de 30 de Março
Uma das inovações mais salientes da Lei de Meios para 1974 está na previsão de programas autónomos de investimento, aprovados pelos Ministros das Finanças e do departamento interessado e cuja execução obedecerá a regras específicas no quadro geral da gestão orçamental.A origem dos programas autónomos ou orçamentos de programa encontra-se no reconhecimento da relativa insuficiência dos métodos orçamentais clássicos para a indispensável racionalização das despesas públicas. A concepção puramente político-administrativo do orçamento visa sobretudo a garantia de uma correcta aplicação dos dinheiros públicos, mas não fornece, em muitos casos, instrumentos adequados para garantir a mais racional afectação de recursos escassos a fins diversos concorrentes entre si.
A primeira característica do programa autónomo consistirá na distinção de autonomia lógica dos três momentos em que se desdobra: o planeamento, a programação e o cálculo orçamental. O planeamento fixa a estratégia, a programação define a táctica orçamental e o cálculo traduz essa táctica em termos de despesa.
Outra característica essencial consiste em ter por unidade o programa, ou seja, a tarefa, objectivamente considerada pelo seu ângulo funcional, independentemente, portanto, dos serviços administrativos que nela colaborem.
O terceiro traço distintivo do programa autónomo resultará de ele abranger um horizonte plurianual; e isto porque só com um horizonte mais amplo do que o dos documentos tradicionais se pode proceder às projecções dos custos de cada programa, indispensáveis para as comparações de custo-benefício dos planos alternativos.
Deseja, portanto, o Governo dar concretização a alguns programas autónomos, que virão a ter influência decisiva no desenvolvimento económico em domínios carecidos de intensa acção dinamizadora devidamente programada e coordenada.
A complexidade das acções em causa, a sua relação com o processo de crescimento económico e social, a rapidez e a eficiência que as sociedades modernas exigem na resposta a situações deste tipo, a transformação estrutural a operar e a flexibilidade na execução, não se coadunam com os mecanismos e processos administrativos tradicionais, menos susceptíveis de garantir a celeridade e a eficácia que se desejam.
Por isso se procura ensaiar uma forma de lançamento, execução e contrôle dessas acções, tendo em vista ajustar melhor os métodos de intervenção do Estado às necessidades de desenvolvimento e às circunstâncias especiais de uma sociedade em transformação.
Considera-se que é necessário caminhar com prudência nesta direcção, mas a experiência que se há-de acumular e a análise dos resultados obtidos no final de cada ano permitirão o progressivo aperfeiçoamento do sistema agora iniciado.
Ao recorrer a processos mais dinâmicos de administrar e esperando deles uma resposta franca que se traduzirá em desenvolvimento económico acelerado, não pode o Governo deixar de ter em vista que os seus efeitos se projectem de forma equilibrada no conjunto do território metropolitano. Essa ideia - de contribuir para a correcção de atrasos ou desequilíbrios no desenvolvimento regional - terá de pesar fortemente na selecção dos projectos a programar e desenvolver.
Daí resulta que, de entre os programas autónomos considerados prioritários pelo Governo, e que, tendo em conta os meios financeiros disponíveis, aos Ministros das Finanças e do departamento interessado competirá aprovar, se destacam o desenvolvimento do vale do Mondego, o fomento pecuário do arquipélago dos Açores, a reconversão da viticultura da região do Douro, a implantação e defesa de povoamentos florestais em áreas delimitadas da província de Trás-os-Montes e a intensificação da execução dos esquemas da electrificação agrícola e rural em zonas determinadas.
Cada programa suporá a criação de um organismo de gestão por ele responsável, concebido e estruturado de forma a poder agir com a maleabilidade indispensável.
Sendo, no entanto, de prever que muitos problemas venham a ser postos em comum, e convindo em cada um aproveitar a experiência de todos, parece conveniente que a coordenação, apoio e fiscalização dos vários programas autónomos sejam assegurados através de uma comissão central coordenadora directamente dependente do Ministro das Finanças.
Nestes termos, usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. Os programas autónomos a que referem os artigos 10.º e 21.º da Lei de Meios para 1974 serão aprovados por portaria conjunta do Ministro das Finanças e do Ministro responsável pelo departamento interessado.
2. Da portaria constarão, designadamente:
a) O objecto ou finalidade do programa;
b) Se for caso disso, a zona ou área em que o mesmo se executará;
c) A composição da comissão executiva prevista no n.º 1 do artigo 2.º;
d) O departamento ou departamentos de que tecnicamente dependerá a referida comissão executiva;
e) As dotações que forem consignadas à execução do programa, nos termos das alíneas a) e b) do artigo 5.º, e as regras gerais a que devam sujeitar-se o seu levantamento e utilização e a efectivação das despesas.
Art. 2.º - 1. A execução de cada um dos programas será confiada a uma administração de programa autónomo, dirigida por uma comissão executiva e dotada dos serviços administrativos e técnicos para o efeito necessários.
2. As administrações dos programas autónomos gozam de personalidade jurídica e de autonomia administrativa e financeira.
3. A administração de cada programa autónomo será assistida por um representante do Tribunal de Contas, a designar pelo Ministro das Finanças.
Art. 3.º - 1. Aprovado um programa autónomo nos termos do artigo 1.º, o Ministro das Finanças e o Ministro ou Ministros dos departamentos interessados nomearão, em despacho conjunto, os membros da comissão executiva, fixando simultaneamente as condições em que prestarão os seus serviços.
2. A administração do programa autónomo considera-se existente a partir da data da posse da sua comissão executiva.
Art. 4.º Cumprido o que se dispõe no artigo precedente, a comissão executiva elaborará e submeterá à aprovação conjunta dos Ministros a que se alude no mesmo artigo, no prazo que para o efeito lhe for fixado, regulamento de que constem, designadamente:
a) A estrutura, a composição e a competência dos serviços necessários;
b) O estatuto do pessoal desses serviços, sem prejuízo do disposto no artigo 8.º;
c) As condições, as fases e o período de execução do programa;
d) Os princípios e regras a que deva obedecer a sua gestão;
e) A articulação a estabelecer entre a administração do programa autónomo e os serviços ou organismos que devam participar, directa ou indirectamente, na execução deste último ou que tenham competência em matérias por ele abrangidas ou com ele relacionadas, definindo-se as atribuições de cada um e os termos em que se processará a colaboração de todos.
Art. 5.º Constituem receitas das administrações dos programas autónomos:
a) As dotações que lhes forem atribuídas através do Orçamento Geral do Estado;
b) As dotações que, por transferência de outros serviços ou organismos, lhes devam ser consignadas;
c) As receitas que derivem do pagamento de serviços eventualmente prestados a terceiros, bem como da exploração transitória de bens que lhes estejam afectados ou de empreendimentos cuja promoção ou instalação lhes haja sido cometida.
Art. 6.º As administrações dos programas autónomos só poderão aplicar as suas receitas na realização das despesas necessárias à execução dos programas, de acordo com o que se estabelecer na portaria e no regulamento a que aludem, respectivamente, os artigos 1.º e 4.º do presente diploma.
Art. 7.º Os contratos a celebrar pelas administrações de programas autónomos são dispensados de visto do Tribunal de Contas, desde que sobre eles tenha sido dado parecer favorável pelo delegado a que se refere o n.º 3 do artigo 2.º Art. 8.º - 1. Para o desempenho de funções nas administrações de programas autónomos poderão ser designados, por qualquer das formas previstas na lei, e em regime de ocupação exclusiva ou de acumulação, funcionários dos serviços do Estado.
2. As remunerações a atribuir aos funcionários a que se refere o número anterior serão fixadas por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro ou Ministros dos departamentos interessados no programa.
3. As acumulações previstas no n.º 1 não carecem de autorização do Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos.
Art. 9.º Com o objectivo de coordenar a acção e uniformizar os métodos de trabalho dos diferentes programas autónomos será constituída uma comissão central coordenadora dependente do Ministro das Finanças e composta por cinco membros designados pelo mesmo Ministro.
Art. 10.º - 1. As administrações dos programas autónomos apresentarão, até 31 de Março de cada ano, o relatório da actividade desenvolvida e as contas de gerência do ano anterior à comissão central coordenadora, que os submeterá, com o seu parecer, ao Ministro das Finanças e ao Ministro ou Ministros interessados no programa.
2. As contas de gerência serão posteriormente sujeitas ao julgamento do Tribunal de Contas, nos termos da lei geral.
Art. 11.º - 1. Concluída a execução do programa ou logo que assim o determinem, o Ministro das Finanças e o Ministro ou Ministros dos departamentos interessados dissolver-se-á a administração do programa autónomo.
2. A dissolução operar-se-á mediante portaria dos Ministros referidos no número anterior, nela se fixando os termos e o prazo em que deva processar-se o destino dos bens e direitos que integrem o património.
Art. 12.º Competirá ao Ministro das Finanças a resolução das dúvidas que se suscitem, na interpretação e execução do presente diploma.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Marcello Caetano - Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Promulgado em 8 de Março de 1974.
Publique-se.O Presidente da República, AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ.
Para ser presente à Assembleia Nacional.