Despacho 21 130/2007
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, entidade requerida no processo cautelar de suspensão de eficácia interposto pela SIDES - Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior, S. A., que corre os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, sob o n.º 2305/07.0BELSB, vem, pelo presente despacho, e nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 128.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, reconhecer que o diferimento da execução do acto objecto da referida providência, inserido no processo de encerramento compulsivo do estabelecimento de ensino superior Universidade Independente, de que é entidade instituidora a SIDES - Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior, S. A., seria gravemente prejudicial para o interesse público.
Assim, entende este Ministério que o despacho de encerramento compulsivo, proferido a 2 de Agosto de 2007, na sequência de um processo instruído para o efeito pela Inspecção-Geral, nos termos do disposto no artigo 47.º do Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo (aprovado pelo Decreto-Lei 16/94, de 22 de Janeiro, alterado pela Lei 37/94, de 11 de Novembro, pelo Decreto-Lei 94/94, de 23 de Março, e pelo Decreto-Lei 74/2006, de 24 de Março), doravante designado Estatuto, se deve manter pleno de eficácia, não vindo a interposição daquela providência a afectar a execução do referido despacho e dos seus actos consequentes, com todas as suas legais implicações.
Com efeito:
1 - Na providência cautelar em apreço foi pedida "a suspensão da eficácia do despacho de encerramento compulsivo proferido pelo Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em 2 de Agosto de 2007, com as legais consequências".
2 - O despacho aqui em causa, que se dá por integralmente reproduzido, para os devidos efeitos legais, foi notificado à direcção da SIDES, S. A., em 3 de Agosto de 2007, em obediência ao disposto no citado artigo 47.º do EESPC e disposições aplicáveis do Código do Procedimento Administrativo.
3 - O mesmo despacho, na sua parte decisória e que aqui importa salientar, confirmou o projecto de decisão de encerramento ínsito no despacho anterior, de 9 de Abril de 2007, e atento o disposto nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 47.º do EESPC, ouvidas a SIDES - Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior, S. A., e a Universidade Independente, em sede de audiência prévia, determinou o encerramento compulsivo do estabelecimento de ensino superior Universidade Independente de que é instituidora a mencionada SIDES, S. A., por se comprovar, de forma inequívoca, através de processo instruído para o efeito pela Inspecção-Geral do Ministério, que se considera integralmente reproduzido, que o funcionamento daquela Universidade decorreu e continua a decorrer, à data da sua prolação, em condições de manifesta degradação pedagógica, com desrespeito pelos normativos que são garantia do ensino e da necessária credibilidade pública dos seus cursos.
4 - Atento o disposto no supracitado artigo 47.º, n.º 1, do Estatuto, quando o funcionamento de um estabelecimento de ensino ocorrer em condições de manifesta degradação pedagógica, inequivocamente comprovada em processo instruído para o efeito pelo serviço competente do Ministério da Educação, pode proceder-se ao seu encerramento compulsivo mediante despacho fundamentado do Ministério da Educação.
5 - De facto, resultou inequivocamente provado no mencionado processo da Inspecção-Geral do Ministério, composto por 16 volumes, instruído com prova documental e testemunhal, no âmbito do qual foram ainda ouvidas a SIDES, S. A., e a Universidade Independente, embora só aquela se tenha pronunciado e requerido a produção de prova complementar, e sintetizado nas conclusões do seu relatório final, de 22 de Julho de 2007, que:
"A SIDES, S. A., entidade instituidora da Universidade Independente (UNI), atravessa uma situação calamitosa que se estende à UNI, provocando grande perturbação académica e indignação geral. De facto, continua por esclarecer a titularidade das acções, pendente de decisão judicial, o que tem levado a constantes alterações na sua direcção. Por força destes acontecimentos, a direcção da SIDES, S. A., presidida por Rui Verde, foi destituída em 26 de Fevereiro de 2007, por deliberação da assembleia geral, tendo, a 20 de Março, retomado o poder por decisão judicial, continuando, porém, em simultâneo, nas instalações da UNI, os membros da direcção nomeada em 26 de Fevereiro. Na sequência da prisão preventiva de Rui Verde, a direcção passou a ser assegurada apenas por dois elementos. Em 4 de Abril, foi apresentada uma nova direcção, que, por sua vez, renunciou às suas funções, em 26 do mesmo mês, alegando, dois dos seus membros, falta de condições estruturais e objectivos. O registo desta renúncia foi feito, em 31 de Maio de 2007, na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, sendo que, desde esta data, a SIDES, S. A., não tem direcção registada, nem comunicou à tutela a existência de uma outra direcção, desconhecendo-se, pois, quem assume os destinos daquela sociedade anónima proprietária da UNI. Estas alterações sucessivas, cujo desfecho se não pode, pois, antever, vêm provocando sucessivas situações de completo vazio de poder e consequente ausência de coordenação dos diversos sectores que asseguram o funcionamento da Universidade Independente.
Os conflitos na SIDES, S. A., têm afectado, contínua e persistentemente, o funcionamento da UNI, atingindo-a em sectores chave da sua organização pedagógica, minando, na opinião pública, a credibilidade dos seus cursos e motivando grande apreensão por parte de muitos estudantes que reclamaram a possibilidade de transferência para outros estabelecimentos de ensino superior, conforme indiciava o elevado número de pedido de certificados de habilitações e de programas de disciplinas. Com a publicação da Portaria 401/2007, de 5 de Abril, que veio assegurar aos alunos a possibilidade da sua transferência para outro estabelecimento de ensino, 249 alunos oriundos da UNI efectivaram matrícula noutras instituições de ensino superior, maioritariamente privadas. Para além destes, muitos outros deixaram de estudar este ano lectivo, aguardando que as instituições de ensino superior públicas elaborem os regulamentos necessários à sua aceitação no próximo ano lectivo. A conjugação destas duas realidades provocou uma redução drástica da frequência da UNI, principalmente nos primeiros anos curriculares dos vários cursos.
As contínuas alterações na direcção da SIDES, S. A., que têm levado à tomada de sucessivas decisões contraditórias sobre a titularidade dos órgãos académicos, têm provocado a indefinição na sua constituição, e a sua paralisação ou irregularidade do funcionamento. Não se encontra, assim, assegurada a imprescindível autonomia do estabelecimento em relação à entidade instituidora, como se exige no n.º 2 do artigo 19.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo e na alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do Regime Jurídico do Desenvolvimento e Qualidade do Ensino Superior, aprovado pela Lei 1/2003, de 6 de Janeiro. De facto:
a) Depois da constituição como arguido e de decretada, judicialmente, a proibição de entrada nas instalações da UNI ao reitor, Luís Arouca, este renunciou ao seu cargo, tendo sido substituído pelo Prof. Doutor Jorge Roberto. Este docente, que só registou, provisoriamente, o seu doutoramento em 18 de Abril de 2007, foi nomeado, em 30 de Março de 2007, por uma direcção ainda não registada na Conservatória do Registo Comercial e contra a vontade expressa do conselho científico, que rejeitara o seu nome, e da direcção ainda em funções que, publicamente, rejeitou tal nomeação; contrariando os Estatutos da UNI, o conselho pedagógico não foi ouvido e desconhece-se o parecer do conselho geral e quais os membros do corpo docente que foram ouvidos;
b) Apesar de apontado pelo reitor da UNI e pela direcção da SIDES, S. A., como vice-reitor da UNI, o Prof. Doutor Carvalho Rodrigues não desempenha qualquer cargo na UNI;
c) O Prof. Doutor Raul Cunha, igualmente nomeado vice-reitor, também só registou, provisoriamente, o seu doutoramento em 18 de Abril de 2007, sendo mais um recém doutorado que, por isso, poderá não assegurar a necessária credibilidade académica à UNI;
d) O reitor, demonstrando uma inaceitável incompreensão da dimensão institucional do seu cargo, tem adoptado uma posição subalterna face à direcção da SIDES, S. A., sendo disso exemplos claros o facto de, apesar de notificado da decisão de encerramento compulsivo da UNI, na sua qualidade de responsável estatutário pela gestão pedagógica da UNI, o reitor não ter respondido, bem como o facto de não ter estado presente na conferência da imprensa de 18 de Abril, momento de representação pública da Universidade;
e) A estabilidade institucional dos órgãos académicos anunciada pela SIDES, S. A., continua ausente da UNI, sendo disso exemplos as sucessivas mudanças operadas nas equipas reitorais ao longo dos últimos meses, desde Fevereiro de 2007, e o facto de a actual equipa não contar com a totalidade dos seus membros;
f) O conselho científico só regularizou a sua constituição de acordo com as exigências do artigo 8.º da Lei 1/2003, de 6 de Janeiro, em 20 de Abril de 2007, isto é, já no decurso do presente processo. Porém, nas reuniões de 29 de Março e de 20 de Abril de 2007, reuniu e deliberou com falta de quórum, em violação dos princípios reflectidos no artigo 22.º do Código do Procedimento Administrativo, conjugado com o artigo 133.º do mesmo Código, e pacificamente aceites quanto aos órgãos colegiais, com a consequente nulidade das suas deliberações, designadamente as relativas à aprovação do corpo docente e dos programas das unidades curriculares;
g) O conselho directivo não funciona, sendo que o seu presidente, Prof. Doutor Álvaro Dias, apresentou a sua renúncia ao cargo em 9 de Maio de 2007, não se conhecendo o seu substituto. A constituição deste órgão também enferma de indefinição, pois existem dois despachos da direcção da SIDES, S. A., com a mesma data, mas designando membros diferentes;
h) Apesar da confirmação, pelo actual reitor, nos seus cargos, de todos os directores de faculdade nomeados pelo reitor Luís Arouca, em 26 de Fevereiro, as Faculdades de Direito e de Ciências da Engenharia e Tecnologia encontram-se sem director mercê da renúncia do Prof. Doutor Álvaro Dias e do desmentido do Professor Carvalho Rodrigues em relação ao desempenho de cargos na UNI. Na Faculdade de Arquitectura, depois da saída do director nomeado por Luís Arouca, a directora indicada pela SIDES, S. A., desconhecia que desempenhava tal função;
i) Quanto às coordenações de curso, refira-se que o curso de Direito, em virtude da renúncia do Prof. Doutor Álvaro Dias, não tem coordenador e que alguns coordenadores de curso nomeados em 26 de Fevereiro já não desempenham essas funções, tendo-se verificado já quatro substituições, três das quais de doutores por mestres.
O corpo docente da UNI tem vindo a sofrer constantes alterações e não oferece garantias de estabilidade, o que constituiu um dos maiores factores de perturbação da vida da UNI, provocando grande perplexidade e revolta nos estudantes, registando-se, também, uma generalizada e persistente situação de salários em atraso. Aquele corpo docente não assegura, também, na maioria dos cursos de licenciatura, as qualificações académicas legalmente exigidas, bem como o exercício do regime de funções em tempo integral, no 2.º semestre do ano lectivo 2006-2007. De facto:
a) Vários professores doutorados, tais como o Prof. Doutor Horácio Saraiva, Prof. Doutor António Rebelo, Prof. Doutor Eduardo dos Santos e Prof.ª Doutora Anabela Sérgio, já abandonaram a UNI; outros, como o Prof. Doutor Rui Verde encontra-se preso preventivamente e o Prof. Doutor Luís Arouca está impedido judicialmente de entrar nas instalações da UNI, muito embora a UNI continue a considerá-los como fazendo parte do corpo docente da Universidade em regime de tempo integral;
b) Nos processos individuais dos docentes Miguel Varela, Orlindo Manuel Gouveia Pereira e José Pinto dos Santos não constam os seus certificados de doutoramento, não sendo possível, assim, aferir das suas habilitações;
c) O registo provisório do doutoramento do docente Juan Manuel Uruburu Colsa já caducou, embora continue a constar da lista de docentes em tempo integral, sendo que a UNI, conforme obriga o artigo 6.º do Decreto-Lei 216/97, de 18 de Agosto, só poderia incluir no seu corpo docente como estando habilitados com o grau de doutor os docentes que apresentem os respectivos diplomas devidamente registados;
d) No 2.º semestre do ano lectivo 2006-2007, o corpo docente dos cursos de Economia, Gestão, Psicologia, Engenharia do Ambiente, Engenharia Civil, Engenharia Industrial, Engenharia Informática e Arquitectura não reúne as condições previstas nos artigos 14.º e 28.º do EESPC quanto ao número exigido de docentes doutorados;
e) No 2.º semestre do ano lectivo 2006-2007, os cursos de Gestão e Administração Regional e Autárquica (GARA), Ciências da Comunicação, Economia, Gestão, Psicologia, Engenharia do Ambiente, Engenharia Civil e Arquitectura não apresentam o número necessário de docentes doutorados em tempo integral, nos termos do n.º 2 do artigo 14.º do EESPC.
As actividades lectivas decorreram com irregularidade nos meses de Março e Abril, sendo que no mês de Abril foram, em média, leccionadas apenas 50% das aulas previstas, verificando-se ausências prolongadas ou abandonos definitivos de vários docentes, o que compromete seriamente o processo de ensino e aprendizagem.
O acesso e ingresso de estudantes na UNI revela a existência de frequentes actos de negligência e falta de rigor na aceitação e apreciação de candidaturas.
O processo de concessão de equivalências na UNI foi, sempre, realizado sem a intervenção do conselho científico, em contradição com a alínea f) do n.º 2 do artigo 7.º dos Estatutos da UNI. Apenas na reunião do conselho científico de 20 de Abril, pela primeira vez, este órgão se pronunciou sobre a concessão de equivalências.
Foram atribuídas equivalências ilegais a cinco alunos do curso de Administração Regional e Autárquica, que ingressaram na UNI no ano lectivo 2004-2005, em clara violação do Decreto-Lei 316/83, de 2 de Julho, e das recomendações efectuadas anteriormente no âmbito do processo de inquérito UI.01/06-16-A/2003, levado a cabo por esta Inspecção-Geral.
A anterior falta de uma autoridade académica que assinasse os certificados de habilitações dos estudantes só veio a ser sanada pela actual equipa reitoral.
Na sequência dos acontecimentos do 2.º semestre do ano lectivo 2006-2007, mais de duas centenas e meia de estudantes abandonaram a UNI, matriculando-se noutras instituições de ensino superior ou deixando de estudar, tendo-se verificado o abandono de turmas em bloco, designadamente nos primeiros anos dos cursos.
A falta de pagamento de propinas é um facto inegável e sintoma de falta de confiança dos estudantes na UNI e, tal como referido pela própria direcção da SIDES, S. A., e Reitoria, afecta a qualidade pedagógica da instituição, pois inviabiliza o pagamento aos docentes e está a condicionar a publicação dos resultados dos estudantes.
Constatou-se também que continuam a não existir programas em várias unidades curriculares dos cursos de licenciatura em Arquitectura, Engenharia Industrial, Engenharia Informática e Engenharia Electrotécnica, o que põe em causa o ensino ministrado naquelas áreas, pois não estão definidos objectivos, metodologias, conteúdos programáticos, bibliografia obrigatória e complementar e métodos de avaliação.
O calendário escolar aprovado na UNI não garante o cumprimento das horas de contacto definidas por unidade curricular, mantendo-se o défice de horas de contacto formalmente marcadas, embora tenham sido feitas alterações à forma de apresentação do referido calendário quanto ao 2.º semestre do ano lectivo 2006-2007.
Os canais de comunicação entre a direcção da SIDES, S. A., e a actual direcção da Associação Académica estão bloqueados mercê de um acumular de conflitos e de acusações mútuas na praça pública.
As acções e omissões da direcção da SIDES, S. A., e da Reitoria da UNI, designadamente a forma como, na praça pública, desde 2005, geriram as várias crises societárias e procederam a sucessivas substituições de responsáveis académicos, provocaram, juntamente com a prisão preventiva do antigo vice-reitor e a proibição de entrada nas instalações do antigo reitor, o descrédito total da UNI na comunidade académica e no País em geral, com a consequente descredibilização das formações ali ministradas."
6 - Mais se determinou que a decisão de encerramento produzisse efeitos imediatos com a sua notificação, devendo a entidade instituidora dar-lhe cumprimento, procedendo ao encerramento da Universidade Independente até ao dia 31 de Outubro de 2007, assegurando, exclusivamente e até essa data, as actividades estritamente necessárias à conclusão do ano lectivo de 2006-2007, sendo da sua inteira responsabilidade a prática de qualquer acto ou actividade que possa criar expectativas ou iludir alunos, professores e pessoal não docente relativamente ao funcionamento da Universidade Independente no ano lectivo de 2007-2008, devendo, nomeadamente, abster-se de desenvolver naquele estabelecimento quaisquer actividades lectivas ou outras relacionadas com o ensino, ou, ainda, com a preparação de um novo ano escolar, tais como efectuar matrículas e inscrições, contratar docentes ou pessoal não docente, distribuir serviço docente e definir conteúdos, programas, metodologias, etc.
7 - Caso os responsáveis pelo estabelecimento de ensino não cumpram integralmente o referido despacho, em termos susceptíveis de verificação in loco, será o mesmo comunicado às autoridades administrativas e policiais competentes para procederem, de imediato, ao encerramento coercivo do estabelecimento, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 4 do artigo 47.º do Estatuto.
8 - Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 48.º do Estatuto, ficou a Direcção-Geral do Ensino Superior encarregue da guarda da documentação fundamental da Universidade Independente, após auto de entrega da mesma pelos responsáveis do estabelecimento de ensino superior, a efectuar em 31 de Janeiro de 2008, devendo estes assegurar, como é da sua responsabilidade legal, a integral conservação e fidedignidade daqueles registos, bem como, designadamente, a emissão dos documentos comprovativos da situação académica dos alunos até à sua efectiva entrega para guarda na Direcção-Geral do Ensino Superior.
9 - O princípio da prossecução do interesse público, consagrado no artigo 266.º, n.º 1, da Constituição, é, segundo o Prof. Freitas do Amaral, o princípio motor da Administração Pública. A administração actua, move-se, funciona para prosseguir o interesse público. O interesse público é o seu único fim.
10 - Na verdade, a administração, por força daquele princípio fundamental da actividade administrativa, está obrigada, uma vez definidos por lei quais os interesses colectivos ou interesses gerais da comunidade que hão-de integrar o conceito de interesse público, a pautar a sua conduta de modo a prosseguir este, mas sempre no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos administrados.
11 - Embora o conceito de interesse público seja um conceito relativo, de conteúdo variável com o tempo, com a região e com os homens, o interesse público é, sem dúvida, o interesse colectivo; o interesse, se geral de uma determinada comunidade, é o bem comum.
12 - Para a prossecução de tal interesse, a administração goza da prerrogativa ou privilégio de execução prévia, segundo o qual pode executar imediatamente, com recurso ou não ao uso da força, as suas próprias decisões, independentemente do recurso aos tribunais, desde que o faça pelas formas e nos termos admitidos por lei.
13 - No domínio do ensino superior, a lei define claramente o interesse público, cometendo ao Estado a atribuição de garantir o elevado nível pedagógico, científico e cultural do ensino [cf. o artigo 1.º, alínea d) da Lei 1/2003, de 6 de Janeiro].
14 - As obrigações cometidas ao Estado na defesa da qualidade, da credibilidade e da dignificação do ensino superior português legitimam a acção fiscalizadora em toda a sua extensão e consequências.
15 - No que respeita, concretamente, ao ensino particular e cooperativo, rege o artigo 75.º, n.º 2, da Constituição: o Estado reconhece e fiscaliza o ensino particular e cooperativo, nos termos da lei.
16 - Assim, nos termos da alínea j) do artigo 9.º do referido Estatuto, conjugado com o artigo 23.º do Decreto-Lei 79/2005, de 15 de Abril, tendo ainda em conta o disposto no artigo 61.º da Lei de Bases do Sistema Educativo e no artigo 2.º, n.º 2, alínea j), da Lei 1/2003, de 6 de Janeiro, compete ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior "fiscalizar o cumprimento da lei e aplicar, quando esta o determinar, as sanções cominadas em caso de infracção".
17 - Por outro lado, as liberdades de aprender e de ensinar asseguradas pelo artigo 43.º da Constituição, para poderem ser efectivas, vinculadas como devem estar ao indispensável e desejável aperfeiçoamento do ser humano, exigem que o Estado procure assegurar a qualidade daquilo que se ensina e daquilo que se aprende, no ensino público, como no ensino privado, sem o que mais não seriam do que liberdades meramente formais, vazias de qualquer capacidade formativa.
18 - No caso em apreço, o quadro geral descrito é caracterizado, nomeadamente, pela indefinição societária da entidade instituidora mesclada por situações de vazio de poder na sua direcção, em virtude de sucessivas renúncias dos seus titulares, no período em apreço, pela falta de autonomia da Universidade e dos seus responsáveis académicos face à respectiva entidade instituidora com os consequentes reflexos na perturbação do funcionamento daquela, com particular ênfase, a partir de 26 de Fevereiro último, data em que o ex-reitor, Prof. Doutor Luís Arouca, destituiu todos os titulares dos órgãos académicos dos seus cargos, incluindo todos os directores das faculdades, os directores de curso e os chamados directores executivos, e suspendeu todas e quaisquer actividades lectivas, pela instabilidade e irregularidade no funcionamento dos órgãos académicos da Universidade Independente, bem como pela indefinição na sua constituição, pela falta de estabilidade do corpo docente, caracterizada por constantes alterações e por uma situação generalizada e persistente de salários em atraso, pela falta de qualificações do pessoal docente dos diversos cursos e por um desempenho de funções em regime de tempo integral largamente deficitário, por parte dos docentes qualificados, de acordo com os requisitos previstos na lei, pelo funcionamento irregular das actividades lectivas afectadas por mudanças constantes e ausências prolongadas ou abandonos definitivos de membros do corpo docente, pela falta de rigor na apreciação das candidaturas de acesso e ingresso, pela existência de um processo sistemático de concessão de equivalências sem a intervenção do conselho científico, tendo-se registado ilegalidades, em processo instruído para o efeito, na atribuição de equivalências no curso de GARA, pelo abandono dos alunos da mesma Universidade, por turmas em bloco, sobretudo, nos primeiros anos dos cursos de licenciatura.
19 - O que consubstancia uma situação generalizada de degradação pedagógica, atingindo e afectando, de forma profunda, generalizada e irreversível, os sectores chave do funcionamento pedagógico da Universidade Independente, sendo inquestionável e notória a sua falta de credibilidade para assegurar a qualidade científica, pedagógica e cultural do ensino ali ministrado, como se exige a uma instituição de ensino superior reconhecida como de interesse público.
20 - Ora, nem a SIDES, S. A., nem a Universidade Independente conseguiram dar eficaz resposta à resolução da situação de indefinição e de instabilidade que criaram e que se foi agravando no decurso do processo, repondo o status quo ante o início da crise, i. e., repondo a normalidade em toda a sua extensão e consequências e dando garantias de credibilidade e de estabilidade perante os seus alunos, funcionários, docentes e não docentes, assim como perante o ministério da tutela, a comunidade académica e a sociedade em geral, conforme lhes competia e era da sua inteira responsabilidade, também a aferir no plano social, dado o estatuto de utilidade pública de que gozam.
21 - A decisão de encerramento foi devidamente ponderada em face da prova reunida em processo próprio, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares interessados, revelando-se, ademais, adequada, necessária e proporcional, face à grave lesão infligida no interesse público, traduzido na garantia de um ensino de qualidade, cujas instituições, cursos, graus e diplomas deverão ser munidos de reconhecimento e credibilidade públicas, e no interesse de terceiros, nomeadamente alunos, efectivamente prejudicados pela situação de manifesta degradação pedagógica do ensino naquele estabelecimento universitário, obrigando-os, por um lado, a concluir os seus estudos noutra instituição, mediante a sujeição a um processo de transferência e de equivalências para prosseguimento de estudos, e, por outro, a verem afectada a credibilidade dos certificados e diplomas obtidos naquela Universidade, nomeadamente no contexto laboral.
22 - A salvaguarda dos interesses dos alunos - a considerar obrigatoriamente numa decisão desta natureza, nos termos da lei - foi devidamente acautelada através de várias providências tomadas ao longo do processo relativas à preservação dos dados e registos académicos dos percursos escolares, através, nomeadamente, da realização e da guarda pela Inspecção-Geral de cópia actualizada das bases de dados do percurso académico dos alunos da Universidade Independente e do programa que permite aceder à mesma - sem prejuízo da efectiva responsabilidade legal da entidade instituidora pela integral conservação e fidedignidade daqueles registos, bem como pela emissão dos documentos comprovativos da situação académica dos alunos, até ao momento fixado para a guarda da documentação fundamental daquela Universidade na Direcção-Geral do Ensino Superior -, e à aplicação dos regimes legais de mudança de curso e transferência no ensino superior em qualquer momento do ano lectivo, tendo-se criado, na fase final do processo, um grupo de acompanhamento, no seio daquele serviço, para apoiar os processos de transferência dos alunos da Universidade Independente para outras instituições.
23 - De tal modo que a suspensão dos efeitos da decisão de encerramento equivaleria, assim, a admitir manter-se em funcionamento um estabelecimento de ensino superior que, tal como resultou comprovado e não infirmado pela entidade instituidora, em sede de audição, atingiu um estado de degradação da qualidade e da credibilidade do ensino ministrado, a todos os níveis, que compromete seriamente o reconhecimento dos seus cursos e graus, afectando de forma gravosa alunos e ex-alunos, docentes e não docentes e a comunidade académica em geral.
24 - Minada na sua credibilidade e imagem públicas e perante um estado de descrédito generalizado entre alunos, docentes e o público em geral, a suspensão de tal decisão, permitindo-se, com isso, o início de um novo ano escolar naquele estabelecimento, sem quaisquer condições ou garantias de qualidade, de estabilidade ou de continuidade, tão necessárias a uma instituição de ensino superior, acarretaria a criação de falsas expectativas em alunos, professores e pessoal não docente em redor de uma situação de aparente e enganadora normalidade ou de reposição dessa normalidade. Seria, pura e simplesmente, irresponsável.
25 - Para além do que, com a suspensão do despacho, minada ficaria também a autoridade do Estado para definir todo um enquadramento e uma prática sistemática de avaliação e de fiscalização da qualidade do ensino, assim como para exigir o cumprimento de padrões de qualidade a todas as instituições de ensino superior e exercer a necessária acção fiscalizadora, aplicando, caso se justifique, as sanções previstas na lei e executando-as, conforme constitui corolário do princípio da prossecução do interesse público que inspira a actividade administrativa.
26 - Com efeito, o XVII Governo Constitucional inscreveu no seu Programa, que submeteu à aprovação da Assembleia da República, a reforma do ensino superior como uma das prioridades da sua acção governativa, a qual assenta, entre outros vectores de intervenção, na promoção da qualidade do sistema do ensino superior num quadro que garanta a sua integração no actual contexto europeu, assim como a qualificação dos portugueses no espaço europeu. Para tanto, foi desencadeada a avaliação internacional de todo o nosso sistema de ensino superior, público e privado, universitário e politécnico, e das suas instituições, de forma independente, transparente e exigente, à luz de padrões internacionais, recorrendo a organizações internacionais de experiência e idoneidade reconhecidas, como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), a Rede Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior (ENQA), a Associação Europeia das Universidades (AEU) e a Associação Europeia de Instituições de Ensino Superior (EURASHE).
27 - A implementação da avaliação global do sistema de ensino superior e das suas instituições, complementada, designadamente, pela revisão dos regimes jurídicos da avaliação do ensino superior e das instituições de ensino superior, recentemente aprovada, espelha parte essencial de uma estratégia consolidada para garantir o seu reconhecimento nacional e internacional, assim como a total integração ao nível europeu da rede de instituições do ensino superior português.
28 - Concomitantemente, no âmbito das suas funções de regulação, o ministério da tutela deve zelar pelo cumprimento dos requisitos de qualidade para cursos e instituições e da responsabilidade própria das instituições privadas face aos seus alunos.
29 - As universidades públicas e privadas são, indiferenciadamente da sua natureza jurídica, "centros de criação, transmissão e difusão da cultura, da ciência e da tecnologia, que, através da articulação do estudo, da docência e da investigação, se integram na vida da sociedade" - cf. os artigos 1.º da Lei 108/88, de 24 de Setembro, 6.º da Lei 1/2003, de 6 de Janeiro, e 6.º, n.º 2, do Estatuto.
30 - A qualidade tem de constituir um requisito fundamental de qualquer instituição, sem o que não poderá a mesma sobreviver, nem no contexto nacional e muito menos no europeu ou internacional.
31 - Antes de tudo, porém, cada instituição, consoante a sua natureza e projecto científico, pedagógico e cultural, tem de respeitar, a todo o tempo, as condições mínimas de funcionamento, nos domínios pedagógico, científico e cultural, estabelecidas no quadro legal aplicável, as quais estão sujeitas a um escrutínio sistemático por parte dos serviços técnicos e de inspecção e fiscalização do ministério responsável pelo ensino superior, visando defender padrões aceitáveis de qualidade no ensino leccionado, de exigência e de dignidade do ensino superior face aos superiores interesses dos alunos e da sociedade em geral, assim como a integração das diversas instituições, independentemente da sua natureza e denominação, de forma harmónica e equilibrada no sistema de ensino superior.
32 - Ora, o cumprimento dos requisitos mínimos exigidos para a prestação de um serviço de ensino de qualidade, em termos pedagógicos, que constitui apanágio de uma universidade integrada no sistema de ensino superior nacional e sem o que perde a sua razão de existir, está, neste caso, conforme se constatou no mencionado despacho, irremediavelmente posto em causa.
33 - No requerimento da providência cautelar, a entidade instituidora da Universidade Independente não nega, na essência, os factos apurados ao longo do processo, nem, sequer, as conclusões que deles inequivocamente se retiram - nem poderia fazê-lo de boa fé, já que os mesmos assentam em dados objectivos, alguns dos quais públicos e notórios, indesmentíveis, apurados em sede e processo próprio de encerramento, cujo relatório e conclusões integram o processo administrativo -, apelando, contudo, aqui e ali à aplicação de medidas do tipo preventivo, em vez da medida que foi efectivamente tomada, como se aquelas fossem as mais adequadas à regularização da situação em apreço.
34 - Nestes termos, como se compreenderá, a suspensão do encerramento e o consequente diferimento dos actos de execução subsequentes seria gravemente prejudicial para o interesse público, pois equivaleria a admitir o funcionamento de um estabelecimento de ensino superior manifestamente à margem dos padrões mínimos de exigência por que se devem reger todos os estabelecimentos de natureza congénere, configurando uma situação em que, comprovadamente, não se verificam as condições mínimas legais, exigíveis e indispensáveis ao seu funcionamento e ao reconhecimento dos seus cursos e graus, cumprindo padrões de qualidade aceitáveis.
35 - Esta situação afectaria gravemente o prestígio do ensino superior, sendo susceptível de acarretar prejuízos graves para os alunos que frequentam o estabelecimento de ensino e para a credibilidade do ensino superior privado e do ensino superior em geral, pois, a admitir-se, evidenciaria a impotência do Estado para prosseguir uma actividade fiscalizadora que constitucionalmente lhe foi atribuída.
Face ao exposto, nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 128.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, reconheço que o diferimento da execução dos actos consequentes do acto suspendendo seria gravemente prejudicial para o interesse público que incumbe prosseguir ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, pelo que determino que, não obstante a existência da providência cautelar, o encerramento em curso deve ocorrer dentro dos prazos fixados no mesmo despacho, com todas as devidas e legais consequências.
23 de Agosto de 2007. - O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, José
Mariano Rebelo Pires Gago.