Decreto-Lei 53/88
de 25 de Fevereiro
O presente diploma visa solucionar, de uma forma directa e objectiva, a actual situação da justiça fiscal, reconhecidamente ineficaz e provocadora de sérios prejuízos tanto para os contribuintes como para o Estado.
As razões para se ter chegado a tal situação devem encontrar-se no ainda complexo sistema fiscal vigente e no turbulento período que a economia portuguesa atravessou nos primeiros anos de edificação da democracia, o qual deixou sequelas bem vincadas, que ainda apresentam as suas marcas.
Ao mesmo tempo que o Governo estuda e prepara a entrada em vigor da reforma fiscal, agora essencialmente no domínio da tributação directa e depois de ter, com êxito, reformulado a tributação indirecta, importa corrigir as distorções que vêm do passado e que se acumularam num volume insustentável.
Como tal, o Governo entende assumir medidas, de excepção e temporárias, sem dúvida, mas eficazes, no sentido de se atingir a breve trecho a operacionalidade da justiça fiscal em termos justos, objectivo essencial a prosseguir.
A presente iniciativa apresenta-se, assim, com carácter excepcional e sob a forma de derradeira oportunidade.
A prevista entrada em vigor da reforma fiscal, que incluirá um novo enquadramento jurídico das infracções fiscais e uma reformulação processual fiscal, obriga a que o sistema se encontre em funcionamento em todos os seus vectores, designadamente no da justiça fiscal, ficando dotado de uma mais eficiente e correcta coercibilidade e da possibilidade de satisfação atempada dos litígios.
Com os tribunais tributários desimpedidos e um novo enquadramento mais aperfeiçoado em vigor, nada justificará no futuro a tomada de medidas semelhantes à actual.
Assim, são concedidas aos contribuintes faltosos determinadas facilidades, num período de tempo limitado, sempre sem alterar os valores de incidência das contribuições e impostos, a fim de que possam regularizar a sua situação perante o fisco.
Neste sentido, poderão ser regularizadas as dívidas exigidas, tanto em processos executivos como de transgressão, com o total perdão de juros e redução de multas e desde que no período previsto sejam pagos os impostos devidos ou, acordado um esquema de pagamentos a prestações dentro de certos parâmetros, sendo progressiva a onerosidade consoante o prazo de pagamento.
Contemplam-se também as situações que possam ser de necessária analise concreta, tendo em atenção o volume da dívida, e que, quase sempre, arrastam consigo consequências no campo sócio-económico e mesmo de manutenção de postos de trabalho ou salários, o que importa salvaguardar.
Obviamente que o não aproveitamento de tais facilidades implicará, porque libertados os meios para tal, o accionar imediato dos mecanismos legais adequados à concretização das sanções previstas e da cobrança das dívidas.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º As importâncias devidas por contribuições, impostos, taxas ou outras receitas administrados pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos provenientes de obrigações cujo prazo de cobrança voluntária tenha terminado até 31 de Dezembro de 1987 poderão ser satisfeitas nos termos constantes do presente diploma.
Art. 2.º - 1 - As dívidas exigidas em processos executivos podem ser regularizadas nas seguintes condições:
a) Pagamento da quantia exequenda na totalidade, nos três meses seguintes ao da entrada em vigor do presente diploma, com dispensa de juros de mora e de custas;
b) Pagamento até 18 prestações mensais, no caso de a quantia exequenda exceder 500000$00, não podendo nenhuma delas ser inferior a 100000$00,
c) Pagamento até 36 prestações mensais, no caso de a quantia exequenda exceder 5000000$00 não podendo nenhuma delas ser inferior a 200000$00.
2 - Nas situações referidas nas alíneas b) e c) do número anterior haverá lugar a:
a) Dispensa de juros de mora, quanto às prestações pagas nos três meses imediatos ao da entrada em vigor do presente diploma;
b) Redução dos juros de mora ao quantitativo equivalente a 0,15% da totalidade dos juros contados nos termos do n.º 8, quanto à prestação paga no quarto mês imediato ao da entrada em vigor deste diploma, aumentando a percentagem para as restantes prestações em 0,15% por cada mês a mais;
c) Redução das custas a 3% da quantia exequenda, a título de imposto de justiça.
3 - A primeira prestação deverá ser paga dentro dos três meses subsequentes ao da entrada em vigor do presente diploma, vencendo-se a segunda no mês imediato ao do pagamento da primeira e cada uma das restantes no mês seguinte ao da imediatamente anterior.
4 - Poderão ser antecipadas prestações, com o benefício da redução dos juros de mora correspondente ao mês em que o pagamento for satisfeito.
5 - As custas serão pagas em conjunto com a última prestação, perdendo o executado o direito à redução caso não satisfaça esta condição.
6 - Nos casos previstos na alínea c) do n.º 1 e desde que se verifique notória dificuldade financeira e previsíveis consequências económicas graves para os contribuintes, pode o Ministro das Finanças, por despacho sobre requerimento do interessado, alargar o número de prestações mensais até cinco anos e o início da contagem da progressividade do pagamento dos juros, nos termos da alínea b) do n.º 2, a partir da 24.ª prestação.
7 - O requerimento do interessado, devidamente fundamentado, deve ser apresentado nos 60 dias seguintes ao da entrada em vigor deste diploma na repartição de finanças da área da sua sede ou domicílio.
8 - Para os efeitos da alínea b) do n.º 2, os juros de mora serão os contados até ao mês da entrada em vigor, inclusive, deste diploma.
Art. 3.º - 1 - As infracções originadas pelo incumprimento da obrigação de imposto, designadamente as provenientes de autoliquidação ou retenção na fonte, praticadas até 31 de Dezembro de 1987 poderão, desde que não haja ainda sentença condenatória, ser regularizadas nos termos dos números seguintes.
2 - Existindo auto de notícia:
a) Pagamento da totalidade do imposto e juros compensatórios em dívida nos três meses seguintes ao da entrada em vigor do presente diploma, com dispensa de custas e redução da multa a 5% do quantitativo do imposto em falta;
b) Pagamento do imposto e juros compensatórios nos termos estabelecidos nas alíneas b) ou c) do n.º 1 do artigo 2.º, com dispensa das custas que seriam devidas no processo de transgressão e redução da multa a 20% do quantitativo do imposto em falta.
3 - Não tendo sido ainda levantado auto de notícia poderá o infractor beneficiar das condições previstas no n.º 2 deste artigo, desde que o requeira ao chefe da repartição de finanças competente nos três meses subsequentes ao da entrada em vigor do presente diploma e apresente os elementos necessários à liquidação do imposto, caso ainda o não tenha feito, pagando no mesmo prazo a totalidade da dívida ou a primeira prestação.
4 - Não se mostrando liquidados o imposto e juros compensatórios até ao final do terceiro mês subsequente ao da entrada em vigor do presente diploma, poderá o infractor beneficiar das condições estabelecidas nas alíneas a) ou b) do n.º 2, desde que efectue o pagamento na totalidade ou da primeira prestação no mês seguinte ao da notificação da liquidação.
5 - As multas serão pagas em conjunto com a primeira prestação e reverterão integralmente para o Estado.
6 - É aplicável à divisão em prestações e ao seu vencimento o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 2.º
7 - Nas situações previstas no n.º 3, o não cumprimento das condições impostas neste diploma implica o imediato levantamento de auto de notícia.
Art. 4.º - 1 - Nos casos referidos no artigo anterior, poderão ser concedidas facilidades excepcionais aos infractores cujos impostos e juros compensatórios em dívida excedam 5000000$00 e desde que os mesmos apresentem notórias dificuldades financeiras e previsíveis consequências económicas graves.
2 - As facilidades serão concedidas por despacho do Ministro das Finanças, sobre requerimento fundamento apresentado pelo interessado, nos termos e com os limites previstos nos n.os 6 e 7 do artigo 2.º
Art. 5.º - 1 - Às infracções respeitantes ao incumprimento de obrigações tributárias acessórias praticadas até 31 de Dezembro de 1987 e desde que não haja ainda sentença condenatória será aplicado o mínimo da multa estabelecido na lei, reduzido a 75%, desde que o seu pagamento se efectue nos três meses seguintes ao da entrada em vigor do presente diploma.
2 - Nas situações regularizadas nos termos do número anterior não são devidas custas no respectivo processo de transgressão.
3 - Se a infracção consistir na falta de apresentação de declarações, participações ou outros documentos com interesse para o apuramento da situação tributária do infractor, ou na sua inexactidão, este só poderá beneficiar do regime previsto no n.º 1 se, nos três meses imediatos ao da entrada em vigor deste diploma, suprir ou corrigir a falta.
Art. 6.º Poderão igualmente beneficiar das facilidades de pagamento previstas no artigo 2.º do presente diploma os terceiros que efectuem de pronto o pagamento da dívida nos termos do artigo 25.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos.
Art. 7.º Nos processos de execução fiscal em que já se encontre designada data para a arrematação dos bens penhorados suspender-se-á a praça se o executado efectuar o pagamento da primeira prestação até àquela data ou comprovar ter requerido a concessão das facilidades excepcionais a que aludem o n.º 6 do artigo 2.º e o artigo 4.º
Art. 8.º - 1 - As facilidades estabelecidas neste diploma cessam logo que o pagamento de qualquer das prestações não seja efectuado no prazo do seu vencimento, prosseguindo os processos, nesse caso, a sua tramitação normal.
2 - Serão levadas em conta, todavia, as importâncias pagas.
Art. 9.º Os prazos de prescrição das dívidas e do procedimento judicial suspendem-se durante o período do pagamento em prestações.
Art. 10.º - 1 - Mantêm-se em vigor os regimes de pagamento em prestações já autorizados, salvo se o interessado declarar, por escrito ou termo no processo, nos três meses seguintes ao da entrada em vigor do presente diploma, a sua opção pelos esquemas aqui previstos.
2 - O presente diploma não prejudica a aplicação de outros regimes legais vigentes mais favoráveis aos infractores ou executados.
Art. 11.º - 1 - As dívidas constantes de processos de execução fiscal instaurados até 31 de Dezembro de 1987 de valor não superior a 10000$00 poderão ser julgadas em falhas.
2 - A informação referente a estes processos será carregada em ficheiro informático para posterior identificação e eventual reactivação dos processos dentro do prazo de prescrição.
Art. 12.º É atribuída competência ao chefe da repartição de finanças para, nas situações regularizadas nos termos deste diploma, arquivar o respectivo processo, sem procedimento judicial.
Art. 13.º Este diploma não é aplicável ao incumprimento de obrigações no âmbito do imposto sobre o valor acrescentado.
Art. 14.º Fica revogado o artigo 4.º do Decreto-Lei 746/75, de 31 de Dezembro.
Art. 15.º O presente diploma entra em vigor em 29 de Fevereiro de 1988.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 7 de Janeiro de 1988. - Aníbal António Cavaco Silva - Miguel José Ribeiro Cadilhe.
Promulgado em 1 de Fevereiro de 1988.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 4 de Fevereiro de 1988.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.