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Acórdão 22/2000/T, de 24 de Março

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Texto do documento

Acórdão 22/2000/T. Const. - Processo 275/99. - Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 - Adão Luís Sousa Martins Ribeiro impugnou judicialmente a decisão do presidente da Câmara Municipal de Paredes que, no uso da competência que lhe foi delegada pela Câmara, lhe aplicou a coima de 5000$00, a acrescer ao valor de 24 000$00 "correspondente à tarifa não paga" e às custas devidas, 1354$00, por não ter "procedido ao pagamento da correspondente tarifa de lixo prevista na postura sobre sistema de lixos e higiene pública", violando "o disposto no artigo 18.º-A" respectivo e assim praticando a contra-ordenação prevista na alínea C), a), do artigo 17.º da referida postura.

A impugnação foi julgada procedente, por sentença de 12 de Outubro de 1998. O tribunal julgou "ilegal a postura sobre sistema de lixos e higiene pública na parte em que não se harmoniza com as normas de hierarquia superior, como as do Decreto-Lei 310/95, de 20 de Novembro, e os diplomas regulamentares para que remete, máxime, a Portaria 189/95, de 20 de Junho, para os resíduos industriais, e a Portaria 768/88, de 30 de Novembro, para os resíduos urbanos, que se mantém em vigor por força do artigo 27.º, n.º 2, do Decreto-Lei 239/97, de 9 de Setembro, que, entretanto, revogou aquele Decreto-Lei 310/95, e por considerar, até, materialmente inconstitucional o artigo 18.º, n.º 1, alíneas B), C), D), E) e F), da referida postura - para que remete o artigo 17.º, alínea C), a) - conjugado com o seu artigo 10.º, por ofensivo do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República e ainda porque não se provou que o arguido produzisse ou depositasse qualquer lixo ou pudesse beneficiar do respectivo serviço camarário de recolha do mesmo [...]".

O Ministério Público recorreu então para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, por ter sido recusada a aplicação do "artigo 18.º, n.º 1, alíneas B), C), E) e F), da postura sobre o sistema de recolha de lixo e higiene pública da Câmara Municipal de Paredes".

O recurso foi admitido.

2 - Notificado para o efeito, o Ministério Público veio apresentar as alegações, começando por salientar que o objecto do recurso se restringia à recusa de aplicação "da norma constante do artigo 18.º, n.º 1, alíneas B), C), D), E) e F), da referida postura, em conjugação com o seu artigo 10.º" com fundamento em inconstitucionalidade material por violação do princípio da igualdade.

Referiu jurisprudência deste Tribunal no sentido da não inconstitucionalidade da norma do n.º 2 do artigo 10.º da postura municipal em causa e concluiu no sentido da procedência do recurso.

Em resumo, considerou que, cabendo às autarquias locais "a gestão dos lixos ou resíduos urbanos", nada impede que cobre dos munícipes respectivos a taxa correspondente, cujo montante não pode ser determinado individualizadamente, por razões de ordem prática, em nada violando o princípio da igualdade a definição de presunções para o efeito, com base na experiência e em factos notórios; ora, verifica-se que, em regra, "todos os munícipes serão produtores de lixos ou resíduos domésticos e equiparados", que as actividades comerciais ou industriais produzem maior quantidade de lixo e que essa quantidades varia "normalmente [...] em função da dimensão física do estabelecimento".

Finalmente, observou que o princípio da igualdade também não impõem "que os processos técnicos e a periodicidade da recolha dos lixos em toda a área do município tenham de ser estritamente idênticos".

O recorrido não contra-alegou.

3 - Corridos os vistos, cumpre decidir.

Começando pela delimitação do objecto do recurso, cabe circunscrevê-lo à recusa de aplicação da norma constante da alínea D) do artigo 18.º, n.º 1, da postura sobre o sistema de recolha de lixo e higiene pública da Câmara Municipal de Paredes, norma que seria aplicável à fixação do montante da tarifa a pagar no caso concreto e que efectivamente foi afastada com fundamento em inconstitucionalidade material, por violação do princípio da igualdade.

Conforme parece depreender-se da decisão recorrida, o juízo de inconstitucionalidade assentou na verificação de que "este normativo [o artigo 18.º, com as suas diversas alíneas], conjugado com o artigo 10.º que tinha como pressuposto do pagamento da tarifa a produção de lixo e, actualmente (desde 9 de Agosto de 1998) é obrigatório 'independentemente da quantidade de lixo produzido e ou depositado', se afigura materialmente inconstitucional, por ofender o princípio da igualdade dos munícipes de Paredes, pela incidência coactiva e desproporcionada de uma tarifa (taxa) que é exigida pelo poder administrativo, principalmente aos industriais e comerciantes, em razão de um serviço público que não é prestado nem tributado de forma igualitária, mas discriminatória, ultrapassando o que seria proporcional e razoável, já que a tarifa passou a ser 'independentemente da quantidade de lixo produzido e ou depositado' (cf. o n.º 2 do artigo 10.º da postura), o que significa que a causalidade da tarifa (taxa) nada tem a ver directamente com o lixo, mas tão-somente, com a área dos estabelecimentos, sendo apelidado como um 'imposto de superfície' e não a contraprestação de um serviço público prestado com um mínimo de qualidade ao consumidor obrigado a pagá-lo, sob pena de procedimento contra-ordenacional".

Não figura no requerimento de interposição de recurso qualquer referência ao n.º 2 do artigo 10.º da postura; não sendo admissível a ampliação do objecto do recurso nas alegações, não pode considerar-se a norma correspondente, não se apreciando, portanto, a questão da conformidade constitucional da imposição do pagamento da tarifa mas, tão-somente, a definição do critério de cálculo do montante devido, para o lixo industrial.

Também não serão analisadas as regras relativas às diversas formas de recolha do lixo (artigo 3.º da postura), como parecem sugerir as alegações do recorrente, ao referir os "processos técnicos e a periodicidade de recolha dos lixos", por também excederem o objecto do presente recurso.

Considera-se, finalmente, que a omissão da alínea D) no mesmo requerimento de interposição de recurso, que indica como "norma cuja aplicação foi recusada e que deverá ser objecto de apreciação pelo Tribunal Constitucional: artigo 18.º, n.º 1, alíneas B), C), E) e F), da postura [...]" se deve a lapso de escrita evidente, detectado do confronto do requerimento de interposição de recurso, quer com a decisão recorrida, quer com as alegações, sendo certo que não teria qualquer sentido a interposição do presente recurso se não se pretendesse abranger a alínea D).

4 - É o seguinte o teor do referido artigo 18.º, na parte relevante:

"Artigo 18.º

1 - As tarifas previstas no artigo 10.º são definidas nos seguintes termos:

...

D) Indústria, indústria hoteleira e afins (designadamente cafés, bares, restaurantes) oficinas de reparação, hospitais, centros de saúde, clínicas médicas e supermercados - a tarifa a pagar é determinada pela área em metros quadrados correspondente a cada estabelecimento:

...

Com área de 601 a 800 m2 - 8000$00;

...

O Tribunal Constitucional já por diversas vezes se pronunciou pela não inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 10.º da postura em questão, que determina a obrigação de pagamento de uma tarifa independentemente da "quantidade de lixo produzida e ou depositada".

Como se disse, esta norma não integra o objecto do presente recurso, é, todavia, conveniente recordar que, segundo jurisprudência constante, este Tribunal julgou que tal tarifa, não obstante incidir sobre todos os munícipes e não depender da quantidade de lixo efectivamente produzido, se traduz numa verdadeira taxa e não num imposto (cf., entre outros, os Acórdãos n.os 1139/96, 1140/96, 140/97 e 141/97 deste Tribunal).

O Tribunal Constitucional considerou então não ser ilegítimo, do ponto de vista constitucional, fazer assentar numa presunção a determinação do índice para a definição do montante a cobrar, até por ser impossível a determinação individual do volume de lixo efectivo.

Assim, no Acórdão 1139/96, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 10 de Fevereiro de 1997, julgou-se que "a imposição das tarifas à totalidade dos munícipes (e todos, seguramente, hão-de, em menor ou maior quantidade, 'produzir' lixo) não é algo que se configura como ilógico, aleatório, desproporcionado ou dependente de presunção irrealista, motivo pelo qual se não deverá deixar de concluir que a base, pressuposto ou índice da determinação dos sujeitos àquelas tarifas também não conduziria [...] a transmutar a natureza de taxa da tarifa em crise".

No Acórdão 1140/96, publicado também no Diário da República, 2.ª série, de 10 de Fevereiro de 1997, afirmando-se embora que "o montante da tarifa não se acha fixado nesse artigo 10.º, n.º 2, sim no artigo 18.º, que não constitui objecto do recurso. Depois, os montantes constantes deste artigo 18.º - que, quanto aos lixos industriais e especiais, varia em função da área do estabelecimento - não se revelam excessivos. Finalmente, o próprio facto de o montante da tarifa exceder, eventualmente, o custo do serviço de recolha e destino do lixo não é, de per si, suficiente para que tal tributo deva ficar submetido ao regime dos impostos.

De facto, como se sublinhou no Acórdão 640/95 (publicado no Diário da República, 2.ª série, de 20 de Janeiro de 1996), a propósito das portagens, a pagar pela utilização da ponte sobre o Tejo, cujos montantes foram fixados pela Portaria 351/94, de 3 de Junho, as opções feitas pelo legislador (ou pela Administração) na fixação do montante das taxas são, em princípio, insindicáveis por este Tribunal, que, quando muito, poderá cassar as decisões legislativas (ou regulamentares), se, entre o montante do tributo e o custo do bem ou serviço prestado, houver uma desproporção intolerável - se a taxa for de montante manifestamente excessivo".

Embora no presente recurso apenas esteja em causa o critério de definição do montante da tarifa a pagar, e não o âmbito subjectivo dessa obrigação, a verdade é que são transponíveis as razões apontadas.

Assim, tal como não é viável fazer funcionar um sistema municipal de recolha de lixo se houver, caso a caso, que determinar quem o produz e quem o não produz, justificando-se a presunção de que provém de todos os munícipes, também se não afigura viável determinar que quantidade de lixo resulta, em geral, de cada um. Note-se que há tarifas próprias para os "lixos especiais", nos termos da alínea F) do n.º 1 do artigo 18.º da postura.

Para além disso, e como se escreveu no Acórdão 640/95, num trecho já atrás transcrito, cabe na liberdade do legislador (da Administração, mediante regulamento, no caso) a determinação do montante das taxas a cobrar, não competindo a este Tribunal a sua apreciação, a não ser que "entre o montante do tributo e o custo do bem ou serviço prestado, [haja] uma desproporção intolerável - se a taxa for de montante manifestamente excessivo".

Não é, seguramente, o caso.

Não se afigurando desrazoável nem arbitrário o índice escolhido - a área do estabelecimento industrial - nem de montante manifestamente excessivo o quantitativo definido para cada área, não pode haver-se como infringido o princípio da igualdade.

Assim, decide-se não julgar inconstitucional a norma constante da alínea D) do n.º 1 do artigo 18.º da postura sobre sistema de lixos e higiene pública, determinando-se, consequentemente, a reforma da decisão recorrida, no que toca à questão de constitucionalidade.

Lisboa, 12 de Janeiro de 1999. - Maria dos Prazeres Beleza - Messias Bento - José de Sousa e Brito - Alberto Tavares da Costa - Luís Nunes de Almeida.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1765881.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1988-11-30 - Portaria 768/88 - Ministério do Planeamento e da Administração do Território

    Comete à Direcção-Geral da Qualidade do Ambiente a competência de fiscalização referida no n.º 3 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 488/85, de 25 de Novembro, sobre resíduos sólidos urbanos.

  • Tem documento Em vigor 1994-06-03 - Portaria 351/94 - Ministérios das Finanças e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    FIXA AS TAXAS DE PORTAGEM A COBRAR PELA UTILIZAÇÃO DA PONTE SOBRE O TEJO EM LISBOA. A PRESENTE PORTARIA ENTRA EM VIGOR NO DIA IMEDIATO AO DA SUA PUBLICAÇÃO.

  • Tem documento Em vigor 1995-03-14 - Portaria 189/95 - Ministério da Educação

    AUTORIZA O INSTITUTO SUPERIOR DE MATEMÁTICA E GESTÃO - ISMAG, EM LISBOA A MINISTRAR O CURSO DE ARQUITECTURA, DE ACORDO COM O PLANO DE ESTUDOS PUBLICADO EM ANEXO, CONFERIDO PELA CONCLUSAO DO MESMO O GRAU DE LICENCIADO.

  • Tem documento Em vigor 1995-11-20 - Decreto-Lei 310/95 - Ministério do Ambiente e Recursos Naturais

    Estabelece as regras a que fica sujeita a gestão de resíduos.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-09 - Decreto-Lei 239/97 - Ministério do Ambiente

    Estabelece as regras a que fica sujeita a gestão de resíduos, nomeadamente a sua recolha, transporte, armazenagem, tratamento, valorização e eliminação.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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