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Acórdão 528/2006, de 6 de Novembro

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Texto do documento

Acórdão 528/2006

Processo 227/06

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - Francisco Pedro Santos Almeida (ora recorrente) interpôs, no Tribunal Central Administrativo, recurso contencioso de uma acto de indeferimento tácito imputado ao Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (ora recorrido), que se teria formado sobre um requerimento dirigido a este último. O Tribunal Central Administrativo, por Acórdão de 8 de Julho de 2004, negou provimento ao recurso. Inconformado com esta decisão, o recorrente recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo, que, por Acórdão de 7 de Abril de 2005, julgou o recurso improcedente.

2 - Novamente inconformado, recorreu com fundamento em oposição de julgados. Alegou, então, para o que ora releva, que:

"[...] o douto acórdão recorrido, nos termos explicitados no douto acórdão fundamento, violou efectivamente os artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, conjugados com o artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, e com o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991, ou, subsidiariamente, faz uma interpretação das normas supracitadas conjugadas com o artigo 2.º do mesmo Decreto-Lei 187/90 (que prevê, singelamente, que o "presente diploma" se aplica ao pessoal do quadro da DGCI) violadora do princípio da igualdade previsto nos artigos 13.º e 59, n.º 1, alínea a), da Constituição, e como tal inconstitucional."

3 - O Supremo Tribunal Administrativo, reunido o Pleno da Secção de Contencioso Administrativo, decidiu, por Acórdão de 19 de Janeiro de 2006, negar provimento ao recurso. Para tanto, fundamentou assim a decisão:

"[...] Quanto à resolução da oposição, a questão jurídica a decidir consiste em saber se podem ser computadas na aplicação do regime de transição para o novo sistema retributivo da função pública estabelecido pelo Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, as remunerações acessórias auferidas após 30 de Setembro de 1989 por funcionários requisitados depois dessa data (como sucedia com o recorrente contencioso) para o exercício de funções na DGCI e posteriormente integrados no respectivo quadro de pessoal. E foi tratada pelo Pleno deste Tribunal, entre outros, no Acórdão de 27 de Novembro de 2003, a p. 47 727, e solucionada no sentido de que "as remunerações acessórias auferidas pelos funcionários vinculados à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos antes de 1 de Outubro de 1989 não deveriam ser atribuídas a funcionários requisitados após 30 de Setembro de 1989 para o exercício de funções na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos nem deveriam ser levadas em consideração na respectiva transição para o novo sistema retributivo criado pelo Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, não lhes sendo aplicável o regime do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, que estabelece o estatuto remuneratório do pessoal das carreiras da administração tributária e aprova a respectiva escala salarial".

A decisão ali proferida na parte relevante assenta nos fundamentos que se transcrevem:

"[...] O citado Decreto-Lei 184/89 definiu os princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da função pública, prevendo o respectivo artigo 43.º que seria objecto de desenvolvimento e regulamentação noutros diplomas legais e entraria em vigor conjuntamente com os diplomas legais de desenvolvimento relativo a matéria salarial.

Este desenvolvimento, em matéria de estatuto remuneratório dos funcionários e agentes da Administração Pública, foi estabelecido pelo Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, o qual, nos termos do respectivo artigo 45.º, n.º 1, produziu efeitos a partir de 1 de Outubro de 1989.

Ora, aquele Decreto-Lei 184/89, visando devolver coerência e equidade ao sistema de remunerações da função pública, determinou (artigo 38.º) a extinção de todas as remunerações acessórias não previstas ou enquadráveis nos suplementos previstos nos artigos 15.º e 19.º

Para salvaguarda de direitos eventualmente adquiridos, estabeleceu este mesmo diploma legal, no artigo 39.º, que as remunerações acessórias extintas pelo artigo anterior deveriam ser levadas em conta na remuneração a considerar para efeitos de transição para o novo sistema retributivo, garantindo, ainda, que desta não poderia resultar redução da remuneração auferida pelo funcionário ou agente (artigo 40.º). Porém, aquele artigo 39.º expressamente estabelece que o diferencial de integração, correspondente à diferença entre a remuneração indiciária e o montante já percebido, 'tem carácter de remuneração pessoal e não pode ser atribuído a situações constituídas após a entrada em vigor do novo sistema retributivo' (n.º 6). Assim, como bem conclui o acórdão fundamento, o legislador quis salvaguardar as remunerações que cada um auferisse a título pessoal, mas à data da entrada em vigor do Decreto-Lei 184/89. O que, como se viu, aconteceu em 1 de Outubro de 1989.

No caso da ora recorrida, só com a respectiva requisição e início de funções na DGCI, em 14 de Maio de 1990, passou a mesma a auferir a remuneração acessória a que tinham direito os funcionários que ali prestavam serviço antes daquela entrada em vigor do Decreto-Lei 184/89 (1 de Outubro de 1989).

Daí que tal remuneração acessória lhe não deveria ter sido atribuída nem, por consequência, levada em conta para efeitos da respectiva transição para o novo sistema retributivo.

[...]

Assim, a recorrente não pertencia, ainda, ao quadro da DGCI na data da respectiva integração no novo sistema retributivo, estabelecido pelo Decreto-Lei 353-A/89, diploma que, como já se viu, passou a produzir efeitos a partir de 1 de Outubro de 1989, por força do disposto no respectivo artigo 45.º, n.º 1.

Daí também que não lhe fosse aplicável o regime estabelecido, designadamente no citado artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, cujo 'âmbito' de aplicação se limita ao pessoal da DGCI, como expressamente determina o respectivo artigo 2.º ('O presente diploma aplica-se ao pessoal do quadro da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos dos seguintes grupos: [...]').

A transição da recorrida para o novo sistema retributivo fez-se, pois, segundo o regime do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro (v. artigo 2.º, n.º 1). E, para efeito desta transição, não havia que considerar remunerações acessórias (artigo 30.º, n.os 2 e 3), pois que, à data da produção de efeitos desse diploma, ainda não iniciara funções como requisitada na DGCI, encontrando-se a exercer funções no serviço de origem, o IROMA, sem auferir tais remunerações."

Estas considerações são inteiramente transponíveis para a situação do recorrente, que, sendo funcionário do quadro do IROMA requisitado na DGCI depois de 1 de Outubro de 1989, viria a ser integrado no quadro desta DG a partir de 5 de Setembro de 1994. E não existem razões para inverter o sentido da jurisprudência que decorre do acórdão transcrito [...].

Isto apesar da argumentação suplementar do recorrente, que se passa a analisar.

Vem sustentado que o recorrente não pode ser tratado de modo diferente dos funcionários do quadro da DGCI, mas esta proposição não pode ser acolhida porque existe diferença nas situações em causa que não é meramente formal, já que a experiência anterior em área diversa não é igual em termos substanciais à dos funcionários do quadro da DGCI e os emolumentos que o recorrente auferia desde a requisição até à integração no NSR eram devidos a título precário, isto é, enquanto requisitado, podendo suceder que nunca tivesse sido integrado no quadro do serviço requisitante. Além disso, a igualdade a que o recorrente podia aspirar legitimamente era a em relação aos funcionários em iguais condições do quadro do IROMA.

Também não há dúvida de que o momento relevante para aplicação dos critérios legais de integração no NSR é a situação remuneratória em 30 de Setembro de 1989, como decorre do n.º 2 do artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro.

Quanto à argumentação do recorrente relativa a interpretação correcta do artigo 2.º do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, é verdade que nele se refere singelamente a respectiva aplicação ao pessoal do quadro da DGCI, mas o recorrente esquece que não integrava aquela categoria de pessoal no momento relevante para aplicar o Decreto-Lei 187/90, por não pertencer a tal quadro. E, de todo o modo, aquele artigo nunca podia deixar de ser aplicado em consonância com as demais normas que regulam a integração no NSR, designadamente a que dispõe que os elementos relevantes a ter em conta são os relativos à situação do funcionário em 30 de Setembro de 1989, e, quer nessa data quer nos 12 meses anteriores, o recorrente não tinha senão as diuturnidades e os emolumentos ou outras remunerações acessórias que lhe tinham sido pagas pelo IROMA, pelo que não pode beneficiar naquela integração na DGCI da consideração de remunerações acessórias ou outras que tenha auferido a título transitório depois de 1 de Outubro de 1989 até à efectiva integração no novo quadro para o qual transitou. [...]"

4 - É desta decisão que vem interposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, o presente recurso, através de um requerimento que tem o seguinte teor:

"[...] não se conformando com o douto acórdão proferido nos presentes autos, vem dele interpor recurso para o Tribunal Constitucional nos termos da alínea b) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, com a alteração introduzida pela Lei 85/89, de 7 de Setembro, por considerar que a interpretação que no acórdão recorrido se faz dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, e do artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, viola os artigos 13.º e 59.º da Constituição, o que, nos termos requeridos pelo artigo 75.º-A, n.º 2, da Lei 28/82, foi oportunamente suscitado pelo ora recorrente nas suas alegações de recurso por oposição de julgados e levado às respectivas conclusões [alíneas b) e d)].

O recorrente, nas suas alegações de recurso por oposição de julgados, veio sustentar, designadamente nas suas conclusões, o seguinte entendimento:

"a) Como sustenta o douto acórdão fundamento aqui em causa, embora o Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, não aluda, no seu artigo 3.º, às normas do artigo 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, nem por isso este último preceito deixa de produzir os seus efeitos naqueles casos, como o dos autos, em que à data da publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, se não tinha ainda produzido a integração no quadro de funcionários que se encontravam então requisitados na DGCI e só mais tarde foram integrados no respectivo quadro;

b) Para efeitos remuneratórios, a situação dos funcionários que não estavam ainda integrados no quadro mas que já exerciam funções na DGCI como requisitados e recebendo as remunerações acessórias tem de ser resolvida pela conjugação das aludidas normas dos dois diplomas conjugado com o despacho do Sr. SEO, por forma que da aplicação do NSR lhes não resulte qualquer diferenciação de vencimentos em relação aos funcionários já integrados na mesma categoria. A tal obriga o princípio da igualdade de tratamento vertido nos artigos 13.º e 59.º da Constituição, sendo certo que o facto de não estar o recorrente, já integrado no quadro da DGCI à data de 1 de Outubro de 1989, atento a implementação do NSR só se ter concretizado quanto ao pessoal ao serviço da DGCI após o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991, não justifica esse desigual tratamento com a consequente redução da remuneração efectivamente auferida à data daquela integração e que incluía as remunerações acessórias;

c) Ora, o douto acórdão a quo sustenta, ao invés, que os funcionários que iniciaram funções na Direcção-Geral dos Impostos, na situação de requisitados, após 1 de Outubro de 1989, como é o caso do recorrente, não podiam beneficiar na transição para o NSR dos respectivos abonos emolumentares, não existindo violação quer do artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, quer dos artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, por não se encontrarem então já integrados no quadro da DGCI, nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho;

d) Mas sendo assim, o douto acórdão recorrido, nos termos explicitados no douto acórdão fundamento, violou efectivamente os artigos 30.º e 32.º, ambos do Decreto-Lei 353-A/89, conjugados com o artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, e com o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991, ou, subsidiariamente, faz uma interpretação das normas supracitadas conjugadas com o artigo 2.º do mesmo Decreto-Lei 187/90 (que prevê, singelamente, que o 'presente diploma' se aplica ao pessoal do quadro da DGCI) violadora do princípio da igualdade previsto nos artigos 13.º e 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, e como tal inconstitucional."

Ora, precisamente, o douto acórdão sob recurso ao negar ao recorrente a aplicação do regime do artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, conjugado com o artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, por força do artigo 2.º deste último diploma, fez uma interpretação restritiva destes preceitos, a qual é violadora do princípio da igualdade vertido nos artigos 13.º e 59.º da Constituição. É assim a interpretação restritiva dos preceitos constantes do artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, e dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho - por, alegadamente, os mesmos não abrangerem os funcionários que à data precisa da transição para o NSR ainda não tivessem iniciado funções na DGCI mas que as iniciaram, como requisitados, antes da publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, e muito especialmente, no caso concreto, foram integrados no quadro próprio da DGCI antes da publicação deste diploma (no caso da recorrente, tal sucedeu em 18 de Junho de 1989), que regulou o regime de transição (embora com efeitos reportados a 1 de Outubro de 1989), que está em causa no presente recurso para esse Meritíssimo Tribunal Constitucional.

Na verdade, no entender do recorrente (acompanhado, aliás, de parte da jurisprudência do STA), não há nenhuma razão atendível para rejeitar a aplicação do regime de transição para o NSR, de acordo com o disposto no artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, ao recorrente (máxime os n.os 3 e 4), concretizado pelo Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho (v. o artigo 3.º, n.º 4), quando o recorrente, à data da publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, já se encontrava ao serviço da DGCI em regime de requisição (desde 18 de Junho de 1989), a receber, como os demais funcionários da DGCI com a mesma categoria e número de diuturnidades, as mesmas remunerações acessórias, pelo que uma tal interpretação restritiva da lei (artigos 30.º do Decreto-Lei 353-A/89 e 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90) sufragada pelo acórdão recorrido - segundo a qual aquelas normas só se aplicariam ao pessoal integrado no quadro da DGCI à data da entrada em vigor do NSR (1 de Outubro de 1989) - é atentatória do princípio da igualdade de tratamento consagrado nos artigos 13.º e 59.º da Constituição da República. [...]"

5 - Já neste Tribunal, foi, pelo relator, proferido o seguinte despacho:

"Considera o recorrente, no requerimento de interposição de recurso, que "a interpretação que no acórdão recorrido se faz dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, e 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, viola os artigos 13.º e 59.º da Constituição". Por outro lado, acrescenta que a questão de inconstitucionalidade "foi oportunamente suscitad[a] pelo ora recorrente nas suas alegações de recurso por oposição de julgados e levado às respectivas conclusões [alíneas b) e d)]".

Ora, tendo em atenção o teor do requerimento e daquelas conclusões, bem como o facto de vir questionada uma determinada interpretação daqueles preceitos, convido o recorrente, nos termos do n.º 6 do artigo 75.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, a esclarecer, em termos concisos, claros e perceptíveis, qual (ou quais) a(s) exacta(s) interpretação (interpretações) normativa(s) da(s) norma(s) questionada(s) cuja constitucionalidade pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, de tal modo que, se este Tribunal a(s) vier a julgar desconforme(s) com a Constituição, a(s) possa enunciar claramente na decisão que proferir. Na verdade, incumbindo ao recorrente a definição do objecto do recurso, deve o mesmo, quando pretenda questionar determinada interpretação normativa de um certo preceito, explicitar com precisão e clareza essa dimensão normativa, sob pena de, não o fazendo, transferir para o Tribunal Constitucional, de forma inaceitável, o ónus que sobre ele impende, não sendo suficiente afirmar, como se faz no requerimento de interposição do recurso para este Tribunal, que "a interpretação que no acórdão recorrido se faz [...] viola os artigos 13.º e 59.º da Constituição"."

6 - O recorrente veio dizer o seguinte:

"[...] O recorrente submete à apreciação do Tribunal Constitucional as normas dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, e 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, enquanto preceitos que consagram o regime de transição dos funcionários do regime geral (da função pública) integrados na DGCI para o novo sistema retributivo implementado, precisamente, pelo Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugado com o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991 que lhe deu execução.

É que, de acordo com a interpretação que deles faz o acórdão recorrido, por força de uma interpretação literal (e restritiva) do artigo 2.º do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, a transição para o NSR dos funcionários no exercício de funções na DGCI a receber remunerações acessórias à data de implementação do NSR (o que sucedeu só após a publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugado com o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991) só seria feita, com integração dessas mesmas remunerações acessórias, se o funcionário em questão estivesse em 30 de Setembro de 1989 já integrado no quadro da mesma DGCI, o que não sucedeu no caso concreto.

Entende, ao invés, o recorrente (e com ele alguma jurisprudência do STA - v. o acórdão fundamento citado no acórdão a quo) que o que está em causa é o regime de transição para o NSR do recorrente, enquanto integrado no pessoal do regime geral da DGCI (artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90) para efeitos das remunerações acessórias a considerar na sua transição para o NSR de acordo com o n.º 3 do artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, atenta a regra de transição do pessoal requisitado constante do artigo 32.º, alínea b), do mesmo Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, segundo o qual, se o lugar de destino conferir direito a remuneração acessória de qualquer natureza, a remuneração a abonar no lugar de destino enquanto se mantiver a requisição é apurada nos termos dos n.os 2 a 5 do artigo 30.º do mesmo diploma, não havendo pois razão a justificar um desigual tratamento daqueles que ainda não estavam no quadro da DGCI em 30 de Setembro de 1989 mas que, apesar disso, estavam requisitados na DGCI à data da implementação do NSR (o que só sucedeu com a aplicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, pelo despacho ministerial de 19 de Abril de 1991), e que assim receberam legalmente as remunerações acessórias devidas ao pessoal do quadro.

Nem se diga como faz o douto acórdão recorrido, que passamos a transcrever:

"Vem sustentando que o recorrente não pode ser tratado de modo diferente dos funcionários do quadro da DGCI, mas esta diferença nas situações em causa, que não é meramente formal, já que a experiência anterior em área diversa não é igual em termos substanciais à dos funcionários do quadro da DGCI e os emolumentos que o recorrente auferia desde a requisição até à integração no NSR eram devidos, a título precário, isto é, enquanto requisitado, podendo suceder que nunca tivesse sido integrado no quadro do serviço requisitante. Além disso, a igualdade a que o recorrente podia aspirar legitimamente era em relação aos funcionários em iguais condições do quadro do IROMA."

Com o devido respeito, não é, de todo, assim.

Há efectivamente violação do princípio constitucional da igualdade de tratamento (artigos 13.º e 59.º da Constituição) na interpretação feita pelo acórdão a quo dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugados com os artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, porquanto naquele douto acórdão parece esquecer-se que estamos perante trabalhadores do regime geral (da função pública), conforme decorre do n.º 4 do artigo 3.º do Decreto-Lei 187/90, e não de pessoal integrado nas carreiras da administração tributária.

Ora, o pessoal do regime geral, seja ele motorista de ligeiros seja ele "segundo-oficial" (como era o caso do ora recorrente), exerce funções idênticas quer ao serviço da DCGI quer ao serviço de outro organismo do Estado.

Daí que tendo transitado - como segundo-oficial - em regime de requisição para a DGCI, e auferindo, por isso, remunerações acessórias à data da efectiva integração no NSR, deveria ter tido tratamento igual aos demais funcionários (do regime geral) integrados no quadro de DGCI em exercício nesta, das mesmas funções e categoria idêntica. E isto enquanto se mantivesse requisitado ou, por maioria de razão, se após a requisição fosse integrado no quadro da DGCI, como sucedeu in casu.

Donde, com todo o respeito, se afigura claro ao recorrente que a interpretação dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugados com os artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89 dada pelo douto acórdão recorrido, enquanto restringindo aos funcionários (do regime geral) já integrados no quadro da DGCI em 30 de Setembro de 1989 a transição para o NSR, incluindo nesta as remunerações acessórias, legalmente recebidas por todos, no exercício das mesmas funções e com a mesma categoria até à implementação do NSR, é violadora do princípio da igualdade previsto nos artigos 13.º e 59.º da Constituição, devendo como tal ser declarada."

7 - Foi, então, o recorrente notificado para alegar, o que fez, concluindo assim:

"IV - Conclusões:

a) Vem o presente recurso interposto do douto acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do STA que considerou que, não pertencendo o recorrente ao quadro da DGCI na data da integração no NSR, não lhe era aplicável o regime estabelecido no artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, cujo âmbito de aplicação se limitaria ao pessoal do quadro da DGCI naquela aludida data;

b) Assim, a transição do recorrente para o NSR fez-se, pois, segundo o regime do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro. E, para o efeito dessa transição, não haveria que considerar remunerações acessórias (artigo 30.º, n.os 2 e 3, deste diploma), pois que à data da produção de efeitos desse diploma ainda não iniciara funções como requisitado na DGCI, encontrando-se no serviço de origem sem auferir tais remunerações;

c) Ora, ainda que o recorrente não fosse funcionário do quadro da DGCI à data de 1 de Outubro de 1989, já era funcionário público, possuindo a mesma categoria e diuturnidades, razão pela qual teria de ser integrado como os restantes funcionários da DGCI, na mesma situação funcional, no mesmo índice remuneratório e a receber o mesmo diferencial de integração, ainda que estes apenas lhe fossem devidos desde a sua tomada de posse como requisitado na DGCI em 18 de Junho de 1990;

d) Na verdade, o que sumamente releva in casu é saber se ele já se encontrava requisitado na DGCI e a receber as inerentes remunerações acessórias aquando da transição para a nova estrutura salarial, o que apenas ocorreu após a publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugado com o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991;

e) É que o pessoal do regime geral da função pública, seja ele motorista de ligeiros ou segundo-oficial (como era o caso do ora recorrente), exerce funções idênticas quer ao serviço da DGCI quer ao serviço de outros organismos do Estado;

f) Assim sendo, no entender do recorrente (acompanhado de parte de jurisprudência do STA), não há nenhuma razão atendível para rejeitar a aplicação ao recorrente do regime de transição do NSR de acordo com o artigo 30.º e por força do artigo 32.º do Decreto-Lei 353-A/89 quando aquele à data da publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugado com o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991, já se encontrava ao serviço na DGCI em regime de requisição (desde 18 de Junho de 1990), a receber como os demais funcionários da DGCI, com a mesma categoria e número de diuturnidades e as mesmas remunerações acessórias, pelo que uma tal interpretação restritiva da lei (artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89) sufragada pelo acórdão recorrido - segundo a qual aquelas normas só se aplicariam ao pessoal integrado na DGCI à data da entrada em vigor do NSR (1 de Outubro de 1989) é atentatória do princípio da igualdade consagrado nos artigos 13.º e 59.º da Constituição e, como tal, deve ser declarada inconstitucional por esse Meritíssimo Tribunal Constitucional."

8 - Contra-alegou o recorrido, tendo dito, a concluir:

"I - A questão objecto do presente recurso é a da apreciação da constitucionalidade dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugados com os artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, na interpretação deles feita pelo acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do STA proferido em 19 de Janeiro de 2006, que considerou que, não pertencendo o recorrente ao quadro da DGCI na data da respectiva integração do NSR, não lhe era aplicável o regime estabelecido no artigo 3.º, n.º 4, do acima mencionado Decreto-Lei 187/90, cujo âmbito de aplicação se limitaria ao pessoal do quadro da DGCI em 1 de Outubro de 1989.

II - Defende o recorrente, por outro lado, que não há nenhuma razão atendível para rejeitar a aplicação do regime de transição do NSR de acordo com o artigo 30.º, em conjugação com o artigo 32.º, do Decreto-Lei 353-A/89, uma vez que, à data da publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, já se encontrava ao serviço da DGCI em regime de requisição (desde 18 de Junho de 1990), a receber como os demais funcionários da DGCI, com a mesma categoria e o mesmo número de diuturnidades e as mesmas remunerações acessórias.

III - Considera por isso o recorrente que o acórdão recorrido, ao considerar que as normas referidas só seriam de aplicar ao pessoal integrado na DGCI à data da entrada em vigor do NSR, fez uma interpretação restritiva da lei e violadora do princípio da igualdade consagrado nos artigos 13.º e 59.º da CRP.

IV - Ora, como esse Digníssimo Tribunal tem vindo a considerar, o princípio da igualdade não proíbe que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio; ou seja, proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer, sem qualquer justificação razoável, segundo critérios objectivos constitucionalmente relevantes.

V - Proíbe também que se tratem por igual situações essencialmente desiguais. E proíbe ainda a discriminação, ou seja: as diferenciações de tratamento fundadas em categorias meramente subjectivas.

VI - Ora, a situação do recorrente não era igual à situação dos funcionários que, à data da entrada em vigor do NSR, já pertenciam ao quadro da DGCI.

VII - No caso do recorrente, só com a respectiva requisição e início de funções na DGCI, em 18 de Junho de 1990, passou a auferir a remuneração acessória a que tinham direito os funcionários que pertenciam ao quadro antes da entrada em vigor do NSR (1 de Outubro de 1989); mas tal aconteceu a título precário, pois, como bem refere o acórdão recorrido, o recorrente poderia não ter sido integrado no quadro do serviço requisitante.

VIII - Assim, enquanto os funcionários vinculados ao quadro da DGCI à data da entrada em vigor do NSR já auferiam remunerações acessórias nos 12 meses imediatamente anteriores a essa data, os requisitados e integrados após essa data já não beneficiavam delas por, entretanto, terem sido extintas.

IX - Acresce que tais remunerações acessórias não faziam parte do estatuto remuneratório dos serviços de onde o recorrente era originário.

X - Daí que a situação do recorrente, que prestou serviço em organismo diferente da DGCI, por ser materialmente diferente da situação daqueles que prestavam serviço e eram funcionários do quadro da DGCI na data de entrada em vigor do NSR, constitui fundamento material bastante, segundo critérios objectivos relevantes, para que as remunerações acessórias a que tinham direito os funcionários da DGCI que aí prestavam serviço antes da entrada em vigor do NSR não fossem levadas em conta para efeitos da transição do recorrente para o NSR."

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

II - Fundamentação. - 9 - É o seguinte, na parte ora relevante, o teor dos artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, e 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, preceitos dos quais o recorrente extrai a norma cuja constitucionalidade, por alegada violação do princípio da igualdade, pretende ver apreciada:

"Artigo 30.º

Regime de transição

1 - A integração na nova estrutura salarial faz-se de acordo com as seguintes regras:

a) Na mesma carreira e categoria;

b) Em escalão a que corresponda na estrutura da categoria remuneração igual ou, se não houver coincidência, a remuneração imediatamente superior.

2 - A remuneração a considerar para efeitos da transição referida no n.º 1 resulta do valor correspondente à remuneração base decorrente do Decreto-Lei 98/89, de 29 de Março, actualizada a 12%, acrescida do montante da remuneração acessória a que eventualmente haja direito, com excepção das que sejam consideradas suplementos, nos termos do Decreto-Lei 184/89, de 2 de Julho, e deste diploma.

3 - Para efeitos do número anterior, as remunerações acessórias de montante variável são fixadas no valor médio das remunerações acessórias percebidas nos 12 meses imediatamente anteriores à data da produção de efeitos do presente diploma.

4 - Sempre que o montante apurado nos termos dos números anteriores ultrapasse o valor do escalão máximo da respectiva categoria, é criado um diferencial de integração correspondente à diferença entre a remuneração indiciária e o montante a que o funcionário ou o agente tem direito nos termos dos números anteriores.

5 - Da aplicação do presente diploma não pode resultar a redução das remunerações efectivamente auferidas.

...

Artigo 32.º

Regime de transição do pessoal destacado, requisitado e em comissão de serviço

A transição do pessoal destacado, requisitado e em comissão de serviço obedece ao disposto no artigo 30.º, devendo ainda atender-se às seguintes regras:

a) ...

b) Se o lugar de destino conferir direito a remuneração acessória de qualquer natureza, a remuneração a abonar no lugar de destino, enquanto se mantiverem o destacamento, a requisição e a comissão de serviço, é apurada nos termos dos n.os 2 a 5 do artigo 30.º

Artigo 2.º

Âmbito

O presente diploma aplica-se ao pessoal do quadro da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos dos seguintes grupos:

a) Administrador tributário, do grupo de pessoal dirigente superior;

b) Pessoal dirigente;

c) Pessoal técnico superior do Centro de Estudos Fiscais;

d) Pessoal técnico superior (economistas/juristas) que desempenhe funções na área da fiscalização tributária;

e) Pessoal técnico de orientação e supervisão;

f) Pessoal técnico tributário;

g) Pessoal técnico de fiscalização tributária;

h) Pessoal técnico judicial.

Artigo 3.º

Transição

...

4 - Para efeitos de aplicação do n.º 3 do artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, ao pessoal do regime geral da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, incluindo o pessoal dirigente abrangido pelo artigo 31.º do referido decreto-lei, adoptar-se-á critério idêntico ao utilizado para as carreiras de pessoal da administração tributária, sendo os respectivos montantes fixados por categoria, mediante despacho do ministro das Finanças."

10 - Para melhor compreender e delimitar a exacta questão de constitucionalidade normativa que vem colocada, importa começar por, ainda que de forma breve, descrever a evolução do quadro legal que conduziu à solução normativa que o recorrente pretende ver confrontada com a Constituição. Vejamos.

10.1 - Com o objectivo assumido, no próprio preâmbulo, de "devolver coerência" e "dotar de equidade" o sistema retributivo da função pública, o Governo aprovou o Decreto-Lei 184/89, de 2 de Junho, diploma que veio lançar as bases de um novo sistema retributivo (NSR) da função pública. Com particular relevância para a questão que agora nos ocupa, dispunha o artigo 38.º daquele diploma que seriam "extintas todas as remunerações não previstas ou enquadráveis no artigo 15.º", preceito que, por sua vez, estabelecia, no seu n.º 1, que "o sistema retributivo da função pública é composto por: a) remuneração base; b) prestações sociais e subsídio de refeição; c) suplementos [concretizados depois no artigo 19.º]", acrescentando-se ainda, no n.º 2, que não seria "permitida a atribuição de qualquer tipo de abono que não se enquadre nas componentes referidas no número anterior". Porém, para salvaguarda dos direitos já adquiridos, foi estatuído no n.º 3 do artigo 39.º deste mesmo diploma que, "nos casos de percepção de remunerações acessórias extintas pelo artigo anterior, a remuneração a considerar para efeitos de transição resulta do somatório dos montantes correspondentes à remuneração base, às diuturnidades e às remunerações acessórias", e, no n.º 4, que, "sempre que o montante apurado nos termos do n.º 3 ultrapasse o valor do escalão máximo da respectiva categoria", seria criado um diferencial de integração correspondente à diferença entre a remuneração indiciária e o montante já percebido, o qual, no entanto, nos termos do n.º 6 do mesmo artigo, "tem carácter de remuneração pessoal e não pode ser atribuído a situações constituídas após a entrada em vigor do novo sistema retributivo". Finalmente, no n.º 2 do artigo 40.º, garantia-se ainda que, em caso algum, poderia "resultar da introdução do novo sistema retributivo redução da remuneração que o funcionário ou agente já aufere [...]". Em suma: com este conjunto de preceitos, o legislador pretendeu, por um lado, "devolver coerência" e "dotar de equidade" o sistema, pondo "cobro à vasta teia de subsistemas retributivos e de remunerações acessórias praticadas", e, simultaneamente, como se ponderou na decisão recorrida, salvaguardar as remunerações que cada um já auferisse a título pessoal à data da entrada em vigor do Decreto-Lei 184/89 (o que, nos termos do seu artigo 43.º, n.º 1, articulado com o artigo 45.º, n.º 1, do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, aconteceu em 1 de Outubro de 1989).

10.2 - O Decreto-Lei 184/89 previa, contudo, no seu artigo 43.º, n.º 1, que os princípios gerais que nele se estabeleciam seriam objecto de desenvolvimento e regulamentação por outros diplomas legais, o que, no que respeita ao estatuto remuneratório dos funcionários e agentes da Administração Pública, foi feito através do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro (o qual, nos termos do respectivo artigo 45.º, n.º 1, produziu efeitos a partir de 1 de Outubro de 1989). É neste último diploma que se inserem dois dos preceitos de que se extrai a norma que o recorrente pretende ver confrontada com a Constituição. Por um lado, estatui-se no n.º 2 do artigo 30.º que "a remuneração a considerar para efeitos da transição referida no n.º 1 resulta do valor correspondente à remuneração base decorrente do Decreto-Lei 98/89, de 29 de Março, actualizada a 12%, acrescida do montante da remuneração acessória a que eventualmente haja direito, com excepção das que sejam consideradas suplementos, nos termos do Decreto-Lei 184/89, de 2 de Julho, e deste diploma", e, no n.º 3, que, "para efeitos do número anterior, as remunerações acessórias de montante variável são fixadas no valor médio das remunerações acessórias percebidas nos 12 meses imediatamente anteriores à data da produção de efeitos do presente diploma", preceituando-se ainda, no n.º 5, que "da aplicação do presente diploma não pode resultar a redução das remunerações efectivamente auferidas". No que se refere ao regime de transição do pessoal destacado, requisitado e em comissão de serviço, estabeleceu-se no artigo 32.º, n.º 2, que, "se o lugar de destino conferir direito a remuneração acessória de qualquer natureza, a remuneração a abonar no lugar de destino, enquanto se mantiverem o destacamento, a requisição e a comissão de serviço, é apurada nos termos dos n.os 2 a 5 do artigo 30.º"

10.3 - Em virtude da sua especificidade, porém, as remunerações dos funcionários da administração tributária foram objecto de regulação autónoma, através do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho. Pertencem a este diploma os dois últimos artigos questionados pelo recorrente. O artigo 2.º, que supra já transcrevemos integralmente e que se limita a definir o âmbito pessoal de aplicação do diploma, e o n.º 4 do artigo 3.º, que preceitua que, "para efeitos de aplicação do n.º 3 do artigo 30.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, ao pessoal do regime geral da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, incluindo o pessoal dirigente abrangido pelo artigo 31.º do referido decreto-lei, adoptar-se-á critério idêntico ao utilizado para as carreiras de pessoal da administração tributária, sendo os respectivos montantes fixados por categoria, mediante despacho do Ministro das Finanças".

11 - A partir do quadro legal que, em síntese, se descreveu, considerou a decisão recorrida que, no caso do ora recorrente, uma vez que só foi requisitado e iniciou funções na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos em 18 de Junho de 1990 - vindo, aliás, a ser integrado no quadro desta Direcção-Geral somente a partir de 5 de Setembro de 1994 -, as remunerações acessórias a que tinham direito os funcionários que ali prestavam serviço antes da entrada em vigor do Decreto-Lei 184/89 (em 1 de Outubro de 1989) não lhe deveriam ter sido atribuídas nem, por consequência, deveriam ser levadas em conta para efeitos de transição para o novo sistema retributivo.

É esta a interpretação, cuja compatibilidade com a Constituição o recorrente questiona. No seu entendimento, sintetizado na conclusão da alínea f) da alegação para este Tribunal, "não há nenhuma razão atendível para rejeitar a aplicação ao recorrente do regime de transição do NSR de acordo com o artigo 30.º e por força do artigo 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, quando aquele à data da publicação do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, conjugado com o despacho ministerial de 19 de Abril de 1991, já se encontrava ao serviço na DGCI em regime de requisição (desde 18 de Junho de 1990) a receber como os demais funcionários da DGCI com a mesma categoria e número de diuturnidades e as mesmas remunerações acessórias, pelo que uma tal interpretação restritiva da lei (artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89) sufragada pelo acórdão recorrido - segundo a qual aquelas normas só se aplicariam ao pessoal integrado na DGCI à data da entrada em vigor do NSR (1 de Outubro de 1989) é atentatória do princípio da igualdade consagrado nos artigos 13.º e 59.º da Constituição e, como tal, deve ser declarada inconstitucional por esse Meritíssimo Tribunal Constitucional". Em suma, a questão de constitucionalidade que vem colocada pode, pois, enunciar-se nos seguintes termos: é compatível com a Constituição, designadamente com o princípio da igualdade consagrado nos seus artigos 13.º e 59.º, a norma, extraída por interpretação dos artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, e 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, que estatui que não devem ser consideradas, para efeitos de transição para o novo sistema retributivo da função pública estabelecido pelo Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, as remunerações acessórias auferidas, após 30 de Setembro de 1989, por funcionários requisitados, após essa data, para o exercício de funções na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e posteriormente integrados no respectivo quadro de pessoal?

Vejamos.

12 - Unanimemente reconhecido como princípio estruturante do Estado de direito democrático, o princípio da igualdade postula, na sua formulação mais sintética, que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento diferente para as situações de facto desiguais (cf., por todos, entre inúmeros nesse sentido, os Acórdãos n.os 563/96, 319/2000, 232/2003 e 96/2005, disponíveis na página Internet deste Tribunal - http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos -, que procederam, cada um no seu tempo, a uma síntese da abundante jurisprudência constitucional sobre o tema). Correctamente entendido, o princípio da igualdade não proíbe as distinções, mas apenas aquelas que se afigurem destituídas de um fundamento racional. Como se ponderou, por exemplo, no Acórdão 187/2001 (igualmente disponível naquela página): "como princípio de proibição do arbítrio no estabelecimento da distinção, tolera, pois, o princípio da igualdade a previsão de diferenciações no tratamento jurídico de situações que se afigurem, sob um ou mais pontos de vista, idênticas, desde que, por outro lado, apoiadas numa justificação ou fundamento razoável, sob um ponto de vista que possa ser considerado relevante". Em suma, e no essencial, o que o princípio constante do artigo 13.º da Constituição impõe, sobretudo, é uma proibição do arbítrio e da discriminação sem razão atendível. O que importa, como afirma, sugestivamente, Vieira de Andrade (Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 2.ª ed., 2001, p. 272), e tem sido repetido em inúmeras ocasiões pelo próprio Tribunal Constitucional, "é que não se discrimine para discriminar".

Por sua vez, o artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição concretiza o princípio da igualdade no que à retribuição do trabalho diz respeito, podendo servir de parâmetro de aferição da igualdade no domínio específico do seu âmbito de aplicação. Aí se estatui, designadamente, o princípio de que para "trabalho igual, salário igual", devendo a retribuição do trabalho atender à "quantidade, natureza e qualidade" daquele. Caracterizando o conteúdo do princípio da igualdade, na dimensão de "trabalho igual, salário igual", escreveu-se, por exemplo, no Acórdão 584/98 (igualmente disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos):

"O artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa - ao preceituar que "todos os trabalhadores [...] têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna" - impõe que a remuneração do trabalho obedeça a princípios de justiça.

Ora a justiça exige que, quando o trabalho prestado for igual em quantidade, natureza e qualidade, seja igual a remuneração. E reclama (nalguns casos apenas consentirá) que a remuneração seja diferente, pagando-se mais a quem tiver melhores habilitações ou mais tempo de serviço. Deste modo se realiza a igualdade, pois que, como se sublinhou no Acórdão 313/89 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13.º vol., t. II, pp. 917 e segs.), do que no preceito constitucional citado se trata é um direito de igualdade.

Escreveu-se neste aresto:

"O direito de que aqui se trata é um direito de igualdade - mas de uma igualdade material que exige que se tome sempre em consideração a realidade social em que as pessoas vivem e se movimentam e não de uma igualdade meramente formal e uniformizadora (cf. Francisco Lucas Pires, Uma Constituição para Portugal, Coimbra, 1975, pp. 62 e segs.).

Uma justa retribuição do trabalho é, no fundo, o que os princípios enunciados no preceito visam assegurar: a retribuição deve ser conforme à quantidade, natureza e qualidade do trabalho; deve garantir uma existência condigna e a trabalho igual - igual em quantidade, natureza e qualidade - deve corresponder salário igual.

O princípio 'para trabalho igual, salário igual' não proíbe, naturalmente, que o mesmo tipo de trabalho seja remunerado em termos quantitativamente diferentes, conforme seja feito por pessoas com mais ou menos habilitações e com mais ou menos tempo de serviço, pagando-se mais, naturalmente, aos que maiores habilitações possuem e mais tempo de serviço têm. O que o princípio proíbe é que se pague de maneira diferente a trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho, têm iguais habilitações e o mesmo tempo de serviço.

O que, pois, se proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjectivas.

Se as diferenças de remuneração assentarem em critérios objectivos, então elas são materialmente fundadas e não discriminatórias [...]""

E, desenvolvendo precisamente esta última dimensão do princípio da igualdade, ponderou-se, por exemplo e mais recentemente, nos Acórdãos n.os 323/2005 e 105/2006:

"Deste modo, não se apresenta como solução normativa destituída de fundamento material, face ao princípio da igualdade, a diferenciação remuneratória na categoria superior, mesmo que implique o recebimento de remuneração superior pelo funcionário menos antigo nessa categoria, que resulte do diferente posicionamento atingido nos escalões da categoria de origem, desde que isso corresponda a um factor objectivo, susceptível de repercutir-se nas características do trabalho prestado ou nas capacidades e qualificações profissionais dos trabalhadores em causa, como sucede com a maior antiguidade na carreira. Face à substancial homogeneidade do conteúdo funcional das diversas categorias que a compõem, a valorização da experiência profissional inerente ao maior tempo de serviço na carreira não colide com os parâmetros da igualdade retributiva da alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, visto que não é desrazoável presumir que essa maior experiência global se possa traduzir num melhor desempenho. Por outro lado, não se trata de uma solução dirigida a beneficiar ou desfavorecer uma classe de funcionários determinada segundo um elemento arbitrariamente fixado, porque a antiguidade ou tempo de serviço na carreira é uma característica que todos compartilham e com que todos contam na melhoria da sua situação retributiva [...]"

Descritos os traços essenciais dos parâmetros constitucionais com os quais a norma questionada tem de ser confrontada, cabe perguntar: a não consideração, para efeitos de transição para o novo sistema retributivo da função pública, criado pelos Decretos-Leis 184/89, de 2 de Junho e 353-A/89, de 16 de Outubro, das remunerações acessórias auferidas após 30 de Setembro de 1989 por funcionários requisitados, depois essa data, para o exercício de funções na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e, posteriormente, integrados no respectivo quadro de pessoal, se comparada com a consideração, para os mesmos efeitos de transição, das remunerações acessórias auferidas pelos funcionários que, já antes de 30 de Setembro de 1989, pertenciam ao referido quadro, é arbitrária ou, pelo contrário, tem fundamento material bastante?

13 - De tudo quanto se deixou dito resulta evidente não só que são diferentes as situações que o recorrente pretende comparar mas também que, como se refere na decisão recorrida, tais diferenças não são meramente formais.

Desde logo, há uma razão determinante para que tivessem de ser consideradas, para efeitos de transição para o novo sistema retributivo, as remunerações acessórias auferidas pelos funcionários da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos que já exerciam funções naquela Direcção-Geral ao tempo da entrada em vigor do novo regime: a necessidade de tutela de direitos adquiridos e a impossibilidade de redução da retribuição. Razão que, manifestamente, não vale para aqueles que, como o ora recorrente, só passaram a exercer funções naquela Direcção-Geral já depois da entrada em vigor dos diplomas que vieram extinguir tais remunerações acessórias, uma vez que estes já sabiam que, a partir daquela data, as mesmas não eram devidas. Dito de outro modo: a razão fundamental para que tivessem de ser consideradas as remunerações acessórias, para efeitos de transição, em relação aos funcionários da DGSI que já aí exerciam funções, antes da entrada em vigor do NSR, não vale para aqueles que, como o ora recorrente, só passaram a exercer funções nessa Direcção-Geral depois de 1 de Outubro de 1989 (no caso concreto, em 18 de Junho de 1990), uma vez que, a partir da entrada em vigor do novo quadro legal, ficara estatuído que, para os novos funcionários, as mesmas não eram devidas. Como se mencionou na decisão recorrida, à data da entrada em vigor das regras que definiram as condições de transição para o NSR da função pública, o ora recorrente era ainda funcionário e exercia funções no IROMA, pelo que era em relação aos demais funcionários do quadro deste Instituto que se encontrassem em condições iguais às suas que o recorrente podia legitimamente aspirar a ser tratado de modo igual.

Acresce, finalmente, que uma outra razão - também ela apontada pela decisão recorrida - pode ainda ser invocada para justificar a diferença de tratamento e, dessa forma, afastar a alegada violação do princípio constitucional da igualdade, designadamente na dimensão a que se refere o artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, de que a trabalho igual deve corresponder salário igual. É que, como ali se refere, "a experiência anterior em área diversa não é igual em termos substanciais à dos funcionários do quadro da DGCI", sendo aceitável, do ponto de vista daquele princípio constitucional, que esse factor seja tido em conta para efeitos remuneratórios.

14 - Assim sendo, apenas resta concluir que a norma questionada pelo recorrente, extraída dos artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, e 2.º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei 187/90, de 7 de Junho, na interpretação que deles fez a decisão recorrida, distinguindo a situação dos funcionários que já exerciam funções na Direcção-Geral das Contribuições e Impostos antes de 1 de Outubro de 1989 da situação daqueles que só após essa data para ali foram requisitados, tem fundamento material bastante e, consequentemente, não viola o princípio constitucional da igualdade.

III - Decisão. - Nestes termos, decide-se negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta.

Lisboa, 27 de Setembro de 2006. - Gil Galvão - Vítor Gomes - Maria dos Prazeres Pizarro Beleza - Bravo Serra - Artur Maurício.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1524430.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1989-03-29 - Decreto-Lei 98/89 - Ministério das Finanças

    Procede à actualização para o ano de 1989 das remunerações base, pensões, gratificações e ajudas de custo dos trabalhadores da Administração Pública.

  • Tem documento Em vigor 1989-06-02 - Decreto-Lei 184/89 - Presidência do Conselho de Ministros

    Estabelece principios gerais de salários e gestão de pessoal da Função Pública.

  • Tem documento Em vigor 1989-09-07 - Lei 85/89 - Assembleia da República

    Introduz alterações à Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, lei de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1989-10-16 - Decreto-Lei 353-A/89 - Presidência do Conselho de Ministros

    Estabelece regras sobre o estatuto remuneratório dos funcionários e agentes da Administração Pública e a estrutura das remunerações base das carreiras e categorias nele contempladas.

  • Tem documento Em vigor 1990-06-07 - Decreto-Lei 187/90 - Ministério das Finanças

    Estabelece o estatuto remuneratório do pessoal das carreiras da administração tributária e aprova a respectiva escala salarial.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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