainda, juridicamente fundamentada numa ponderação de interesses bastante: «o interesse na demonstração, dentro de um prazo razoável, da existência de um pressuposto justificativo da aceitação de uma oneração do domínio público prevalece sobre um ilimitado direito de ver reconhecida a existência anterior de uma servidão de passagem».

Acrescente-se que, neste aresto, o Tribunal se debruçou ainda sobre uma outra questão, igualmente pertinente para os presentes autos, e que foi a de saber se, para as servidões constituídas antes da passagem e construção do caminho de ferro, as normas sub judicio, ao não preverem qualquer indemnização, estariam conformes aos artigos 13.º e 62.º da CRP. Sobre este ponto, avançou o Tribunal:

«[...]

Um eventual não cumprimento das leis de expropriação no que se refere a servidões anteriormente constituídas não é, obviamente, objeto passível de apreciação pelo Tribunal Constitucional no presente recurso, até porque, se razões derivadas da natureza do controlo de constitucionalidade não o impedissem, no caso a comprovação da constituição anterior de tal servidão não foi sequer feita.

Mas já é manifestamente inatacável numa perspetiva de constitucionalidade que o diploma de 1981 declare que só através de compromisso assumido pelo Caminho de Ferro se mantiveram servidões anteriormente constituídas, dada a integração do Caminho de Ferro, desde a sua origem, no domínio público.

[...]»

Depois, apesar de o Tribunal Constitucional não se ter pronunciado especificamente sobre a validade dos normativos contidos no já referido artigo 8.º do Decreto-Lei 468/71, debruçou-se, no Acórdão 353/2004 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), sobre uma interpretação normativa próxima, incidente sobre os n.os 2 e 5 do artigo 3.º, quando interpretados no sentido de que «a mera classificação de certos bens como domínio público implicaria, ipso facto, a sua automática transferência para tal domínio, independentemente de justa indemnização». Em face deste entendimento, o Tribunal considerou, citando doutrina nacional:

«[...]

Sucede, assim, que no momento em que determinada lei vem dispor que certas categorias de coisas são dominiais, quando até aí não o eram, o preceito legal não pode ter eficácia de fazer automaticamente incluir no domínio público todas as coisas enquadráveis naquelas categorias: se elas já pertenciam ao património do Estado, integram-se automaticamente no seu domínio público; mas se eram propriedade particular, como tal têm de continuar, enquanto não forem expropriadas mediante adequada indemnização, pois o contrário equivaleria pura e simplesmente a um confisco".

[...]

Ora, prevendo a dimensão normativa em análise uma automática transferência da propriedade para o domínio público, apenas com base na classificação de certos bens, pelo preenchimento das previsões legais para tanto, e sem pagamento de "justa indemnização", tem de concluir-se que essa dimensão normativa viola o artigo 62.º, n.º 2, da Constituição da República.

[...]»

10 - A apreciação da questão de constitucionalidade sindicanda não pode fazer-se sem ter ainda em conta o direito de acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva (cf. artigo 20.º da CRP).

É sabido que o princípio da tutela jurisdicional efetiva, enquanto subprincípio concretizador do princípio do Estado de Direito, não tem apenas uma dimensão subjetiva - associada, entre outras dimensões, a um direito a um processo equitativo (due process of law), integrando também uma dimensão objetiva ou institucional, nos termos da qual os poderes públicos - mormente o legislador - têm o dever de «erigir instituições, definir procedimentos e emitir em geral normas que tornem possível o acesso ao tribunal e ao processo justo» (cf. o Acórdão 606/2013, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). Dispondo o legislador ordinário de ampla margem de conformação na acomodação dos interesses que avultam no processo, os eventuais ónus, cominações e preclusões só merecerão censura constitucional se forem insuscetíveis de credenciar-se racionalmente, nos termos de um juízo negativo de controlo (cf., entre outros, os Acórdãos n.os 337/2000, 428/2003, 215/2007, 451/2008 e 556/2008, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).

No Acórdão 596/2009 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) o Tribunal Constitucional reconheceu que a repartição do ónus da prova não se afigurava matéria processual, «conquanto o momento de primacial efetividade da norma ocorra dentro do processo». Porém, instado a pronunciar-se sobre uma norma que dispunha que, em caso de acidente rodoviário em autoestradas, em razão do atravessamento de animais, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança pertenceria à concessionária, o Tribunal não se eximiu a apreciar a validade de tal normativo à luz do princípio do acesso ao direito, tendo, em aplicação das coordenadas supra enunciadas, chegado à seguinte conclusão (o itálico é nosso):

«[...]

Não se vislumbra que seja desprovido de fundamento material bastante a opção do legislador cometer o ónus em causa à parte que se encontra em melhores condições para antecipadamente poder lançar mão dos meios ou instrumentos materiais aptos à prova dos factos, quer pelo domínio material que tem sobre as autoestradas e os meios de equipamento e infraestruturas adequadas a conferir maior segurança na circulação rodoviária, quer pela sua capacidade económica para se socorrer desses meios.

[...]»

Existem hipóteses em que da conformação legislativa do direito de acesso ao direito advém uma violação do direito de propriedade privada. Nos Acórdãos n.os 516/94, 451/95 e 128/95 (disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt) foi analisada uma norma que estabelecia a impenhorabilidade, por qualquer tribunal, de bens já penhorados pelas repartições de finanças. Assumindo a «clara natureza processual» da matéria da impenhorabilidade dos bens, o Tribunal Constitucional reconheceu o impacto de um tal regime jurídico no direito de propriedade privada dos credores não estaduais (o itálico é nosso):

«[...]

Simplesmente, a regra do artigo 300.º, n.º 1, 1.ª parte, do CPT, tutela o interesse público de tal modo que pode acarretar, de um ponto de vista prático, a paralisia ou suspensão da realização prática dos créditos de terceiros durante longos períodos [...].

Em tais casos [...] o direito patrimonial do credor exequente em execução não fiscal vê-se anulado na sua consistência prática, ficando à mercê da evolução da situação patrimonial do devedor no futuro, o qual pode vir a ser declarado falido, acarretando a declaração falimentar e evidentes prejuízos para o credor, mas não para o Estado ou credor público equiparado.

[...]»

No Acórdão 273/2004 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), estavam em causa normativos do Código de Registo Predial que estatuíam a inadmissibilidade do registo da ação de impugnação pauliana. Apreciando se tais normativos seriam compatíveis com a tutela constitucional conferida pelo artigo 62.º da Constituição ao credor impugnante, o Tribunal considerou que (o itálico é nosso):

«[...]

Na verdade, se é certo que da insusceptibilidade de registo de ação de impugnação pauliana pode resultar uma maior dificuldade em garantir a eficácia da impugnação pauliana, especialmente nas hipóteses consideradas pelo recorrente de existirem sucessivas transmissões do bem objeto da ação, essa dificuldade não vai nunca ao ponto de determinar a privação do direito de crédito [...].

Por tudo o exposto, necessário se torna concluir que, ainda que nada na Constituição impeça a possibilidade de registo da impugnação pauliana e se possa não vislumbrar qualquer "direito ou interesse constitucionalmente protegido" que justifique, do ponto de vista constitucional, a não admissão desse registo, a interpretação normativa dos artigos 2.º, n.º 1, alínea u), e 3.º, n.º 1, alínea a), do Código do Registro Predial que vem questionada não atinge, efetivamente, o núcleo essencial do direito de crédito. A solução normativa por que optou a decisão recorrida não pode, pois, ser considerada inconstitucional, por violação do artigo 62.º, n.º 1, da Constituição, lido conjugadamente com o princípio da proporcionalidade, que se extrai, entre outros, do artigo 18.º, n.º 2, da mesma Constituição.

[...]»

Por último, justifica referência o Acórdão 215/2000 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), no qual foi sindicada a validade do artigo 5.º do Código de Registo Predial, enquanto considera terceiros, para efeitos de registo predial, todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado prédio, vejam esse direito afastado por qualquer facto jurídico anterior não registado ou registado posteriormente. Também aqui se cotejou tal segmento normativo com o direito de propriedade privada, chegando-se, uma vez mais, a um juízo negativo de inconstitucionalidade (o itálico é nosso):

«[...]

Será constitucionalmente admissível esta "ablação" da propriedade por efeito do regime de efeitos do registo predial português?

O registo predial destina-se a dar publicidade à situação jurídica dos bens, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário (artigo 1.º do CRP), ou seja, dar publicidade aos direitos inerentes àqueles prédios (ou objetos sujeitos a registo).

O perfeito conhecimento da situação jurídica dos objetos sujeitos a registo é absolutamente essencial à certeza e segurança do comércio jurídico de imóveis, segurança jurídica que subjaz em todo o ordenamento jurídico em que assenta o Estado de Direito.

[...]»

11 - À luz da jurisprudência constitucional, não existem dúvidas de que nem todo o tipo de afetação do direito de propriedade privada será indemnizável nos termos do n.º 2 do artigo 62.º da CRP, muito embora tal afetação careça sempre de justificação à luz do princípio da proibição do excesso - seja genericamente, enquanto atuação meramente conformadora ou reguladora daquele direito (cf. o artigo 2.º da CRP), seja especificamente, enquanto medida verdadeiramente compressora do seu âmbito de proteção (cf. o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição).

Por outro lado, esta vertente conformadora, ou mesmo restritiva, do direito de propriedade privada pode surgir em resultado de normas reguladoras do processo ou da alocação do ónus da prova, as quais somente serão inconstitucionais se forem insuscetíveis de credenciar-se racionalmente, afetando excessivamente a posição patrimonial protegida pelo artigo 62.º da Constituição. Neste juízo, há que ter na devida conta que um sistema institucional de instrumentos e mecanismos jurídicos e de normas organizatórias e procedimentais é um elemento essencial para garantir a tutela de outros interesses constitucionalmente protegidos, mormente a segurança no domínio e na exploração dos bens.

12.1 - A apreciação da presente questão de constitucionalidade reclama que se deem como assentes dois pontos prévios.

O primeiro é o de que não é transponível para o caso a jurisprudência lavrada no Acórdão 353/2004 (já referido). É incontestável que um normativo que previsse que a classificação de certos bens como dominiais implicaria, ipso facto, a sua automática transferência para tal domínio, sem previsão de indemnização ou compensação, seria inconstitucional, por violar o preceituado no n.º 2 do artigo 62.º, da Constituição. Contudo, não é este o segmento normativo que integra o objeto do presente recurso, o qual não trata, portanto, de questão análoga nem sequer semelhante.

O segundo é o de que a apreciação crítica que o legislador fez do regime probatório por ele mesmo criado, sendo um elemento relevante, não é um fator determinante na apreciação da questão de constitucionalidade sob escrutínio, já que o juízo legislativo da conveniência e adequação de um dado complexo normativo não se sobrepõe, como é bom de ver, à apreciação pelo Tribunal Constitucional, enquanto órgão a quem compete especificamente administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional (artigo 221.º, n.º 1, da CRP).

12.2 - Como vimos, as margens de águas públicas, pelo relevo público que lhes é conatural, ingressam, na ausência de direitos de propriedade privada, no domínio público de entes públicos. Contudo, as normas em crise não se limitam a instituir uma particular alocação do ónus da prova. Estatuem, ainda, um prazo para a propositura da ação de reconhecimento do direito de propriedade privada - prazo esse que, ao tempo dos autos, terminaria em 1 de julho de 2014, por aplicação da Lei 78/2013 - a que acresce a necessidade de oferecer prova documental de tal direito, ou prova da posse privada dos bens em causa, em momento anterior a 31 de dezembro de 1864 (cf. o artigo 15.º, n.os 1, e 2, alínea a), da Lei 54/2005, na redação conferida pela Lei 78/2013).

O regime jurídico assim delineado justifica-se em razão da necessidade de dar estabilidade à base dominial, visto estarem em causa coisas que o legislador, em cumprimento do mandato constitucional inscrito no artigo 84.º, n.º 1, alínea f), considera proporcionarem utilidade pública merecedora de um estatuto e de uma proteção especiais. Vale isto por dizer que as exigências vertidas nas normas em crise - que só valem, recorde-se, para as margens de águas navegáveis ou flutuáveis - encontram o seu fundamento último na proteção de interesses constitucionais a que esse tipo de águas se acha indissociavelmente ligado.

Resta apurar se estas exigências apresentam creditação racional, equilibrando os interesses cuja consecução se visa alcançar, ou se, ao contrário, instituem, como entendeu a decisão recorrida, uma probatio verdadeiramente diabólica, suscetível de brigar com a garantia de acesso ao direito e com o direito de propriedade privada.

12.3 - No entender deste Tribunal, a fixação de um prazo máximo para a propositura da ação de reconhecimento - afinal, o único aspeto verdadeiramente inovador relativamente ao regime jurídico anteriormente vigente (cf. o artigo 8.º do Decreto-Lei 468/71) - é um elemento indispensável à estabilização da base dominial. Porém, o objeto do presente recurso, talqualmente delimitado supra, não incide sobre o segmento normativo relativo à fixação de um prazo para o recurso à via judiciária. Daí que este elemento, sendo sistematicamente relevante, não se afigure determinante no apuramento da validade da dimensão interpretativa cuja aplicação foi recusada pelo tribunal recorrido.

Já a exigência de prova reportada a momento anterior a 1864, quando acoplada a uma presunção ilidível de dominialidade, pode ser mais problemática.

12.4 - Dois pontos que afiguram decisivos para o juízo deste Tribunal.

O primeiro respeita à explicação da relevância da data de 31 de dezembro de 1864 para efeitos da prova da propriedade privada. É que foi nesta data, como se disse já, que as margens de águas públicas foram objeto de declaração de dominialidade, através do decreto régio então publicado. Nada houve de arbitrário na escolha de tal data, que sendo aquela em que as margens de águas públicas passaram a estar excluídas do comércio jurídico privado, apresenta uma evidente credenciação racional - era mesmo a única data que faria sentido considerar para o efeito.

O segundo recorda a já mencionada jurisprudência constitucional em matéria de distribuição do ónus da prova (cf. o Acórdão 596/09): ela exige que tal ónus seja alocado à parte que se encontra em melhores condições para antecipadamente poder lançar mão dos meios ou instrumentos materiais aptos à prova dos factos. Ora, não é contestável que o particular é, à partida, quem preenche melhor - ou, pelo menos, menos mal - esta exigência.

Não se esconde que duas circunstâncias podem causar embaraço a estes pontos, que reputámos decisivos.

A primeira lembra que os diplomas anteriores a 1971 não continham, apesar dos argumentos doutrinais, uma presunção de dominialidade semelhante à que constava do artigo 8.º do Decreto-Lei 468/71 e à que atualmente consta do artigo 15.º da Lei 54/2005, nem qualquer ónus de intentar uma ação de reconhecimento da propriedade privada sobre os terrenos marginais.

A segunda sublinha criticamente o facto de, impendendo, desde 1892, sobre a administração pública, o dever de pôr em marcha a classificação e demarcação das bacias hidrográficas, contendo uma série de informações relevantes para a atual ação de reconhecimento, tais como a navegabilidade ou flutuabilidade das águas e dos troços, ou a largura das margens confinantes - e que permitiriam ter atempadamente "dissipado" eventuais "dúvidas" sobre a situação jurídica dos bens em causa -, tal dever jamais haver sido cumprido.

Estes "embaraços" não se afiguram, porém, suficientes para pôr em causa a credenciação racional que já sublinhámos.

Reconhecendo-se embora a existência de instrumentos jurídicos que permitiriam acautelar, pelo menos em parte, os interesses públicos que o regime jurídico vigente visa salvaguardar - nomeadamente, as servidões administrativas e outras restrições de utilidade pública -, não se duvida que a dominialidade pública é o que melhor garante aqueles. Não se olvide que as margens das águas públicas constituem condição de acesso a vias de comunicação - leia-se, a cursos de água navegáveis ou flutuáveis -, apresentando impacto evidente no exercício de liberdades fundamentais, como a liberdade de circulação, consagrada no artigo 44.º da CRP.

Ainda que algumas dúvidas possam substituir, elas não se afiguram suficientes para pôr em causa a conformidade constitucional da norma do artigo 15.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Lei 54/2005, na redação conferida pela Lei 78/2013, quando interpretada no sentido da obrigatoriedade da prova a efetuar pelos autores se reportar a data anterior a 31 de dezembro de 1864, quando confrontada com o direito de acesso ao direito e o direito a uma tutela jurisdicional efetiva, consagrados no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição.

III. Decisão

13 - Pelo exposto, o Tribunal Constitucional decide:

a) Julgar não inconstitucional a norma do artigo 15.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Lei 54/2005, de 15 de novembro, na redação conferida pela Lei 78/2013, de 21 de novembro, quando interpretada no sentido de a obrigatoriedade da prova a efetuar pelos autores se reportar a data anterior a 31 de dezembro de 1864;

b) Por conseguinte, conceder provimento ao recurso.

Sem custas.

Lisboa, 23 de junho de 2015. - João Pedro Caupers - Maria Lúcia Amaral - Maria de Fátima Mata-Mouros - Joaquim de Sousa Ribeiro.

208802508

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1023124.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1913-07-01 - Decreto 5 - Ministério da Justiça - Direcção Geral dos Eclesiásticos - 1.ª Repartição

    Decreto n.º 5, cedendo à Junta de Paróquia de Odemira um terreno destinado à construção duma escola

  • Tem documento Em vigor 1919-05-10 - Decreto 5787-IIII - Ministério do Comércio e Comunicações

    Insere várias disposições sobre as águas de domínio público e de domínio privado. Quanto ás primeiras, dispõe sobre o seu uso e aproveitamento por concessão, nomeadamente, de utilidade pública. Quanto ás águas particulares, dispõe sobre o seu aproveitamento e servidões relativas ao uso das mesmas. Estabelece ainda disposições gerais e transitórias sobre esta matéria.

  • Tem documento Em vigor 1971-11-05 - Decreto-Lei 468/71 - Ministérios da Marinha e das Obras Públicas

    Revê, actualiza e unifica o regime jurídico dos terrenos no domínio público hidrico, no qual se incluem os leitos e as margens das águas do mar, correntes de água, lagos e lagoas, de modo a facilitar o seu aproveitamento para as diversos usos de que são económicamente susceptíveis.

  • Tem documento Em vigor 1980-10-15 - Decreto-Lei 477/80 - Ministério das Finanças e do Plano - Secretaria de Estado das Finanças

    Cria o inventário geral do património do Estado.

  • Tem documento Em vigor 1981-06-09 - Decreto-Lei 156/81 - Ministério dos Transportes e Comunicações

    Aprova o Regulamento de Passagens de Nível.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 2003-06-04 - Lei 16/2003 - Assembleia da República

    Altera e republica o Decreto-Lei nº 468/71, de 5 de Novembro (revê, actualiza e unifica o regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico), no concernente a determinados aspectos da definição do domínio público hídrico nas Regiões Autónomas.

  • Tem documento Em vigor 2005-11-15 - Lei 54/2005 - Assembleia da República

    Estabelece a titularidade dos recursos hídricos.

  • Tem documento Em vigor 2013-11-21 - Lei 78/2013 - Assembleia da República

    Altera (primeira alteração) à Lei n.º 54/2005, de 15 de novembro, que estabelece a titularidade dos recursos hídricos.

  • Tem documento Em vigor 2014-06-19 - Lei 34/2014 - Assembleia da República

    Altera (segunda alteração) a Lei n.º 54/2005, de 15 de novembro, que estabelece a titularidade dos recursos hídricos.

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