de 2 de Março
No quadro da reestruturação do novo sistema da autoridade marítima, com vista a conferir uma maior eficácia à autoridade exercida pelo Estado em matérias de enorme importância estratégica, como sejam a preservação do meio marinho, a salvaguarda da vida humana no mar e a segurança da navegação, foi readaptado o perfil de competências cometidas aos vários organismos com intervenção nestes espaços, tipificando-se o âmbito específico de actuação, em razão da matéria e da área territorial.À aprovação dos novos quadros de competências terá de corresponder uma reestruturação de regimes contra-ordenacionais que permitam, com actualidade e eficácia, dotar aquelas entidades dos instrumentos necessários ao cumprimento e exercício efectivo dos poderes alicerçados em princípios de celeridade e de cooperação institucional entre estas entidades e organismos que integram o novo sistema da autoridade marítima.
Por outro lado, os vários regimes de ilícitos de mera ordenação social de especialidade, que ao longo de várias décadas foram sendo publicados, em matérias que actualmente se inscrevem nas prioridades do sistema da autoridade marítima e que têm cometido às capitanias dos portos os poderes vários de fiscalização, de instrução e de decisão processual, apresentam notórias situações de omissão legislativa, as quais evidenciam fragilidades no plano de actuação da autoridade pública, que urge colmatar.
Importa, pois, com actualidade e rigor, dotar os órgãos locais da Direcção-Geral da Autoridade Marítima com os imprescindíveis mecanismos de poder público necessários ao exercício da autoridade do Estado nas áreas de jurisdição marítima nacional, evitando-se situações de vazio legal, conferindo, desta forma, uma maior eficácia à actuação daquele organismo, integrante da estrutura da autoridade marítima nacional.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta, para valer como lei geral da República, o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto e âmbito
1 - O presente diploma estabelece o regime das contra-ordenações a aplicar nos casos dos ilícitos ocorridos nas áreas sob jurisdição da autoridade marítima nacional (AMN), incluindo ilícitos que ocorram em terrenos do domínio público marítimo, por violação das leis e regulamentos marítimos aplicáveis naquelas áreas, quaisquer que sejam os seus agentes.2 - O disposto no número anterior não prejudica o disposto na lei sobre as competências específicas das autoridades portuárias nas respectivas áreas de jurisdição.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do presente diploma entende-se por:a) «Capitanias dos portos» os órgãos locais da Direcção-Geral da Autoridade Marítima, integrada na autoridade marítima nacional;
b) «Áreas sob jurisdição da AMN» todas as águas interiores sujeitas à sua jurisdição nos termos legalmente previstos, a faixa de terreno do domínio público marítimo nesta jurisdição incluída, o mar territorial e, em conformidade com as disposições da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, de 10 de Dezembro de 1982, a zona contígua, a zona económica exclusiva e a plataforma continental;
c) «Áreas sob jurisdição portuária» as áreas que se encontrem sob jurisdição das autoridades portuárias, nos termos estabelecidos nos respectivos diplomas estatutários.
Artigo 3.º
Conceito
1 - Constitui contra-ordenação todo o facto censurável resultante da prática de actos contrários ao estabelecido nas leis e regulamentos, aplicáveis nas áreas sob jurisdição da autoridade marítima nacional, que possam fazer perigar a segurança de pessoas e bens, da navegação, o regular funcionamento dos portos ou que provoquem danos no património público.2 - Constituem ainda contra-ordenação os factos que ofendam ou contrariem os normativos ou determinações específicas do capitão do porto, que possam contribuir para a degradação do meio marinho e dos bens que integram o domínio público marítimo, ou causar prejuízo a outras actividades que se desenvolvam nas áreas sob jurisdição da AMN, bem como quaisquer actos que violem as obrigações decorrentes dos regimes legais do registo, inscrição e identificação marítima.
3 - Se o mesmo facto constituir, simultaneamente, crime e contra-ordenação, será o agente punido a título de crime, sem prejuízo das sanções acessórias especificamente previstas para a contra-ordenação.
Artigo 4.º
Contra-ordenações e coimas
1 - Constitui contra-ordenação punível com coima de (euro) 2200 a (euro) 3700:a) Não observar, ou cumprir deficientemente, as determinações do capitão do porto no que respeita ao acesso ao mar territorial ou sua interdição ou quaisquer outras determinações em matéria de navegação naquele espaço marítimo;
b) Abandonar destroços de navios, seja em resultado de sinistro seguido de abandono forçado ou em caso de encalhe, não observando as determinações do capitão do porto;
c) Não acatar a determinação do fecho da barra, salvo casos de força maior;
d) Sair do porto sem possuir o respectivo despacho de largada do navio ou embarcação;
e) Efectuar quaisquer manobras que afectem o regular funcionamento do porto, suas entradas ou saídas, ou praticar actos tendentes a colocar obstáculos às vias navegáveis;
f) Impedir ou adoptar medidas que constituam obstáculos ao direito de visita dos agentes da Polícia Marítima (PM) ou ao acesso de equipas de vistoria aos navios ou embarcações;
g) Não cumprir as determinações do capitão do porto em acções de salvamento e socorro marítimo ou de protecção civil em caso de recusa de cedência de navio, embarcação ou equipamento cuja utilização se revele fundamental para o cumprimento daquelas missões;
h) Não acatar a decisão de detenção de navio ou embarcação por parte do capitão do porto ou da ordem de recusa de acesso e permanência no porto ou em área de jurisdição marítima;
i) Fundear fora das áreas que forem determinadas pelo capitão do porto;
j) Efectuar quaisquer trabalhos de pesquisa, prospecção ou exploração ou ainda instalar quaisquer infra-estruturas, equipamentos, cabos ou ductos submarinos na plataforma continental, sem autorização ou licenciamento das autoridades competentes;
k) Instalar ou explorar quaisquer sistemas de produção de energia nas áreas de jurisdição da AMN sem a respectiva autorização, licenciamento ou concessão, ou em violação dos seus termos.
2 - Constitui contra-ordenação punível com coima de (euro) 400 a (euro) 2500:
a) Construir quaisquer edificações ou colocar objectos, equipamentos ou bens em áreas de servidão de assinalamento marítimo, ou em espaços especificamente afectos a imóveis ou equipamentos de sinalização marítima, bem como praticar quaisquer actos que possam interferir com o seu acesso ou utilização;
b) Não observar as determinações constantes do edital da capitania, designadamente em matéria de avisos aos navegantes, comunicações e sinistros;
c) Lançar dragados ou depositar detritos em áreas não autorizadas;
d) Não colaborar com o capitão do porto em processo de averiguação ao relatório de mar apresentado não permitindo, designadamente, a deslocação ou presença de tripulantes para recolha de declarações;
e) Não participar à capitania do porto a ocorrência de sinistro marítimo na área de jurisdição marítima, ainda que tenha sido comunicado a outras entidades;
f) Não participar à capitania do porto a existência de destroços, embarcações naufragadas ou encalhadas, estacas ou quaisquer outros obstáculos artificiais ou naturais que possam colocar em perigo a segurança da navegação;
g) Utilizar indevidamente ou adulterar o nome, marcações, caracteres de identificação de navios ou embarcações;
h) Não observar as condições de segurança estabelecidas sobre o acesso a bordo de navios ou embarcações e a pontões, designadamente colocação de pranchas, redes de protecção e iluminação do local;
i) Lançar fogo-de-artifício, foguetes, efectuar disparos ou emitir quaisquer outros sinais que possam ser confundidos com sinais de alarme ou socorro sem a licença da respectiva capitania do porto.
3 - Constitui contra-ordenação punível com coima de (euro) 25 a (euro) 500:
a) Danificar ou alterar marcas ou instrumentos de sinalização de áreas onde se desenvolvam trabalhos de pesquisa e actividade arqueológica subaquática;
b) Não possuir prova de pagamento da taxa de farolagem e balizagem;
c) Realizar nas áreas de jurisdição marítima quaisquer actos de natureza desportiva ou cultural sem a necessária autorização da capitania do porto competente;
d) Não possuir registo de propriedade válido ou não observar os procedimentos aplicáveis em matéria de registo marítimo, sem prejuízo do disposto em legislação relativa à náutica de recreio;
e) Não possuir a documentação e demais papéis de bordo legalmente exigíveis ou não os facultar para verificação;
f) Não prestar, injustificadamente, as informações solicitadas pelo agente de autoridade ou não cumprir os prazos que lhe forem determinados para apresentação de documentos na capitania do porto;
g) Dar início, em estaleiros, à construção de qualquer navio ou embarcação sem comunicação à capitania do porto competente, sem prejuízo do disposto em legislação relativa à náutica de recreio;
h) Não submeter a tentativa de conciliação os assuntos que o devam ser nos termos estabelecidos na Lei dos Tribunais Marítimos;
i) Não requerer previamente à entidade competente o desmantelamento ou demolição de navios ou embarcações com vista ao seu abate;
j) Realizar trabalhos de soldadura ou outros a bordo de navios ou embarcações que possam colocar em perigo a segurança dos mesmos sem licença da respectiva capitania do porto;
k) Manter embarcações com paus de carga disparados fora de borda sem que estejam em curso operações de carga ou descarga;
l) Não observar os requisitos de atracação de embarcações de pequeno porte;
m) Não observar o disposto no artigo 120.º do Regulamento Geral das Capitanias, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 208/2000, de 2 de Setembro;
n) Não possuir licença para a prática de outros actos na área de jurisdição marítima.
4 - Caso a infracção seja praticada por pessoas colectivas, os montantes mínimos e máximos das coimas previstas nos n.os 1, 2 e 3 são elevados, respectivamente, para (euro) 10000 e (euro) 44000, (euro) 2500 e (euro) 30000 e (euro) 500 e (euro) 20000.
Artigo 5.º
Negligência e tentativa
1 - A negligência e a tentativa são puníveis.2 - Os montantes das coimas previstos no artigo anterior são reduzidos a metade nos seus limites mínimos e máximos no caso de a infracção ter sido praticada com negligência ou de se tratar de tentativa.
Artigo 6.º
Suspensão do pagamento da coima
1 - O capitão do porto competente para aplicar as sanções previstas no presente diploma pode, em casos de comprovada insuficiência económica e do baixo grau de culpa do agente, determinar a suspensão do pagamento da coima concretamente aplicada, por um período não inferior a um ano nem superior a três anos.2 - Caso o agente venha a ser condenado, por decisão definitiva ou transitada em julgado, pela prática de nova infracção no período fixado nos termos do número anterior, cessa a suspensão do pagamento da coima, com efeitos à data da prática do facto, tornando-se exigível o seu pagamento nos prazos legalmente fixados.
3 - O disposto no n.º 1 do presente artigo não se aplica às sanções acessórias nem prejudica o disposto na lei sobre a atenuação especial da coima.
Artigo 7.º
Admoestação
Em casos de reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente, pode o capitão do porto proferir uma admoestação.
Artigo 8.º
Medidas cautelares
1 - Quando a gravidade da infracção o justifique, pode o capitão do porto ordenar como medida cautelar:a) A apreensão do navio ou embarcação e demais equipamentos susceptíveis de terem sido utilizados na prática da contra-ordenação ou poderem vir a sê-lo na prática de novas infracções;
b) A exigência de depósito de uma caução cujo montante corresponde ao limite máximo da coima abstractamente aplicável;
c) Suspensão de trabalhos em curso.
2 - As decisões previstas no presente artigo são notificadas às pessoas que sejam titulares de direitos que por elas possam ser afectados.
Artigo 9.º
Sanções acessórias
1 - Em função da gravidade da infracção e da culpa do agente, o capitão do porto pode decretar as seguintes sanções acessórias:a) Perda do navio ou embarcação e demais equipamento utilizado na prática da contra-ordenação;
b) Suspensão de licenças ou autorizações concedidas pelas capitanias dos portos competentes.
2 - A sanção acessória prevista na alínea a) do número anterior só pode ser decretada se os bens ali previstos serviram ou estavam destinados a servir para a prática de uma contra-ordenação ou que por esta tenham sido produzidos.
3 - A sanção acessória prevista na alínea b) do número anterior só pode ser decretada se a contra-ordenação tiver sido praticada no exercício ou por causa da actividade a que se refere a licença ou autorização.
4 - Quando for declarada a perda de navios, embarcações, equipamentos ou objectos a favor do Estado, o director-geral da Autoridade Marítima propõe, no prazo de 30 dias úteis a contar da data da decisão definitiva ou do trânsito em julgado da decisão judicial, a sua afectação a entidades públicas ou instituições particulares de solidariedade social, mediante parecer obrigatório da Direcção-Geral do Património.
5 - Caso o parecer previsto no número anterior não seja emitido no prazo máximo de 30 dias úteis a contar da data de recepção da proposta, o director-geral da Autoridade Marítima determinará a sua afectação definitiva nos termos propostos.
Artigo 10.º
Fiscalização
1 - Compete aos capitães dos portos fiscalizar o cumprimento do disposto no presente diploma, determinar o estabelecimento de medidas cautelares, proceder à instrução processual, aplicar as coimas e decretar as sanções acessórias decorrentes da prática dos ilícitos contra-ordenacionais.2 - Compete à PM fiscalizar o disposto no presente diploma, determinar o estabelecimento de medidas cautelares de polícia necessários à salvaguarda e protecção de todos os meios de prova relacionados com as infracções detectadas, bem como a prática de actos de instrução dos processos contra-ordenacionais.
3 - Sempre que sejam detectados ilícitos contra-ordenacionais por unidades navais da Marinha em áreas sob jurisdição marítima nacional, compete ao comandante do navio levantar o auto de notícia e tomar todas as medidas consideradas adequadas à salvaguarda de todos os meios de prova admissíveis em direito.
4 - Compete ainda ao comandante do navio, nos termos previstos no número anterior, caso considere provável a fuga do infractor ou a destruição de meios de prova, determinar o apresamento do navio ou embarcação, acompanhando-o até ao porto nacional mais próximo, fazendo entrega do mesmo ao capitão do porto competente para os demais procedimentos subsequentes.
5 - Quaisquer autoridades administrativas ou policiais que detectem factos ou condutas susceptíveis de constituir infracção contra-ordenacional devem levantar auto de notícia, adoptar medidas de protecção ou salvaguarda de meios de prova e proceder à sua remessa à capitania do porto com jurisdição na área da sua ocorrência.
Artigo 11.º
Destino do produto das coimas
O produto das coimas previstas neste diploma reverte:a) 10% para a entidade que levantar o auto de notícia;
b) 30% para a entidade que proceder à instrução e decisão processual;
c) 60% para o Estado.
Artigo 12.º
Direito subsidiário
Em tudo o que não se encontrar especialmente previsto no presente diploma é aplicável o regime geral das contra-ordenações, aprovado pelo Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei 244/95, de 14 de Setembro.
Artigo 13.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor 30 dias após a data da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 5 de Dezembro de 2001. - António Manuel de Oliveira Guterres - Jaime José Matos da Gama - Guilherme d'Oliveira Martins - Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena - Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues - António Luís Santos Costa.
Promulgado em 11 de Fevereiro de 2002.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 14 de Fevereiro de 2002.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.