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Acórdão do Tribunal Constitucional 313/2008, de 2 de Julho

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Sumário

Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do trecho final do artigo 41.º, n.º 2, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 191-B/79, de 25 de Junho (Processo n.º 199/08).

Texto do documento

Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 313/2008

Processo 199/08

Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional.

I - Relatório. - 1 - O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional requereu, nos termos do artigo 82.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), a apreciação e a declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da norma constante do trecho final do artigo 41.º, n.º 2, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, aprovado pelo Decreto-Lei 142/73, de 31 de Março, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei 191-B/79, de 25 de Junho, na parte em que determina que a pensão de sobrevivência será devida a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que tal pensão tenha sido requerida.

O teor da norma em questão é o seguinte (de acordo com a rectificação constante do Diário da República, 1.ª série, n.º 193, de 22 de Agosto de 1979, a pp. 2032-2033):

«2 - Aquele que, no momento da morte do contribuinte, estiver nas condições previstas no artigo 2020.º do Código Civil, só será considerado herdeiro hábil, para efeitos de pensão de sobrevivência, depois de sentença judicial que lhe fixe o direito a alimentos e a pensão de sobrevivência será devida a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que a requeira, enquanto se mantiver o referido direito.» Aduz o requerente que o referido segmento normativo foi, em fiscalização concreta, julgado inconstitucional, por violação do princípio da igualdade - decorrente da injustificada diversidade de tratamento que ocorre quando comparado tal regime com o estabelecido no Decreto Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro, para os beneficiários da Segurança Social, em que a pensão é devida a partir do início do mês seguinte ao do falecimento do beneficiário, quando requerida nos seis meses posteriores ao trânsito em julgado da sentença que reconheça o direito invocado por quem se encontrava nas condições previstas no artigo 2020.º do Código Civil - , através dos Acórdãos n.os 522/2006, 195/2007 e 233/2007.

2 - Notificado nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da LTC, o Primeiro-Ministro, em resposta, ofereceu o merecimento dos autos.

3 - Debatido o memorando apresentado, nos termos do artigo 63.º da LTC, pelo Presidente do Tribunal, e fixada a orientação do Tribunal, procedeu-se à distribuição do processo, cumprindo agora formular a decisão.

II - Fundamentação. - 4 - Não se suscitam dúvidas quanto ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 281.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 82.º da LTC, tendo o Tribunal Constitucional julgado inconstitucional a norma em causa nos três acórdãos identificados pelo requerente - Acórdãos n.os 522/2006, 195/2007 e 233/2007 - , juízo esse que, aliás, veio a ser reiterado nos Acórdãos n.os 298/2007, 484/2007 e 575/2007 e nas decisões sumárias n.os 577/2006 e 43/2008, encontrando-se o texto integral de uns e outras disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

5 - No âmbito do sistema da segurança social, quer no denominado «regime geral» quer no regime específico da função pública, o legislador previu, para a eventualidade da morte dos respectivos contribuintes ou beneficiários, a concessão da denominada «pensão de sobrevivência», verificados determinados requisitos, a certas categorias de familiares dos mesmos (os «herdeiros hábeis», na terminologia do Decreto-Lei 142/73), estabelecendo o artigo 30.º, n.º 1, deste diploma, na versão originária, a regra geral de que «a pensão de sobrevivência [...] vence-se no primeiro dia de cada um dos meses posteriores ao do óbito do contribuinte».

O Decreto-Lei 191-B/79 - com o proclamado propósito de «adaptar o regime das pensões de sobrevivência dos funcionários e agentes da Administração Pública, que data de 1973, às grandes linhas que, após o 25 de Abril de 1974, passaram a enformar o ordenamento jurídico português» e de «designadamente numa perspectiva de aproximação progressiva de um regime de segurança social unificado de acordo com a Constituição [...] acolhe[r] os princípios gerais que, em sede de direito da família, presidiram às alterações introduzidas no Código Civil», entre as quais o «acolhimento do princípio da relevância de uniões de facto, de alguma forma equiparáveis à sociedade conjugal, de harmonia com a redacção actual do artigo 2020.º do Código Civil» (do preâmbulo do diploma) - alterou a redacção da alínea a) do n.º 1 do artigo 40.º e do artigo 41.º do Decreto-Lei 142/73, passando a reconhecer expressamente às pessoas que estiverem nas condições do artigo 2020.º do Código Civil o direito à pensão de sobrevivência como herdeiros hábeis dos contribuintes, e dispondo no n.º 2 do artigo 41.º que estas pessoas só seriam consideradas herdeiros hábeis para efeitos de pensão de sobrevivência depois de sentença judicial que lhes tivesse fixado o direito a alimentos e que a pensão só seria devida a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que a requeressem, e enquanto se mantivesse o referido direito. Por outro lado, na nova redacção dada ao artigo 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei 142/73, estabeleceu-se a regra de que «a pensão de sobrevivência [...] é devida desde o dia 1 do mês seguinte em que se verificar o óbito do contribuinte quando pedida no prazo de seis meses contados a partir da mesma data, ou desde o dia 1 do mês seguinte ao da apresentação do requerimento no Montepio quando solicitada, a todo o tempo, depois de esgotado aquele prazo».

No âmbito do regime geral da segurança social, foi o Decreto-Lei 322/90, de 18 de Outubro, que procedeu ao alargamento às situações de facto previstas no artigo 2020.º do Código Civil do direito à pensão de sobrevivência (definida como a prestação pecuniária que tem «por objectivo, compensar os familiares de beneficiário da perda de rendimentos de trabalho determinada pela morte deste» - artigo 4.º, n.º 1), dispondo o seu artigo 8.º, sob a epígrafe «Situação de facto análoga à dos cônjuges»:

«1 - O direito às prestações previstas neste diploma e o respectivo regime jurídico são tornados extensivos às pessoas que se encontrem na situação prevista no n.º 1 do artigo 2020.º do Código Civil.

2 - O processo de prova das situações a que se refere o n.º 1, bem como a definição das condições de atribuição das prestações, consta de decreto regulamentar.» Foi o Decreto Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro, que deu execução a esta injunção, dispondo no seu artigo 6.º:

«A pensão de sobrevivência é atribuída a partir do início do mês seguinte ao do falecimento do beneficiário, quando requerida nos seis meses posteriores ao trânsito em julgado da sentença, ou a partir do início do mês seguinte ao da apresentação do requerimento, após o decurso daquele prazo.» Na sequência desta evolução legislativa, tem sido colocada a questão de saber se a diferença de regimes, quanto ao início da direito a pensão de sobrevivência reconhecido a quem vivia em situação de união de facto com o beneficiário falecido, consoante se trate de beneficiário do regime geral de segurança social ou de beneficiário do regime específico da função pública, é, ou não, compatível com o princípio constitucional da igualdade perante a lei, consignado no artigo 13.º, n.º 1, da CRP.

Como resulta do precedente relatório, o Tribunal Constitucional, nas diversas ocasiões em que foi chamado a pronunciar-se, sempre julgou inconstitucional a norma do artigo 41.º, n.º 2, do Estatuto de Pensões de Sobrevivência, na parte em que estabelece que a pensão de sobrevivência só é devida a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que seja requerida. Este entendimento é, aliás, sufragado pela orientação dominante que se formou a respeito desta matéria nos tribunais judiciais: cf., designadamente, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Abril de 2004 (processo 3582/03), de 1 de Março de 2007 (processo 136/07), de 25 de Setembro de 2007 (processo 2648/07), de 7 de Fevereiro de 2008 (processo 4789/07) e de 8 de Abril de 2008 (processo 777/08); do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Maio de 2005 (processo 9951/05), de 15 de Dezembro de 2005 (processo 10876/05), de 20 de Junho de 2006 (processo 1784/06), de 11 de Outubro de 2007 (processo 8213/07) e de 8 de Novembro de 2007 (processo 8699/07; do Tribunal da Relação do Porto de 27 de Março de 2008 (processo 1513/08); do Tribunal da Relação de Coimbra de 24 de Outubro de 2006 (processo 1215/06); do Tribunal da Relação de Évora, de 21 de Junho de 2007 (processo 657/07); e do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19 de Outubro de 2005 (processo 1796/05); mas, em sentido contrário, cf. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Março de 2007 (processo 493/07) (os textos integrais dos acórdãos citados estão disponíveis em www.dgsi.pt, nas bases relativas à jurisprudência dos tribunais referidos).

6 - O problema da constitucionalidade aqui em causa foi apreciado, em pormenor, no Acórdão 522/2006, nos seguintes termos:

«2.2.2 - [...] Está em causa [...] sempre no quadro geral da união de facto, relacionar a situação daqueles que, tendo adquirido o direito a auferir uma pensão de sobrevivência por morte do respectivo cônjuge de facto, se diferenciam, tão-só, pela circunstância de essa pensão se gerar por morte de um funcionário ou agente da Administração Pública [...], ou por morte de um beneficiário do denominado Regime Geral da Segurança Social.

No primeiro caso, definido judicialmente o direito à pensão, é a mesma devida, nos termos da norma em apreciação, desde o dia 1 do mês seguinte àquele em que tal pensão foi requerida. No segundo caso, gerado no âmbito do Regime Geral, a mesma pensão - ou seja, a pensão adquirida com base em pressupostos de facto substancialmente idênticos - é devida, nos termos do artigo 6.º do Decreto Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro, se requerida nos seis meses posteriores ao trânsito da decisão judicial que reconheça tal direito, ''a partir do início do mês seguinte ao do falecimento do beneficiário''. Sendo distintos os momentos fixados em cada caso para o começo das prestações (mais cedo relativamente aos beneficiários de pensão gerada no regime geral), coloca-se a questão da observância do princípio constitucional da igualdade relativamente a quem, fora do quadro desse Regime Geral, tenha actuado dentro de lapsos de tempo que conduziriam à primeira hipótese prevista no artigo 6.º do Decreto Regulamentar 1/94. É esta, enfim, a questão de igualdade que aqui importa dilucidar.

2.2.2.1 - Constitui jurisprudência assente e reiterada deste Tribunal a caracterização do princípio da igualdade, decorrente do artigo 13.º da CRP, como proibição do arbítrio (cf. o Acórdão 232/2003, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 17 de Junho de 2003, a pp. 3514/3531). Com tal sentido, nas palavras do Tribunal Constitucional, ''[o] princípio [da igualdade] não impede que, tendo em conta a liberdade de conformação do legislador, se possam (se devam) estabelecer diferenciações de tratamento, 'razoável, racional e objectivamente fundadas', sob pena de, assim não sucedendo, estar o legislador a incorrer em arbítrio, por preterição do acatamento de soluções objectivamente justificadas por valores constitucionalmente relevantes. Ponto é que haja fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada''. (Acórdão 319/2000, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 18 de Outubro de 2000, pp. 16 785/16 786.) Na sugestiva formulação do Tribunal Constitucional alemão (citado por Robert Alexy, Theorie der Grundrechte, Frankfurt, 1986, p. 370), o carácter arbitrário de uma diferenciação legal decorre da circunstância de «não ser possível encontrar [...] um motivo razoável, que surja da própria natureza das coisas ou que, de alguma forma, seja concretamente compreensível». Daí que «[n]ão exista razão suficiente para a permissão de uma diferenciação [legal] se todos os motivos passíveis de ser tomados em conta tiverem de ser considerados insuficientes. É justamente o que sucede, quando não se logra atingir uma fundamentação justificativa da diferenciação. A máxima de igualdade implica, assim, um ónus de argumentação justificativa para tratamentos desiguais» (Robert Alexy, ob. cit., p. 371).

2.2.2.2 - Constitui aqui elemento de igualdade fáctica a circunstância, comum aos dois termos da comparação, de o direito à pensão de sobrevivência ter sido adquirido em função do reconhecimento judicial de uma situação de união de facto com um beneficiário ou subscritor falecido. Este elemento, não expressando uma situação de igualdade fáctica absoluta, já que compara pensões geradas no chamado Regime Geral com pensões geradas no âmbito do Regime dos Funcionários e Agentes da Administração Pública, permite, no entanto, a qualificação da situação de ambos como essencialmente igual, isto em função de uma expressiva preponderância de elementos comuns. De facto, apreciando os dois regimes (o geral e o da Administração Pública), constata-se ocorrer em ambos, de forma substancialmente idêntica, a projecção da «relação jurídica de segurança social» (v. a caracterização desta em Ilídio das Neves, Direito da Segurança Social, Coimbra, 1996, pp. 299/309) na situação de união de facto, expressando esta (a união de facto), nos dois regimes e na base dos mesmos pressupostos, «a relação jurídica de vinculação, que assegura a ligação jurídica dos interessados ao sistema» (Ilídio das Neves, obra citada, p. 308).

A este propósito cumpre sublinhar não colher o argumento [...] segundo o qual um alegado (e hipotético) «valor muito inferior» [...] das pensões pagas pelo Regime Geral justificaria a diferenciação decorrente da norma ora em causa. Desde logo, porque o montante das pensões de sobrevivência pagas nos dois regimes varia em função de elementos cuja multiplicidade e coerência, dentro de cada um desses regimes, torna descabida uma comparação (dos dois regimes) assente na variável «valor da pensão» (v., quanto ao cálculo das pensões aqui em causa nos dois regimes, o artigo 28.º do EPS e os artigos 24.º e 25.º do Decreto-Lei 322/90, de 18 de Outubro, ex vi do disposto no artigo 1.º do Decreto Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro). Por outro lado, tal elemento («valor da pensão») deixa intocada a já referida expressiva preponderância de elementos comuns, ou seja, não descaracteriza as duas situações como sendo de igualdade essencial: em ambas se adquire o direito à pensão com base nos mesmos pressupostos e através de procedimentos substancialmente idênticos.

Nesta situação, que - repete-se - é de igualdade naquilo que expressa a essência relevante para a comparação, quaisquer especificidades do chamado Regime Geral de Segurança Social, relativamente ao Regime de Segurança Social dos Funcionários e Agentes da Administração Pública, porque referidas, como já se indicou, a elementos não relevantes para esta comparação concreta, perdem sentido e deixam de justificar, quanto à fixação do momento a partir do qual a pensão é devida, um tratamento menos vantajoso, como o decorrente do segmento final do n.º 2 do artigo 41.º do EPS, comparativamente ao artigo 6.º do Decreto Regulamentar 1/94. Não obstante, relativamente a essas (possíveis) especificidades de cada um dos regimes, sublinhar-se-á que o «programa constitucional» assenta, neste domínio, na ideia de unificação do sistema de segurança social - «[i]incumbe ao Estado organizar [...] um sistema de segurança social unificado» (artigo 63.º, n.º 2, da CRP) - e que, em tal quadro, a procura de soluções de igualdade não deixa de assumir uma espécie de «valor reforçado» no plano da convergência entre os regimes de protecção social da função pública e «os regimes do sistema de segurança social quanto ao âmbito material, regras de formação de direitos e atribuição das prestações» (artigo 124.º da Lei 32/2002, de 20 de Dezembro, que estabelece as bases do sistema de segurança social).

Da ausência de uma justificação relevante para a mencionada diferenciação «decorre a ofensa ao princípio constitucional da igualdade (artigo 13.º da CRP)».

Este entendimento foi reiterado nas posteriores decisões do Tribunal Constitucional inicialmente citadas, tendo no Acórdão 195/2007 sido invocados, no sentido da «preferência» pela regra do regime geral da segurança social, quer o reconhecimento de que essa regra integra a mais recente opção do legislador, quer a própria natureza da prestação em causa. Este último aspecto foi especialmente salientado na Recomendação 6/B/2006, do Provedor de Justiça (www.provedor-jus.pt/recomendacoes.php), onde se consignou:

«13 - Não há dúvida que o artigo 6.º do Decreto Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro, estabeleceu um regime muito mais generoso do que o preceito supra citado do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, tendo colocado um ponto final na distinção entre cônjuges e unidos de facto, a partir do momento em que estes se acham reconhecidos como herdeiros hábeis, por sentença judicial transitada em julgado.

14 - Já se viu, também, que as decisões jurisprudenciais mais recentes, sobre esta matéria em concreto, não encontram razões atendíveis que permitam justificar a diferença de datas de início do vencimento da pensão (muitas vezes significativas), entre o regime público e o regime geral de segurança social, para o exercício de direitos que são rigorosamente iguais.

15 - Atenta a natureza das pensões de sobrevivência, cuja finalidade é, para ambos os regimes (quer seja o da protecção social da função pública, quer seja o do sistema de segurança social), a de compensar os familiares/herdeiros hábeis do beneficiário da perda dos rendimentos de trabalho determinada pela morte deste, também não se me vislumbram outras justificações que possam estar na origem do estabelecimento de datas diferentes para o início do vencimento das pensões.

16 - Como bem refere Rita Lobo Xavier [in artigo intitulado ''Uniões de facto e pensão de sobrevivência. Anotação aos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 195/03 e 88/04'', publicado na Jurisprudência Constitucional, n.º 3, Julho-Setembro de 2004, pp.

16 e segs.], ''a atribuição da pensão de sobrevivência está intimamente relacionada com as implicações económicas da morte do beneficiário: os herdeiros hábeis terão de provar determinados factos de onde resulte que a morte do beneficiário implicou uma diminuição dos meios de subsistência''.

17 - Ora, nas situações em que esta prova já foi feita judicialmente e os respectivos companheiro/companheira reconhecidos como herdeiros hábeis, ou seja, em que se admitiu que os mesmos ficaram afectados nos seus meios de sobrevivência pela perda de rendimentos do trabalho que o de cujus auferia, não se vê por que razão a lei não lhes há-de assegurar a pensão de sobrevivência a partir do momento em que deixaram de contar com tais rendimentos, isto é, a partir do início do mês seguinte ao do falecimento.

18 - De facto, parece-me demasiado oneroso, injusto e desproporcional, fazer recair sobre os mesmos os prejuízos que podem advir da morosidade na tramitação dos processos judiciais que, nos casos que me foram relatados, ascenderam a cerca de dois anos, quando a mesma situação de morosidade irreleva no caso do regime geral de segurança social.» Pelas razões expostas, surgindo como injustificada, sob o ponto de vista da finalidade dos direitos em causa (o direito legal à pensão de sobrevivência e o direito constitucional à segurança social), a diferenciação de regimes através da qual o legislador estabeleceu soluções substancialmente diferentes para situações essencialmente iguais, há que declarar a inconstitucionalidade da norma questionada, por violação do princípio da igualdade.

III - Decisão. - Termos em que se decide declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade, da norma constante do trecho final do artigo 41.º, n.º 2, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, aprovado pelo Decreto-Lei 142/73, de 31 de Março, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei 191-B/79, de 25 de Junho, na parte em que determina que a pensão de sobrevivência a que tenha direito aquele que, no momento da morte do contribuinte, estiver nas condições previstas no artigo 2020.º do Código Civil, apenas será devida a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que tal pensão tenha sido requerida.

Lisboa, 11 de Junho de 2008. - Mário José de Araújo Torres (relator) - Benjamim Silva Rodrigues - Carlos Alberto Fernandes Cadilha - Maria Lúcia Amaral - Maria João Antunes - Gil Galvão - João Cura Mariano - Vítor Gomes - José Manuel Borges Soeiro - Ana Maria Guerra Martins - Joaquim de Sousa Ribeiro - Carlos Pamplona de Oliveira (com declaração) - Rui Manuel Moura Ramos.

Declaração de voto

Voto a decisão, com discordância quanto ao seu fundamento. Tal como declarei no Acórdão 522/2006, entendo que, face à natureza da pensão em causa, independentemente do problema de igualdade de tratamento legislativo que se levanta, a norma consagra, essencialmente, uma solução desadequada ao fim a que se destina. Significa este entendimento que a solução legal não poderia manter-se ainda que o regime estabelecido no Decreto Regulamentar 1/94, de 18 de Janeiro, fixasse outra disciplina quanto aos beneficiários da Segurança Social. - Carlos Pamplona de Oliveira.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2008/07/02/plain-235717.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/235717.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1973-03-31 - Decreto-Lei 142/73 - Ministério das Finanças - Secretaria de Estado do Tesouro - Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência

    Aprova o estatuto das pensões de sobrevivência.

  • Tem documento Em vigor 1979-06-25 - Decreto-Lei 191-B/79 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério das Finanças e do Plano

    Revê o estatuto das pensões de sobrevivência, aprovado pelo Decreto Lei 142/73, de 31 de Março, e insere outras disposições sobre a matéria.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1990-10-18 - Decreto-Lei 322/90 - Ministério do Emprego e da Segurança Social

    Define e regulamenta a protecção na eventualidade da morte dos beneficiários do regime geral de segurança social.

  • Tem documento Em vigor 1994-01-18 - Decreto Regulamentar 1/94 - Ministério do Emprego e da Segurança Social

    Define o regime de acesso às prestações por morte, no âmbito dos regimes de segurança social, previstas no Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, por parte das pessoas que se encontram na situação de união de facto.

  • Tem documento Em vigor 1998-02-26 - Lei 13-A/98 - Assembleia da República

    Altera a lei orgânica sobre a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 2002-12-20 - Lei 32/2002 - Assembleia da República

    Aprova as bases gerais da segurança social, bem como as atribuições prosseguidas pelas instituições de segurança social e a articulação com entidades particulares de fins análogos.

  • Tem documento Em vigor 2003-06-17 - Acórdão 232/2003 - Tribunal Constitucional

    Pronuncia-se pela inconstitucionalidade do segmento normativo que contém o critério respeitante aos candidatos que tenham acedido ao ensino superior integrados no contingente da Região Autónoma dos Açores, constante da parte final da alínea a) do n.º 7 do artigo 25.º do Regulamento do Concurso do Pessoal Docente da Educação Pré-Escolar e Ensinos Básico e Secundário.(Pocesso nº 306/2003)

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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