Decreto-Lei 115/93
de 12 de Abril
Pela Directiva n.º
89/398/CEE
, aprovada pelo Conselho das Comunidades Europeias em 3 de Maio de 1989, foram estabelecidas as regras respeitantes aos géneros alimentícios destinados a uma alimentação especial.
Esta directiva foi transportada para o direito interno pelo Decreto-Lei 227/91, de 19 de Junho, que, dando cumprimento ao que se dispõe no n.º 1 do artigo 4.º da mesma directiva, determina que a lei especial estabelecerá as disposições específicas aplicáveis a determinados grupos de géneros alimentícios, nomeadamente os preparados para lactentes, os leites de transição e outros alimentos de complemento.
Por outro lado, a Directiva n.º 91/321/CEE da Comissão, aprovada em 14 de Maio de 1991 e publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, n.º L175, de 4 de Julho de 1991 (NUMDOC391L321), veio estabelecer as normas de composição, de rotulagem e de publicidade relativas às fórmulas para lactentes e às fórmulas de transição destinadas a lactentes saudáveis na Comunidade.
Nesta directiva, que agora se transpõe para o direito interno, prevê-se, igualmente, que os Estados membros dêem execução aos princípios e objectivos do Código Internacional de Comercialização dos Substitutos do Leite Materno, adoptado pela 34.ª Assembleia Mundial de Saúde, relativos à comercialização, informação e responsabilidade das autoridades sanitárias.
O regime jurídico previsto no presente diploma será complementado, conforme se prevê no seu articulado, já que se aguarda que a nível comunitário venham a ser definidos outros aspectos, entre os quais a lista das substâncias que podem ser adicionadas às fórmulas para lactentes e às fórmulas de transição, bem como os critérios microbiológicos e o nível máximo das substâncias cuja quantidade seja susceptível de prejudicar a saúde dos lactentes.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objectivo e âmbito
O presente diploma estabelece o regime jurídico aplicável às fórmulas para lactentes e às fórmulas de transição destinadas a lactentes saudáveis na Comunidade.
Artigo 2.º
Definições e designações
1 - Para efeitos do presente diploma, entende-se por:
a) «Lactentes» - crianças com idade inferior a 12 meses;
b) «Crianças de tenra idade» - crianças com idade compreendida entre 1 e 3 anos;
c) «Fórmulas para lactentes» - géneros alimentícios com indicações nutricionais específicas, destinados a lactentes durante os primeiros 4 a 6 meses de vida e que satisfaçam as necessidades nutricionais deste grupo etário;
d) «Fórmulas de transição» - géneros alimentícios com indicações nutricionais específicas, destinados a lactentes com idade superior a 4 meses, que constituam o componente líquido principal de uma dieta progressivamente diversificada deste grupo etário.
2 - Apenas as fórmulas para lactentes podem ser comercializadas ou descritas como adequadas à satisfação integral das necessidades nutricionais de lactentes saudáveis durante os primeiros 4 a 6 meses de vida.
Artigo 3.º
Entidades competentes
1 - No âmbito do presente diploma, compete à Direcção-Geral de Saúde:
a) Recolher as informações e os documentos previstos no artigo 11.º e exigir, se necessário, esclarecimentos suplementares aos fabricantes ou importadores;
b) Suspender ou limitar provisoriamente a comercialização dos produtos, nos termos do artigo 12.º;
c) Comunicar às instâncias comunitárias e aos restantes Estados membros das Comunidades as decisões tomadas ao abrigo do artigo 12.º;
d) Fiscalizar e controlar o cumprimento das disposições do presente diploma;
e) Aplicar as medidas de ordem sanitária que as actividades de fiscalização revelem necessárias.
2 - No cumprimento das funções de fiscalização e controlo referidas na alínea d) do número anterior, a Direcção-Geral de Saúde é coadjuvada:
a) Pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge e pelo Instituto de Qualidade Alimentar, para efeitos de apoio laboratorial;
b) Pela Inspecção-Geral das Actividades Económicas, para efeitos do disposto no artigo 14.º
Artigo 4.º
Composição
1 - A composição de base, as substâncias nutritivas e os critérios de composição das fórmulas para lactentes e das fórmulas de transição são aprovados por portaria do Ministro da Saúde.
2 - As fórmulas para lactentes e as fórmulas de transição devem ser fabricadas a partir das fontes proteicas definidas na portaria a que se refere o número anterior.
3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, as fórmulas para lactentes e as fórmulas de transição podem ser fabricadas a partir de outros ingredientes alimentares cuja adequação a utilizações dietéticas de lactentes, respectivamente a partir da idade do nascimento e de idade superior a 4 meses, tenha sido comprovada através de dados científicos geralmente aceites.
4 - Na composição destas fórmulas devem ser observadas as proibições e restrições à utilização dos ingredientes alimentares constantes da portaria a que se alude o n.º 1 deste artigo.
5 - As fórmulas para lactentes e as fórmulas de transição devem satisfazer os critérios de composição especificados naquela portaria.
6 - Para que as fórmulas para lactentes e as fórmulas de transição fiquem prontas a ser utilizadas, apenas deve ser eventualmente necessário a adição de água.
7 - No fabrico destas fórmulas apenas podem ser utilizadas as substâncias constantes da portaria a aprovar nos termos do n.º 1, por forma a satisfazer os requisitos relativos a substâncias minerais, vitaminas, aminoácidos e outros compostos nitrogenados e substâncias para fins nutricionais específicos.
8 - As fórmulas para lactentes e as fórmulas de transição não podem conter nenhuma substância em quantidades susceptíveis de prejudicarem a saúde dos lactentes.
Artigo 5.º
Denominação
1 - A denominação sob a qual os produtos abrangidos pelas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 2.º podem ser vendidos é, respectivamente, «Fórmula para lactentes» e «Fórmula de transição».
2 - A denominação dos produtos integralmente fabricados a partir das proteínas do leite de vaca deve ser, respectivamente, «Leite para lactentes» e «Leite de transição».
Artigo 6.º
Rotulagem
1 - A rotulagem dos produtos abrangidos pelo presente diploma rege-se pela legislação geral em vigor nesta matéria e pelas normas especiais estabelecidas nos números seguintes.
2 - A rotulagem destes produtos deve, obrigatoriamente, mencionar:
a) Nas fórmulas para lactentes, que o produto se adequa à utilização nutricional específica de lactentes a partir do nascimento, quando não são amamentados;
b) Nas fórmulas para lactentes não enriquecidas em ferro, que, caso o produto seja ministrado a lactentes de idade superior a 4 meses, as suas necessidades totais em ferro devem ser satisfeitas através de fontes adicionais;
c) Nas fórmulas de transição, que o produto apenas se destina à nutrição de lactentes de idade superior a 4 meses, que deve constituir apenas um dos componentes de uma dieta diversificada e que não deve ser utilizado como substituto do leite materno durante os primeiros 4 meses de vida.
3 - Nas fórmulas para lactentes e nas fórmulas de transição, a rotulagem deve ainda, obrigatoriamente, mencionar:
a) O valor energético expresso em quilojoules (kj) e quilocalorias (kcal) e o teor em proteínas, lípidos e hidratos de carbono por 100 ml do produto pronto a ser utilizado;
b) A qualidade média de cada uma das substâncias minerais e vitaminas constantes da portaria a que se alude no n.º 1 do artigo 4.º e, se for caso disso, de colina, inositol e carnitina por 100 ml do produto pronto a ser utilizado;
c) Instruções para a preparação adequada do produto e uma advertência para os riscos de saúde decorrentes de uma preparação inadequada.
4 - Os rótulos das fórmulas para lactentes e das fórmulas de transição devem ser concebidos de forma a conter as informações necessárias à utilização adequada dos produtos e que não desincentivem o aleitamento materno, sendo proibida a utilização dos termos «humanizados» e «maternizados» e de outros análogos, e podendo o termo «adaptado» apenas ser utilizado se for conforme ao n.º 7 e à portaria a que refere o artigo 4.º
5 - A rotulagem das fórmulas para lactentes deve, além do disposto no número anterior, conter as seguintes menções obrigatórias, precedidas pela expressão «Informação importante» ou por qualquer outra equivalente:
a) A afirmação da superioridade do aleitamento materno;
b) A recomendação de que o produto apenas seja utilizado mediante parecer de pessoas independentes qualificadas nos domínios da medicina, da nutrição ou da farmácia ou de outros profissionais responsáveis pelos cuidados maternos e infantis.
6 - Os rótulos das fórmulas para lactentes não devem incluir imagens de lactentes nem outras imagens ou textos susceptíveis de criarem uma impressão falsamente positiva da utilização do produto, podendo conter representações gráficas que permitam a identificação fácil do produto e ilustrem o modo de preparação.
7 - Os rótulos apenas podem conter menções à composição especial de uma dada fórmula para lactentes nos casos referidos na portaria a aprovar nos termos do n.º 1 do artigo 4.º e caso se encontrem em conformidade com as condições nele estabelecidas.
Artigo 7.º
Embalagem e apresentação
1 - Os produtos abrangidos pelo presente diploma só podem ser comercializados sob a forma de pré-embalados, de modo que as embalagens os envolvam inteiramente.
2 - Os requisitos, proibições e restrições constantes dos n.os 4, 5, 6 e 7 do artigo anterior são aplicáveis à apresentação dos respectivos produtos, nomeadamente à sua forma, aspecto ou modo de embalagem, aos materiais de embalagem utilizados, ao modo como estão dispostos e ao contexto em que são expostos.
Artigo 8.º
Publicidade
1 - A publicidade das fórmulas para lactentes deve restringir-se a publicações especializadas em cuidados de saúde infantis e publicações científicas.
2 - À publicidade referida no número anterior são aplicáveis os requisitos, proibições e restrições constantes dos n.os 4, 5, 6 e 7 do artigo 6.º
3 - Esta publicidade deve apenas conter informações de carácter científico e factual, não devendo pressupor nem fazer crer que a alimentação por biberão seja equivalente ou superior ao aleitamento materno.
4 - Nos locais de venda directa ou indirecta não pode haver publicidade, oferta de amostras nem qualquer outra prática de promoção de venda directa ao consumidor de fórmulas para lactentes no retalhista, como expositores especiais, cupões de desconto, bónus, campanhas de vendas especiais, vendas a baixo preço ou vendas conjuntas.
5 - Os fabricantes e distribuidores de fórmulas para lactentes não podem fornecer ao público em geral, nem às grávidas, mães ou membros das respectivas famílias, produtos grátis ou a preço reduzido, amostras ou quaisquer outros brindes de promoção, quer directa, quer indirectamente, através do sistema de cuidados de saúde ou dos profissionais de saúde.
6 - Em tudo o que não esteja expressamente previsto neste artigo é aplicável o disposto no Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei 330/90, de 23 de Outubro.
Artigo 9.º
Material informativo e pedagógico
1 - Todo o material informativo e pedagógico, quer escrito, quer áudio-visual, relativo à alimentação dos lactentes e destinado a ser divulgado entre mulheres grávidas e mães de lactentes e de crianças de tenra idade deve conter informações claras sobre todos os pontos que a seguir se referem:
a) Vantagens e superioridade do aleitamento natural;
b) Alimentação materna e a preparação para o aleitamento natural e sua manutenção;
c) O eventual efeito negativo da introdução do aleitamento parcial a biberão sobre o aleitamento natural;
d) A dificuldade de reconsiderar a decisão de não aleitar naturalmente;
e) A utilização correcta de fórmulas para lactentes, caso seja necessário, sejam elas de fabrico industrial ou confeccionadas em casa.
2 - Sempre que o material referido no número anterior contenha informações relativas à utilização de fórmulas para lactentes, deve incluir igualmente as implicações sociais e financeiras da sua utilização, os riscos para a saúde decorrentes de alimentos ou de métodos de alimentação inadequados, bem como os riscos da utilização incorrecta de fórmulas para lactentes.
3 - Não é permitido neste material o recurso a quaisquer imagens que possam idealizar a utilização das fórmulas para lactentes.
Artigo 10.º
Donativos
1 - Os donativos de equipamentos ou de materiais informativos ou pedagógicos por parte de fabricantes ou distribuidores só podem ser feitos a pedido e mediante a autorização da Direcção-Geral de Saúde.
2 - Os equipamentos ou materiais referidos no número anterior, a distribuir apenas através dos estabelecimentos e serviços da saúde, podem mencionar o nome ou a sigla da firma doadora, ficando-lhe vedada, no entanto, a possibilidade de fazer referência a uma marca registada de fórmulas para lactentes.
3 - Os donativos ou a venda a preço reduzido de fornecimentos de fórmulas para lactentes a instituições ou organizações, sejam elas para uso das próprias instituições ou para distribuição externa, só podem ser feitas a pedido e mediante a autorização da Direcção-Geral dos Cuidados de Saúde Primários, a quem compete assegurar que as mesmas apenas sejam utilizadas por lactentes que devam ser alimentados por este tipo de produto e somente durante o tempo necessário.
Artigo 11.º
Comercialização
1 - A comercialização das fórmulas para lactentes e das fórmulas de transição depende do envio prévio pelo respectivo produtor ou importador à Direcção-Geral de Saúde dos elementos constantes do n.º 2 do presente artigo.
2 - O pedido de comercialização, dirigido à Direcção-Geral de Saúde, deve ser formulado em requerimento e será instruído com os seguintes elementos:
a) Memória descritiva do produto;
b) Documento proveniente de laboratório oficial referindo a composição e as características higiénicas do produto;
c) Projecto de rótulo e de modelo de embalagem;
d) Projecto da documentação destinada à divulgação e à publicidade do produto.
3 - No caso de se tratar de um produto importado de país comunitário, ficam dispensados os elementos referidos nas alíneas a) e b) do número anterior, devendo, no entanto, ser apresentado documento comprovativo da sua comercialização.
4 - Sempre que o entender necessário, a Direcção-Geral dos Cuidados de Saúde Primários pode exigir ao fabricante ou importador a apresentação de documentação complementar ou de trabalhos científicos que comprovem a conformidade do produto com as regras constantes deste diploma.
5 - O pedido de comercialização deverá ser apreciado no prazo máximo de 90 dias, devendo o interessado ser notificado do respectivo despacho, com indicação dos fundamentos em caso de indeferimento.
6 - Nas situações referidas no n.º 3, o prazo fixado no número anterior é de 60 dias.
7 - Esgotados os prazos referidos nos números anteriores, presume-se deferido o requerimento em que é formulado o pedido de comercialização.
8 - Das decisões proferidas ao abrigo deste artigo cabe recurso para o Ministro da Saúde, nos termos da legislação em vigor.
Artigo 12.º
Restrições
A Direcção-Geral de Saúde pode suspender ou limitar provisoriamente o comércio dos produtos abrangidos por este diploma, ainda que circulem livremente em qualquer outro Estado membro das Comunidades Europeias, desde que verifique, fundamentadamente, que não obedecem aos critérios de composição e de qualidade definidos no artigo 4.º ou que põem em perigo a saúde humana.
Artigo 13.º
Contra-ordenações
1 - Constitui contra-ordenação, punível com coima mínima de 10000$00 e máxima de 500000$00 ou 1500000$00, consoante se trate de pessoa singular ou colectiva:
a) A comercialização de produtos sem a autorização a que se refere o artigo 11.º;
b) A comercialização das fórmulas para lactentes e das fórmulas de transição com violação do disposto no artigo 4.º;
c) A falta de menção na rotulagem do produto das indicações estabelecidas no artigo 6.º;
d) A utilização na rotulagem de imagem ou textos susceptíveis de criarem uma impressão falsamente positiva da utilização do produto, bem como dos termos «humanizado», «maternizado» ou outros análogos;
e) A embalagem, a apresentação e a publicidade dos produtos efectuada em contravenção com o disposto nos artigos 7.º e 8.º;
f) A divulgação de material informativo e pedagógico com violação do disposto no artigo 9.º;
g) A doação de equipamentos ou materiais informativos ou pedagógicos em contravenção com o disposto no artigo 10.º
2 - Em todas as infracções previstas nos números anteriores será sempre punível a negligência.
Artigo 14.º
Tramitação processual
1 - O processamento das contra-ordenações previstas no artigo anterior compete à Direcção-Geral de Saúde, através dos seus serviços ou dos das administrações regionais de saúde, conforme os casos, ou à Inspecção-Geral das Actividades Económicas.
2 - Tem competência para aplicação das coimas previstas neste diploma a entidade que tenha efectuado o processamento das contra-ordenações.
3 - O produto da aplicação das coimas reverte a favor das seguintes entidades:
a) 20% para a entidade que levanta o auto;
b) 20% para a entidade que aplica a coima;
c) 60% para o Estado.
Artigo 15.º
Regulamentação especial
Por portaria conjunta dos Ministros da Saúde, da Agricultura, do Comércio e Turismo e do Ambiente e Recursos Naturais, e de acordo com os actos de direito comunitário que venham a ser adoptados nesta matéria, serão estabelecidos os critérios de pureza das substâncias referidas no n.º 7 do artigo 4.º, a lista das substâncias que podem ser adicionadas às fórmulas para lactentes e às fórmulas de transição, bem como os critérios microbiológicos e o nível máximo das substâncias cuja quantidade seja susceptível de prejudicar a saúde dos lactentes.
Artigo 16.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no 1.º dia do mês seguinte ao da sua publicação, sem prejuízo da possibilidade de continuarem a ser comercializados até 31 de Maio de 1994 os produtos não conformes com o que nele é estabelecido.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 11 de Fevereiro de 1993. - Aníbal António Cavaco Silva - Arlindo Marques da Cunha - Arlindo Gomes de Carvalho - Fernando Manuel Barbosa Faria de Oliveira - Carlos Alberto Diogo Soares Borrego.
Promulgado em 24 de Março de 1993.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 25 de Março de 1993.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.