Decreto 46342
Em numerosos países as sociedades e os fundos de investimento constituem valiosos instrumentos de canalização das poupanças e servem uma necessidade específica do pequeno e médio investidor, que procura uma rentabilidade estável para as suas economias, com um mínimo de risco e liquidez quase garantida.
Por outro lado, em países onde a bolsa tem uma função reduzida e estão menos desenvolvidas as transacções sobre títulos, estas instituições têm contribuído de forma positiva para estimular a poupança privada, disciplinar e alargar as relações de compra e venda de títulos e dar ao público um maior conhecimento e consciência dos problemas ligados ao mercado dos capitais. Com efeito, a criação das sociedades de fundos de investimentos permitiu aumentar gradualmente o campo de acção dos meios financeiros nesses países e levar um maior volume de capitais privados a participar, de forma bastante activa, no desenvolvimento de diferentes sectores da actividade económica.
Pela sua importância na recolha das poupanças, na orientação dos recursos financeiros e no esclarecimento do público, estas instituições são, pois, instrumentos de reconhecido interesse pela ajuda que podem conferir à realização dos programas de desenvolvimento económico e como um dos meios de financiar esse mesmo desenvolvimento.
Publicado o Decreto-Lei 46302, de 27 de Abril de 1965, onde se fixa o quadro das normas gerais por que se regem as instituições parabancárias, julga-se oportuno definir desde já as condições especiais a que o Governo entende dever subordinar a constituição e funcionamento dos fundos abertos de investimentos mobiliários e das correspondentes sociedades gestoras e entidades depositárias.
A regulamentação destas instituições inicia-se com a flexibilidade normativa aconselhável e eventual reajustamento à evolução do mercado de capitais e por forma a assegurar o perfeito cumprimento das funções que visam alcançar.
Usando da faculdade conferida pelo n.º 3.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo o seguinte:
Artigo 1.º A fim de fomentar e promover a aplicação de capitais, sobretudo das pequenas e médias poupanças, em títulos de entidades públicas e privadas, é permitida a constituição de fundos de investimentos mobiliários e de sociedades gestoras, nos termos previstos neste diploma.
Art. 2.º Os fundos de investimentos mobiliários são conjuntos de valores mobiliários pertencentes a uma pluralidade de pessoas, singulares e colectivas, em que cada participante será titular de quotas-partes dos valores que os integram.
§ único. A administração dos fundos é exercida em nome dos participantes por sociedades gestoras, devendo os valores que os constituem ser confiados a um ou mais depositários.
Art. 3.º Os fundos de investimentos mobiliários têm por fim exclusivo a constituição de uma carteira diversificada de títulos, em ordem a compensar os riscos e as rentabilidades dos vários investimentos, sem dispor de participações maioritárias nas diferentes empresas.
Art. 4.º As sociedades gestoras têm por objecto exclusivo a administração, gestão e representação de um ou mais fundos.
§ único. A sociedade gestora exercerá todos os seus actos em nome e por conta comum dos participantes e, na qualidade de gestora de um fundo e de sua legal representante, poderá comprar, vender, subscrever, trocar ou receber quaisquer valores mobiliários e exercer todos os direitos que directa ou indirectamente estejam relacionados com os bens do fundo.
Art. 5.º As sociedades gestoras devem constituir-se sob a forma de sociedade anónima e satisfazer aos seguintes requisitos:
a) Ser de nacionalidade portuguesa, nos termos da legislação aplicável, e ter a sede em território nacional;
b) O capital ser representado apenas por acções nominativas;
c) Ter um capital social realizado de, pelo menos, 2500000$00, não devendo, porém, em caso algum, o capital e reservas ser inferior a 1 por cento do valor global dos fundos que administram;
d) Investir os seus capitais em valores fàcilmente realizáveis, sendo-lhes, porém, lícito adquirir os imóveis indispensáveis às suas instalações.
Art. 6.º À sociedade gestora incumbe especialmente:
a) Administrar, gerir e representar o fundo;
b) Representar os participantes do fundo em todos os direitos derivados das suas participações;
c) Emitir, em ligação com o depositário, os certificados de participação do fundo e autorizar o seu reembolso;
d) Determinar o valor das participações;
e) Seleccionar os valores que devem constituir o fundo, de acordo com a política de aplicações prevista no respectivo regulamento de gestão, e dar instruções ao depositário para a compra e venda daqueles;
f) Manter em ordem a sua escrita e, bem assim, a do fundo.
Art. 7.º À sociedade gestora é vedado:
a) Contrair empréstimos ou onerar por qualquer forma os valores do fundo;
b) Proceder a operações que possam assegurar-lhe, bem como aos depositários ou aos participantes, o predomínio sobre qualquer sociedade;
c) Possuir certificados de participação dos fundos que administra.
Art. 8.º A remuneração dos serviços da sociedade gestora deve constar expressamente do regulamento de gestão do fundo e sòmente pode abranger:
1.º Uma comissão de gestão, a liquidar periòdicamente pelo fundo, destinada a cobrir todas as despesas de gestão, incluindo a remuneração ao depositário, mas das quais se excluem as despesas relativas à compra e venda de valores por conta do fundo;
2.º Uma comissão de emissão, a liquidar no acto de pagamento pelos subscritores, destinada a cobrir as despesas de venda e emissão dos certificados;
3.º Uma comissão de resgate, a liquidar pelos participantes, no acto de reembolso dos certificados.
Art. 9.º Podem ser depositários as instituições de crédito referidas nas alíneas a) a c) do artigo 3.º do Decreto-Lei 41403 e os bancos de investimento, competindo-lhes nessa qualidade em especial:
a) Receber em depósitos os valores do fundo;
b) Efectuar todas as operações de compra e venda de valores, de cobrança de juros e dividendos por eles produzidos e as relativas ao exercício dos direitos de subscrição;
c) Aceitar e satisfazer os pedidos de subscrição, fazendo a entrega dos certificados contra o recebimento da importância correspondente ao preço da emissão;
d) Satisfazer os pedidos de reembolso de certificados de participação, efectuando-se o reembolso mediante o pagamento do valor dos certificados apresentados a resgate;
e) Pagar aos titulares dos certificados a sua quota-parte nos lucros a que tenham direito;
f) Assumir uma função de vigilância e de garantia, perante os participantes, de ser cumprido o regulamento de gestão do fundo, especialmente no que se refere à política de investimentos.
Art. 10.º O património do fundo deverá ser aplicado de acordo com as seguintes regras:
a) Não ter mais de 10 por cento em dinheiro ou em depósitos bancários;
b) Os títulos não cotados na bolsa não poderão exceder 20 por cento da carteira do fundo e serão obrigatòriamente alienados se não vierem a ser cotados nos três anos seguintes ao da sua aquisição;
c) Nenhuma empresa poderá estar representada por mais de 10 por cento dos valores mobiliários por ela emitidos;
d) Nenhum lote de títulos da mesma empresa poderá representar mais de 10 por cento do fundo.
§ 1.º As percentagens referem-se ao momento da aquisição ou subscrição dos valores mobiliários e, sempre que sejam ultrapassadas por virtude do exercício dos direitos de subscrição ligados aos títulos, a política de investimentos deverá ser ajustada de modo que, no prazo máximo de um ano, venham a ser respeitadas aquelas percentagens.
§ 2.º Sempre que as circunstâncias o aconselhem, poderá o Ministro das Finanças rever, em portaria, as regras estabelecidas neste artigo.
Art. 11.º O património do fundo é dividido em participações de características iguais, sem valor nominal, designadas por unidades de participação e representadas por certificados.
§ 1.º Os certificados de participação, nominativos ou ao portador, podem agrupar várias unidades de participação e conferem aos seus titulares um direito de propriedade nos haveres do fundo proporcional ao número de unidades que representam.
§ 2.º A subscrição da proposta para ingresso no fundo implica a aceitação do respectivo regulamento de gestão e confere mandato à sociedade gestora para que realize as operações inerentes à gestão e à boa administração do fundo, bem como à sua liquidação ou transformação quando as circunstâncias e os interesses dos participantes o aconselhem.
§ 3.º O regulamento de gestão do fundo deve ser reproduzido no verso dos certificados de participação e nas propostas.
Art. 12.º Os participantes não poderão exigir a liquidação ou partilha do fundo, estando-lhes, porém, assegurado o direito de em qualquer ocasião pedirem o reembolso das unidades de participação que possuam.
§ único. A dissolução e liquidação só poderão verificar-se nas condições previstas no regulamento de gestão, sendo obrigatória a publicação do respectivo aviso, com seis meses de antecedência, em dois jornais de grande circulação, um de Lisboa e outro do Porto.
Art. 13.º Para efeitos de subscrição e reembolso, o valor de cada unidade de participação será calculado diàriamente, excepto aos sábados, domingos e feriados, e determina-se dividindo-se o valor líquido global dos bens do fundo pelo número de unidades de participação em circulação.
§ 1.º O valor líquido global dos bens do fundo apurar-se-á adicionando ao montante em dinheiro em caixa e em depósitos bancários o valor dos títulos em carteira e outros valores e deduzindo da importância assim obtida o valor dos encargos efectivos ou pendentes.
§ 2.º O valor dos títulos em carteira será calculado pela última cotação efectuada na bolsa nos últimos 90 dias; na falta desta, o cálculo será efectuado de harmonia com os princípios de uma sã e prudente avaliação.
§ 3.º Para obter o preço de emissão e de reembolso, ao valor da unidade de participação acrescentar-se-á nos casos de subscrição e deduzir-se-á nos de reembolso, respectivamente, a comissão de emissão e a de resgate.
Art. 14.º Quando os pedidos de reembolso excedam num só dia 5 por cento do valor total dos bens do fundo, a sociedade poderá mandar suspender as operações de reembolso.
§ 1.º Sempre que os interesses dos participantes o aconselhem, a sociedade gestora poderá igualmente suspender a emissão de certificados de emissão.
§ 2.º A suspensão da emissão de certificados ou das operações de resgate e as razões que as determinaram devem ser imediatamente comunicadas pela sociedade gestora à Inspecção-Geral de Crédito e Seguros, a qual poderá fixar em seguida o prazo máximo da suspensão.
Art. 15.º Sempre que as circunstâncias o aconselhem, poderá o Ministro das Finanças determinar, em portaria, a suspensão da emissão de certificados ou das operações de reembolso.
Art. 16.º Na determinação e aplicação dos resultados obtidos pelo fundo deverá ter-se em conta que os rendimentos líquidos de qualquer proveniência serão distribuídos pelos participantes na forma estabelecida no regulamento de gestão e que as mais-valias realizadas sobre a carteira de valores mobiliários não podem ser repartidas.
Art. 17.º As contas do fundo são encerradas anualmente na data indicada no regulamento de gestão e submetidas à apreciação da Inspecção-Geral de Crédito e Seguros.
§ 1.º Nos três meses seguintes à data do encerramento, a sociedade gestora publicará as contas do fundo, acompanhadas de um relatório anual e do parecer da entidade fiscalizadora das contas, da relação dos valores que compõem a carteira e, bem assim, da indicação do número de unidades de participação e de certificados em circulação.
§ 2.º A sociedade gestora dará a conhecer semanalmente a composição discriminada dos valores mobiliários do fundo.
Art. 18.º Para efeito de garantias ou cauções legalmente exigíveis, os certificados de participação são equiparados às acções e obrigações de empresas privadas.
Art. 19.º Os fundos de investimentos mobiliários gozarão de todos os benefícios fiscais que vierem a ser definidos em diploma legal, com vista a colocar os titulares dos certificados pelo menos na mesma posição em que se encontrariam se fossem investidores directos.
Art. 20.º A sociedade gestora e o depositário respondem solidàriamente por todos os compromissos assumidos no âmbito do regulamento de gestão.
Art. 21.º Os fundos de investimentos mobiliários, as sociedades gestoras e os depositários já em funcionamento à data da publicação deste diploma terão o prazo de seis meses para se adaptarem às disposições nele contidas.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 20 de Maio de 1965. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - António Manuel Pinto Barbosa.