Decreto-Lei 115/96
de 6 de Agosto
O presente diploma tem como objectivo transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º
94/57/CE
, do Conselho, de 22 de Novembro, relativa às regras comuns para o reconhecimento das organizações de vistoria e inspecção dos navios e para as actividades relevantes das administrações marítimas.
De facto, impõe-se uma aplicação eficaz e uniforme das regras constantes de diversas convenções internacionais com vista ao reforço da salvaguarda da vida humana no mar e da prevenção da poluição.
Uma vez que, tradicionalmente ou por conveniência de gestão administrativa, várias das funções de inspecção e de vistoria estabelecidas naqueles instrumentos internacionais são delegadas nas sociedades de classificação de navios, torna-se necessária a criação de regras claras e exigentes com vista ao reconhecimento da capacidade técnica e idoneidade dessas organizações.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
O presente diploma estabelece as regras relativas ao reconhecimento prévio das organizações habilitadas para realizar as inspecções, aprovação de planos e esquemas, realização de provas das diversas disciplinas e aprovação de cadernos de estabilidade e vistorias de navios.
Artigo 2.º
Entidades habilitadas
Os actos e operações referidos no artigo anterior, quando não efectuados directamente pela Direcção-Geral de Portos, Navegação e Transportes Marítimos (DGPNTM), só podem ser realizados por organizações previamente reconhecidas nos termos do presente diploma.
Artigo 3.º
Âmbito de aplicação
1 - O disposto no presente diploma aplica-se aos actos e operações referidos nos artigos anteriores que se encontrem previstos nas seguintes convenções internacionais, respectivos protocolos e emendas em vigor:
a) Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar de 1974;
b) Convenção Internacional sobre Linhas de Carga de 1966;
c) Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios de 1973;
d) Convenção n.º 92 da OIT, Relativa ao Alojamento da Tripulação a Bordo;
e) Convenção sobre o Regulamento Internacional para Evitar Abalroamentos no Mar, 1972;
f) Convenção Internacional para Arqueação de Navios, 1969;
g) Códigos tornados obrigatórios através de qualquer das Convenções referidas.
2 - O disposto no presente diploma aplica-se ainda aos actos e operações referidos nos artigos anteriores previstos nas directivas emanadas do Conselho da União Europeia sobre Segurança Marítima que prevejam a possibilidade de delegação em organismos reconhecidos.
Artigo 4.º
Processo de reconhecimento
1 - Compete à DGPNTM reconhecer a capacidade técnica das organizações indicadas no artigo 1.º, mediante requerimento que lhe seja dirigido pelos interessados, instruído com toda a documentação necessária e suficiente para a comprovação dos requisitos mínimos, constantes do anexo ao presente diploma, que dele faz parte integrante.
2 - Sobre o pedido formulado nos termos do número anterior, deverá ser proferida decisão no prazo máximo de 30 dias a contar da data da entrega do requerimento ou, no caso previsto no número seguinte, da entrega de toda a documentação em falta.
3 - Em caso de instrução incompleta a DGPNTM poderá, no prazo previsto no número anterior, solicitar ao requerente que forneça a documentação em falta.
Artigo 5.º
Navios nacionais
Aos navios portugueses devem aplicar-se os requisitos de construção e manutenção relativamente ao casco, às máquinas, às instalações eléctricas e de controlo dos navios por uma organização reconhecida, nos termos do presente diploma.
Artigo 6.º
Celebração de acordo prévio
1 - Para que as organizações reconhecidas possam exercer a sua actividade, torna-se necessária a celebração prévia de um acordo formal com o ministério que tutela o sector da segurança das embarcações, no qual se estabeleçam as tarefas e funções específicas assumidas pela organização reconhecida relativamente aos navios que arvorem a bandeira portuguesa, que inclua, obrigatoriamente, os seguintes elementos:
a) A possibilidade de auditorias periódicas, a efectuar pela DGPNTM ou por um organismo externo por ela designado, das tarefas que as organizações desempenham em seu nome;
b) A possibilidade de inspecções aleatórias e minuciosas aos navios;
c) As disposições relativas à comunicação de informações essenciais sobre a sua frota classificada, as alterações da classificação ou a desclassificação dos navios;
d) As disposições constantes do anexo II da Resolução A.739 (18) da Organização Marítima Internacional.
2 - As organizações reconhecidas poderão ser obrigadas a dispor de representação permanente, com personalidade jurídica estabelecida em Portugal, exigência que deverá ficar expressa no acordo a que se refere o número anterior.
Artigo 7.º
Equiparação de entidades estrangeiras
1 - As entidades reconhecidas por qualquer Estado membro da União Europeia, ao abrigo e nos termos da Directiva n.º
94/57/CE
, do Conselho, de 22 de Novembro, ficam equiparadas às referidas no artigo 2.º do presente diploma, sem prejuízo do cumprimento do disposto na parte deste que lhes seja aplicável, nomeadamente no seu artigo 6.º
2 - O disposto no número anterior aplica-se igualmente às entidades que, não satisfazendo os requisitos previstos nos n.os A-2 e A-3 do anexo ao presente diploma, sejam reconhecidas pela Comissão das Comunidades Europeias.
3 - Nas situações previstas no número anterior, compete à DGPNTM requerer à Comissão das Comunidades Europeias o respectivo reconhecimento.
Artigo 8.º
Suspensão do reconhecimento
Sempre que qualquer das entidades reconhecidas deixar de reunir as condições mínimas para o efeito, compete à DGPNTM suspender o respectivo reconhecimento, mediante notificação ao interessado da decisão de suspensão devidamente fundamentada.
Artigo 9.º
Competência de fiscalizacão
1 - Compete à DGPNTM fiscalizar as entidades reconhecidas e executar todas as disposições previstas no presente diploma e na Directiva n.º
94/57/CE
, do Conselho, de 22 de Novembro.
2 - As organizações reconhecidas ficam obrigadas a fornecer à DGPNTM todas as informações relevantes no que se refere às mudanças de classificação e desclassificação de navios que arvorem bandeira nacional.
3 - As organizações reconhecidas não poderão emitir certificados para navios que tenham sido desclassificados ou que tenham sofrido mudança de classificação por razões de segurança sem prévia consulta à DGPNTM sobre a necessidade de realização de inspecção completa aos mesmos.
Artigo 10.º
Norma revogatória
Fica revogada a Portaria 157/74, de 27 de Fevereiro.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 3 de Julho de 1996. - António Manuel de Oliveira Guterres - João Cardona Gomes Cravinho.
Promulgado em 19 de Julho de 1996.
Publique-se.
O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 23 de Julho de 1996.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.
ANEXO
Critérios mínimos para as organizações referidas no artigo 2.º
A) Aspectos gerais
1 - A organização reconhecida deve poder comprovar que dispõe de vasta experiência na avaliação da construção de navios mercantes.
2 - A organização deve incluir na sua classificação uma frota de pelo menos 1000 navios de tráfego oceânico (mais de 100 tAB), num total não inferior a 5 milhões de tAB.
3 - A organização deverá empregar pessoal técnico em número adequado ao número de navios classificados. No mínimo, serão necessários 100 inspectores próprios para corresponder aos requisitos estabelecidos no n.º 2.
4 - A organização deverá dispor de um sistema global de regras e regulamentações relativas à concepção, construção e inspecção periódica dos navios mercantes, publicadas e continuamente actualizadas e melhoradas através de programas de investigação e desenvolvimento.
5 - O registo de navios da organização deve ser publicado anualmente.
6 - A organização não deverá ser controlada por armadores, construtores navais ou quaisquer outras entidades comercialmente implicadas no fabrico, equipamento, reparação ou exploração de navios, nem deve o seu rendimento depender substancialmente de uma só entidade comercial.
B) Aspectos específicos
1 - A organização deve contar com:
a) Pessoal técnico, de gestão e de investigação em número suficiente (proporcional às tarefas e aos navios classificados, responsáveis também pelo desenvolvimento de capacidades e por fazer as regras e regulamentações);
b) Uma cobertura mundial assegurada por pessoal técnico ou por pessoal técnico de outras organizações reconhecidas.
2 - A organização deve ser regida por um código deontológico.
3 - A organização deve ser gerida e administrada de modo a garantir a confidencialidade das informações solicitadas pela administração.
4 - A organização deve estar preparada para fornecer à administração as informações relevantes.
5 - Os gestores da organização devem definir e documentar a sua política e os seus objectivos e empenhamento em matéria de qualidade e assegurar que a sua política é entendida, aplicada e garantida a todos os níveis da organização.
6 - A organização deve desenvolver, aplicar e manter um sistema de qualidade interno eficaz, baseado nos aspectos mais apropriados das normas de qualidade internacionalmente reconhecidas e em conformidade com as normas EN 45004 (organismos de inspecção) e EN 29001, segundo a interpretação dos requisitos do sistema de certificação da qualidade de IACS (Quality System Scheme Requirements), que, nomeadamente, garante que:
a) As regras e regulamentações da organização sejam estabelecidas e mantidas de forma sistemática;
b) Tais regras e regulamentações sejam respeitadas;
c) Sejam satisfeitos os requisitos referentes às funções legais que a organização é autorizada a desempenhar;
d) Sejam definidas e documentadas as responsabilidades, autoridade e inter-relação do pessoal cujo trabalho afecta a qualidade dos serviços da organização;
e) Todo o trabalho seja levado a cabo em condições controladas;
f) Seja estabelecido um sistema de supervisão que controle as acções e o trabalho efectuado pelos inspectores e pelo pessoal técnico e administrativo empregado directamente pela organização;
g) Os requisitos referentes às principais funções legais que a organização está autorizada a desempenhar só sejam aplicados ou directamente controlados por inspectores próprios seus ou por inspectores de outras organizações reconhecidas;
h) Seja mantido um sistema de qualificação dos inspectores e de actualização contínua dos seus conhecimentos;
i) Sejam mantidos registos que comprovem o cumprimento das normas aplicáveis nos domínios abrangidos pelos serviços prestados, bem como o bom funcionamento do sistema de qualidade; e
j) Seja criado um sistema global de auditorias internas planeadas e documentadas relativas ao desempenho, em todos os locais de trabalho da organização, de actividades relacionadas com a qualidade.
7 - A organização deve demonstrar a sua capacidade para:
a) Desenvolver e manter actualizado um conjunto próprio e adequado de regras e regulamentações relativas ao casco, às máquinas e às instalações eléctricas e de controlo cujo nível de qualidade seja o das normas técnicas internacionalmente reconhecidas, com base nas quais são emitidos os certificados da Convenção SOLAS e os certificados de segurança para navio de passageiros (no que se refere à estrutura do navio e aos sistemas de máquinas de bordo essenciais) e os certificados das linhas de carga (no que se refere à resistência do navio);
b) Efectuar todas as inspecções e vistorias exigidas pelas convenções internacionais para a emissão de certificados, incluindo os meios de avaliar, utilizando pessoal profissional qualificado, a aplicação e a manutenção do sistema de gestão de segurança, tanto em terra como a bordo dos navios que deverão estar abrangidos na certificação.
8 - O sistema de qualidade da organização deve ser certificado por uma empresa de auditoria independente reconhecida pela administração do Estado em que está localizada.
9 - A organização deve permitir que colaborem no desenvolvimento das suas regras e ou regulamentações representantes da administração e outras partes interessadas.