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Acórdão 314/2007, de 2 de Julho

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Sumário

Não julga inconstitucional a norma do artigo 39.º do Código de Processo Civil, enquanto aplicável subsidiariamente ao processo penal, com a interpretação de que a renúncia de mandatário constituído do arguido, no decurso de prazo para recurso, só suspende a contagem deste com a notificação da renúncia ao arguido, prosseguindo essa contagem com a constituição de novo mandatário

Texto do documento

Acórdão 314/2007

Processo 116/2007

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

Relatório. - No Tribunal da Comarca de Setúbal corre o processo comum colectivo n.º 40/03.8 TELSB, em que é arguido, além de outros, João António Calado Dias, inicialmente patrocinado pela advogada Dr.ª Paula Brum.

Nesse processo foi realizada audiência de discussão e julgamento e proferido acórdão que foi depositado na secretaria em 26 de Maio de 2006, no qual o arguido João António Calado Dias foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, sob a forma agravada, previsto e punido pelos artigos 21.º, n.º 1, e 24.º, alínea c), do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 8 anos de prisão.

Através de requerimento que deu entrada no Tribunal em 30 de Maio de 2006, a advogada, Dr.ª Paula Brum, renunciou ao mandato que lhe tinha sido conferido pelo arguido, sem explicitar as razões dessa renúncia.

O arguido foi notificado da renúncia ao mandato em 9 de Junho de 2006, tendo em 27 de Junho de 2006 vindo requerer a junção aos autos de procuração forense a favor da advogada Dr.ª Margarida Dias Ferreira.

Em 11 de Julho de 2006, via fax, já patrocinado pela nova advogada constituída, o arguido veio interpor recurso do acórdão condenatório proferido nos autos.

Este recurso não foi admitido com o fundamento de ter sido deduzido fora do prazo legal.

O arguido reclamou deste despacho, alegando, além do mais, que a aplicação stricto sensu do disposto no artigo 39.º do CPC, em processo penal, põe em causa o direito de defesa do arguido, nomeadamente o direito ao recurso consagrado no artigo 32.º da CRP.

O M.mº Juiz a quo manteve o despacho reclamado.

Foi cumprido o disposto no artigo 688.º, n.º 4, segunda parte, do CPC, ex vi do artigo 4.º do CPP, tendo o Ministério Público respondido, pugnando pelo indeferimento da reclamação.

Foi ordenada a subida dos autos de reclamação ao Tribunal da Relação de Évora, onde o Exmo. Juiz Desembargador Vice-Presidente deste Tribunal proferiu decisão que julgou improcedente a reclamação com os seguintes fundamentos:

"A questão que se discute na presente reclamação consiste em saber se a renúncia ao mandato produz efeitos no decurso do prazo para interpor recurso do acórdão condenatório.

O Código de Processo Penal, no seu artigo 64.º, n.º 1, alínea d), estatui que é obrigatória a assistência de defensor nos recursos ordinários ou extraordinários.

Este diploma legal é totalmente omisso no que diz respeito à revogação e renúncia do mandato. Face a tal omissão, e por força do disposto no seu artigo 4.º, e na falta de disposições que permitam a analogia, devem observar-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal.

O Código do Processo Civil, no seu artigo 39.º, regula a revogação e renúncia do mandato da seguinte forma ...

Como se pode observar, pela leitura da disposição legal transcrita, trata-se de uma regulamentação bastante exaustiva e precisa que se harmoniza perfeitamente com o processo penal, acautelando suficientemente os direitos de defesa do arguido.

Nos termos desta disposição legal, cuja redacção foi introduzida pela reforma do processo civil de 1995-1996, a renúncia ao mandato passou a produzir efeitos com a notificação da renúncia ao mandante.

Notificada à parte a renúncia do mandatário, deve considerar-se suspenso o prazo de interposição do recurso, que voltará a correr logo que seja constituído novo mandatário no prazo a que alude o n.º 3 do citado artigo 39.º do CPC ou quando ocorrer nomeação oficiosa nos termos do n.º 4 do mesmo preceito.

No caso concreto estamos perante um acórdão que foi depositado na secretaria em 26 de Maio de 2006.

Assim, o prazo para a interposição do recurso iniciar-se-ia no dia seguinte à data do respectivo depósito e terminaria em 12 de Junho de 2006.

Acontece que, através de requerimento que deu entrada no Tribunal em 30 de Maio de 2006, a advogada, Sr.ª Dr.ª Paula Brum, renunciou ao mandato que lhe tinha sido conferido pelo arguido.

O arguido foi notificado da renúncia ao mandato em 9 de Junho de 2006, tendo em 26 de Junho de 2006 vindo requerer a junção aos autos de procuração forense a favor da advogada Exma. Sr.ª Margarida Dias Ferreira.

Em 11 de Julho de 2006, via fax, já patrocinado pela nova advogada constituída, o arguido velo interpor recurso do acórdão proferido nos autos.

Destes factos resulta que o prazo se suspendeu em 9 de Junho de 2006 (data em que ocorreu a notificação da renúncia ao mandato) e voltou a correr em 26 de Junho de 2006 (data em que foi constituído o novo mandatário).

Atendendo a que, nos termos do artigo 411.º do CPP, o prazo para interposição do recurso é de 15 dias, constata-se que o recurso interposto em 11 de Julho de 2007 está manifestamente fora de prazo."

O arguido interpôs recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da lei da organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional (doravante referida como LTC), nos seguintes termos:

"O recorrente pretende que seja apreciada a inconstitucionalidade:

a) Do artigo 39.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei 44 129, de 28 de Dezembro de 1961, na redacção actualmente em vigor que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 180/96, de 25 de Setembro, enquanto considerado aplicável ao processo penal nos termos do artigo 4.º do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87, de 17 de Fevereiro, na interpretação que lhe foi dada pelo venerando presidente desse Tribunal, no despacho proferido na reclamação à margem identificada, por entender que esse preceito, nessa interpretação, viola o princípio constitucional de que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa).

O despacho do presidente do venerando Tribunal da Relação de Évora interpretou a norma do n.º 2 do artigo 39.º do Código de Processo Civil no sentido de que a mesma se harmoniza com os princípios do processo penal e que assim, ocorrendo uma renúncia ao mandato no decurso do prazo de recurso de um acórdão condenatório, os efeitos da mesma só se produzem com a sua notificação ao mandante, só nessa data se suspendendo o referido prazo.

Esta inconstitucionalidade da norma interpretada neste sentido foi já devidamente suscitada na reclamação apresentada ao presidente do venerando Tribunal da Relação de Évora do despacho que não admitira o recurso interposto pelo arguido ora recorrente."

O arguido recorrente apresentou alegações de recurso com as seguintes conclusões:

"1) Nos presentes autos, a anterior mandatária do arguido ora recorrente renunciou ao mandato quando haviam decorrido 4 dias do prazo para apresentação da motivação de recurso de acórdão condenatório, faltando, consequentemente, decorrer 11 dias;

2) O arguido veio a ser notificado dessa renúncia quando faltavam apenas três dias para o final desse referido prazo de recurso;

3) Constituiu nova mandatária dentro do prazo que lhe foi conferido para tal, a qual subscreveu a motivação de recurso e apresentou no prazo de 15 dias contados dessa constituição, por entender que o prazo para interposição e motivação do mesmo se havia interrompido com a renúncia ao mandato e que, por conseguinte, decorreria na íntegra após a sua constituição como mandatária;

4) Entendemos que só esse entendimento assegura cabalmente todas as garantias de defesa do arguido consagradas no processo penal e na lei fundamental;

5) Porém, foi esse recurso rejeitado por extemporaneidade da sua apresentação;

6) Ainda que entendendo não cumprir tão cabalmente esse desígnio, aceita-se que se possa entender que o prazo não se interrompe com a renúncia ao mandato mas apenas se suspende, voltando a decorrer o que do mesmo restava;

7) Mas também em conformidade com esse entendimento, o recurso foi tempestivo, ainda que lançando mão da faculdade prevista no artigo 145.º do Código de Processo Civil, pois foi entregue no 2.º dia útil subsequente ao termo do prazo;

8) Pelo que não deveria ter sido rejeitado mas sim o recorrente notificado para o pagamento da multa nos termos do n.º 6 do mesmo artigo 145.º;

9) Apresentada a competente reclamação para o presidente do venerando Tribunal da Relação da Évora, foi a mesma indeferida por se entender que, na falta de preceito específico no Código de Processo Penal que regule a renúncia ao mandato, se aplica o artigo 39.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, nos termos do qual os efeitos da renúncia ao mandato só se produzem com a sua notificação ao mandante;

10) De acordo com essa interpretação e no caso concreto, restariam ao arguido apenas três dias para apresentar a sua motivação de recurso, sendo de considerar que a existência de um prazo, certo e conhecido atempadamente, é um elemento essencial da própria defesa do arguido;

11) A notificação ao mandante é um acto efectuado pela secretaria judicial, pelo que tal interpretação deixaria entregue ao livre arbítrio da mesma a maior ou menor extensão de um prazo ou, até, a sua total inexistência;

12) Pelo que tal preceito, na interpretação que foi feita, não se harmoniza com os princípios do processo penal pois não assegura as garantias de defesa do arguido, designadamente o direito ao recurso;

13) Sendo assim, nessa interpretação, ferido de inconstitucionalidade por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa;

14) Pelo que deve ser declarada a inconstitucionalidade material da norma do artigo 39.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, enquanto aplicada ao processo penal, na interpretação que lhe foi dada pelo venerando presidente do Tribunal da Relação de Évora."

O Ministério Público apresentou contra-alegações, onde concluiu do seguinte modo:

"1 - Havendo renúncia ao mandato de advogado constituído, estando a decorrer o prazo para interposição do recurso da decisão condenatória, não se afigura passível de censura constitucional uma interpretação do artigo 39.º, n.º 2, do Código de Processo Civil que considere suspenso o citado prazo pelo período que decorre entre a notificação de renúncia e a constituição de novo mandatário, estando este ainda em tempo para interpor o respectivo recurso.

2 - Termos em que não deverá proceder o presente recurso."

Fundamentação. - A questão decidenda é a de saber se a aplicação subsidiária do disposto no artigo 39.º do CPC, em processo penal, com a interpretação de que a renúncia de mandatário constituído do arguido, no decurso de prazo para recurso, só suspende a contagem deste com a notificação da renúncia ao arguido, prosseguindo essa contagem com a constituição de novo mandatário, viola o direito constitucional à defesa do arguido, nomeadamente o direito ao recurso, consagrados no artigo 32.º, n.º 1, da CRP.

O direito de defesa do arguido em processo penal, constitucionalmente proclamado, é uma cláusula geral que inclui não só todas as garantias explicitadas nos diversos números do artigo 32.º da CRP mas também todas as demais que decorram da necessidade de efectiva defesa do arguido.

Este preceito deve ser interpretado à luz do denominado processo penal equitativo e leal, no qual o Estado, ao fazer valer o seu jus puniendi, deve actuar com respeito pela pessoa do arguido, considerando-o um sujeito processual a quem devem ser asseguradas todas as possibilidades de contrariar a acusação, de ser julgado por um tribunal independente e do processo decorrer com lealdade de procedimentos, considerando-se ilegítimas quaisquer disposições, ou suas interpretações, que impliquem uma diminuição inadmissível das possibilidades de defesa do arguido.

Uma das manifestações deste direito à defesa, actualmente (desde a revisão de 1997) com consagração específica no texto constitucional (artigo 32.º, n.º 1, in fine), é o direito ao recurso.

De modo a garantir a possibilidade de defesa contra a prolação de decisões injustas deve ser assegurada ao arguido a possibilidade de as impugnar para um segundo grau de jurisdição, delas recorrendo.

Mas, para que esta possibilidade seja efectiva, é necessário que as normas processuais que regulamentam o direito ao recurso assegurem que o arguido recorrente tenha a possibilidade de analisar e avaliar criteriosamente os fundamentos da decisão recorrida de forma a permitir-lhe um exercício consciente, fundado e eficaz desse seu direito.

Neste domínio, entrelaça-se a aplicação de um outro direito constitucional processual penal, que é o direito de o arguido ser assistido por defensor (artigo 32.º, n.º 3, da CRP).

Na verdade, atentas as especiais exigências técnico-jurídicas que presidem à decisão sobre a eventual utilidade ou conveniência de interpor recurso e à elaboração da sua motivação, a assistência do arguido por defensor tecnicamente habilitado nesta fase é um elemento do núcleo essencial do seu direito de defesa que deve ser assegurado pelo legislador ordinário, o que sucede no artigo 64.º, n.º 1, alínea d), do CPP.

Ponderadas estas considerações gerais, poderá dizer-se que estes direitos constitucionais se mostrarão violados sempre que não se conceda um prazo razoável ao arguido em processo penal para impugnar decisão relevante que o afecte, devendo nesse período encontrar-se ininterruptamente assistido por defensor tecnicamente habilitado.

Neste recurso está em questão a interpretação adoptada pela decisão recorrida do regime da influência da renúncia do mandatário do arguido ao mandato que lhe foi conferido por este, no decurso do prazo para interposição de recurso de acórdão condenatório. Não importa saber se essa interpretação é a mais correcta no plano infraconstitucional mas sim se essa interpretação é tolerada pelas enunciadas directrizes constitucionais.

Tendo a mandatária do arguido renunciado ao mandato em 30 de Maio de 2006, sem explicitar as razões dessa renúncia, quando o prazo para este recorrer do acórdão que o havia condenado na pena de 8 anos de prisão se havia iniciado em 27 de Maio de 2006, e tendo o arguido sido notificado da renúncia em 9 de Junho de 2006, entendeu a decisão recorrida, aplicando o disposto no artigo 39.º do CPC, que aquele prazo apenas se suspendeu com a notificação da renúncia ao mandato ao arguido, prosseguindo a sua contagem com a constituição de novo mandatário. A decisão recorrida contabilizou o prazo de recurso entre a data do depósito da sentença e a data da notificação ao arguido da renúncia da sua mandatária, somando este período de tempo ao que decorreu após a constituição de novo mandatário.

Da aplicação subsidiária do artigo 39.º do CPC, ao processo penal, face à inexistência de regulamentação específica, resulta que a renúncia ao mandato por parte de advogado constituído pelo arguido não tem como consequência a imediata extinção da relação de mandato e a consequente cessação das obrigações do mandatário para com o seu cliente (artigo 39.º, n.º 1, do CPC), mantendo-se o dever do mandatário renunciante prestar assistência ao mandante, o qual tem de ser "pontual e escrupulosamente" cumprido, como impõe o artigo 83.º do EOA.

Nos termos do n.º 2 do artigo 39.º do CPC, a renúncia só produz efeitos, extinguindo a relação de mandato, com a sua notificação ao mandante, pelo que só a partir da recepção da declaração de renúncia pelo arguido cessam os deveres do mandatário renunciante para com o seu cliente.

Assim, não se pode considerar que o arguido, entre a declaração de renúncia e a sua recepção pelo destinatário, ficou desprovido de defensor. E, não constando da declaração de renúncia as razões de tal atitude, também não é possível ponderar se, a partir da emissão dessa declaração, a assistência ao arguido ficou enfraquecida, de modo a considerar-se que deixou de estar assegurado o seu direito a defender-se.

Após a constituição de novo mandatário pelo arguido, é inequívoco que este passou novamente a estar assistido por defensor, pelo que também a contagem do prazo de recurso após este acto não ofende o direito de defesa do arguido.

Conclui-se, pois, que durante os dois períodos que a decisão recorrida contabilizou, somando-os, para considerar decorrido o prazo de recurso, o arguido esteve sempre devidamente assistido por defensor.

Resta agora saber se, tendo-se verificado uma mudança de defensor no decurso do prazo de recurso, a necessidade de assegurar um efectivo direito de defesa ao arguido se satisfaz com a concessão de um único prazo de recurso, a repartir pelos sucessivos defensores, como sustentou a decisão recorrida.

Se para assegurar um efectivo direito de defesa é necessário que o arguido esteja assistido por um defensor na fase de recurso, já não se revela um requisito do núcleo essencial desse direito que a pessoa do defensor seja a mesma durante o decurso do prazo de recurso.

A ponderação da decisão de recorrer e a elaboração da motivação do recurso, com a inerente escolha das questões a suscitar, é um labor que, apesar de ter um cunho pessoal, permite a transmissão pelo primitivo defensor para o novo defensor do trabalho intelectual e material já desenvolvido.

O prazo para a interposição do recurso é atribuído ao arguido e não à pessoa do seu defensor, não exigindo a necessidade de garantia de um efectivo direito ao recurso em processo penal, que se concedam tantos prazos distintos quantos os defensores que se sucedam na assistência ao arguido.

Se a mudança da pessoa do defensor no decurso do prazo de recurso é susceptível de causar alguma perturbação ao exercício do respectivo direito, não se pode dizer, numa visão geral e abstracta, que a manutenção, nesses casos, do prazo único previsto na lei (15 dias) para a dedução do recurso penal põe em causa, de modo inadmissível, a possibilidade de o arguido recorrer das decisões que o afectam.

E se, no caso concreto, essa perturbação assumir uma dimensão tal que ponha em causa uma real possibilidade de exercício do direito ao recurso, o regime processual penal permite que o arguido invoque a figura do justo impedimento (artigo 107.º, n.º 2, do CPP) para que possa exercer de modo efectivo o seu direito ao recurso, nunca ficando a sua posição de sujeito processual desprotegida.

É certo que este Tribunal já por duas vezes julgou inconstitucional a contagem ininterrupta do prazo para interposição de recurso em casos em que ocorreu uma substituição do defensor do arguido:

No Acórdão 39/04, de 14 de Janeiro (publicado no Diário da República, 2.ª série, de 20 de Fevereiro de 2004), julgou-se "inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, e do princípio da segurança e da confiança jurídica, ínsito no princípio do Estado de direito consagrado no artigo 2.º, ambos da Constituição da República Portuguesa, a norma do n.º 1 do artigo 420.º do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual é extemporâneo o recurso interposto pelo novo defensor do arguido dentro do prazo reiniciado a partir da sua nomeação, depois de ter sido proferido em 1.ª instância despacho, não impugnado, a interromper o anterior prazo de interposição de recurso, motivado por pedido de escusa do anterior patrono deduzido na sua pendência";

No acórdão 159/04, de 17 de Março (publicado no Diário da República, 2.ª série, de 23 de Abril de 2004), julgou-se "inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 20.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, da CRP, a norma resultante da interpretação conjugada dos artigos 66.º, n.º 4, e 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual o prazo para interposição do recurso, de 15 dias, se conta ininterruptamente, a partir da data do depósito da decisão na secretaria, mesmo no caso de recusa de interposição do recurso por parte do defensor oficioso nomeado, cuja substituição foi requerida, o que foi deferido por o tribunal a quo considerar existir justa causa para essa substituição".

Contudo, enquanto na primeira situação, o que pesou no julgamento de inconstitucionalidade foi o facto de o Tribunal recorrido ter, anteriormente à rejeição do recurso por extemporaneidade, proferido despacho declarando interrompido o respectivo prazo, donde resultou uma violação dos princípios da segurança e da confiança jurídica, na segunda situação foi a desconsideração pela decisão recorrida da circunstância do defensor substituído ter-se recusado a interpor recurso que fundamentou o julgamento de inconstitucionalidade.

Em nenhuma destas decisões se entendeu que a contagem ininterrupta do prazo de recurso, ocorrendo no seu decurso a substituição da pessoa do defensor do arguido, só por si, violava qualquer directriz constitucional.

Ora, nenhuma daquelas circunstâncias, que foram decisivas para os julgamentos acima referidos, se verifica no presente processo - a declaração de renúncia ao mandato não explicitou as razões da mesma e nas instâncias nunca se declarou que o prazo de recurso se havia interrompido.

Não se mostrando violados os direitos constitucionais do arguido à defesa, nomeadamente ao recurso e à assistência por defensor (artigo 32.º, n.os 1 e 3, da CRP), pela aplicação subsidiária do disposto no artigo 39.º do CPC, em processo penal, com a interpretação de que a renúncia de mandatário constituído do arguido, no decurso de prazo para recurso, só suspende a contagem deste com a notificação da renúncia ao arguido, prosseguindo essa contagem com a constituição de novo mandatário, deve ser negado provimento ao recurso para este Tribunal.

Decisão. - Pelas razões expostas, acorda-se em negar provimento ao recurso interposto por João António Calado Dias da decisão do vice-presidente da Relação de Évora de 27 de Novembro de 2006.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC (artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei 303/98).

Lisboa, 16 de Maio de 2007. - João Cura Mariano - Rui Pereira - Mário José de Araújo Torres - Benjamim Rodrigues - Rui Manuel Moura Ramos.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1582261.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1961-12-28 - Decreto-Lei 44129 - Ministério da Justiça - Gabinete do Ministro

    Aprova o Código de Processo Civil. Dispõe sobre o regime da acção - em geral e executiva -, e sobre a competência e garantias da imparcialidade. Estabelece disposições gerais sobre o processo, processo de declaração (ordinário, sumário e sumaríssimo) e sobre o processo de execução (para pagamento de quantia certa, para entrega de coisa certa e para prestação de facto). Prevê os processos especiais e o Tribunal Arbitral (voluntário e necessário).

  • Tem documento Em vigor 1987-02-17 - Decreto-Lei 78/87 - Ministério da Justiça

    Aprova o Código de Processo Penal.

  • Tem documento Em vigor 1993-01-22 - Decreto-Lei 15/93 - Ministério da Justiça

    Revê a legislação do combate à droga, definindo o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas.

  • Tem documento Em vigor 1996-09-25 - Decreto-Lei 180/96 - Ministério da Justiça

    Revê o Código de Processo Civil, altera o Decreto-Lei 329-A/95 de 12 de Dezembro que o reviu e republicou e rectifica algumas inexactidões na republicação do Código em anexo ao citado diploma.

  • Tem documento Em vigor 1998-10-07 - Decreto-Lei 303/98 - Ministério da Justiça

    Dispõe sobre o regime de custas no Tribunal Constitucional.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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