Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1 - Filipa Santos de Sousa Bacelar, recorrente nos presentes autos em que é recorrido Edgar José Ribeiro Conde, intentou contra este, ação declarativa sob a forma de processo sumaríssimo. Invocou, em síntese, que em setembro de 2008 havia sido contratada pelo réu para prestar apoio escolar junto dos estabelecimentos pertencentes ao mesmo réu, desde as 14h30 até às 19h30 dos dias da semana, mediante o pagamento mensal de (euro)400,00 (quatrocentos euros). Peticionou o pagamento da remuneração respeitante ao mês de janeiro de 2009 e da quantia de (euro)2.400,00 (dois mil e quatrocentos euros) pela revogação do contrato sem pré-aviso.
O réu contestou, impugnando os factos invocados pela autora.
A fls. 33 foi proferido despacho com o seguinte conteúdo:
«O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia, não existindo causa de incompetência relativa que cumpra conhecer.
A petição inicial não é inepta e a forma de processo é a adequada.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária.
São, também, legítimas e encontram-se devidamente patrocinadas.
Não se vislumbram exceções dilatórias que cumpram conhecer.
Inexistem nulidades.
Nos termos do artigo 795.º-2 do Código de Processo Civil, designo o próximo dia 27 de novembro de 2012, pelas 9:30 horas, nas instalações deste Tribunal, para a realização da audiência de julgamento (não antes por manifesta impossibilidade de agenda).
Notifique, chamando a atenção para o estabelecido pelo artigo 796.º-4 do Código de Processo Civil.
Benavente, 27 de setembro de 2012.»
A realização de audiência e julgamento foi posteriormente adiada pelos despachos de fls. 37 e 39.
Em de 1 de abril de 2013, foi proferido despacho de verificação da incompetência do Tribunal em razão da matéria, dizendo o seguinte:
«A competência material do Tribunal afere-se perante a estrutura imprimida pelo autor à sua petição - tendo concretamente em consideração a causa de pedir apresentada -, conjugada com o pedido que, assente nesses factos, se encontra formulado contra o réu.
Atende a lei, para efeitos de atribuição da competência material, ao objeto da causa sob o ponto de vista qualitativo, ou seja, à natureza da relação substancial pleiteada, obedecendo a instituição de diversas espécies de tribunais a um princípio de especialização que comporta evidentes vantagens.
Na situação subjudice, a autora assenta a sua pretensão facto de ter sido contratada pelo período de um ano, mediante uma retribuição mensal, para prestar funções enquanto auxiliar de educação, mediante um horário pré-estabelecido, nos estabelecimentos do réu.
Alegando que o réu, ao dispensar os seus serviços da forma como dispensou, não respeitou o formalismo e a antecedência previstos para a denúncia do contrato, pretendendo, desta forma a autora., haver para si, a título de indemnização, a totalidade dos valores respeitantes ao período em falta.
Entende o tribunal que, face a tais alegações assim produzidas, estaríamos aqui perante uma relação jurídico-laboral.
Isto porque, o contrato em causa, tal como a autora o configura, tem por objeto a prestação da sua atividade profissional de educadora de infância, a realizar por conta de outrem (neste caso. do réu), mediante determinada contrapartida mensal, a ser paga mensalmente.
Decorre também da alegação da autora que esta desempenharia as suas funções no local indicado pelo réu, no horário por este estipulado, e de acordo com as direções deste.
Ora, consideramos que são essencialmente dois os elementos constitutivos do contrato de trabalho: a subordinação económica e a subordinação jurídica.
Haverá subordinação económica se o trabalhador receber certa remuneração do empregador e subordinação jurídica quando, no exercício da atividade a que se obrigou, o trabalhador se encontra sob as ordens, direção e fiscalização do empregador.
A subordinação e a autonomia são os elementos diferenciadores do contrato de trabalho e do contrato de prestação de serviços, o que significa que naquele o trabalhador põe a disposição do empregador o exercício próprio da atividade, e que neste não e já o exercício dessa atividade que é posto a sua disposição, mas antes, fundamentalmente, o seu resultado.
Ora, da forma como a autora estrutura a sua causa de pedir, esta alega que se obrigou diariamente, de segunda a sexta-feira, a prestar apoio escolar nos estabelecimentos do réu, das 14h30 às 19h00.
E que era o réu quem determinava em que estabelecimento é que a autora prestava a sua atividade, e que a execução do trabalho da autora era fiscalizada por quem verificava a boa execução desse trabalho, e que a autora cumpria um horário de trabalho diário.
Face ao exposto, temos de concluir que o réu recebeu a promessa da autora da prestação da sua atividade e não um qualquer resultado que dela derivasse, atividade exercida em certo local e dentro de determinado horário com sujeição a fiscalização do réu.
Por consequência, o referido contrato deve qualificar-se como contrato de trabalho e não de prestação de serviços, como faz a autora.
Ora, a competência para conhecer "das questões emergentes de relações de trabalho subordinado" compete aos tribunais do trabalho (artigo 85.º-b) da Lei 3/99, de 13/07 (cf. artigo 187.º da Lei 52/2008, de 28/08), no caso colocado pelo AA o instalado em Vila Franca de Xira (cf. Anexo VI ao Decreto-Lei 186-A/99, de 31/05).
A infração das regras de competência em razão da matéria determina a incompetência absoluta do Tribunal - artigo 101.º do Código de Processo Civil, e pode ser arguida pelas partes ou suscitada oficiosamente pelo Tribunal - artigo 102.º-1) do Código de Processo Civil.
Estando perante um caso de incompetência absoluta, exceção dilatória, esta implica a absolvição da ré da instância - artigos 105.º-1), 288.º-1-a), 493.º-2) e 494.º-a), todos do Código de Processo Civil.
Face ao exposto, julgo verificada a exceção de incompetência deste Tribunal em razão da matéria e em consequência absolvo o réu da instância.»
Notificada deste despacho, a autora arguiu a respetiva nulidade, invocando a inconstitucionalidade, por violação do princípio do processo equitativo previsto no artigo 20.º da Constituição, do «entendimento normativo dado ao artigo 796.º, n.º 7, do C.P.C., no sentido em que a sentença proferida em processo sumaríssimo, em que se considera verificada a exceção de incompetência do tribunal em razão da matéria, pode ser proferida sem facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa questão, quando até então nenhuma das partes ou o tribunal a tinham colocado, debatido ou de qualquer forma a ela referido» (fl. 46).
A nulidade foi indeferida por despacho de 4 de dezembro de 2014 (fls. 49 e ss.), dizendo, com relevo para os presentes autos, o seguinte:
«lncasu, após realização da audiência de discussão e julgamento, no momento da prolação da sentença, o tribunal entendeu por verificada a exceção de incompetência material do tribunal, por entender, em face dos factos alegados pelas partes, que estaríamos perante uma relação jurídico-laboral e não perante uma mera prestação de serviço, pelo que absolveu o R. da instância.
Não compreendemos como é que a A. não perspetivou a solução jurídica apresentada pelo tribunal, quando estamos perante uma matéria de competência material do tribunal, que integram uma incompetência absoluta. Tanto mais, conforme alega a A. na petição inicial, a A. beneficia de apoio judiciário, pese embora tenha o mesmo sido solicitada para propor uma ação laboral. Afigura-se-nos que a A. perspetivou de modo claro a relação jurídica que estava em causa, tendo até pedido apoio judiciário para propor ação laboral, o que acabou por não fazer, decidindo, antes, qualificar a relação com o R. como se de prestação de serviços se tratasse. Entendemos, que a A. perspetivou a soluço jurídica apresentada, ou era-lhe exigível que a perspetivasse, por se tratar de uma questão de competência material do tribunal.
Assim, porque não se vislumbra que tenha sido omitido qualquer ato que a lei prescreva, impõe-se indeferir a nulidade invocada.
No que diz respeito à invocada inconstitucionalidade, entendemos que não estamos perante uma interpretação inconstitucional do n.º 7 do artigo 796.º do CPC de 1961, quando é proferida sentença que conhece da incompetência material do tribunal, sem antes dar o contraditório às partes, uma vez que foram respeitadas as regras do contraditório, conforme supra explanado, tendo as partes tido a oportunidade, quer nos articulados, quer nas alegações, para se pronunciarem quanto a tal exceção, que deve, desde logo, ser equacionada pelas partes, assim que interpõem a ação.» (fls. 50-51)
2 - É deste despacho que vem interposto o presente recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, adiante referida como "LTC").
Admitido o recurso, e subidos os autos a este Tribunal Constitucional, foi determinada a produção de alegações.
A recorrente apresentou alegações, concluindo nos seguintes moldes:
«A. O despacho recorrido adotou, em relação ao artigo 796.º/n.º 7 do C.P.C. (revogado), o entendimento normativo no sentido de que a sentença proferida em processo sumaríssimo, na qual se considera verificada a exceção da incompetência do tribunal em razão da matéria, pode ser proferida sem facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa questão, quando até então nenhuma das partes ou o tribunal a tinham colocado, debatido ou de qualquer forma a ela referido.
B. Salvo melhor opinião, é inconstitucional tal entendimento normativo, o qual foi devidamente suscitado no artigo 6.º do requerimento de arguição de nulidade desatendida pelo despacho recorrido.
C. Está em causa uma decisão surpresa e a possibilidade de as parte se pronunciarem previamente sobre o objeto de tal "surpresa", o que decorre do princípio do contraditório, em termos que hoje se julga que são consensuais.
D. É irrelevante o argumento de que a parte podia ter equacionado a questão antes de propor a ação, porque a verdade é que, com base nos pressupostos de que partiu, entendeu que não tinha de equacionar tal hipótese, a qual também não fora equacionada nem na contestação, nem nos restantes despachos interlocutórios proferidos pelo tribunal.
E. Não pode por isso haver qualquer dúvida quanto ao facto de ter ocorrido uma decisão surpresa acerca de uma questão principal e nuclear - a da competência do tribunal - sobre a qual as partes não se tinham pronunciado, nem sido convidadas a pronunciar, e não fora objeto de qualquer debate.
F. E, assim sendo, é flagrante que o entendimento normativo adotado consubstanciou uma violação do princípio do contraditório.
G. Outro problema é o de valorar a intensidade lesiva da violação do princípio do contraditório, de forma a apurar se está ou não em causa a violação do direito a um processo equitativo, que o artigo 20.º da CRP e o artigo 6.º da CEDH consagram.
H. Ora, na ótica da recorrente, estando em causa a apreciação de uma exceção relativa à competência do tribunal, ou seja, perante uma questão que envolve a verificação dos pressupostos para que o tribunal possa conhecer o mérito da causa, não pode duvidar-se da relevância de tal intensidade lesiva, razão pela qual se deve entender que o entendimento normativo em apreço viola o direito a um processo equitativo, tal como está consagrado nas regras legais supra citadas.
I. Pelo exposto, deve ser julgado inconstitucional, por violação do direito a um processo equitativo previsto no artigo 20.º da CRP, o entendimento normativo dado ao artigo 796.º/n.º 7 do CPC (revogado), eventualmente conjugado com o artigo 3.º do CPC, no sentido de que a sentença proferida em processo sumaríssimo, na qual se considera verificada a exceção da incompetência do tribunal em razão da matéria, pode ser proferida sem facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa questão, quando até então nenhuma das partes ou o tribunal a tinham colocado, debatido ou de qualquer forma a ela referido.» (fls. 85 ess.)
O recorrido não contra-alegou.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
3 - O presente recurso tem por objeto o artigo 796.º, n.º 7, do Código de Processo Civil ("CPC"), de 1961, na redação do Decreto-Lei 329-A/95, de 12 de dezembro, interpretado no sentido de que «a sentença proferida em processo sumaríssimo, na qual se considera verificada a exceção da incompetência do tribunal em razão da matéria, pode ser proferida sem facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa questão, quando até então nenhuma das partes ou o tribunal a tinham colocado, debatido ou de qualquer forma a ela referido». A recorrente invoca a violação do direito ao contraditório enquanto dimensão integrante do direito ao processo equitativo, previsto no artigo 20.º da Constituição.
A causa em que emerge o presente recurso de constitucionalidade apresenta contornos que se afiguram úteis para a cabal compreensão do objeto do mesmo. Atentemos nos mesmos.
A autora, ora recorrente, intentou ação contra o réu, invocando a celebração, entre as partes, de um contrato de fornecimento de serviços de apoio escolar, peticionando o pagamento de diversas quantias a título de remuneração em dívida e de revogação do contrato sem pré-aviso. Foi proferido um primeiro despacho liminar, considerando o tribunal competente (em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia), e designando data para a realização da audiência de julgamento. Este despacho foi notificado às partes. Posteriormente, a realização da referida audiência foi adiada por duas vezes.
Em 1 de abril de 2013, foi proferido despacho-sentença de verificação da incompetência do tribunal em razão da matéria, considerando-se que o contrato invocado pela autora seria um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços. A qualificação do contrato não foi matéria objeto de impugnação pelo réu na sua contestação, não se tratando, por conseguinte, de matéria controvertida para nenhuma das partes. Tal despacho não foi precedido de notificação prévia às partes, designadamente tendo em vista o exercício do contraditório. Por isso, a recorrente, notificada do mesmo, arguiu a respetiva nulidade, invocando a inconstitucionalidade do «entendimento normativo dado ao artigo 796.º, n.º 7, do C.P.C., no sentido em que a sentença proferida em processo sumaríssimo, em que se considera verificada a exceção de incompetência do tribunal em razão da matéria, pode ser proferida sem facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa questão, quando até então nenhuma das partes ou o tribunal a tinham colocado, debatido ou de qualquer forma a ela referido» (fls. 46). Tal nulidade foi indeferida, entendendo a Juíza a quo que, por um lado, a autora deveria ter perspetivado a solução jurídica apresentada pelo tribunal, uma vez que se trata de matéria que integra uma incompetência absoluta e, por outro lado, a autora chegou a formular pedido de apoio judiciário para propositura de ação laboral, tendo posteriormente optado por propor ação invocando um contrato de prestação de serviços. Concluiu ainda a referida Magistrada que não se verificou qualquer inconstitucionalidade «uma vez que foram respeitadas as regras do contraditório [...] tendo as partes tido a oportunidade, quer nos articulados, quer nas alegações, para se pronunciarem quanto a tal exceção, que deve, desde logo, ser equacionada pelas partes assim que interpõem a ação» (fl. 51).
Apreciemos então o enquadramento jusconstitucional do objeto dos presentes autos.
4 - Sobre o princípio do contraditório, salientou este Tribunal, no Acórdão 86/88 (disponível, bem como a restante jurisprudência constitucional adiante citada, em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/) que este parâmetro se integra no âmbito da garantia de acesso ao direito, a qual abrange, «entre o mais, um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância das garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder "deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outras" (cf. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, I, Coimbra, 1956, p. 364)».
No Acórdão 243/2013 disse Tribunal, quanto às exigências do processo equitativo que «o procedimento de conformação normativa deve ser justo e a própria conformação deve resultar num "processo materialmente informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais" (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, anot. XVI ao artigo 20.º, p. 415). Se tal exigência não afasta a liberdade de conformação do legislador na concreta estruturação do processo, a mesma "impõe, antes de mais, que as normas processuais proporcionem aos interessados meios efetivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialética que elas protagonizam no processo (Ac. n.º 632/99). Um processo equitativo postula, por isso, a efetividade do direito de defesa no processo, bem como dos princípios do contraditório e da igualdade de armas" (cf. Rui Medeiros in Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2010, anot. XVIII ao artigo 20.º, p. 441).»
É assente, na jurisprudência constitucional, que do conteúdo do direito de defesa e do princípio do contraditório resulta prima facie que cada uma das partes deve poder exercer uma influência efetiva no desenvolvimento do processo, devendo ter a possibilidade, não só de apresentar as razões de facto e de direito que sustentam a sua posição antes de o tribunal decidir questões que lhes digam respeito, mas também de deduzir as suas razões, oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e tomar posição sobre o resultado de umas e outras (cf. designadamente, os Acórdãos. n.os 1185/96 e 1193/96).
A jurisprudência adota, assim, um entendimento amplo do contraditório, entendido "como garantia da participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão" (Lebre de Freitas, Introdução ao processo civil: conceito e princípios gerais. Coimbra: Coimbra Editora, 1996, p. 96.). Adianta ainda este autor que "o escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à atuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir ativamente no desenvolvimento do processo."
5 - No caso em apreço, embora estejamos no âmbito de incompetência absoluta e, portanto, de conhecimento oficioso pelo tribunal, tal não significa que as partes não possam discutir e debater o potencial enquadramento jurídico da controvérsia. De outra banda, a prolação da decisão sem a concessão prévia, às partes, da oportunidade de, querendo, se pronunciarem sobre essa questão, alegando e oferecendo razões que fundem a pretensão subjetiva de cada uma, significa que as mesmas foram privadas, inelutavelmente, da efetiva possibilidade de influir no convencimento do juízo, e de, assim, poderem determinar ou contribuir para o modo como vem a ocorrer o desfecho do processo.
Daí concluir-se, pela inconstitucionalidade do artigo 796.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, na redação do Decreto-Lei 329-A/95, de 12 de dezembro, na interpretação segundo a qual «a sentença proferida em processo sumaríssimo, na qual se considera verificada a exceção da incompetência do tribunal em razão da matéria, pode ser proferida sem facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa questão, quando até então nenhuma das partes ou o tribunal a tinham colocado, debatido ou de qualquer forma a ela referido», por violação do direito ao contraditório, ínsito na garantia do processo equitativo prevista no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, assim se concedendo provimento ao recurso.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se:
a) Julgar inconstitucional o artigo 796.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, na redação do Decreto-Lei 329-A/95, de 12 de dezembro, na interpretação segundo a qual «a sentença proferida em processo sumaríssimo, na qual se considera verificada a exceção da incompetência do tribunal em razão da matéria, pode ser proferida sem facultar às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa questão, quando até então nenhuma das partes ou o tribunal a tinham colocado, debatido ou de qualquer forma a ela referido», por violação do direito ao contraditório, ínsito na garantia do processo equitativo prevista no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição;
E, em consequência,
b) Conceder provimento ao recurso e determinar a reformulação decisão recorrida, em conformidade com o presente juízo de inconstitucionalidade.
Sem custas, por não serem legalmente devidas.
Lisboa, 13 de outubro de 2015. - Pedro Machete - Fernando Vaz Ventura - João Cura Mariano - Ana Guerra Martins - Joaquim de Sousa Ribeiro.
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