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Acórdão 1/2006/T, de 19 de Janeiro

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Texto do documento

Acórdão 1/2006/T. Const. - Processo 1075/2005. - Acordam no plenário do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - No Acórdão 723/2005, de 29 de Dezembro, a 1.ª Secção do Tribunal decidiu admitir as candidaturas à eleição de Presidente da República, a realizar em 22 de Janeiro de 2006, dos cidadãos António Pestana Garcia Pereira, Aníbal António Cavaco Silva, Francisco Anacleto Louçã, Manuel Alegre de Melo Duarte, Jerónimo Carvalho de Sousa e Mário Alberto Nobre Lopes Soares, e não admitir as candidaturas à mesma eleição dos cidadãos Diamantino Maurício da Silva, Josué Rodrigues Gonçalves Pedro, Maria Teresa Lemos Lameiro, Maria Manuela de Sousa Magno, Carmelinda Maria dos Santos Pereira, Luís Filipe Brito da Silva Guerra e Luís Filipe Botelho Ribeiro.

2 - Da decisão de inadmissão vieram recorrer para o plenário do Tribunal Luís Filipe Botelho Ribeiro, Maria Manuela de Sousa Magno e Luís Filipe Brito da Silva Guerra.

O primeiro apresentou um requerimento de recurso com o seguinte teor:

"Luís Filipe Botelho Ribeiro, candidato à Presidência da República com processo no Tribunal Constitucional n.º 4088, não se conformando com a decisão de não aceitação da sua candidatura, dela vem interpor recurso para o colectivo do egrégio Tribunal Constitucional, a mais alta instância judicial da República Portuguesa.

A razão de fundo para este recurso é a de considerar que a sua exclusão resulta de uma grave e evidente injustiça que não deve ser sancionada e ratificada de facto com a sua exclusão.

Afirmamos que o insuficiente número de declarações de propositura decorre directamente de um tratamento deliberadamente discriminatório por parte de entidades públicas, com obrigações consignadas na lei de publicação das propostas das diferentes candidaturas, obrigações essas que, como é público e notório, tendo sido amplamente assumidas em relação a outras, arbitrariamente escolhidas sem qualquer critério democraticamente válido, não foram cumpridas em relação a esta candidatura.

Esta candidatura contribui para o pluralismo do regime democrático, defendendo claramente algumas ideias e valores que nenhuma outra candidatura assume. Propõe-se igualmente reforçar a participação da sociedade civil na vida pública e a renovação de figuras na classe política portuguesa.

Esta candidatura reclamou e foram-lhe negadas pela concessionária de serviço público de televisão quaisquer oportunidades de divulgação do seu programa e candidato em condições mínimas de igualdade com as outras, mesmo depois de formalizada no Tribunal Constitucional. Consideramos por isso ter sido violado o princípio da igualdade de oportunidades consagrado na lei e que obriga, nomeadamente em eleições legislativas, a RTP a dedicar tempos informativos iguais a todos os partidos, a partir da data de marcação das eleições. Embora omissa em relação às presidenciais, parece-nos que o espírito da lei obrigaria neste caso a que a televisão pública consagrasse o mesmo tempo e tratamento em entrevistas e debates a todos os candidatos a partir, pelo menos, do momento de formalização das respectivas candidaturas e da marcação das eleições.

Os cidadãos que interpelávamos só se dispunham a dar-nos o seu apoio após conhecimento das ideias e do candidato. Esta fase de recolha de apoios é já um processo político e de cidadania de grande importância, correspondendo de certa forma às eleições primárias noutros países, ou seja, à fase em que se define quem, de todos os que manifestam essa disponibilidade e intenção, será afinal candidato. Sem acesso à televisão, paga por todos nós para apresentar aos cidadãos uma informação isenta, pluralista e completa, não formatada por critérios sectários, tivemos de recorrer à imprensa regional e local para divulgar o nosso projecto e recolher as assinaturas quase porta a porta, o que se comprova pelo padrão geográfico dos nossos proponentes. É legítimo supor-se que se, como os outros candidatos, tivéssemos tido oportunidade de fazer chegar a nossa mensagem a todo o País, certamente teríamos atingido e ultrapassado o limite exigido das 7500 assinaturas.

Se a República não conseguiu ou não se esforçou suficientemente para criar condições de pluralismo democrático nos seus próprios canais públicos de televisão, se não se empenhou para fazer valer o mesmo tipo de exigências de transparência, pluralismo e isenção que impõe em eleições legislativas, o próximo acto eleitoral não poderá ser considerado democrático se uma só candidatura vier a ser rejeitada com base no critério do número de proponentes. É óbvio que tal número depende do conhecimento público do programa e que essa divulgação, podendo e devendo ser assegurada pelo serviço público de televisão, acabou por não ser feita apesar de insistentemente solicitada por todos os candidatos - apenas 13, ao fim e ao cabo.

Em conclusão:

Considerando que a democracia dos cidadãos é para ser levada a sério e que não há nem pode haver cidadãos de primeira e de segunda categoria numa democracia moderna;

Considerando que, num Estado de direito, as obrigações decorrentes do princípio de igualdade de oportunidades consignado na lei se sobrepõem à arbitrariedade de quaisquer critérios editoriais durante períodos eleitorais como aquele que vivemos a partir do momento em que foi marcada a eleição presidencial de 2006;

Considerando absolutamente injusta e contrária às leis da República a ostracização do nosso e de outros programas cívicos pelo serviço público de televisão, já mesmo depois de formalizada a candidatura, o que fizemos em 16 de Dezembro, ainda antes de pelo menos dois dos debates arranjados a cinco e ignorando todos os outros cidadãos;

Considerando que a política editorial da RTP, contra a qual intentámos uma acção junto das entidades competentes que dificilmente terá efeitos em tempo útil, teve como resultado premeditado um muito deficiente conhecimento pelos cidadãos do nosso projecto cívico:

Pedimos justiça aos Mmos. Juízes do egrégio Tribunal Constitucional, requerendo a revisão da decisão de não aceitação da nossa candidatura com base unicamente no critério do número de proponentes, uma vez que tal decisão apenas teria o pernicioso efeito de ratificar, sancionar, estender, agravar e dar sequência a uma injustiça anteriormente praticada por um organismo sob tutela do Estado, supostamente ao serviço de todos e cada um dos cidadãos, a televisão pública, à qual não devem as instituições de garantia da constitucionalidade democrática permitir que em nenhuma circunstância se transforme num instrumento partidocrático e de perpetuação no poder da actual classe dirigente. A outra condição exigida, apesar de por nós mal compreendida, foi satisfeita em tempo útil através da indicação de um domicílio em Lisboa para contacto com o mandatário."

Por sua vez, Maria Manuela de Sousa Magno apresentou o seguinte requerimento de recurso:

"A candidatura às eleições para a Presidência da República da cidadã portuguesa Maria Manuela de Sousa Magno, registada e colectada com o NIPC 901586560, não se conformando com o douto acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional em 29 de Dezembro de 2005 pelas 20 horas e 15 minutos, relativamente ao seu processo de candidatura, vem, nos termos e para os efeitos do artigo 94.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, apresentar recurso do mesmo.

Com os seguintes fundamentos:

Dos factos:

1.º No uso de um direito constitucional, cf. artigo 48.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, a cidadã Maria Manuela de Sousa Magno decidiu concorrer às eleições presidenciais de Janeiro de 2006.

2.º Sem apoio de máquinas partidárias ou outros, iniciou o seu processo de candidatura junto dos cidadãos, em cumprimento do requisito plasmado no artigo 13.º, n.º 1, do Decreto-Lei 319-A/76, de 3 de Maio.

O que veio a conseguir.

3.º Independente de grupos de pressão, corporações ou interesses económicos, demasiado cedo sentiu as 'resistências' provenientes do 'coração' do Estado de direito democrático,

Ou seja,

4.º Das instituições que mais deviam dignificar o 'seu' suporte institucional: a Constituição da República Portuguesa!

5.º Defraudados os milhares de proponentes desta candidatura, assim como todos aqueles que de forma voluntária e dedicada a ergueram, denunciam veementemente a discriminação e desigualdade com que ostensivamente foram tratados, em consciente violação do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.

Porquanto,

6.º Em 5 de Dezembro de 2005, a candidatura recorrente, no uso de um direito que lhe assiste, solicitou ao STAPE, para facilitar a instrução do seu processo de candidatura, a consulta e ou fornecimento dos cadernos nacionais de recenseamento eleitoral,

No entanto,

7.º Apesar de a candidatura cumprir todos os requisitos legais, nomeadamente o seu registo como pessoa colectiva, n.º 901586560, foi o solicitado rejeitado pelo STAPE, de forma liminar e por telefone.

8.º Consciente da razão e do direito que lhe assistia, a candidatura recorrente solicitou de novo o pedido para a Comissão Nacional de Eleições, tendo o mesmo, em clara violação e desrespeito pela lei, nomeadamente o artigo 29.º da Lei 13/99, de 22 de Março, sido negado com uma 'falsa' fundamentação de direito [documentos 1 e 1-a)].

No entanto,

9.º No cumprimento do que dispõe o artigo 14.º, n.º 1, do Decreto-Lei 319-A/76, de 3 de Maio, a candidatura recorrente entregou no passado dia 23 no Tribunal Constitucional o seu processo de candidatura com as assinaturas proponentes, necessárias ao mesmo (documento 2).

10.º No dia 26, o Tribunal Constitucional comunica à candidatura, por fax, pelas 21 horas e 26 minutos a existência de irregularidades [documentos 3, a), b)].

As quais,

11.º Consistiam na falta de certificados de cidadãos eleitores, o que era do conhecimento da candidatura porque os mesmos eram esperados na sede, enviados por correio pelas respectivas juntas de freguesia.

12.º Mais uma vez, e no dia 28 pelas 15 horas e 50 minutos, a recorrente deslocou-se ao Tribunal Constitucional a fim de regularizar o seu processo de candidatura, nos termos do artigo 93.º, n.º 3, da Lei 28/82, de 15 de Novembro.

13.º Após terem sido entregues 657 certidões, e no período em que a candidata, acompanhada de três apoiantes, as uniam às respectivas declarações, o Tribunal Constitucional pelas 16 horas e 30 minutos impôs a paragem do processo em curso, apenas contabilizando as que já estavam unidas e que perfaziam 70.

14.º Pela persistência da candidata em querer ser recebida pelo Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, face à não contabilização das restantes certidões, acabaram as mesmas por serem recolhidas para contagem.

Nesse mesmo período,

15.º A candidata informa o Tribunal Constitucional de que na sede de candidatura se encontravam ainda, no mínimo, mais 114 certidões, o que veio a verificar-se serem 160.

No entanto,

16.º O Tribunal Constitucional não permite que se vá à sede da candidatura recolher essas certidões e reafirma a paragem de todo o processo, apesar de o mesmo ter sido interrompido, sem mais, quando ainda estava em curso as contagens e uniões das certidões com as declarações.

17.º Inconformada, a recorrente expressou naquele momento a disposição de apresentar recurso, e, no dia 29 pelas 10 horas e 25 minutos, entregou um requerimento no Tribunal Constitucional, que o mesmo omitiu no seu acórdão, acompanhado de mais 160 certidões de eleitor.

Do direito:

18.º No dia 29, pelas 20 horas e 15 minutos, o Tribunal Constitucional informa, por fax, a decisão do acórdão que conclui pela rejeição da candidatura agora recorrente,

Contudo,

19.º Deixa por esclarecer, o que entende nos termos da lei, o que são dois dias para suprir irregularidades processuais. Cf. artigo 93.º, n.º 3, da Lei 28/82.

De facto,

20.º Sendo a candidatura recorrente notificada das irregularidades pelas 21 horas e 26 minutos do dia 26, serão dois dias quarenta e oito horas ou tantas quantas o Tribunal Constitucional dê entendimento?

Na verdade:

21.º Nem a remissão para a norma quanto ao funcionamento dos tribunais, do CPC, que o Tribunal Constitucional faz é relevante,

Já que,

22.º É o próprio Tribunal Constitucional que, ao efectuar uma notificação às 21 horas e 26 minutos, está a 'dizer' que não está encerrado e nem encerra às 16 horas!

Em tais circunstâncias,

23.º A candidatura recorrente entende ter sido violada pelo Tribunal Constitucional a Lei 28/82, nomeadamente o seu artigo 93.º, n.º 3.

Acresce ainda,

24.º Como pode o Tribunal Constitucional rejeitar por extemporâneo um processo que está em pleno decurso, alegando as 16 horas para o fecho do Tribunal, quando toma tal decisão às 16 horas e 30 minutos?

Afinal a que horas encerra o Tribunal Constitucional?

25.º É convicção da candidatura recorrente que nada terá sido ao acaso ou 'ingénuo' quer quanto à notificação das irregularidades, feita em período já nocturno, quer mesmo quanto ao facto de estarmos perante a coincidência (??) de um dia de tolerância.

26.º A candidatura recorrente questiona o Tribunal Constitucional por que razão apenas contabilizou 70 certidões, e reconhece no seu acórdão, terem sido entregues mais 587 certidões,

E mais,

27.º Aceita um requerimento, acompanhado de mais 160 certidões sem que sobre o mesmo se pronuncie,

Assim,

28.º Devia o Tribunal Constitucional devolver à candidatura recorrente as 747 certidões que manteve em seu poder sem as contabilizar e,

29.º De forma imparcial e isenta, a que estão obrigados todas as instituições superiores do Estado de direito, informar sem ambiguidades,

30.º A norma do CPC em que o Tribunal Constitucional se 'refugia' para interromper um processo em curso é a mesma que, no seu n.º 4 do artigo 143.º, permitiria à recorrente completar o seu processo de candidatura atempadamente.

Conclusão:

A candidatura recorrente considera, assim, que foram sujeitos a omissão ou violação os seguintes artigos:

Artigos 13.º e 48.º da Constituição da República Portuguesa;

Artigo 93.º, n.º 3, da Lei 22/89, de 15 de Novembro;

Artigo 29.º, da Lei 13/99, de 22 de Março;

Artigo 143.º, n.º 4, do CPC.

Nestes termos, e querendo continuar a acreditar nas instituições superiores do Estado, a candidatura recorrente de Maria Manuela de Sousa Magno espera de V.ª Ex.ª a habitual justiça!"

Luís Filipe Brito da Silva Guerra apresentou um requerimento de recurso mais extenso, que concluiu assim:

"1 - O recorrente entregou no Tribunal Constitucional, para instruir o seu processo de candidatura à eleição do Presidente da República, mais de 7500 declarações de proponentes, acompanhadas das respectivas certidões de eleitor.

2 - Esse número resulta quer da documentação entregue inicialmente pelo recorrente, no último dia do prazo para apresentação de candidaturas, quer da documentação entregue posteriormente, no último dia do prazo para suprimento das irregularidades verificadas.

3 - De facto, no prazo para suprimento de irregularidades, o recorrente não só entregou pessoalmente no Tribunal Constitucional 648 propostas de candidatura instruídas com certidão de eleitor dos subscritores como, além disso, enviou via fax mais 53 propostas de candidatura acompanhadas das respectivas certidões de inscrição no recenseamento eleitoral.

4 - Essas 53 novas propostas de candidatura e respectivas certidões de eleitor foram entregues pessoalmente no Tribunal Constitucional no início do dia seguinte ao termo do prazo para suprimento de irregularidades, antes do início da reunião para decidir sobre a admissão ou rejeição das candidaturas.

5 - Além dessas, também foram entregues no Tribunal Constitucional oito certidões de eleitor que se haviam enviado no dia anterior por fax, a que se alude na decisão recorrida, sendo certo que a respectiva declaração de proposição da candidatura do recorrente já se encontrava nos autos.

6 - A prática de actos processuais no âmbito do processo eleitoral segue o disposto nos artigos 143.º, n.º 4, e 150.º, n.os 2, alínea c), e 3, do Código de Processo Civil, por remissão feita pelo artigo 159.º-B da LEPR, não sendo legítimo afastar a sua aplicação ao caso vertente.

7 - A orientação jurisprudencial do Tribunal Constitucional tem sido a de aceitar o suprimento de irregularidades até à prolação da decisão de admissão ou de rejeição das candidaturas.

8 - Assim sendo, nada obsta à admissão da candidatura do recorrente.

9 - Em qualquer caso, e sem prescindir, o recorrente já tinha apresentado até às 16 horas do dia 28 de Dezembro o mínimo de 7500 declarações de proponentes da sua candidatura, embora 430 estivessem instruídas com documento probatório diferente de certidão de inscrição no recenseamento eleitoral, ainda que suficientemente explícito quanto à capacidade eleitoral dos proponentes.

10 - O recorrente alegou e demonstrou que só não apresentava a certidão de inscrição no recenseamento eleitoral dos referidos proponentes por motivos alheios à sua vontade, consubstanciados na recusa ou demora das entidades competentes para a sua emissão, apesar de os ter requerido.

11 - A lei eleitoral é omissa quanto à solução a dar a esta situação.

12 - Porém, a solução a dar a essa lacuna há-de resultar da aplicação conjugada dos artigos 366.º e 387.º, n.º 1, do Código Civil e do artigo 266.º, n.º 4, do Código de Processo Civil.

13 - Assim sendo, os documentos que o recorrente apresentou para demonstrar a inscrição no recenseamento eleitoral dos proponentes da sua candidatura, em substituição das certidões em falta, deveriam ter sido aceites como válidos, atenta a excepcionalidade da situação.

14 - Aliás, o próprio Tribunal Constitucional já afirmou e aceitou essa possibilidade, ainda que no domínio de situação e de quadro normativo diverso.

15 - De qualquer modo, as normas dos artigos 15.º, n.º 7, da LEPR e 68.º da LRE, quando interpretadas no sentido de que não se pode fazer a prova da capacidade eleitoral dos proponentes por meio diverso de certidão emitida pelas comissões recenseadoras, mesmo na hipótese de recusa ou demora ilegal e injustificada na sua passagem por parte destas, são inconstitucionais, por violação do disposto nos artigos 18.º, n.º 2, 122.º e 124.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

16 - Subsidiariamente, na hipótese de não ser aceite a prática dos actos processuais através de telecópia após a hora de fecho da Secretaria Judicial, então coerentemente também não se pode aceitar a notificação por fax dos mandatários dos candidatos fora das horas de expediente.

17 - E, quer por esse motivo quer porque a lei eleitoral não a prevê, então a notificação do mandatário do recorrente sempre teria de ser havida como nula, dado não obedecer às prescrições legais e ter prejudicado a defesa do notificando, isto é, ter encurtado, na prática, o prazo para que o mesmo suprisse as irregularidades verificadas.

18 - Finalmente, a arguição da nulidade da referida notificação foi feita de modo tempestivo, por ter ocorrido dentro do prazo de que o recorrente dispunha para suprir as mencionadas irregularidades.

19 - Face ao exposto, a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que admita a candidatura do recorrente à eleição do Presidente da República marcada para o dia 22 de Janeiro de 2006.

Assim se fará a (in)esperada e necessária justiça."

O recurso do cidadão Luís Filipe Brito da Silva Guerra deu entrada por telecópia neste Tribunal (no n.º 213233610) às 15 horas e 54 minutos do dia 30 de Dezembro de 2005.

O recurso da cidadã Maria Manuela de Sousa Magno, por sua vez, deu entrada por telecópia neste Tribunal (noutro número, 213233649) às 15 horas e 56 minutos do mesmo dia 30 de Dezembro.

O recurso do cidadão Luís Filipe Botelho Ribeiro deu entrada na portaria deste Tribunal, por entrega em mão, às 16 horas e 10 minutos do dia 30 de Dezembro (hora averbada no carimbo de entrada).

3 - Notificados os mandatários das restantes candidaturas, nos termos do artigo 94.º, n.º 4, da Lei do Tribunal Constitucional, para, querendo, responderem aos referidos recursos, foi apresentada resposta por parte da mandatária do candidato António Pestana Garcia Pereira, nos seguintes termos:

"O candidato António Pestana Garcia Pereira, notificado dos recursos interpostos por outros candidatos, entende dever sobre os mesmos pronunciar-se, o que faz consignando o seguinte:

1.º O basilar princípio constitucional (artigo 122.º da Constituição da República Portuguesa) de que qualquer cidadão português maior de 35 anos se pode candidatar ao cargo público de Presidente da República - princípio esse que os partidos políticos, e muito em particular os da área do poder, apesar de todos os seus esforços, ainda não conseguiram usurpar... - não poderá jamais ser inutilizado ou esvaziado por qualquer interpretação ou aplicação concreta de normativos da lei ordinária. Assim,

2.º É inaceitável a interpretação de que o Tribunal Constitucional possa praticar actos processuais (v. g., notificações, fazendo iniciar a contagem de prazos de um ou dois dias) a altas horas da noite, ignorando para esse efeito as horas normais de expediente, mas já considere a contagem dos mesmos prazos em função das ditas horas de expediente, conduzindo deste modo e desde logo a um real encurtamento dos referenciados prazos, encurtamento esse tão juridicamente inadmissível quanto democraticamente inaceitável;

3.º Ou que ora se admita ora não se admita a aplicação subsidiária das regras do processo civil ao presente processo de candidatura, sempre na perspectiva do resultado mais gravoso para o candidato concorrente.

4.º Como é também democrática e constitucionalmente intolerável que se possa pretender repercutir sobre os cidadãos ilegíveis [sic] sejam as consequências de actos ilícitos da Administração Pública (como é o caso do eventual incumprimento dos prazos legais para a passagem de certidões), sejam os ónus e encargos de obtenção e apresentação da documentação comprovativa de factos que são afinal do inteiro conhecimento, oficial ou oficioso, de outro órgão do Estado!

5.º O aparecimento de candidaturas de cidadãos comuns, não indicados e muito menos impostos pelas grandes máquinas partidárias - porque genuína e exactamente correspondente ao constitucionalmente consagrado princípio da participação dos cidadãos na vida pública (artigo 48.º da Constituição da República Portuguesa) - deveria ser não apenas saudado como também acarinhado e deveria também conduzir necessariamente a uma interpretação e aplicação da lei conformes a tal princípio. De outro modo,

6.º E tal como aliás já foi lastimavelmente patente ao longo de todo o tempo que antecedeu o período de apresentação e formalização das diversas candidaturas, onde actualmente a lei fundamental proclama, e proclama tão clara quanto correctamente, que qualquer cidadão eleitor, português de origem e maior de 35 anos, se pode candidatar ao cargo de Presidente da República, passaria, em verdadeiro golpe anticonstitucional, a impor-se que afinal apenas aos candidatos indicados pelos grandes partidos políticos é que tal direito seria reconhecido ...

7.º Por fim, e a título de nota final, não pode igualmente deixar de se consignar e repudiar a lamentável actuação das entidades públicas a quem deveria competir a salvaguarda da igualdade, da fluência e da transparência democráticas de todo o processo eleitoral - como é o caso do STAPE e da Comissão Nacional de Eleições -, as quais, rigorosamente nada tendo feito para pôr cobro à escandalosa discriminação praticada (designadamente por parte de toda a comunicação social) em favor precisamente dos candidatos apoiados e patrocinados pelos grandes partidos políticos, já todavia se empenharam em adoptar comportamentos e em defender interpretações da lei (nomeadamente em matéria de legitimidade para requerer ou obter a passagem de certidões de inscrição no recenseamento eleitoral ou de acesso aos registos oficiais do próprio STAPE) que apenas têm um denominador e um resultado objectivo comum,

8.º E o qual é o de dificultar e mesmo impossibilitar na prática o exercício do direito de todo o cidadão português maior de 35 anos se poder candidatar ao cargo de Presidente da República. Deste modo,

9.º A aceitarem-se como boas todas estas práticas e interpretações, seriam o sistema político-constitucional e a própria democracia que ficariam, por essa via, lastimavelmente empobrecidos e esvaziados."

Luís Filipe Brito da Silva Guerra (também recorrente) apresentou também resposta quanto ao recurso interposto pela cidadã Maria Manuela de Sousa Magno, nos seguintes termos:

"A recorrente tem obviamente razão.

Aliás, o artigo 124.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa determina que os candidatos a Presidente da República têm de ser propostos por no mínimo 7500 e no máximo 15 000 cidadãos eleitores.

A candidatura da recorrente cumpre esse requisito, como resulta dos autos.

Por isso, a candidatura da recorrente deve ser admitida.

O formalismo processual, embora necessário para assegurar uma igualdade de tratamento entre os candidatos, não é sacrossanto.

E, nesse sentido, não se reveste de uma qualquer essencialidade capaz de pôr em causa a substancialidade dos direitos fundamentais de participação política.

Basta, por isso, que seja minimamente cumprido, como aliás aconteceu.

Por seu turno e sem prescindir, o preceito constitucional acima citado só exige que os cidadãos proponentes de uma dada candidatura sejam eleitores, mas não estabelece em que termos tem de ser feita a prova da sua qualidade de eleitores.

Ora, o artigo 15.º da Lei Eleitoral do Presidente da República restringe injustificadamente os meios de prova da capacidade eleitoral dos proponentes, sendo, por isso, inconstitucional.

Por isso, verificada a inconstitucionalidade daquela norma, deve, por um lado, ser admitido qualquer meio de prova da inscrição no recenseamento eleitoral; por outro lado, mas indo mais longe, se a recorrente apresentou mais de 7500 proponentes, o ónus da prova de que os mesmos não são eleitores deve competir ao Estado, neste caso, na pessoa do Tribunal Constitucional.

De facto, as relações entre Estado e os cidadãos devem ser pautadas pela confiança, valendo em primeira mão as declarações que os mesmos fazem perante aquele.

Aliás, é isso que acontece com as declarações de rendimentos para efeitos fiscais, sendo certo que esse princípio deve valer para todas as relações dos cidadãos com o Estado.

Assim, ainda que se entenda que a recorrente não apresentou atempadamente pouco mais de uma centena de certidões de eleitor, esse facto não deve levar à rejeição da sua candidatura, salvo se for demonstrado que os proponentes em causa não estão inscritos no recenseamento eleitoral.

Face ao exposto, a candidatura da recorrente deve ser admitida."

Por sua vez, Maria Manuela de Sousa Magno (também recorrente) veio responder ao recurso interposto por Luís Filipe Brito da Silva Guerra, pela seguinte forma:

"Quanto aos factos:

Consideramos pertinentes e idóneos para o recurso apresentado por essa candidatura, com a particularidade para aqueles, em que:

Numa nítida desresponsabilização e ilegalidade de muitas juntas de freguesia, a impunidade e o 'desprezo' pela lei é patente e não isento.

Quanto ao direito:

No recurso em apreço foram denunciadas omissões legais, não cumprimento de prazos, uma leitura muito própria do Tribunal Constitucional de algumas normas em confronto directo com preceitos constitucionais e processuais, em que nos revemos, e igualmente alegamos no nosso recurso,

Foram ainda:

Feitas considerações quanto às ambiguidades existentes na própria Lei Eleitoral, de Recenseamento e de Eleição para o Presidente da República, as quais são também subscritas pela nossa candidatura, dada a permissão de entendimentos e decisões injustas, violadoras de direitos dos cidadãos, por instituições que subvertem o seu papel de guardiães da Constituição da República Portuguesa!

Pelo exposto:

A candidatura de Manuela Magno nada tem a opor quanto à apreciação do recurso apresentado pelo candidato Luís Filipe Brito Guerra, com a qual se solidariza."

Apresentou ainda resposta Luís Filipe Botelho Ribeiro (igualmente recorrente), nos seguintes termos:

"Luís Filipe Botelho Ribeiro, candidato à Presidência da República com processo no Tribunal Constitucional n.º 4088, vem responder aos recursos interpostos pelos restantes candidatos manifestando-lhes a sua total solidariedade democrática. Parece-nos que quaisquer das razões aduzidas derivam do primado de questões de forma sobre a questão de fundo, exigida por lei, que é a exigência de um mínimo de representatividade para as diferentes candidaturas. Mas como pode alguma vez ser justo o critério do número de assinaturas quando o 'sistema' tudo dispôs para que nenhum dos candidatos em causa pudesse ter acesso aos meios de comunicação social públicos, pagos por todos e também por eles? Como se pode considerar justo um sistema que primeiro silencia as candidaturas críticas e depois as considera não representativas? É duma injustiça gritantemente grosseira. E ao mesmo tempo deixa outros candidatos, os do costume, a falar sozinhos nos canais públicos, sem qualquer critério objectivo que o justifique.

Lendo os recursos dos candidatos Luís Filipe Guerra e Manuela Magno, qualquer verdadeiro democrata sente um impulso de indignação e de solidariedade com a luta dos cidadãos pela abertura dum regime caduco que se refugia na interpretação fechada das leis e na hermeticidade cega de aspectos puramente formais para manter os cidadãos do lado de fora dos muros da 'cidade'. Fica-se com a impressão de estar a ler o anúncio redentor de um tempo novo que ainda não chegou para os cidadãos portugueses. A crítica feita ao regime actual é tão pertinente e certeira como algumas que, a seguir ao 25 de Abril, se escreveram sobre o simulacro de democracia de que acabáramos de ser libertados.

Também o actual regime partidocrático está caduco e apodrecido, repugnando à boa consciência dos portugueses que cada vez mais o rejeitam e lhe manifestam a sua desaprovação e falta de confiança, de que a crescente abstenção eleitoral é apenas um dos muitos sinais. Tudo na presente realidade confirma a necessidade e urgência de um novo 25 de Abril, de uma nova abertura democrática, pacificamente anunciada por militares de cravos nas armas ou, desta feita, por juízes constitucionais, com ou sem cravos na toga ou no coração. A coragem que tal ditasse seria tanto mais heróica quanto sabemos que uma boa parte do colectivo do Tribunal Constitucional deve o seu lugar, directa ou indirectamente, aos partidos políticos que compõem a Assembleia da República, logo ao sistema partidário cuja sufocante e abusiva apropriação da democracia portuguesa os candidatos recorrentes contestam.

Daqui a poucos dias saberemos se a sua decisão se ficou peja prudência conservadora ou avançou com coragem liberadora. Saberemos se prevaleceu a cegueira aos evidentes atropelos ao imperativo de pluralismo democrático pela imprensa vigiada do regime ou foram afinal ouvidos à voz interior que do mais fundo de qualquer espírito de boa vontade sempre clama e clamará por justiça."

Por parte dos restantes candidatos não foi apresentada qualquer resposta.

Cumpre apreciar e decidir.

II - Fundamentos. - 4 - Tendo em conta o prazo para o recurso para o plenário do Tribunal Constitucional no n.º 1 do artigo 94.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, suscita-se a questão prévia da tempestividade do recurso interposto por Luís Filipe Botelho Ribeiro, por ter dado entrada neste Tribunal após a hora do encerramento da Secretaria ao público.

Note-se, preliminarmente, que as candidaturas rejeitadas, designadamente a deste recorrente, o foram porque, na sequência do Acórdão 722/2005, de 26 de Dezembro, da 1.ª Secção deste Tribunal, as irregularidades então detectadas não foram adequadamente supridas no prazo fixado para o efeito, e que já no Acórdão 723/2005, de que agora pretendem interpor recurso, se escreveu:

"Impõe-se, desde já, salientar que o prazo concedido pelo artigo 93.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional para o suprimento das irregularidades verificadas expirou no dia 28 de Dezembro de 2005, às 16 horas, hora de fecho da Secretaria Judicial.

É assim irrelevante tudo o que os candidatos apresentaram depois daquela data e hora [...]"

Não podia, aliás, deixar de ser do conhecimento dos recorrentes a jurisprudência reiterada deste Tribunal quanto a vários prazos em processos eleitorais (Acórdãos n.os 287/2002, 427/2005, 432/2005, 429/2005, 433/2005, 496/2005, 540/2005, 542/2005, 543/2005, 550/2005, 551/2005, 552/2005, 553/2005 e 556/2005, publicados, respectivamente, em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 53.º vol., pp. 751 e segs., e no Diário da República, 2.ª série, n.os 203, de 21 de Outubro de 2005, 183, de 22 de Setembro de 2005, 190, de 3 de Outubro de 2005, 206, de 26 de Outubro de 2005, 217, de 11 de Novembro de 2005, 219, de 15 de Novembro de 2005, 220, de 16 de Novembro de 2005, embora alguns com votos de vencido, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt), segundo a qual, na expressão do Acórdão 598/2000, de 20 de Dezembro, "os prazos para apresentação de candidaturas e para suprimento das irregularidades estabelecidas na lei eleitoral (no caso, do Presidente da República) são peremptórios, e insusceptíveis de prorrogação ou suspensão - sob pena de irremediável perturbação do calendário do processo eleitoral, cujos prazos se acham sucessivamente concatenados".

Esta jurisprudência funda-se, como também se tem reiterado nos referidos acórdãos, no facto de os processos eleitorais serem decisivamente marcados pela urgência e celeridade, resultante de, estando o dia da realização do acto eleitoral marcado, todo o processo relativo à admissão das candidaturas ter de ser encerrado dentro de um calendário estrito, por forma a não prejudicar todos os subsequentes actos indispensáveis à realização da eleição, cujos prazos estão sucessivamente concatenados.

O Tribunal Constitucional tem, assim, salientado - a propósito de outros processos eleitorais, mas com aplicação também ao processo relativo à eleição do Presidente da República - que "a celeridade do contencioso eleitoral exige uma disciplina rigorosa no cumprimento dos prazos legais, sob pena de se tornar inviável o calendário fixado para os diversos actos que integram o processo eleitoral; e que essa celeridade implica a impossibilidade de aplicação de diversos preceitos contidos no Código de Processo Civil, directa ou indirectamente relacionados com prazos para a prática de actos pelas partes". E na própria Lei Eleitoral do Presidente da República (Decreto-Lei 319-A/76, de 8 de Maio, na redacção dada pela Lei 143/85, de 26 de Novembro), o artigo 159.º-B, sobre "[d]ireito subsidiário", dispõe: "Em tudo o que não estiver regulado na legislação referente à eleição do Presidente da República, aplica-se aos actos que impliquem intervenção de qualquer tribunal o disposto no Código de Processo Civil quanto ao processo declarativo, com excepção dos n.os 3 e 4 do artigo 144.º e dos n.os 4 e 5 do artigo 145.º" (normas estas que dispunham, em 1985, sobre a suspensão do prazo fora dos dias úteis e sobre o justo impedimento).

Ora, segundo a regra geral para a prática dos actos processuais - e isto, portanto, mesmo independentemente de quaisquer especificidades motivadas pela específica natureza do processo eleitoral - os actos processuais que impliquem a recepção de quaisquer requerimentos e documentos devem ser praticados durante as horas de expediente dos serviços, o que significava, no caso, até às 16 horas (pois, aplicando-se ao funcionamento da Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, como regime supletivo nos termos do artigo 12.º do Decreto-Lei 545/99, de 14 de Dezembro, o artigo 122.º, n.os 1 e 3, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei 3/99, de 13 de Janeiro, conclui-se que o horário de funcionamento daquela Secretaria Judicial é, nos dias úteis, até às 17 horas, encerrando ao público "uma hora antes do termo do horário diário", isto é, às 16 horas). Sendo o prazo para recorrer, nos termos do artigo 94.º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, de "um dia", tal significava que o recurso poderia ser interposto durante o dia seguinte ao da notificação ao interessado, dentro do horário de abertura ao público dos serviços.

5 - Pode, pois, desde já concluir-se, quanto ao recurso interposto por Luís Filipe Botelho Ribeiro, que não foi interposto tempestivamente, pois foi entregue em mão no Tribunal Constitucional já depois de encerrada a Secretaria ao público (isto é, e conforme registo no requerimento entregue, já depois das 16 horas). Não poderá, pois, tomar-se dele conhecimento.

Acrescente-se, aliás, que tal recurso não poderia seguramente obter provimento, por manifesta improcedência, pois, desde logo, o recorrente reconhece que não entregou no Tribunal Constitucional os elementos exigidos por lei, apenas pretendendo que este Tribunal "corrija" alegadas anteriores situações de "injustiça" que teriam justificado tal falta - para o que, evidentemente, o Tribunal Constitucional carece de competência.

Vai, assim, tomar-se conhecimento dos recursos interpostos por Maria Manuela de Sousa Magno e por Luís Filipe Brito da Silva Guerra.

6 - Começando pelo primeiro, verifica-se que - para além de outras considerações, como as relativas à actuação de outras entidades públicas, cuja apreciação necessariamente escapa à competência deste Tribunal no presente processo - a recorrente centra a sua argumentação no facto de os serviços do Tribunal Constitucional não terem permitido que as operações de regularização dos documentos que entregara - com a correspondência e união das declarações de propositura às certidões de inscrição no recenseamento eleitoral - se prolongassem para além do termo do horário de expediente do último dia do prazo para regularização do processo de candidatura, nem terem aceite a entrega de documentos suplementares, para instruir o processo de apresentação da candidatura, para além desse prazo.

Ora, como se afirmou no acórdão recorrido, o prazo concedido pelo artigo 93.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional para suprimento das irregularidades verificadas expirou no dia 28 de Dezembro de 2005 às 16 horas, hora do fecho da Secretaria Judicial, sendo "irrelevante tudo o que os candidatos apresentaram depois daquela data e hora".

A isto não obsta o artigo 143.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, além do mais porque não estava em causa qualquer envio de documentos por telecópia fora do horário de expediente - mas a regularização dos documentos entregues, que não continham a correspondência das declarações de propositura a certidões de inscrição no recenseamento eleitoral.

A irregularidade não pode ser suprida pelo envio de documentos por telecópia, pois há-de ser o original que é entregue dentro do prazo. E é manifestamente incompatível com a necessária celeridade do processo eleitoral, designadamente um posterior envio dos originais no prazo de cinco dias, conforme previsto no artigo 150.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

À conclusão de que o prazo expirou no dia 28 de Dezembro de 2005 pelas 16 horas, hora do fecho da Secretaria Judicial, também não obstam - diversamente do que se afirma no requerimento de recurso e nalgumas respostas a este - nem o facto de se tratar do horário de encerramento da Secretaria ao público, podendo, porém, o Tribunal continuar a funcionar, nem a circunstância de, num processo marcado pela urgência como é o eleitoral, a notificação de decisões poder ser feita para além daquela hora de encerramento do Tribunal ao público. Aliás, e para além do mais, não se vê qualquer razão séria para que as notificações só devessem poder ser dirigidas aos candidatos (ou seus mandatário) durante o horário de abertura do Tribunal ao público.

Diga-se, aliás, que, mesmo que o Tribunal tivesse permitido que continuasse a actividade de correspondência e união das certidões de inscrição no recenseamento eleitoral às declarações de propositura, para além do fim do horário de expediente do último dia do prazo de regularização, ainda assim ficariam a faltar declarações de propositura: o Acórdão 722/2005 verificou a falta de 716 certidões para a obtenção do número mínimo legal de proponentes (faltavam 1016 certidões nos 7750 proponentes), e no último dia do prazo a recorrente apresentou apenas 657. Só, portanto, admitindo a entrega dos originais de outras certidões, ou declarações, e depois do termo do prazo legal, se poderia ter eventualmente conseguido preencher o requisito legalmente exigido.

O que, porém, não podia admitir-se, por desrespeitar o prazo para a regularização do processo previsto no artigo 93.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional.

Não tendo, pois, a recorrente suprido as irregularidades detectadas na apresentação da sua candidatura, é de confirmar o acórdão recorrido, que a não admitiu.

7 - Passando ao recurso interposto por Luís Filipe Brito da Silva Guerra - e abstraindo também das considerações e comentários com que enquadra a substância da sua argumentação -, verifica-se que o recorrente começa por invocar a possibilidade de juntar documentos ao processo da sua candidatura, por telecópia, depois do encerramento da Secretaria do Tribunal Constitucional ao público (isto é, depois das 16 horas do dia 28 de Dezembro).

Já resulta, porém, do que se disse, que tal junção não era admissível, pois tinham de ser entregues, dentro do prazo, os originais dos documentos em causa, não sendo aplicável aos processos eleitorais a possibilidade de remessa posterior, no prazo de cinco dias, prevista no artigo 150.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. Esta conclusão não representa, aliás, qualquer "restrição dos direitos fundamentais" (ou qualquer "concepção restritiva dos direitos humanos" ou "formal da justiça"). É, simplesmente, o corolário da necessária celeridade do processo de apresentação de candidaturas (no caso, de regularização da apresentação de candidaturas), de modo a não inviabilizar a realização do acto eleitoral já marcado, dependente de actos a realizar em prazos estreitos sucessivamente concatenados. Os requisitos formais da apresentação da candidatura são, aliás, previstos na Lei Eleitoral do Presidente da República, como modo de garantir a representatividade democrática mínima dos candidatos. Concorde-se ou não com eles, deve reconhecer-se que se trata de formalidades, sim, mas que servem uma finalidade substancial, e de representatividade democrática.

Não procede, pois, a alegação do recorrente, no sentido de que a lei lhe permite juntar os originais documentos em falta, seja depois do encerramento ao público da Secretaria do Tribunal Constitucional seja num prazo que complementasse o seu envio por telecópia. E, justamente por faltarem os originais dos documentos em causa, também não procede a pretensão do recorrente de suprir irregularidades para além do prazo, até ao momento de decisão definitiva sobre a admissão de candidaturas (que o Tribunal Constitucional afirmou, noutro contexto e relativamente a processo eleitoral regulado por normas diferentes).

O recorrente invoca, ainda, a possibilidade de fazer prova da capacidade eleitoral activa dos proponentes por meios diversos daqueles que a lei refere - designadamente pela junção de elementos de informação obtidos impressos a partir do sítio do STAPE na Internet.

Ora, tal impressão não pode ser equiparada a uma "certidão" de eleitor, pois esta pressupõe necessariamente, pelo menos, uma declaração de uma entidade pública (cf. o Acórdão 438/2005, disponível em www.tribunalconstitucional.pt; e diga-se, aliás, que, como se afirmou também na decisão recorrida, o invocado Acórdão 254/85, deste Tribunal, tratou de outra questão, e num quadro normativo também diferente, não apoiando a tese do recorrente quanto à suficiência das impressões entregues).

Depois, e como se referiu no acórdão recorrido, citando o Acórdão 598/2000, é certo que este pretenso "meio de prova" "vai para além do previsto na Lei Eleitoral do Presidente da República, que [...] manda fazer a prova da qualidade de eleitor dos proponentes através de tais certidões [certidões das comissões recenseadoras]", sendo às comissões de recenseamento que o artigo 68.º da Lei 13/99, de 22 de Março, atribui a competência para passar certidões relativas ao recenseamento eleitoral.

E sobretudo - decisivamente também para o acórdão recorrido - a forma de comprovar a inscrição do proponente no recenseamento eleitoral que o recorrente pretendeu utilizar não previne uma das finalidades que o n.º 7 do artigo 15.º do Decreto-Lei 319-A/76 visa acautelar, ao prever que o proponente terá de apresentar o requerimento da certidão em duplicado, com indicação expressa do nome do candidato proposto, devendo o duplicado ser arquivado: isto é, que um mesmo eleitor não proponha mais de uma candidatura, sendo justamente para tal finalidade que fica arquivado o duplicado. Tal finalidade - substancial e não apenas formal, e não baseada em qualquer "alegação genérica" ou "suspeita", ao contrário do que o recorrente pretende - não é, evidentemente, assegurada pela entrega de impressões de informações obtidas no sítio na Internet do STAPE. A exclusão dos meios de prova da inscrição no recenseamento eleitoral pretendidos pelo recorrente não viola, assim, direitos fundamentais, nem é inconstitucional, antes visando acautelar finalidades constitucionalmente relevantes.

Contra esta conclusão insurge-se o recorrente invocando circunstâncias "excepcionais", consistentes na alegada imputabilidade às próprias comissões de recenseamento, e ao STAPE, da falta (ou atraso) na emissão (ou expedição) das certidões de inscrição no recenseamento, contestando a conclusão do acórdão recorrido de que, se "a capacidade eleitoral activa dos proponentes não está provada pelos meios que a lei considera idóneos, o Tribunal não poderá deixar de o assinalar e daí extrair as devidas consequências, independentemente das razões que terão determinado a irregularidade". Neste contexto, afirma mesmo existir uma "lacuna da lei" que evite a possibilidade, que aquelas entidades teriam, de "boicotar irreversivelmente uma determinada candidatura".

Também neste ponto não assiste, porém, razão ao recorrente.

Na verdade, e independentemente da questão de saber se se verificaram, ou não, no seu caso, circunstâncias realmente excepcionais, e se elas seriam, ou não, atendíveis - pois pode duvidar-se de que o juízo sobre o cumprimento dos requisitos de entrega de certidões de inscrição no recenseamento eleitoral dos cidadãos proponentes possa ficar condicionado pelo juízo sobre o procedimento, alegadamente ilegal, das entidades públicas encarregadas da emissão dessas certidões -, é certo que estava ao alcance do próprio recorrente ter prevenido tais dificuldades. Também já no acórdão recorrido se referiu que o candidato não demonstrou "que as intimações judiciais a que lançou mão, para efeito de obter, de diversas comissões recenseadoras, as certidões requeridas, tivessem sido pedidas com antecedência razoável relativamente ao termo do prazo para apresentação das candidaturas ou mesmo do prazo para suprimento de irregularidades, sendo certo que bastaria o decurso do prazo de três dias sobre o requerimento das certidões sem que estas tivessem sido emitidas para serem pedidas as intimações judiciais". Antes pelo contrário, o que resulta do processo é que as referidas intimações foram apenas requeridas, por via postal, no último dia do prazo para apresentação das candidaturas, sendo que faltavam na candidatura em causa, como decorre do Acórdão 722/2005, 699 certidões de eleitor. A invocação de "boicote", de "lacuna da lei", ou, simplesmente, a tentativa de prova da demora das comissões de recenseamento na expedição das certidões não desmente tal possibilidade legal, o seu tardio uso, ou a falta de providências destinadas a evitar a necessidade da sua utilização.

Mantém-se, pois, a conclusão de que o recorrente não preencheu, dentro do prazo legalmente previsto, a totalidade dos requisitos previstos na Lei Eleitoral do Presidente da República.

8 - Por último - para além de uma genérica invocação de nulidade da decisão por omissão de pronúncia, que não se vê onde se possa sustentar, já que o acórdão recorrido se pronunciou sobre todas as questões relativas à admissibilidade das candidaturas que lhe cumpria apreciar, na sequência, aliás, do Acórdão 722/2005, anteriormente proferido -, o recorrente volta a fazer referência à nulidade, que alegara, da notificação do mandatário da candidatura. Reconhecendo que a notificação foi efectuada por telecópia para o número indicado pelo próprio candidato, e dizendo concordar com a notificação por essa via, afirma, porém, que tal entendimento só teria "em conta as conveniências do Tribunal e não as do cidadão que se relaciona com as instituições judiciárias", pelo que acaba por contestar a possibilidade de notificação por telecópia.

Acontece, porém, que, não estando o candidato, ou seu mandatário, presente, para poder ser notificado pessoalmente da decisão do Tribunal Constitucional, não existe outra forma de notificação compatível com os prazos curtos impostos pela celeridade que caracteriza o processo de suprimento das irregularidades das candidaturas. E a própria lei processual civil admite a possibilidade de notificação por telecópia (artigo 176.º, n.º 5).

O prazo em que o Tribunal Constitucional tinha, em concreto, de apreciar os requisitos formais da apresentação da candidatura, e, portanto, o dia em que a sua decisão seria proferida, resultam de disposição legal expressa, conjugada com o calendário eleitoral fixado. O recorrente sabia, pois, ou devia saber, em que dia iria ser notificado dessa decisão. E não se vê como uma alegada irregularidade de notificação, a ter existido, pode ter afectado o prazo de suprimento de irregularidades. Antes, tendo o número para o qual iria ser enviada a notificação sido indicado, a pedido do Tribunal e para esse fim, pelo próprio candidato - que assim logo ficou ciente da utilização dessa forma de notificação e, mesmo, de que iria ser notificado -, só podem ser imputadas à própria candidatura as dificuldades, alegadas pelo recorrente, de preparação da "sua defesa".

As restantes alegações do recorrente são irrelevantes para questionar o sentido da decisão recorrida, que deve, portanto, ser mantida.

III - Decisão. - Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:

a) Não tomar conhecimento do recurso do Acórdão 723/2005, interposto por Luís Filipe Botelho Ribeiro;

b) Negar provimento aos recursos do mesmo acórdão apresentados por Maria Manuela de Sousa Magno e por Luís Filipe Brito da Silva Guerra.

Lisboa, 3 de Janeiro de 2006. - Paulo Mota Pinto - Bravo Serra - Benjamim Rodrigues - Gil Galvão - Maria João Antunes - Vítor Gomes - Mário Torres - Carlos Pamplona de Oliveira - Maria Helena Brito - Maria Fernanda Palma - Rui Manuel Moura Ramos - Maria Prazeres Pizarro Beleza - Artur Maurício.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1461742.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1976-05-03 - Decreto-Lei 319-A/76 - Ministério da Administração Interna

    Regulamenta a eleição do Presidente da República. Dispõe sobre capacidade eleitoral, sistema eleitoral, organização do processo eleitoral, campanha eleitoral, eleição (sufrágio, apuramento e contencioso eleitoral) e ilícito eleitoral.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1985-11-26 - Lei 143/85 - Assembleia da República

    Alterações à lei eleitoral para a Presidência da República.

  • Tem documento Em vigor 1989-07-28 - Lei 22/89 - Assembleia da República

    Autoriza o Governo a conceder um empréstimo à República Popular de Moçambique.

  • Tem documento Em vigor 1999-01-13 - Lei 3/99 - Assembleia da República

    Aprova a lei de organização e funcionamento dos Tribunais Judiciais.

  • Tem documento Em vigor 1999-03-22 - Lei 13/99 - Assembleia da República

    Aprova a nova lei do recenseamento eleitoral e publica em anexo os modelos dos impressos nela previstos.

  • Tem documento Em vigor 1999-12-14 - Decreto-Lei 545/99 - Presidência do Conselho de Ministros

    Organiza a composição e funcionamento da secretaria e dos serviços de apoio do Tribunal Constitucional.

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