de 30 de Agosto
1. A riqueza natural do arquipélago dos Açores em pastagens e a relativamente curta distância a que fica do continente aconselham a que seja encarada a sua situação específica dentro de uma política de fomento pecuário.As excepcionais condições dos Açores para a produção de leite estão insuficientemente aproveitadas, pois praticamente só a ilha de S. Miguel e parte das ilhas Terceira e Faial se encontram em fase de desenvolvimento e recuperação de pastagens espontâneas e de zonas incultas.
As ilhas de S. Jorge, Pico e Flores possuem cerca de 27000 ha de pastagens naturais e de incultos susceptíveis de acentuada melhoria, sendo de 40000 ha a área total a recuperar em todo o arquipélago.
Tal dá bem a ideia da natureza, importância e alcance do trabalho a desenvolver e dos meios humanos, técnicos e materiais necessários à sua efectivação.
Basta aproveitar metade dessa área inculta e elevar a produção para cerca de 3500 l por unidade bovina e por ano para se alcançar a duplicação da actual produção leiteira.
2. Paralelamente à vocação natural do arquipélago para a produção de leite, existe uma situação particular que aconselha intensificar a exploração de outra espécie animal, o suíno.
Na verdade, o facto de os Açores estarem livres de peste suína africana e de febre aftosa torna essa região singularmente indicada para a instalação de núcleos de selecção e de multiplicação, podendo encarar-se igualmente a possibilidade de explorações de recria-acabamento com vista ao abastecimento de unidades de processamento, tanto quanto possível associadas à industrialização das peças menos nobres das carcaças de bovinos.
Também a avicultura merece um tratamento especial, pelo menos no que respeita ao regular abastecimento do arquipélago, actualmente a processar-se em regime deficitário.
3. A actual orgânica dos serviços oficiais açorianos bem como as suas dotações orçamentais não podem suportar o lançamento de realizações de grande vulto e, assim, há que encontrar soluções capazes de, a curto prazo, dinamizar a actividade agro-pecuária açoriana de maneira a conseguir maior criação de riqueza no arquipélago e contribuir significativamente para o abastecimento do País.
A indispensabilidade de encarar o arquipélago dos Açores como um espaço geo-económico único, a necessidade de conduzir toda a acção no sentido de evitar assimetrias no seu desenvolvimento, os vultosos investimentos a fazer, a vantagem de concentração dos meios de actuação e do seu contrôle estadual, os possíveis ajustamentos dos vários factores de trabalho às ocorrências que eventualmente possam surgir, além da evidente oportunidade de aumentar a participação açoriana no abastecimento continental, levam o Governo Provisório a lançar o Programa Autónomo de Desenvolvimento Pecuário dos Açores.
O instituto dos programas autónomos, previstos na Lei de Meios para o corrente ano e regulado pelo Decreto-Lei 126/74, de 30 de Março, independentemente dos ajustamentos que lhe deverão ser introduzidos, permite agir imediatamente com a urgência e eficácia que as circunstâncias impõem.
4. Este Programa exige uma acção dinâmica mas prolongada, dada a amplitude dos seus objectivos.
As metas principais a atingir e que sobrelevam todas as outras relacionam-se com o arroteamento de incultos e a recuperação de pastagens espontâneas e o seu povoamento com animais de bom nível zootécnico, acções cujo êxito não dependerá somente do número e eficiência de utilização das máquinas e da qualidade dos técnicos, mas igualmente do maior ou menor grau de eficiência do trabalho a realizar, por parte daqueles que directa ou indirectamente estejam relacionados com os objectivos em vista.
5. Ao aumento de produção de leite, quer por crescimento do efectivo existente, quer por elevação das produções unitárias, corresponderá maior disponibilidade naquele produto em carne.
Quanto ao leite, a sua utilização continuará a ser preferentemente da natureza industrial, ainda que haja natural e desejável aumento de consumos locais.
Para além das opções da sua utilização industrial, algumas delas, aliás, naturalmente já definidas - leite em pó e dietéticos em S. Miguel e Terceira e queijo em S. Jorge -, há que rever situações respeitantes à qualidade da matéria-prima e dos produtos atrás referidos e estudar quais as opções mais viáveis e convenientes para as restantes ilhas.
Dada a carência sazonal de leite no continente, a qual ultimamente tem sido parcialmente colmatada com importações de Espanha e Holanda, há que encarar a possibilidade de suprir esses deficits com leite proveniente dos Açores, impondo-se, no entanto, estudar o problema com a devida profundidade e as cautelas necessárias, de modo a não afectar a economia leiteiro do arquipélago.
6. O acréscimo dos efectivos leiteiros virá a traduzir-se em maior disponibilidade de animais para a produção de carne, que, no caso dos Açores, será sempre um produto subsidiário da produção leiteira.
Embora a produção de carne açoriana não tenha possibilidades de preencher totalmente a situação deficitária do continente, pode atenuar o volume das importações, havendo, no entanto, que definir qual a melhor política a seguir, se a engorda dos animais do arquipélago, se o seu envio e acabamento no continente.
Prevê-se, de todo o modo, que com a execução deste projecto se obtenha um aumento para o dobro da produção de carne e leite que, assim, se elevariam, respectivamente, para 40000 t e 400 milhões de litros, além do concomitante incremento da indústria de lacticínios.
7. É a fase de arranque do programa aquela em que as metas a atingir são consideradas não só mais difíceis mas igualmente as que exigem maior utilização de meios financeiros e de trabalho.
Propõe-se, portanto, o Governo dotar aquele Programa com meios julgados suficientes para as acções a empreender nos primeiros dez anos, as quais, além dos aspectos já referidos, far-se-ão sentir igualmente noutros domínios, tais como:
apetrechamento das explorações, abastecimento de água às pastagens, abertura de caminhos de penetração, electrificação agrícola, sanidade pecuária, formação profissional, assistência técnica e vulgarização e indústrias de produtos pecuários.
Nestes termos:
Ao abrigo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei 126/74, de 30 de Março:
Manda o Governo Provisório da República Portuguesa, pelos Ministros da Economia e das Finanças, o seguinte:
1.º É criado o Programa Autónomo do Desenvolvimento Pecuário dos Açores, abreviadamente designado por Programa Pecuário dos Açores (PPA), que se destina a promover e apoiar o desenvolvimento pecuário do arquipélago dos Açores.
2.º - 1. O PPA é dotado de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, dependendo directamente da Secretaria de Estado da Agricultura.
2. O PPA tem por objectivos promover e apoiar:
a) A recuperação de pastagens espontâneas e de terras incultas numa área aproximada de 40000 ha;
b) Acções de defesa, melhoramento e intensificação de pastagens e de forragens existentes e o estudo de culturas forrageiras adaptáveis às condições ecológicas açorianas e com reconhecido interesse na alimentação de bovinos;
c) Acções no sentido de se praticarem rotações com base nas culturas mais indicadas, observando o interesse que existe em manter indústrias tradicionais, sobretudo aquelas que possam fornecer subprodutos para alimentação de bovinos;
d) A aquisição, instalação e emprego dos meios necessários ao máximo aproveitamento das pastagens e forragens e à sua conservação através de processos naturais e/ou artificiais;
e) A abertura e melhoria de caminhos de acesso às pastagens;
f) A construção e o abastecimento de bebedouros nas pastagens, quer através de fornecimento de água a partir das reservas naturais, de furos, de redes de abastecimento público, ou com aproveitamento directo de águas pluviais;
g) A rega a partir de bacias hidrográficas e de lagoas naturais e/ou artificiais;
h) A electrificação das explorações agro-pecuárias;
i) Acções de protecção e de defesa higio-sanitária dos animais;
j) Acções de melhoramento da qualidade higiénica do leite e a maior difusão e bom emprego da ordenha mecânica, sobretudo com utilização de unidades móveis;
l) A racional utilização de alimentos simples, complementados e compostos e dos subprodutos da indústria animal, dos matadouros e da pesca, com vista à alimentação das espécies pecuárias;
m) A aquisição, no espaço metropolitano ou no estrangeiro, de bovinos leiteiros para povoamento das áreas a recuperar e para substituição de bovinos existentes sem interesse zootécnico;
n) A intensificação da inseminação artificial através de material fecundante adquirido no País ou no estrangeiro, a criação de livros genealógicos e a realização de contrastes funcionais;
o) A organização de associações de criadores;
p) A intensificação de instalação de viteleiros de 1.ª e 2.ª fases, nas linhas onde praticamente ainda não existem, e a instalação de «estábulos de acabamento» de novilhos, desde que a operação se afigure rendível e competitiva;
q) A instalação de núcleos de selecção, de multiplicação e de recria-acabamento de suínos com vista ao povoamento do arquipélago, à exportação, ao abate ou ao processamento das respectivas carcaças ou parte delas;
r) A instalação de aviários, de centros de abate de aves e de classificação de ovos;
s) A realização de obras de beneficiação e ampliação do matadouro de Ponta Delgada e de estudos e projectos relacionados com unidades de processamento de produtos e subprodutos de origem animal, já existentes ou a criar;
t) Acções de melhoria tecnológica na produção e industrialização de leite e de carne e dos respectivos subprodutos, compreendendo a instalação de uma unidade piloto na ilha de S. Jorge, para o estudo do queijo daquela ilha;
u) Noções de formação profissional e de assistência técnica e vulgarização;
v) A instalação de um laboratório de patologia e higiene veterinária;
x) Propor a instalação de parques de retém de gado e de quarentena, nos portos de embarque, e o apetrechamento dos cais acostáveis com equipamento que possibilite a «contentorização» dos produtos de origem animal a exportar e a armazenagem de matérias-primas destinadas a alimentação das espécies pecuárias;
z) Propor a utilização de navios especialmente adequados ao transporte de gado vivo, de carne e de produtos das indústrias de processamento.
3.º - 1. Para a prossecução dos seus objectivos, compete especialmente ao PPA:
a) Efectuar, com utilização de trabalhos já existentes e/ou outros a elaborar, o reconhecimento sistemático da região e o inventário e análise dos seus recursos com vista a assegurar a sua melhor utilização em proveito do desenvolvimento pecuário dos Açores;
b) Elaborar os planos de desenvolvimento da sua área de acção, em perfeita conjugação de esforços com os diversos serviços de Estado, corpos administrativos e autarquias locais;
c) Coordenar e promover pelos competentes serviços a realização das acções que a comissão executiva não possa levar a efeito e acompanhar a sua execução;
d) Elaborar, através dos seus serviços, estudos e projectos necessários ao cumprimento dos planos;
e) Solicitar aos serviços do Estado e corpos administrativos a execução de trabalhos de carácter técnico e a elaboração de estudos e projectos;
f) Contratar com empresas privadas nacionais e/ou estrangeiras a elaboração de estudos e projectos que se reconheçam necessários;
g) Executar todas as acções programadas, sejam elas de que natureza forem, e suportar os encargos correspondentes;
h) Gerir os fundos públicos que anualmente lhe venham a ser atribuídos, bem como outras verbas que lhe sejam consignadas por quaisquer entidades, inclusive corpos administrativos, por transferência ou por empréstimo;
i) Promover a constituição e organização de quaisquer empresas regionais de reconhecido interesse, para exercício de actividades agro-industriais, comerciais ou de prestação de serviços;
j) Efectuar os estudos conducentes ao melhor aproveitamento, em unidades industriais instaladas ou a instalar na região, das matérias-primas leite e carne e dos respectivos subprodutos e assegurar a coordenação das acções indispensáveis à realização dos correspondentes objectivos;
l) Pronunciar-se sobre os pedidos de instalação, na região, de actividade de economia pecuária;
m) Propor ao Governo medidas legislativas ou outras consideradas recomendáveis para melhor rendimento da actividade do PPA e mais perfeito desempenho das suas atribuições;
n) Proceder ao arrendamento e à aquisição de terrenos e outros imóveis necessários à instalação e funcionamento dos seus serviços ou que sirvam à realização de trabalhos e execução dos planos, promovendo a respectiva expropriação, quando esta se mostre indispensável.
2. A realização de empreendimentos incluídos nos planos aprovados e cuja execução fique a cargo do PPA não carece de pareceres, licenciamentos, autorização ou aprovações legalmente exigidas para empreendimentos da mesma natureza, salvo aqueles que o Secretário de Estado da Agricultura excluir da dispensa.
4.º A administração do PPA será dirigida por uma comissão executiva constituída por três membros, um dos quais será designado para presidente, nomeada por despacho dos Ministros da Economia e das Finanças.
5.º A comissão executiva ficará dependente do Secretário de Estado da Agricultura.
6.º À comissão executiva compete:
a) Elaborar planos de trabalho e de investimento e superintender na respectiva execução, aprovar as adjudicações e contratos relativos a obras, estudos, trabalhos, serviços, materiais, equipamentos e ao mais que for necessário à realização dos objectivos do PPA, tudo nos termos e até aos limites legalmente estabelecidos;
b) Elaborar regulamentos internos e instruções sobre todos os assuntos relativos à administração do PPA;
c) Fiscalizar o cumprimento das leis, regulamentos e instruções que lhe são aplicáveis;
d) Nomear árbitros e constituir mandatários nos litígios e processos em que intervenha o PPA;
e) Autorizar despesas, nos termos e até aos limites legais estabelecidos para os órgãos dirigentes dos serviços dotados de autonomia administrativa e financeira, e ordenar o pagamento de todas as despesas, incluindo as que excedam esses limites, depois de devidamente autorizadas.
7.º - 1. Às reuniões da comissão para fins administrativos assistirá um delegado do Tribunal de Contas, designado pelo Secretário de Estado do Tesouro, que desempenhará as funções prescritas no artigo 10.º do Decreto 22257, de 25 de Fevereiro de 1933, e no artigo 7.º do Decreto-Lei 126/74, de 30 de Março.
2. No caso de parecer desfavorável do delegado do Tribunal de Contas sobre os contratos a celebrar pela Administração, será o processo submetido a decisão conjunta dos Ministros das Finanças e da Economia.
8.º Ao presidente da comissão executiva pertence superintender nos serviços do PPA, competindo-lhe:
a) Propor e submeter a apreciação superior todos os assuntos que dela careçam;
b) Representar o PPA em juízo e fora dele e outorgar em nome do mesmo em todos os contratos e actos jurídicos;
c) Exercer os demais actos de competência do PPA que, nos termos desta portaria não sejam atribuídos especificamente à comissão executiva.
9.º - 1. As dotações atribuídas durante a vigência do programa, através do Orçamento Geral do Estado, acrescidas dos saldos de anos anteriores, não ficam sujeitas ao regime de duodécimos, sendo de 75000000$00 a dotação consignada para o ano de 1974.
2. Os fundos concedidos através do Orçamento Geral do Estado serão requisitados pela comissão executiva à 2.ª Delegação da Direcção-Geral da Contabilidade Pública;
as respectivas importâncias serão depositadas na Caixa Geral de Depósitos, fazendo-se a sua movimentação por meio de cheques nominativos, assinados por dois membros da comissão executiva, sendo um deles o presidente ou o vogal designado para o substituir.
3. Para o pagamento directo de despesas urgentes poderá a comissão executiva manter em cofre um fundo permanente até à importância de 100000$00.
10.º As despesas necessárias à execução do Programa estão sujeitas ao visto do presidente do Programa ou do vogal substituto, obtido o parecer favorável do representante do Tribunal de Contas, nos termos do artigo 7.º deste diploma.
Ministérios da Economia e das Finanças, 23 de Agosto de 1974. - O Ministro das Finanças, José da Silva Lopes. - O Ministro da Economia, Emílio Rui da Veiga Peixoto Vilar. - O Secretário de Estado do Orçamento, António de Seixas da Costa Leal. - O Secretário de Estado da Agricultura, Alfredo Gonzalez Esteves Belo.