Resolução do Conselho de Ministros n.º 82/2009
As zonas costeiras assumem uma importância estratégica em termos ambientais, económicos, sociais, culturais e recreativos, pelo que o aproveitamento das suas potencialidades e a resolução dos seus problemas exigem uma política de desenvolvimento sustentável apoiada numa gestão integrada e coordenada dessas áreas.
Tal constatação determinou o compromisso assumido pelos países com zonas costeiras, incluindo os da União Europeia, no âmbito da Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento Sustentável realizada em 1992 no Rio de Janeiro, de promover o desenvolvimento sustentável e a gestão integrada das zonas costeiras e
marinhas.
No seguimento desse compromisso, foram desenvolvidos diversos projectos e programas a nível comunitário, nos quais Portugal participou, que deram origem ao designado Programa de Demonstração. Este Programa permitiu reunir um conjunto de orientações e conclusões sobre a gestão integrada das zonas costeiras na Europa, das quais resultou a Recomendação 2002/413/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2002, relativa à execução da gestão integrada da zona costeira na Europa, que define princípios gerais e opções para uma Estratégia de Gestão Integrada de Zonas Costeirasna Europa.
De acordo com esta recomendação, cabe aos Estados membros estabelecer os fundamentos de tal estratégia, a qual deve garantir a protecção e requalificação do litoral, o seu desenvolvimento económico e social, bem como a coordenação de políticas com incidência na zona costeira. O documento prevê um prazo de 45 meses para os Estados membros apresentarem à Comissão os resultados da adopção da recomendação.Ao nível comunitário outras políticas sectoriais reflectem igualmente esta necessidade, com destaque para a Directiva Quadro da Água (Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro, que estabelece um quadro de acção comunitária no domínio da política da água) e a Directiva Quadro Estratégia Marinha (Directiva n.º 2008/56/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Junho, que estabelece um quadro de acção comunitária no domínio da política para o meio
marinho).
Também em Portugal, o reconhecimento da importância estratégica da zona costeira, bem como da necessidade de proceder à sua protecção e gestão integrada, levou a que nas últimas três décadas fossem desenvolvidas várias iniciativas públicas, que se iniciaram com a clarificação do regime jurídico dos terrenos do domínio público marítimo pelo Decreto-Lei 468/71, de 5 de Novembro, medida inovadora e precursora da filosofia de constituição de uma faixa de protecção do litoral e adoptada posteriormente em outros países europeus, e que tiveram continuidade com o regime dos planos de ordenamento da orla costeira, aprovado pelo Decreto-Lei 309/93, de 2 de Setembro, a Estratégia para a Orla Costeira Portuguesa, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 86/98, de 10 de Julho, e a Estratégia Nacional da Conservação da Natureza, adoptada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 152/2001, de 11 de Outubro, no âmbito da qual a política do litoral, nas suas vertentes terrestre e marinha, é assumida como de crucial importânciapara a prossecução dos seus objectivos.
A necessidade de uma visão estratégica de gestão integrada do litoral está claramente expressa no Programa do XVII Governo Constitucional, que consigna para as zonas costeiras o desenvolvimento de uma política integrada e coordenada, em articulação com a política do mar, que favoreça a protecção ambiental e a valorização paisagística mas que enquadre, também, a sustentabilidade e qualificação das actividades económicas queaí se desenvolvem.
O Programa do XVII Governo Constitucional estabelece ainda que sejam intensificadas as medidas de salvaguarda dos riscos naturais na faixa costeira, designadamente por via de operações de monitorização e identificação de zonas de risco aptas a fundamentar os planos de acção necessários a uma adequada protecção, prevenção e socorro.Do mesmo passo, determina que seja estabelecida uma política integrada do Governo para os assuntos do mar e para a acção articulada de todas as entidades com competências ligadas ao mar, o que vem reforçar o firme empenhamento governamental de proceder a
uma abordagem convergente nestas matérias.
No que se refere à disciplina de ocupação do litoral, o Programa do XVII Governo Constitucional prevê a aprovação do último plano de ordenamento da orla costeira (POOC), da competência governamental, bem como a retoma da execução programadados restantes POOC.
Aprovados a Estratégia Nacional para o Mar, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 163/2006, de 12 de Dezembro, cujo plano de acção está em pleno desenvolvimento, e o último POOC, para a área territorial entre Vilamoura e Vila Real de Santo António, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 103/2005, de 24 de Junho, retomada a execução programada e articulada dos POOC, com a instituição de um modelo de coordenação estratégica, definido, e em execução, o Plano de Acção para o Litoral 2007-2013, aprovado por despacho do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, de 9 de Outubro de 2007, no qual são identificadas as acções prioritárias a desenvolver, em especial em matéria de prevenção, protecção e monitorização das zonas de risco, aprovadas três operações integradas de requalificação do Litoral - Polis do Litoral - em áreas particularmente sensíveis, ria Formosa (Decreto-Lei 92/2008, de 3 de Junho), ria de Aveiro (Decreto-Lei 11/2009 de 12 de Janeiro), Litoral Norte (Decreto-Lei 231/2008, de 28 de Novembro), e do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, já aprovado em Conselho de Ministros, resta, para completar o estipulado no Programa do Governo, aprovar esta Estratégia Nacionalpara a Gestão Integrada da Zona Costeira.
O procedimento de elaboração da Estratégia iniciou-se em 2006 com a elaboração do documento «Bases para a estratégia de gestão integrada da zona costeira nacional», colocado à discussão pública no início de 2006 e divulgado em 2007 através da sua publicação pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e doDesenvolvimento Regional.
Na sequência desse documento foi desenvolvida, sob coordenação do Instituto da Água, I.P., enquanto autoridade nacional da água, uma proposta de Estratégia Nacional para a Gestão Integrada da Zona Costeira (ENGIZC) tomando como referência estudos anteriores e beneficiando de uma consulta alargada a diversas entidades públicas,
privadas e da comunidade científica.
A ENGIZC é coerente com as restantes estratégias, políticas e programas nacionais, nomeadamente a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 109/2007, de 20 de Agosto, o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, aprovado pela Lei 58/2007, de 4 de Setembro, a Estratégia Nacional para o Mar, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 163/2006, de 12 de Dezembro, a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 152/2001, de 11 de Outubro, a Estratégia Nacional para a Energia, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 169/2005, de 24 de Outubro, as Orientações Estratégicas para o Sector Marítimo-Portuário, apresentadas pelo Governo em Dezembro de 2006, o Plano Estratégico Nacional das Pescas, o Plano Estratégico Nacional de Turismo, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 57/2007, de 4 de Abril, o Programa Nacional de Turismo de Natureza, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 112/98, de 25 de Agosto, as Perspectivas para a Sustentabilidade da Região Autónoma dos Açores, o Plano de Ordenamento Turístico dos Açores, o Plano de Ordenamento Turístico da Madeira e os planos de ordenamento da orla costeira.A ENGIZC reafirma os desígnios nacionais conferidos pelo actual quadro legal em vigor, reforçando a visão integradora que se deseja para a zona costeira, consagrando novos desígnios fruto de outros referenciais e garantindo a articulação com o planeamento e gestão do espaço marítimo e com a conservação do meio marinho.
Cumprindo as orientações comunitárias, a ENGIZC foi delineada definindo uma visão para um período de 20 anos, sem prejuízo de recorrer aos mecanismos de avaliação e revisão necessários, assumindo assim o carácter exigido por um documento de natureza
estratégica e de longo prazo.
A ENGIZC tem como visão uma zona costeira harmoniosamente desenvolvida e sustentável, baseada numa abordagem sistémica e de valorização dos seus recursos e valores identitários, suportada no conhecimento e gerida segundo um modelo que articula instituições, políticas e instrumentos e assegura a participação dos diferentes actoresintervenientes.
A visão adopta os princípios definidos no documento «Bases para a gestão integrada da zona costeira nacional», os quais integram as orientações comunitárias e o sistema de valores reflectidos nos instrumentos de gestão territorial nacionais: sustentabilidade e solidariedade intergeracional; coesão e equidade social; prevenção e precaução;abordagem sistémica; conhecimento científico e técnico; subsidiariedade; participação;
co-responsabilização; operacionalidade.
Considerando o quadro de referência adoptado e a visão e princípios definidos, foi estabelecido um conjunto de opções estratégicas em coerência com os resultados da avaliação ambiental estratégica, desenvolvida de acordo com o Decreto-Lei 232/2007,de 15 de Junho.
As opções estratégicas para a prossecução da visão apontam para:i) Um modelo de ordenamento e desenvolvimento da zona costeira que articule as dinâmicas socioeconómicas com as ecológicas na utilização dos recursos e na gestão de
riscos (abordagem ecossistémica);
ii) Um modelo institucional alicerçado na articulação de competências baseada na co-responsabilização institucional e no papel coordenador de uma entidade de âmbitonacional; e
iii) Um modelo de governança assente na cooperação público-privado, que aposte na convergência de interesses através do estabelecimento de parcerias, da co-responsabilização e da partilha de riscos.Assumindo de uma forma clara a natureza sectorialmente transversal da ENGIZC, foram considerados quatro objectivos de carácter horizontal, complementados por quatro objectivos de carácter temático, que reflectem a especificidade e identidade da zona costeira e que permitem concretizar a visão e as opções estratégicas. Estes objectivos concretizam-se através de um conjunto de 20 medidas, cuja descrição é sistematizada através de indicadores fundamentais para a sua operacionalização.
Assim, são definidos como objectivos transversais:
i) Desenvolver a cooperação internacional;
ii) Reforçar e promover a articulação institucional e a coordenação de políticas einstrumentos;
iii) Desenvolver mecanismos e redes de monitorização e observação;iv) Promover a informação e a participação pública.
Quanto aos objectivos temáticos, adoptam-se os seguintes:
i) Conservar e valorizar os recursos e o património natural, cultural e paisagístico;
ii) Antecipar, prevenir e gerir situações de risco e de impactes de natureza ambiental,
social e económica;
iii) Promover o desenvolvimento sustentável de actividades geradoras de riqueza e que contribuam para a valorização de recursos específicos da zona costeira;iv) Aprofundar o conhecimento científico sobre os sistemas, os ecossistemas e as
paisagens costeiros.
A concretização da ENGIZC assenta num modelo de governança que aposta na valorização do conhecimento de suporte e nas especificidades de um quadro institucional caracterizado pela diversidade e sobreposição de múltiplas tutelas e jurisdições. O modelo de governança, que conta com uma plataforma de nível interministerial, coordenada pelo Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, identifica o INAG, enquanto autoridade nacional da água, como entidade que coordena a execução da ENGIZC e promove a dinamização de plataformas técnicas de concertação e produção de conhecimento que funcionarão de acordo com um modelo flexível, envolvendo entidades da Administração, organizações não governamentais e instituiçõesuniversitárias e de investigação.
A elaboração da ENGIZC teve em consideração:i) A importância estratégica da zona costeira em termos ambientais, económicos, sociais, culturais e recreativos, bem como a sua significativa fragilidade e a situação de risco em que se encontra e que se tem vindo a agravar progressivamente;
ii) O quadro institucional e legal vigente, os compromissos internacionais e
comunitários assumidos por Portugal;
iii) A Recomendação 2002/413/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio, relativa à execução da gestão integrada da zona costeira na Europa, que define princípios gerais e opções para uma Estratégia de Gestão Integrada de Zonas Costeirasna Europa;
iv) A firme vontade política em promover uma gestão integrada da zona costeira em articulação com as políticas sectoriais relevantes, nomeadamente com a Estratégia Nacional para o Mar, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 163/2006, de12 de Dezembro.
O Governo reconhece, assim, a necessidade de dotar o país de uma Estratégia Nacional para a Gestão Integrada da Zona Costeira que congregue os objectivos fundamentais e as opções estratégicas que deverão presidir a uma política de ordenamento, planeamento e gestão desta zona e servir de referência à actuação das entidades públicas e privadas, dacomunidade científica e dos cidadãos.
A ENGIZC foi objecto de um procedimento de discussão pública, do qual resultaram contributos que foram ponderados e integrados na versão final.Foram ouvidos os órgãos de governo próprio da Região Autónoma da Madeira e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Foi promovida a audição dos órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:Aprovar a Estratégia Nacional para a Gestão Integrada da Zona Costeira, que consta do anexo à presente resolução e que dela faz parte integrante, a qual fornece o referencial para os planos, programas e estratégias com incidência na zona costeira, de acordo com a Recomendação 2002/413/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio.
Presidência do Conselho de Ministros, 20 de Agosto de 2009. - O Primeiro-Ministro, José
Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
(ver documento original)