de 23 de Outubro
A preocupação permanente de proporcionar um elevado nível da qualidade de vida na área da saúde aconselha, por vezes, o recurso a dispositivos médicos para diagnóstico, prevenção, controlo, tratamento, atenuação da doença ou mesmo alteração da anatomia ou compensação de uma lesão ou deficiência.Por essa razão torna-se necessário criar condições que permitam garantir a utilização segura daqueles produtos, garantir a conservação e a melhoria do grau de protecção dos doentes e alcançar o nível de funcionamento que lhes é atribuído pelo fabricante, definindo-se as regras a que devem obedecer o fabrico, a comercialização e a colocação em serviço daqueles dispositivos.
Tratando-se de matéria nunca antes disciplinada, aproveita-se a oportunidade para o fazer de harmonia com as normas constantes da Directiva n.° 93/42/CEE, do Conselho, de 14 de Junho de 1993, que pelo presente diploma se transpõe para o direito interno.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 201.° da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.°
Objecto
O presente diploma transpõe para o ordenamento jurídico interno a Directiva n.° 93/42/CEE, do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa aos dispositivos médicos e estabelece as regras a que devem obedecer o fabrico, a comercialização e a entrada em serviço dos dispositivos médicos e respectivos acessórios, adiante designados por dispositivos.
Artigo 2.°
Âmbito
1 - Ficam sujeitos às disposições do presente diploma, sem prejuízo do disposto no artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 72/91, de 8 de Fevereiro:a) Os dispositivos que incluam como parte integrante uma substância que, quando utilizada separadamente, seja considerada um medicamento;
b) Os dispositivos que incluam como parte integrante uma substância que, se utilizada separadamente, possa ser susceptível de ser considerada medicamento e que possa afectar o corpo humano através de uma acção acessória à do dispositivo;
2 - Aos dispositivos que incluam como parte integrante um medicamento cuja associação constitua um único produto integrado destinado a ser utilizado nessa associação e que não possa ser reutilizado é aplicável o Decreto-Lei n.° 72/91, de 8 de Fevereiro, quanto aos requisitos a observar para a segurança e eficácia do dispositivo.
3 - O presente diploma não se aplica:
a) Aos dispositivos para diagnóstico in vitro;
b) Aos dispositivos implantáveis activos abrangidos pelo Decreto-Lei n.° 44/93, de 20 de Fevereiro;
c) Aos medicamentos abrangidos pelo Decreto-Lei n.° 72/91, de 8 de Fevereiro;
d) Aos produtos cosméticos abrangidos pelo Decreto-Lei n.° 128/86, de 3 de Junho;
e) Ao sangue humano, produtos de sangue humano, plasma humano ou células sanguíneas de origem humana ou a dispositivos que no momento da colocação no mercado incorporem produtos de sangue, plasma ou células de origem humana;
f) Aos órgãos, tecidos ou células de origem humana ou a produtos que contêm tecidos ou células de origem humana ou que deles derivam;
g) Aos órgãos, tecidos ou células de origem animal, excepto se se tratarem de tecidos de origem animal tornados não viáveis ou de produtos não viáveis derivados de tecidos de origem animal, utilizados na fabricação de dispositivos;
4 - As obrigações decorrentes do presente diploma impostas aos fabricantes aplicam-se igualmente à pessoa singular ou colectiva que monta, acondiciona, executa, renova e ou rotula um ou vários produtos prefabricados e ou destinados a um dispositivo com vista à sua colocação no mercado em seu próprio nome.
5 - O disposto no número anterior não se aplica às entidades que não sendo fabricantes montem ou adaptem a um doente específico dispositivos já colocados no mercado, em conformidade com a respectiva finalidade.
6 - O presente diploma não se aplica aos equipamentos de protecção individual abrangidos pelo Decreto-Lei n.° 128/93, de 22 de Abril, tendo em conta a sua principal finalidade.
Artigo 3.°
Definições
Para efeitos do presente diploma, entende-se por:a) Dispositivo médico - qualquer instrumento, aparelho, equipamento, material ou artigo utilizado isoladamente ou combinado, incluindo os suportes lógicos necessários para o seu bom funcionamento, cujo principal efeito pretendido no corpo humano não seja alcançado por meios farmacológicos, imunológicos ou metabólicos, embora a sua função possa ser apoiada por esses meios e seja destinado pelo fabricante a ser utilizado em seres humanos para fins de diagnóstico, prevenção, controlo, tratamento ou atenuação de uma doença, de uma lesão ou de uma deficiência, estudo, substituição ou alteração da anatomia ou de um processo fisiológico e controlo da concepção;
b) Dispositivo médico activo - qualquer dispositivo médico cujo funcionamento depende de uma fonte de energia eléctrica ou outra não gerada directamente pelo corpo humano ou pela gravidade e que actua por conversão dessa energia, não sendo considerados como tal os dispositivos destinados a transmitir energia, substâncias ou outros elementos entre um dispositivo médico activo e o doente, sem qualquer modificação significativa;
c) Dispositivo médico não activo - qualquer dispositivo médico que não satisfaz o disposto na alínea anterior em conjunto com um dispositivo, do modo previsto pelo fabricante destes, por forma a permitir a sua utilização;
d) Acessório - artigo que, embora não sendo um dispositivo, seja especificamente destinado pelo respectivo fabricante a ser utilizado em conjunto com um dispositivo, do modo previsto pelo fabricante deste, por forma a permitir a sua utilização;
e) Dispositivo para diagnóstico in vitro - qualquer dispositivo médico que consista num reagente, produto reagente, conjunto, instrumento, aparelho ou sistema utilizado isoladamente ou combinado, destinado pelo fabricante a ser utilizado in vitro no exame de amostras provenientes do corpo humano, por forma a obter informações sobre estados fisiológicos ou estados de saúde, de doença ou de anomalia congénita;
f) Dispositivo feito por medida - qualquer dispositivo fabricado especificamente de acordo com a prescrição escrita de um médico da especialidade, sob a sua responsabilidade, com indicação de características de concepção específicas e que se destine a ser como tal exclusivamente utilizado num doente determinado, não sendo considerados os dispositivos fabricados de acordo com métodos de fabrico contínuo ou em série, que careçam de adaptação para satisfazerem as necessidades específicas do médico ou de qualquer outro utilizador profissional;
g) Dispositivo para investigações clínicas - qualquer dispositivo destinado a ser colocado à disposição de um médico da especialidade, com vista a ser submetido a investigações num meio clínico humano adequado;
h) Organismo notificado - organismo designado para avaliar e verificar a conformidade dos dispositivos com os requisitos exigidos no presente diploma, bem como aprovar, emitir e ou manter os certificados de conformidade;
i) Fabricante - a pessoa singular ou colectiva responsável pela concepção, fabrico, acondicionamento e rotulagem de um dispositivo médico com vista à sua colocação no mercado sob o seu próprio nome, independentemente de as referidas operações serem efectuadas por essa pessoa ou por terceiros por sua conta;
j) Finalidade - a utilização a que o dispositivo médico se destina, de acordo com as indicações fornecidas pelo fabricante no rótulo, instruções e ou publicidade;
l) Colocação no mercado - primeira colocação à disposição, gratuita ou não, de um dispositivo não destinado a investigações clínicas, com vista à sua distribuição e ou utilização no mercado, independentemente de se tratar de um dispositivo novo ou renovado;
m) Entrada em serviço - fase em que um dispositivo se encontra pronto para a primeira utilização no mercado em conformidade com a respectiva finalidade.
Artigo 4.°
Classificação
Os dispositivos são classificados em classes, tendo em conta a vulnerabilidade do corpo humano e atendendo aos potenciais riscos decorrentes da concepção técnica e do fabrico.
Artigo 5.°
Colocação no mercado
1 - Só podem ser colocados no mercado e postos em serviço os dispositivos que satisfaçam os requisitos essenciais estabelecidos na portaria prevista no artigo 14.° e que ostentem a marcação CE.2 - Ainda que não ostentem a marcação CE, os dispositivos destinados à investigação clínica podem ser colocados à disposição dos médicos ou outras pessoas autorizadas para esse efeito desde que preencham as condições estabelecidas na portaria a que se refere o artigo 14.° 3 - Os dispositivos feitos por medida podem ser colocados no mercado e entrar em serviço, desde que preencham as condições estabelecidas na portaria a que se refere o artigo 14.° 4 - No âmbito de feiras industriais, exposições e outras demonstrações, é permitida a apresentação de dispositivos, ainda que não obedeçam aos requisitos constantes do presente diploma, desde que devidamente assinalada a sua não conformidade, bem como a impossibilidade da sua colocação no mercado e em serviço, antes de se encontrarem em conformidade.
Artigo 6.°
Presunção de conformidade
1 - Presumem-se em conformidade com os requisitos essenciais estabelecidos na portaria a que se refere o artigo 14.° os dispositivos que obedeçam ao disposto nas normas nacionais adoptadas de acordo com as normas harmonizadas cujas referências tenham sido publicadas no Jornal Oficial das Comunidades Europeias.2 - Para efeitos do disposto no número anterior, entende-se que a remissão para as normas harmonizadas abrange igualmente as monografias da farmacopeia europeia, nomeadamente quanto às suturas cirúrgicas e à interacção entre medicamentos e materiais em que os mesmos se contêm cujas referências tenham sido publicadas no Jornal Oficial das Comunidades Europeias.
3 - A lista das normas nacionais que adoptem normas harmonizadas é aprovada por despacho conjunto dos Ministros da Indústria e Energia e da Saúde.
Artigo 7.°
Marcação CE
1 - Os dispositivos, com excepção dos feitos por medida e dos destinados a investigações clínicas, que estejam conformes com os requisitos essenciais referidos no artigo 5.° devem ostentar a marcação CE.2 - A marcação CE deve ser aposta pelo fabricante de modo visível, legível e indelével no dispositivo ou na sua embalagem esterilizada, se praticável e adequado, bem como nas instruções de utilização e, se necessário, na embalagem comercial.
3 - A marcação CE pode ser aposta por qualquer organismo notificado de qualquer Estado membro e deve ser acompanhada do número de identificação atribuído ao organismo responsável pela realização dos procedimentos de avaliação da conformidade.
4 - Sempre que os dispositivos sejam objecto de outras regulamentações relativas a outros aspectos que também prevejam a aposição da marcação CE, esta indicará que os dispositivos correspondem igualmente às disposições dessas outras regulamentações.
5 - Se uma ou mais das regulamentações previstas no número anterior permitirem que o fabricante, durante um período transitório, escolha as medidas que tenciona aplicar, a marcação CE deve indicar que os dispositivos correspondem unicamente às disposições das regulamentações aplicadas pelo fabricante, caso em que as referências das regulamentações aplicadas, tal como publicadas no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, devem ser indicadas nos documentos, manuais ou instruções exigidos pelas regulamentações que acompanham esses dispositivos.
6 - É proibida a aposição de marcas ou inscrições susceptíveis de confusão com a marcação CE, sem prejuízo de poder ser aposta qualquer outra marca no dispositivo, na embalagem ou no folheto de instruções que acompanha o dispositivo, desde que essa aposição não tenha por efeito reduzir a visibilidade ou a legibilidade da marcação CE.
7 - Sem prejuízo do disposto no artigo 9.°, quando se verificar que a marcação CE foi indevidamente aposta, o fabricante deve fazer cessar de imediato a infracção.
8 - Se a não conformidade persistir, a autoridade competente tomará as medidas adequadas para restringir ou proibir a colocação no mercado ou a assegurar a sua retirada do mercado nos termos do artigo 9.° 9 - A autoridade competente notificará, no prazo de 15 dias, o fabricante ou o seu representante legal das irregularidades detectadas.
Artigo 8.°
Procedimentos de avaliação da conformidade
Tendo em vista a aposição da marcação CE, o fabricante dos dispositivos, com excepção dos destinados à investigação clínica e dos feitos por medida, deve optar por um dos procedimentos de avaliação da conformidade estabelecidos na portaria a que se refere o artigo 14.°
Artigo 9.°
Cláusula de salvaguarda
1 - Sempre que se verifique que os dispositivos referidos nos números 1 e 3 do artigo 5.°, ainda que correctamente colocados no mercado e utilizados de acordo com o fim a que se destinam, possam comprometer a saúde e a segurança do doente ou de terceiros, o presidente do conselho de administração do Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (INFARMED) poderá determinar a sua retirada do mercado e de serviço, informando imediatamente a Comissão Europeia, decisão que deve ser dada a conhecer ao fabricante.2 - Para efeitos do disposto no número anterior, entende-se que comprometem a saúde e a segurança do doente ou de terceiros os dispositivos que, nomeadamente:
a) Não observarem os requisitos essenciais referidos no artigo 5.°;
b) Não estiverem em conformidade com as normas e monografias referidas nos números 1 e 2 do artigo 6.°, quando aplicadas pelo fabricante;
3 - Da decisão de retirada do mercado cabe recurso para o Ministro da Saúde, nos termos da lei.
Artigo 10.°
Contra-ordenações
1 - Constituem contra-ordenações:a) A colocação no mercado de dispositivos que comprometam a segurança ou a saúde dos doentes, dos utilizadores e de terceiros, mesmo que esses dispositivos sejam correctamente utilizados e mantidos de acordo com a sua finalidade, punida com coima de 300 000$ a 3 000 000$;
b) A colocação no mercado de dispositivos que não tenham aposta a marcação CE, punida com coima de 150 000$ a 1 500 000$;
c) A utilização indevida da marcação CE, punida com coima de 100 000$ a 1000000$;
d) A quebra de confidencialidade em relação às informações de natureza técnica dos processos de certificação, punida com coima de 150 000$ a 1500000$;
e) A ausência de instruções de utilização redigidas em português, quando for caso disso, punida com coima de 100 000$ a 1 000 000$;
2 - Sendo o infractor pessoa singular, os montantes mínimos e máximos das coimas, previstas nos números anteriores são reduzidos, respectivamente a 50000$ e a 750 000$.
3 - A negligência é punível.
Artigo 11.°
Aplicação e destino das coimas
1 - A instrução dos processos contra-ordenacionais, bem como a aplicação das coimas, é da competência do inspector-geral das actividades económicas.2 - O produto das coimas reverte:
a) Em 60% para o Estado;
b) Em 20% para a Inspecção-Geral das Actividades Económicas;
c) Em 20% para o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) ou para o INFARMED, consoante a contra-ordenação diga respeito a dispositivos médicos activos ou não activos.
Fiscalização
Sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades, o INFARMED, relativamente aos dispositivos médicos não activos, e o INSA, relativamente aos dispositivos médicos activos, procedem à fiscalização do cumprimento do disposto no presente diploma.
Artigo 13.°
Sistemas de vigilância dos dispositivos médicos
1 - Os fabricantes, os responsáveis pela colocação no mercado e pela entrada em serviço dos dispositivos, os médicos e outros técnicos devem comunicar ao INFARMED todas as informações relativas a incidentes ocorridos após a respectiva colocação no mercado dos dispositivos abrangidos pelo presente diploma, nomeadamente:
a) Qualquer defeito, avaria ou deterioração das características e ou funcionamento, bem como qualquer imprecisão na rotulagem ou nas instruções de um dispositivo, que sejam susceptíveis de causar ou ter causado a morte ou uma deterioração grave do estado de saúde de um doente ou utilizador;
b) Qualquer motivo de ordem técnica relacionado com as características ou o funcionamento de um dispositivo pelas razões referidas na alínea anterior que tenham ocasionado a retirada sistemática do mercado dos dispositivos do mesmo tipo por parte do fabricante;
2 - O sistema de vigilância dos dispositivos médicos será objecto de portaria conjunta dos Ministros da Indústria e Energia e da Saúde.
Artigo 14.°
Normas técnicas
As normas técnicas de execução do presente diploma são aprovadas por portaria conjunta dos Ministros da Indústria e Energia e da Saúde.
Artigo 15.°
Confidencialidade
As informações transmitidas a todos os intervenientes na execução do presente diploma são confidenciais, ficando os funcionários que delas tenham conhecimento sujeitos a dever de sigilo, sem prejuízo da divulgação das informações necessárias à salvaguarda da saúde pública.
Artigo 16.°
Entrada em vigor
1 - O presente diploma entra em vigor 30 dias após a data da sua publicação, sem prejuízo dos números seguintes.2 - Os dispositivos provenientes de qualquer Estado membro da Comunidade Europeia que se conformem com as regras relativas ao fabrico, à comercialização e à entrada em serviço do respectivo país de origem, à data de 31 de Dezembro de 1994, podem ser comercializados e utilizados até 29 de Junho de 1998.
3 - O disposto no número anterior é aplicável aos dispositivos provenientes de países terceiros que observem as regulamentações sobre fabrico, comercialização e entrada em serviço em vigor em qualquer dos Estados membros da União Europeia, à data de 31 de Dezembro de 1994.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 24 de Agosto de 1995. - Aníbal António Cavaco Silva - Luís Fernando Mira Amaral - Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Promulgado em 3 de Outubro de 1995.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 6 de Outubro de 1995.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva