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Acórdão 412/2002/T, de 16 de Dezembro

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Texto do documento

Acórdão 412/2002/T. Const. - Processo 124/2002. - Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 - Jorge Manuel Rocha, identificado nos autos, interpôs em 4 de Março de 1999 recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário de Estado da Administração Educativa, datado de 13 de Novembro de 1998, proferido ao abrigo do despacho de delegação de competências n.º 21-XIII/ME/95, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 7 de Dezembro de 1995, afirmando, nessa peça processual:

"[...] Encontra-se, pois, o acto recorrido inquinado do vício de violação de lei, por violação dos princípios da justiça e igualdade, nos termos do artigo 266.º, n.º 2, da CRP."

O Secretário de Estado da Administração Educativa apresentou a sua resposta em 28 de Maio de 1999, tendo pugnado pela extemporaneidade da interposição do recurso e, a não se entender assim, pela improcedência do mesmo porque o despacho recorrido foi proferido em "[...] estrita obediência aos princípios gerais que vinculam a actividade administrativa, máxime o da legalidade previsto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP".

Por acórdão de 8 de Março de 2001, o Tribunal Central Administrativo julgou improcedente a questão prévia da extemporaneidade do recurso e, quanto ao mérito, negou provimento ao mesmo (cf. fls. 81-91).

Inconformado, o recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, formulando as seguintes conclusões com interesse para o presente recurso:

"17.ª Pelo que, com a exigência do artigo 5.º do Decreto-Lei 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 16/96, de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao concurso os professores contratados, e ao considerar-se que tal requisito tem de estar preenchido à data da abertura do concurso, como o fez o despacho recorrido, aquela norma mais não faz que pôr em causa a unidade do sistema.

18.ª Criando, assim, desigualdade e injustiça.

19.ª Em manifesta violação dos princípios constitucionais da igualdade e justiça previstos no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

20.ª Pelo que a permanência daquela norma na ordem jurídica se mostra inadmissível, pelo menos com o sentido, alcance e efeito que a decisão recorrida lhe empresta.

21.ª Encontra-se, pois, o despacho do Exmo. Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa de 13 de Novembro de 1998 inquinado do vício de violação de lei, por violação dos princípios da justiça e igualdade, nos termos do artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

22.ª Pelo que deve o mesmo ser anulado, com todas as legais consequências.

23.ª E a prova de que aquela norma cria injustiça está em que o Decreto-Lei. n.º 15-A/99, de 19 de Janeiro, veio dar nova redacção ao artigo 5.º do Decreto-Lei 384/93, de 18 de Novembro, em que desapareceu a referida exigência dos professores se encontrarem contratados à data da abertura do concurso, sendo requisito suficiente que tenham estado contratados nos últimos dois anos lectivos.

24.ª Encontra-se, pois, o referido despacho inquinado do vício de violação de lei, por violação dos princípios da justiça e igualdade, nos termos do artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

25.ª Pelo que, ao decidir como decidiu, violou a decisão recorrida o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

26.ª Pelo que deve ser concedido provimento ao presente recurso e anulada a decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo e consequentemente anulado o despacho do Exmo. Secretário de Estado da Administração Educativa de 13 de Novembro de 1998, com todas as legais consequências."

Por acórdão de 4 de Dezembro de 2001, o STA negou provimento ao recurso; quanto à questão de constitucionalidade suscitada pelo recorrente pronunciou-se nos seguintes termos:

"Por outro lado, não especifica o recorrente em que consiste a invocada violação dos princípios constitucionais da justiça e da igualdade estabelecidos no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição. Não vêm, aliás, referidos casos idênticos ao do recorrente em que a Administração tenha decidido diferentemente, nem parece injusto que, tendo o recorrente deixado de trabalhar para fazer curso de mestrado a fim de obter as almejadas vantagens, tenha de ter tratamento diferenciado dos restantes concorrentes, que optaram por continuar a trabalhar, mesmo em regime de contrato.

De resto, como diz a Exma. Magistrada do Ministério Público, a violação daqueles princípios, no âmbito do acto administrativo, releva essencialmente no exercício de poderes discricionários que aqui não teve lugar. Não vindo invocada a inconstitucionalidade das normas aplicadas, a obediência àquelas garantiu a observância dos princípios consignados no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição, que assim também não se mostra violado.

Improcedem, nos termos expostos, as conclusões do recorrente, pelo que acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se o acórdão recorrido."

De novo inconformado, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei 28/82, de 15 de Novembro, nos seguintes termos:

"1 - O presente recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro.

2 - Pretende ver-se apreciada a inconstitucionalidade da norma prevista no artigo 5.º do Decreto-Lei 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 16/96, de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao concurso de professores para os quadros de zona pedagógica (QZP) os professores contratados à data da abertura do concurso, interpretação essa defendida quer pelo Tribunal Central Administrativo quer pelo acórdão recorrido.

3 - Tal disposição legal viola o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

4 - Efectivamente, a exigência consagrada no artigo 5.º do Decreto-Lei 384/9, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei 16/96, de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao concurso para os QZP os professores contratados, e ao considerar-se, como entendeu o acórdão recorrido, que tal requisito tem de estar preenchido à data da abertura do concurso, aquela norma mais não fez do que pôr em causa a unidade do sistema.

5 - Com efeito, não pode, por um lado, exigir-se como condição de progressão na carreira docente a valorização profissional e, paralelamente, existir uma norma que erige (para se poder ser opositor ao concurso para os lugares de zona pedagógica) que os professores se encontrem contratados à data da abertura do concurso, sem atender à razão pela qual tal requisito se encontra preenchido.

6 - Criando, assim, manifesta desigualdade e injustiça, violando, pois, o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

7 - De facto, o recorrente, exerceu funções durante anos consecutivos, tendo a sua ligação ao Ministério da Educação para o exercício da actividade docente sido feita sempre através de contrato, ou seja, sempre foi professor contratado.

8 - É certo que, à data da abertura do concurso, o recorrente não se encontrava contratado, mas tal só sucedeu porque constitui imperativo da progressão na carreira docente a valorização profissional, ou seja, achava-se no cumprimento de um dever funcional.

9 - Em conformidade com tal objectivo e dever, o recorrente encontrava-se na data da abertura do concurso em causa a frequentar o curso de mestrado em Filosofia da Natureza e Ambiente.

10 - O que fez em consonância com os objectivos da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei 46/86, de 14 de Outubro) e do Estatuto da Carreira Docente dos Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário (Decreto-Lei 139-A/90, de 28 de Abril) e enquadrado no Regime Jurídico da Formação Contínua de Professores (Decretos-Leis 249/92, de 9 de Novembro e 344/85, de 11 de Outubro).

11 - Assim sendo, não podia o recorrente ser penalizado, como o foi, por tal facto e por se encontrar no cumprimento de um dever.

12 - Acresce que, jurídica e materialmente, a conclusão do mestrado e o exercício da actividade docente se mostram legalmente incompatíveis.

13 - Razão pela qual o recorrente se viu obrigado a dedicar-se em exclusivo durante o ano lectivo de 1997-1998 ao desenvolvimento e conclusão do seu projecto de mestrado, o que fez em manifesta consonância com as exigências de progressão e valorização que a carreira docente exige.

14 - Tendo solicitado a concessão de uma bolsa de mestrado no âmbito do Programa Praxis XXI, do Ministério da Ciência e Tecnologia, que lhe veio a ser atribuída por despacho do Exmo. Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia.

15 - E a atribuição da referida bolsa de mestrado é legalmente incompatível com o exercício da actividade docente.

16 - Pelo que teve, necessariamente, de optar por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu projecto de mestrado.

17 - Acontece que, contrariamente às expectativas legítimas criadas pelo recorrente, o facto de ter optado por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu projecto de mestrado, ao invés de o beneficiar, acabou por prejudicá-lo.

18 - Em manifesta violação dos princípios da justiça e igualdade.

19 - É que um professor que se encontrasse, à data dos factos, em situação idêntica à do recorrente, mas que não se achasse no cumprimento das exigências de progressão e valorização que a carreira docente impõe, obteria colocação no concurso para os QZP.

20 - Enquanto o recorrente, por se ter dedicado exclusivamente ao desenvolvimento e conclusão do seu projecto de mestrado, em manifesta consonância com as exigências de progressão e valorização que a carreira docente exige, veio a ser prejudicado com a anulação, por tal motivo, da sua colocação no concurso para os QZP no ano lectivo de 1998-1999.

21 - Perante tal quadro, tem de entender-se que a subsistência daquela norma na ordem jurídica se mostra inadmissível, pelo menos com o sentido, alcance e efeito que o acto impugnado lhe empresta, confirmado pelo Tribunal Central Administrativo e pelo acórdão ora recorrido.

22 - Encontrando-se, por consequência, a referida norma em manifesta e ostensiva contradição com o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

23 - A questão de constitucionalidade foi suscitada pelo recorrente quer na petição de recurso quer no recurso jurisdicional.

24 - O presente recurso deverá subir nos próprios autos e com efeito suspensivo, nos termos do artigo 78.º, n.º 4, da Lei do Tribunal Constitucional."

Neste Tribunal, apresentou alegações, que concluiu do seguinte modo:

"1 - Foi interposto recurso contencioso de anulação para o Tribunal Central Administrativo do despacho do Exmo. Secretário de Estado da Administração Educativa que negou provimento ao recurso hierárquico interposto pelo recorrente do acto que anulou a colocação obtida no concurso para os QZP no ano lectivo de 1998-1999.

2 - Entendeu o Tribunal Central Administrativo negar provimento ao referido recurso, tendo tal decisão sido confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, na sequência de recurso jurisdicional.

3 - Contudo, a interpretação da norma prevista no artigo 5.º do Decreto-Lei 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 16/96, de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao concurso de professores para os QZP os professores contratados à data da abertura do concurso, viola o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

4 - Efectivamente, a colocação obtida no concurso para os quadros de zona pedagógica, a que o recorrente foi opositor, foi anulada por este não reunir as condições exigidas no citado diploma legal.

5 - Sucede que o recorrente exerceu funções durante anos consecutivos, tendo a sua ligação ao Ministério da Educação para o exercício da actividade docente sido feita sempre através de contrato.

6 - E não obstante o recorrente não se encontrar contratado à data da abertura do concurso, tal só aconteceu porque constitui imperativo da progressão na carreira docente a valorização profissional.

7 - Pelo que, em conformidade com tal objectivo e dever, o recorrente se encontrava na data da abertura do concurso em causa a frequentar o curso de mestrado em Filosofia da Natureza e Ambiente.

8 - Tanto mais que jurídica e materialmente a conclusão do mestrado e o exercício da actividade docente se mostram legalmente incompatíveis.

9 - Razão pela qual o recorrente se viu obrigado a dedicar-se em exclusivo durante o ano lectivo de 1997-1998 ao desenvolvimento e conclusão do seu projecto de mestrado, o que fez em manifesta consonância com as exigências de progressão e valorização que a carreira docente exige.

10 - Pelo que solicitou a concessão de uma bolsa de mestrado no âmbito do Programa Praxis XXI, do Ministério da Ciência e Tecnologia, que lhe veio a ser atribuída por despacho do Exmo. Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia.

11 - Ora, a atribuição da referida bolsa de mestrado é legalmente incompatível com o exercício da actividade docente.

12 - Daí que o recorrente teve necessariamente de optar por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu projecto de mestrado.

13 - Acontece que, o facto de ter optado por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu projecto de mestrado, ao invés de o beneficiar, acabou por prejudicá-lo.

14 - Em manifesta violação dos princípios da justiça e igualdade.

15 - É que um professor que se encontrasse, à data dos factos, em situação idêntica à do recorrente, mas que não se achasse no cumprimento de exigências de progressão e valorização que a carreira docente e a lei impõem, obteria colocação no concurso para os QZP.

16 - Perante tal quadro, tem de entender-se que a subsistência daquela norma na ordem jurídica se mostra inadmissível, pelo menos com o sentido e alcance efeito que o acto impugnado lhe empresta confirmado pelo Tribunal Central Administrativo e pelo acórdão ora recorrido, já que cria manifesta desigualdade e injustiça, violando, pois, o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

17 - Devendo, consequentemente, ser declarada como materialmente inconstitucional, por violação do disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP, e ser revogado o acórdão recorrido, com todas as legais consequências."

Não houve contra-alegações.

Cumpre apreciar e decidir.

2 - Pretende o recorrente ver apreciada a constitucionalidade da norma prevista no artigo 5.º do Decreto-Lei 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 16/96, de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao concurso de professores para os quadros de zona pedagógica (QZP) os professores contratados à data da abertura do concurso, por violação dos princípios da igualdade e da justiça e do disposto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP. E isto, fundamentalmente, porque assim se impede a ponderação de outras situações que, muito embora se não verifique a vinculação contratual do candidato à data da abertura do concurso, impõem a admissibilidade da candidatura, como era o caso do recorrente, em que a não vinculação se devia unicamente ao facto de ter frequentado um curso de mestrado, no cumprimento de um dever de valorização profissional, o que era incompatível com a celebração de um contrato de docência.

Ora, antes do mais, importa salientar a impertinência da invocação do artigo 266.º, n.º 2, da CRP como norma constitucional violada.

Com efeito, a imposição de a Administração Pública se subordinar à Constituição e à lei, devendo actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé, dirige-se aos órgãos e agentes administrativos e não ao legislador.

A sua violação só é assim, em bom rigor, reportável a actos (ou omissões) da Administração e, nomeada ou dominantemente, no exercício de poderes discricionários, onde a lei, visando determinado fim, deixa aos órgãos e agentes administrativos a opção entre diversos meios para alcançar esse fim.

A inconstitucionalidade, neste caso, não se configura, pois, directamente, como uma inconstitucionalidade normativa, sendo certo que só esta cabe nos poderes de cognição do Tribunal Constitucional, no âmbito do recurso de constitucionalidade, em fiscalização concreta.

Não significa o que se deixa dito que a invocada inconstitucionalidade não possa, no caso, ser conhecida; só que a norma em causa terá como parâmetros de constitucionalidade, considerando a pretensa violação dos princípios da igualdade e da justiça, os artigos 13.º e 2.º da CRP, onde o primeiro daqueles princípios se mostra consagrado em termos gerais e o segundo se integra no princípio do Estado de direito.

3 - É o seguinte o teor da norma cuja constitucionalidade foi suscitada nos autos - artigo 5.º do Decreto-Lei 384/93, de 18 de Novembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 16/96, de 8 de Março:

"Artigo 5.º

Podem ser opositores ao concurso referido no artigo anterior, além dos professores já pertencentes a um dos quadros de zona pedagógica, os professores contratados que reúnam, cumulativamente, as seguintes condições:

a) Serem titulares de habilitação profissional ou própria;

b) Terem obtido colocação nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico ou do ensino secundário nos últimos quatro anos lectivos;

c) Terem completado, até 31 de Agosto do ano anterior ao da abertura do concurso, quatro ou mais anos de serviço docente;

d) Terem prestado no ano lectivo anterior, no mínimo, 180 dias de serviço, em horários não inferiores a doze horas semanais." (Itálico nosso.)

O princípio da igualdade abrange fundamentalmente três dimensões ou vertentes: a proibição do arbítrio, a proibição de discriminação e a obrigação de diferenciação, significando a primeira a imposição da igualdade de tratamento para situações iguais e a interdição de tratamento igual para situações manifestamente desiguais (tratar igual o que é igual; tratar diferentemente o que é diferente), a segunda a ilegitimidade de qualquer diferenciação de tratamento baseada em critérios subjectivos (v. g., ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social) e a última surge como forma de compensar as desigualdades de oportunidades.

É pacífica a jurisprudência deste Tribunal neste sentido; cita-se, a título de exemplo, o Acórdão 180/99, de 10 de Março, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 43.º vol., de p. 135 a p. 144, onde se escreveu:

"6 - O Tribunal Constitucional tem considerado que o princípio da igualdade impõe que situações da mesma categoria essencial sejam tratadas da mesma maneira e que situações pertencentes a categorias essencialmente diferentes tenham tratamento também diferente. Admitem-se, por conseguinte, diferenciações de tratamento, desde que fundamentados à luz dos próprios critérios axiológicos constitucionais. A igualdade só proíbe discriminações quando estas se afiguram destituídas de fundamento racional [cf., nomeadamente, os Acórdãos n.os 39/88, 186/90, 187/90 e 188/90, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11.º vol. (1988), pp. 233 e segs., e 16.º vol. (1990), pp. 383 e segs., 395 e segs. e 411 e segs., respectivamente; cf., igualmente, na doutrina, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, t. IV, 2.ª ed., 1993, pp. 213 e segs., Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 6.ª ed., 1993, pp. 564-565, e Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pp. 125 e segs.]."

Também no Acórdão 409/99, de 29 de Junho, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 44.º vol., de p. 461 a p. 485, se disse:

"O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente. Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adopção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objectiva e racional. O princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio (cf., quanto ao princípio da igualdade, entre outros, os Acórdãos n.os 186/90, 187/90, 188/90, 1186/96 e 353/98, publicados no Diário da República, respectivamente de 12 de Setembro de 1990 e de 12 de Fevereiro de 1997, e o último ainda inédito)."

Ora, a norma em causa, que fixa os requisitos de admissibilidade ao concurso, exigindo, antes do mais, que os candidatos sejam ou professores já pertencentes a um dos quadros da zona pedagógica ou "professores já contratados", não ofende, quanto a esta última condição, o princípio da igualdade.

Desde logo, trata por igual, sem qualquer discriminação, todos aqueles que se encontram na mesma situação - a de professores vinculados por contrato.

Não é, porém, aqui que o recorrente vislumbra ofensa ao princípio da igualdade: a violação ocorreria por, alegadamente, poder concorrer um professor que, sem ter frequentado um qualquer curso de valorização profissional, está vinculado por contrato à data da abertura do concurso, mas já não aquele que só não se encontra em tal situação por, em cumprimento de um dever de valorização profissional, ter frequentado um curso de mestrado, o que era incompatível com a contratação.

Por outras palavras, o que o recorrente questiona é o facto de a norma não conferir o mesmo direito (o direito de se candidatar ao concurso) a quem se encontre em situação diferente, mas merecedora (ou até mais) da outorga daquele direito.

Mas não tem razão.

Com efeito, e dado a matéria em causa, justificava-se que, na definição de condições de candidatura ao concurso, o legislador assentasse em critérios, tanto quanto possível, objectivos.

A exigência de o oponente ao concurso se encontrar contratado nada tem de discriminatório, considerando que se trata de uma situação que revela uma permanência no exercício de funções docentes justificativa da oportunidade de uma estabilização profissional que se obtém com a contratação para os quadros da zona pedagógica, do mesmo passo que, cumulativamente com os requisitos previstos na mesma norma, oferece a garantia de uma experiência no ensino necessária para aquela contratação.

Dificilmente, aliás, o legislador poderia equiparar outras situações - designadamente aquela em que o recorrente se encontrava - em que se não verificasse a referida condição, alargando as margens de apreciação da Administração com a ponderação e valorização das múltiplas razões que pudessem justificar a interrupção de funções docentes, com prejuízo da objectividade que deve presidir à verificação dos requisitos de admissibilidade ao concurso.

É certo que o legislador poderia ter acolhido outros factores de admissibilidade ao concurso, como de resto veio a suceder com a nova redacção dada à norma em causa pelo Decreto-Lei 15-A/99, de 19 de Janeiro; mas isto insere-se, ainda, na sua margem de liberdade de conformação, no âmbito da qual a Constituição apenas impõe que se não consagrem soluções arbitrárias, discriminatórias ou manifestamente injustas.

O que se deixa dito no que respeita à não violação do princípio da igualdade vale também quanto à invocada violação do princípio da justiça.

Com efeito, os fundamentos apontados, que demonstram a racionalidade da medida legislativa em causa - e sem embargo da plausibilidade de outra ou outras racionalidades - não são suficientes para se concluir que a norma consagra uma solução injusta.

4 - Decisão:

Pelo exposto, e em conclusão, decide-se negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.

Lisboa, 10 de Outubro de 2002. - Artur Maurício - Maria Helena Brito - Luís Nunes de Almeida - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2076044.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1985-08-23 - Decreto-Lei 344/85 - Ministério da Defesa Nacional

    Ajusta e actualiza os regimes de permanência e eliminação dos alunos dos vários estabelecimentos militares de ensino.

  • Tem documento Em vigor 1986-10-14 - Lei 46/86 - Assembleia da República

    Aprova a lei de bases do sistema educativo.

  • Tem documento Em vigor 1990-04-28 - Decreto-Lei 139-A/90 - Ministério de Educação

    Aprova e publica em anexo o estatuto da carreira dos educadores de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário.

  • Tem documento Em vigor 1992-11-09 - Decreto-Lei 249/92 - Ministério da Educação

    Estabelece o regime jurídico da formação contínua de professores da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.

  • Tem documento Em vigor 1993-11-18 - Decreto-Lei 384/93 - Ministério da Educação

    CRIA OS QUADROS DE ZONA PEDAGÓGICA PREVISTOS NO ARTIGO 27 DO ESTATUTO DA CARREIRA DOS EDUCADORES DE INFÂNCIA E DOS PROFESSORES DOS ENSINOS BASICO E SECUNDÁRIO (ECD), APROVADO PELO DECRETO LEI 139-A/90, DE 28 DE ABRIL, PARA OS 2 E 3 CICLOS DO ENSINO BASICO E PARA O ENSINO SECUNDÁRIO, NO QUE RESPEITA AO ENSINO REGULAR. ALTERA A DESIGNAÇÃO DOS QUADROS DE VINCULAÇÃO DISTRITAL DOS EDUCADORES DE INFÂNCIA E PROFESSORES DO 1 CICLO DO ENSINO BASICO PARA QUADROS DE ZONA PEDAGÓGICA. DEFINE OS OBJECTIVOS, DOTAÇÃO, CONC (...)

  • Tem documento Em vigor 1996-03-08 - Decreto-Lei 16/96 - Ministério da Educação

    Altera o Decreto-Lei 384/93, de 18 de novembro, que criou os quadros de zona pedagógica.

  • Tem documento Em vigor 1998-02-26 - Lei 13-A/98 - Assembleia da República

    Altera a lei orgânica sobre a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1999-01-19 - Decreto-Lei 15-A/99 - Ministério da Educação

    Altera os requisitos de vinculação aos quadros de zona pedagógica e estabelece o direito de acesso à profissionalização em serviço dos docentes integrados em quadros de zona de pedagógica.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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