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Acórdão 254/92, de 31 de Julho

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Sumário

DECIDE NAO SE PRONUNCIAR PELA INCONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS CONSTANTES DO ARTIGO 1, NA PARTE EM QUE DA NOVA REDACÇÃO AOS ARTIGOS 14, NUMERO 2, ALÍNEA G), E 26, NUMERO 2, ALÍNEA D), DA LEI 47/86, DE 15 DE OUTUBRO, - LEI ORGÂNICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO -, E AINDA DO ARTIGO 2, NUMERO 2, DO DECRETO 12/VI, DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA, RELATIVO A AUTONOMIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO E PRONUNCIAR-SE PELA INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA CONSTANTE DO ARTIGO 1 DO MESMO DIPLOMA, NA PARTE EM QUE ADITA NOVOS NUMEROS 4, 5, 6, 7 E 8 AO ARTIGO 105 (NOMEACAO E EXONERAÇÃO DO PROCURADOR-GERAL DA REPUBLICA), DA REFERIDA LEI 47/86, POR VIOLAÇÃO DO PRECEITUADO NA ALÍNEA M) DO ARTIGO 136 DA CONSTITUICAO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, - COMPETENCIA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA -. (PROC. 364/92)

Texto do documento

Acórdão 254/92
Processo 364/92
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1 - Nos termos do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo 278.º da Constituição da República e dos artigos 51.º, n.º 1, e 57.º, n.º 1, da Lei 28/82, de 15 de Novembro, o Presidente da República requereu ao Tribunal Constitucional, em 11 de Junho de 1992, a apreciação preventiva da constitucionalidade das normas constantes do artigo 1.º, na parte em que dá nova redacção aos artigos 14.º, n.º 2, alínea g), 26.º, n.º 2, alínea d), e 105.º, n.os 4, 5, 6, 7 e 8, da Lei 47/86 de 15 de Outubro, e do artigo 2.º, n.º 2, do Decreto 12/VI, da Assembleia da República, recebido na Presidência da República no dia 3 do mesmo mês para ser promulgado como lei, relativo à autonomia do Ministério Público.

2 - Para o requerente, é duvidoso que a nossa lei fundamental permita que continuem a fazer parte do Conselho Superior do Ministério Público membros designados pelo Ministro da Justiça.

Com efeito, segundo invoca o Presidente da República, a «revisão constitucional de 1989 consagrou, expressamente, a autonomia do Ministério Público (artigo 221.º, n.º 2) e constitucionalizou o Conselho Superior do Ministério Público, prevendo, na sua composição, para além dos membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público, a inclusão, de forma inovadora, de representantes eleitos pela Assembleia da República, excluindo da sua previsão a tradicional participação de membros designados pelo Governo (artigo 222.º, n.º 2)».

Consequentemente, será questionável a nova redacção que o artigo 1.º do decreto submetido à promulgação do Presidente da República pretende dar à alínea g) do n.º 2 do artigo 14.º da Lei 47/86, já que aí se contempla a inclusão no Conselho Superior do Ministério Público de «duas personalidades de reconhecido mérito designadas pelo Ministro da Justiça». Do mesmo modo, questionáveis serão a nova redacção dada ao artigo 26.º, n.º 2, alínea d), da Lei 47/86, bem como o artigo 2.º, n.º 2, do decreto em apreço, uma vez que constituem decorrências da referida presença de membros designados pelo Ministro da Justiça no Conselho Superior do Ministério Público.

3 - Por outro lado, o Presidente da República também suscita dúvidas sobre a constitucionalidade do artigo 1.º do diploma em questão, na parte em que introduz alterações ao artigo 105.º da Lei 47/86, ao fixar um limite temporal ao exercício do cargo de Procurador-Geral da República.

Quanto a este último ponto, o requerente interroga-se sobre a questão de saber se tal fixação não contende com o disposto no artigo 136.º, alínea m), da Constituição.

4 - Notificado o Presidente da Assembleia da República, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, veio o mesmo a oferecer o merecimento dos autos, juntando os Diário da Assembleia da República com os trabalhos parlamentares preparatórios do diploma a sindicar.

II - Fundamentação
A) Composição do Conselho Superior do Ministério Público
5 - Na sua versão originária, a Constituição estabelecia, no seu artigo 226.º, que «a Procuradoria-Geral da República é o órgão superior do Ministério Público e é presidida pelo Procuradoria-Geral da República» (n.º 1), cabendo à lei determinar «as regras de organização e composição da Procurador-Geral da República» (n.º 2).

Estes preceitos haviam de ser lidos em conjugação com outros também relativos ao Ministério Público, designadamente o que determinava que o Ministério Público gozava de estatuto próprio (artigo 224.º, n.º 2) e o que dispunha que «a nomeação, colocação, transferência e promoção dos agentes do Ministério Público e o exercício da acção disciplinar competem à Procuradoria-Geral da República» (artigo 225.º, n.º 2).

Com o intuito de dar tradução legal a estes preceitos constitucionais - que, embora cautelosos e não isentos de certa ambiguidade, entravam em colisão com a estrita subordinação do Ministério Público ao Ministro da Justiça contemplada no Estatuto Judiciário de 1962, aprovado pelo Decreto-Lei 44278, onde, nomeadamente, se afirmava que era àquele membro do Governo que cabia «nomear, promover, colocar, transferir e exonerar os magistrados do Ministério Público e exercer sobre eles acção disciplinar» [artigo 171.º, alínea b)] - veio a ser publicada a Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 39/78, de 5 de Julho), que, para além de consagrar a autonomia do Ministério Público (artigo 2.º, n.º 1), alterou profundamente a composição e a competência do seu Conselho Superior.

No que se refere à autonomia do Ministério Público, afirmou-se que ela se caracterizava «pela sua vinculação a critérios de legalidade estrita e de objectividade e pela exclusiva sujeição dos magistrados e agentes do Ministério Público às directivas, ordens e instruções previstas» naquela lei.

Quanto ao Conselho Superior do Ministério Público - na vigência do antigo Estatuto Judiciário constituído apenas pelo Procurador-Geral e pelos seus ajudantes em serviço no Supremo Tribunal de Justiça e nas relações - passou a ser composto pelo Procurador-Geral, pelos procuradores-gerais-adjuntos nos distritos judiciais, por um procurador-geral-adjunto eleito de entre e pelos restantes procuradores-gerais-adjuntos, por dois procuradores da República eleitos pelos seus pares, por um delegado do procurador da República por cada distrito judicial eleito de entre os magistrados da respectiva categoria e por três personalidades de reconhecido mérito designadas pelo Ministro da Justiça (artigo 14.º, n.º 2). Por outro lado, foi esclarecido que era através de este Conselho Superior que a Procuradoria-Geral da República exercia a competência disciplinar e de gestão dos quadros do Ministério Público que, constitucionalmente, lhe fora atribuída (artigo 14.º, n.º 1).

A primeira revisão constitucional, em 1982, obviamente influenciada pela evolução legislativa entretanto ocorrida, procedeu à reformulação do artigo 226.º, n.º 2, onde se passou a prever que a Procuradoria-Geral da República compreendia um órgão colegial que incluía membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público.

Posteriormente, a nova Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 47/86, de 15 de Outubro) manteve, no essencial, o conceito de autonomia, anteriormente assente, bem como a composição do Conselho Superior do Ministério Público (artigos 2.º, n.º 2, e 14.º, n.º 3).

A segunda revisão constitucional, ocorrida em 1989, para além de unificar os antigos artigos 224.º e 225.º, que passaram a constituir o novo artigo 221.º, consagrou constitucionalmente a autonomia do Ministério Público, procedendo à recepção desta inovação legal, introduzida, como se viu, em 1978. Por outro lado, modificou o teor do antigo artigo 226.º - agora, artigo 222.º

Assim, o n.º 2 do artigo 221.º preceitua, hoje, que «o Ministério Público goza de estatuto próprio e de autonomia, nos termos da lei». O artigo 222.º, por seu turno, estabelece que «a Procuradoria-Geral da República é o órgão superior do Ministério Público, com a composição e a competência definidas na lei» (n.º 1) e que «a Procuradoria-Geral da República é presidida pelo Procurador-Geral da República e compreende o Conselho Superior do Ministério Público, que inclui membros eleitos pela Assembleia da República e membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público» (n.º 2).

6 - Foi, exactamente, invocando a revisão constitucional de 1989 que surgiu o projecto de lei 65/VI (in Diário da Assembleia da República, 2.ª série-A, n.º 16, de 1 de Fevereiro de 1992), apresentado por Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

Na respectiva exposição de motivos, aquele projecto de lei assinalava que «a revisão constitucional de 1989 veio consagrar, de forma inequívoca e em todas as suas dimensões fundamentais, a autonomia do Ministério Público», sendo certo que «as alterações operadas tornam indispensável uma revisão da Lei Orgânica do Ministério Público, cuja conformidade com o quadro constitucional já vinha, aliás, em alguns pontos, sendo posta em causa».

Para adequação da lei ordinária à Constituição, o projecto considerava indispensável a recomposição do Conselho Superior do Ministério Público, de modo a «assegurar que, em paralelo com o que ocorre quanto ao Conselho Superior da Magistratura, só tenham assento no Conselho Superior do Ministério Público vogais eleitos (pelos próprios magistrados e pela Assembleia da República), numa proporção conforme ao respeito pela natureza do Ministério Público como órgão sem natureza administrativa, independente, dotado de autonomia institucional». E acrescentava que «tal opção, longamente ponderada e bem adoptada pela revisão constitucional, acarreta que deixem de fazer parte do Conselho de Magistrados não eleitos e personalidades designadas pelo Ministro da Justiça».

Em consonância com esta motivação, propunha-se que o Conselho Superior do Ministério Público passasse a ser composto pelo Procurador-Geral da República, por sete vogais eleitos pelos magistrados, sendo obrigatoriamente um procurador-geral-adjunto, dois procuradores da República e quatro delegados do procurador da República, e por sete vogais eleitos pela Assembleia da República. Em consequência da eliminação dos vogais por inerência, previa-se no projecto que «os procuradores-gerais-adjuntos nos distritos judiciais que não façam parte do Conselho Superior do Ministério Público assistem, quando o solicitem, às reuniões do Conselho, podendo nelas intervir, sem direito de voto».

7 - Composição idêntica para o Conselho Superior do Ministério Público - embora sem prever a possibilidade de assistência, sem direito de voto, dos antigos vogais por inerência - veio a constar igualmente do projecto de lei 78/VI, apresentado por Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (in Diário da Assembleia da República, 2.ª série-A, n.º 16, suplemento, de 1 de Fevereiro de 1992).

Na exposição de motivos afirmava-se que «o texto constitucional arreda (e bem) do Conselho Superior representantes do Governo, designados pelo Ministro da Justiça», considerando-se que, constitucionalmente, aquele órgão é composto apenas por membros eleitos pela Assembleia da República e por membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público.

E, para além disso, explicitava-se que «estando constitucionalmente reconhecida a autonomia do Ministério Público (v. O artigo 221.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa) a manutenção da representação do Governo no Conselho (contra a letra e o espírito da lei fundamental) representa uma ingerência e uma ameaça de intromissão na actividade do Ministério Público, que deve ter por norte apenas a defesa da legalidade democrática, pelo que não pode estar à mercê dos desígnios e objectivos do poder político».

8 - Posteriormente, foi apresentado o projecto de lei 88/VI, da iniciativa de Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (in Diário da Assembleia da República, 2.ª série-A, n.º 20, de 29 de Fevereiro de 1992), também apresentado com o intuito de «harmonizar a Lei Orgânica do Ministério Público - Lei 47/86, de 15 de Outubro - com a segunda revisão da Constituição da República, operada através da Lei Constitucional 1/89, de 8 de Julho».

Todavia, este projecto, ao contrário dos anteriores, não fazia desaparecer da composição do Conselho Superior do Ministério Público os membros por inerência - isto é, os procuradores-gerais-adjuntos nos distritos judiciais - nem extinguia a possibilidade de o Ministro da Justiça designar elementos para aquele órgão. Só que estes últimos elementos passavam de três a dois, como consequência da inclusão de cinco membros eleitos pela Assembleia da República.

9 - Na mesma data, foi apresentado, também, o projecto de lei 89/VI, subscrito por Deputados do Grupo Parlamentar do Partido do Centro Democrático Social, que, afirmando que «a revisão constitucional de 1989 reforçou a autonomia do Ministério Público e modificou o modo que deve presidir ao relacionamento entre o Ministério Público e o Governo», daí retirava que se tornava, «por isso, necessário dar corpo às prescrições do disposto nos artigos 221.º e 222.º da Constituição da República Portuguesa».

No que diz respeito à composição do Conselho Superior do Ministério Público, este projecto de lei mantinha a existência de membros por inerência, acrescentando, até, um - o vice-procurador-geral da República - em substituição do procurador-geral-adjunto eleito pelos seus pares. Contudo, extirpava do Conselho os vogais designados pelo Ministro da Justiça, nele fazendo entrar sete eleitos pela Assembleia da República.

10 - Dando parecer sobre estes projectos, que considerou estarem em condições de subir a Plenário, para serem objecto de debate e apreciação, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias entendeu que «a redacção do n.º 2 do artigo 222.º da Constituição da República Portuguesa, acerca da composição do Conselho Superior do Ministério Público, na referência que faz aos membros que aquele inclui, permite duas leituras».

A primeira, segundo aquela Comissão, vai no sentido de que «o Conselho Superior do Ministério Público integra apenas os membros eleitos ali mencionados, isto é, membros eleitos pela Assembleia da República e membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público, com exclusão de quaisquer outros».

A segunda, pelo contrário, e ainda de acordo com a mesma Comissão, aponta para que «o texto constitucional permite a integração adicional de outros membros, embora com a obrigatoriedade de inclusão daqueles».

O parecer, quanto a estas duas leituras, considera «evidente que, mesmo numa interpretação extensiva, a autonomia do Ministério Público, agora constitucionalizada, imporá sempre limitações para garantir de forma irreversível a sua isenção e imparcialidade». Contudo, acrescenta que «não é linear neste momento, considerado o dinamismo e constante transformação do Ministério Público, que a Constituição da República Portuguesa tenha querido assegurar no Conselho Superior apenas a presença dos membros que refere no artigo 222.º, n.º 2, sem ter tido o cuidado de referir expressamente a exclusão de quaisquer outros».

11 - Durante o debate parlamentar, a questão foi, obviamente, abordada, tendo sido, mesmo, uma das que mereceu maior discussão (cf. Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 34, de 28 de Fevereiro de 1992, pp. 1015 e segs.).

O Deputado Almeida Santos (PS) considerou «feridente do espírito da Constituição», por atentatória da autonomia do Ministério Público, «a presença no respectivo Conselho Superior de dois representantes do Ministro da Justiça - um que fosse!... - com forte cheiro a tutela, onde tutela não cabe».

Isto, no entanto, apesar de aquele parlamentar não ter deixado de confessar não poder «à puridade, pretender que a solução proposta pelo projecto da maioria incorra numa inconstitucionalidade de texto. Uma referência aos membros que o Conselho inclui não pode em pura linguística ser exclusiva de outros. E não nos havemos de esquecer que, segundo a própria Constituição, é à lei ordinária que compete definir o todo de que o texto constitucional definiu a parte. E quando a Constituição quis definir in totum a composição do Conselho Superior da Magistratura, usou a expressão composto pelos seguintes vogais. A diferença é, formalmente, elucidativa».

Sobre o mesmo problema, o Deputado Luís Sá (PCP) afirmou que ele «não é resolúvel provavelmente face ao argumento meramente literal; o que nos leva a considerar que a Constituição pretendeu excluir representantes do Governo do Conselho Superior do Ministério Público não é tanto o facto de eles não serem referidos na Constituição como essa exclusão ser uma consequência lógica da consagração constitucional da autonomia do Ministério Público, que é, antes de mais, uma autonomia face ao Governo e à Administração».

Pelo seu lado, o Deputado Costa Andrade (PSD) insurgiu-se contra a invocação da autonomia do Ministério Público como argumento esgrimido em desabono da presença de membros designados pelo Ministro da Justiça no respectivo Conselho Superior. Desde logo, por tal presença «ser um elemento integrante e legítimo do sistema normativo da autonomia que antecede a própria revisão da Constituição»; para além disso, por ser «uma solução que dá cabal satisfação aos pertinentes dispositivos constitucionais que regulam a matéria em termos de universo aberto e não de enumeração de numerus clausus».

Já das intervenções dos Deputados João Corregedor da Fonseca (Indep.) e Narana Coissoró (CDS) se retira que os mesmos entenderam ter o artigo 222.º, n.º 2, da lei fundamental pretendido excluir da composição do Conselho Superior do Ministério Público membros designados pelo Governo.

O Deputado Narana Coissoró, em dois diferentes momentos, apresenta as razões por que entende estar tal composição taxativamente fixada. Num primeiro momento, parece considerar que a consagração constitucional da autonomia não envolvia, de per si, a exclusão de vogais designados pelo Ministro, porque essa designação se enquadrava num lei ordinária que já previa a autonomia do Ministério Público; no entanto, tal exclusão resultaria necessariamente do facto de, na revisão constitucional, se ter pretendido substituir esses vogais por vogais eleitos pelo Parlamento, ao omitir-se qualquer referência aos primeiros. Daqui parece arrancar para a conclusão de que a revisão constitucional alterou, neste domínio, o conteúdo da própria autonomia do Ministério Público, aprofundando-a, motivo por que, num segundo momento, vem afirmar que «a autonomia do Ministério Público não é compatível com qualquer forma velada de tutela governamental sobre ele, como pela inclusão no Conselho Superior do Ministério Público de dois representantes do Ministro da Justiça».

12 - Concluído o debate, foram aprovados na generalidade, os projectos de lei n.os 78/VI (PCP), 88/VI (PSD) e 89/VI (CDS), tendo sido rejeitado o projecto de lei 65/VI (PS) (cf. Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 36, de 6 de Março de 1992).

A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias procedeu a discussão e votação na especialidade do diploma, em 9 de Abril de 1992, tomando como base de trabalho o projecto de lei 88/VI.

Na parte que ora nos interessa - composição do Conselho Superior do Ministério Público - cumpre assinalar que a manutenção dos membros por inerência foi aprovada por unanimidade dos Deputados presentes do PSD, PS e PCP e que a inclusão de duas personalidades de reconhecido mérito designadas pelo Ministro da Justiça foi aprovada com os votos favoráveis do PSD e contra do PS e PCP (cf. Diário da Assembleia da República, 2.ª série-A, n.º 38, de 16 de Maio de 1992).

Seguidamente, o diploma foi aprovado em votação final global, no Plenário, com votos a favor do PSD, votos contra do PS, do PCP, do CDS e dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro e a abstenção do PSN (cf. Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 63, de 15 de Maio de 1992).

13 - A eventual colisão com a Constituição das normas constantes do diploma sindicado que prevêem a pertença ao Conselho Superior do Ministério Público de «duas personalidades de reconhecido mérito designadas pelo Ministro da Justiça» poderia resultar de uma violação do artigo 222.º, n.º 2, atinente à composição daquele Conselho, ou de uma contradição com o artigo 221.º, n.º 2, que consagra a autonomia do Ministério Público, nos termos da lei.

Analisemos as duas questões, separadamente.
14 - A actual redacção do artigo 222.º, n.º 2, da Constituição radica numa proposta de alteração ao antigo artigo 226.º, n.º 2, constante do projecto de revisão constitucional n.º 3/V, apresentado pelos Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista (in Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 23, 3.º suplemento, de 18 de Novembro de 1987).

A versão do preceito resultante da revisão constitucional de 1982 estabelecia que «a lei determina as regras de organização e competência da Procuradoria-Geral da República, a qual compreende um órgão colegial que inclui membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público». A proposta do PS propugnava que se passasse a dizer que «a lei determina as regras da organização e competência da Procuradoria-Geral da República, a qual compreende um órgão colegial, o Conselho Superior do Ministério Público, que inclui membros eleitos pela Assembleia da República e membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público».

Como é sabido, o artigo 222.º, n.º 2, após a revisão constitucional de 1989, ficou a preceituar que «a Procuradoria-Geral da República é presidida pelo Procurador-Geral da República e compreende o Conselho Superior do Ministério Público, que inclui membros eleitos pela Assembleia da República e membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público».

Suscita-se, pois, a questão de saber se, ao impor a pertença ao Conselho Superior dos elementos eleitos nele referidos, aquele dispositivo pretende excluir a presença de quaisquer outras entidades ou se, pelo contrário, admite que o órgão possa integrar outros elementos.

15 - No primeiro sentido, pode-se apontar a intervenção do Deputado José Magalhães (PCP), no plenário da Assembleia da República, quando do debate da revisão constitucional, já que aí afirmou expressamente que «cessará até a representação do Governo no Conselho Superior do Ministério Público» (cf. Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 85, de 23 de Maio de 1989, p. 4147).

Aliás, essa opinião foi reafirmada posteriormente por José Magalhães, ao escrever, sobre o Conselho Superior do Ministério Público, que, «prevendo-se uma composição dualista (representantes eleitos pelos magistrados/representantes da Assembleia da República), exclui-se a representação governamental» (Dicionário da Revisão Constitucional, p. 39).

No sentido oposto, recordem-se os argumentos avançados pelo Deputado Almeida Santos durante o debate parlamentar do diploma em apreço: por um lado, a referência a membros que o Conselho há-de incluir não pode conduzir à obrigatória exclusão de outros; por outro lado, a composição do Conselho não se encontra exaustivamente definida na lei, sendo sempre necessária uma intervenção do legislador ordinário, ao contrário do que acontece com o Conselho Superior da Magistratura. E também o Deputado Luís Sá salientou que a questão se não podia resolver face a um argumento literal, isto é, face ao teor do artigo 222.º, n.º 2.

Assinale-se, também, que o argumento tirado do texto do referido artigo 222.º, n.º 2, levaria não só à exclusão dos vogais designados pelo Ministro da Justiça, mas também à necessária exclusão dos membros por inerência - isto é, os magistrados não eleitos, ou seja, os procuradores-gerais-adjuntos nos distritos judiciais.

Por isso, quer o PS, quer o PCP, não previram, nos respectivos projectos de lei, a pertença ao Conselho dos mencionados procuradores-gerais-adjuntos nos distritos judiciais. Todavia, como vimos, acabaram por aceitar essa solução, votando-a favoravelmente na especialidade, em Comissão.

E efectivamente, não se vê que o texto do artigo 222.º, n.º 2, tenha outro alcance para além de impor a presença no Conselho Superior do Ministério Público dos membros eleitos pela Assembleia da República e dos membros eleitos pelos magistrados. Como na versão anterior já se exigia a existência de magistrados eleitos pelos seus pares - sem que nunca se tivesse sustentado que só eles podiam integrar o Conselho -, o legislador da revisão constitucional terá pretendido que a Assembleia da República designasse vogais para o órgão, adicionando a referência a esses membros, sem daí extrair qualquer consequência quanto à permanência de outros elementos - por inerência ou nomeados.

Aliás, ao apresentar a citada proposta do Partido Socialista sobre o Conselho Superior do Ministério Público, em sede de revisão constitucional - proposta que deu origem ao actual texto constitucional -, o Deputado Almeida Santos não deixou de sublinhar que tal proposta era «modesta, no sentido de que se remeta para a lei a competência e se defina, apenas em parte, a composição, incluindo esta, além de membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público, tal como acontece hoje, também membros eleitos pela Assembleia da República, como acontece com o Conselho Superior da Magistratura» (cf. Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 49-RC, de 22 de Outubro de 1988).

Tal inclusão de membros eleitos pelo Parlamento - compreensível pela necessidade de conferir legitimação democrática ao Ministério Público, face à consagração constitucional da sua autonomia - em nada prejudica, porém, a possibilidade de o legislador continuar a considerar conveniente a presença de membros designados pelo Governo, tendo em conta, designadamente, que a este compete «defender a legalidade democrática» e «praticar todos os actos e tomar todas as providências necessárias à [...] satisfação das necessidades colectivas» [alíneas f) e g) do artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa], sendo certo que ao Ministério Público continua a caber a representação do Estado (artigo 221.º, n.º 1).

Não se vê, pois, que as normas impugnadas, referentes à designação de duas personalidades de reconhecido mérito para o Conselho Superior do Ministério Público, ofendam o preceituado no artigo 222.º, n.º 2, da Constituição.

16 - Resta, pois, averiguar se a solução avançada no diploma atinge a autonomia do Ministério Público, consignada no artigo 221.º, n.º 2, da lei fundamental.

Não será isento de escolhos o caminho a percorrer se se quiser estabelecer com rigor o exacto conteúdo do conceito de autonomia do Ministério Público e, designadamente, se se pretender distingui-lo do conceito de independência, reservado para os tribunais.

De todo o modo, parece seguro, por um lado, que o conceito de autonomia, agora consagrado na Constituição, vem importado da legislação ordinária - referido, primeiramente, na Lei 39/78, foi confirmado, depois, na Lei 47/86, donde passou para a lei fundamental na revisão de 1989.

E parece igualmente seguro, por outro lado, que o preenchimento de tal conceito pelo legislador ordinário há-de impedir que o Ministério Público, ao qual compete defender a legalidade democrática, seja transformado em instrumento do poder político; deve, assim, ser o mesmo organizado de forma a assegurar-se a sua «isenção e imparcialidade», como se salienta no já referido parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

Neste contexto, não se considera que a presença de duas personalidades designadas pelo Ministro da Justiça para o Conselho Superior do Ministério Público entre em conflito com a autonomia do Ministério Público, constitucionalmente garantida.

É que, como vimos, a autonomia do Ministério Público vem desde 1978, sem que alguma vez se tivesse assinalado a existência de uma contradição insanável entre as disposições legais que a estabeleciam e caracterizavam e as que previam a designação de membros do Conselho pelo Ministro da Justiça - razão por que se não pode subscrever a tese de que a Constituição, ao proceder à recepção do conceito de autonomia, que já vinha da lei, tivesse pretendido inconstitucionalizar essa designação.

Por outro lado, de acordo com o artigo 2.º, n.º 2, da Lei 47/86, que quase reproduziu, na integra, o preceituado no artigo 2.º, n.º 2, da Lei 39/78, «a autonomia do Ministério Público caracteriza-se pela sua vinculação a critérios de legalidade e objectividade e pela exclusiva sujeição dos magistrados e agentes do Ministério Público às directivas, ordens e instruções previstas nesta lei».

Esta autonomia funcional há-de encontrar eco numa certa autonomia orgânica - sem agora se curar de saber qual o seu grau, a sua dimensão e, até, os seus limites. Tal autonomia orgânica encontra, aliás, uma expressão constitucional no n.º 4 do artigo 221.º, quando se comete à Procuradoria-Geral da República «a nomeação, colocação transferência e promoção dos agentes do Ministério Público», certamente para subtrair o exercício de tais competências ao Governo.

Daqui pode extrair-se que não seria compatível com a Constituição que o Governo designasse, por exemplo, a maioria dos membros do Conselho Superior do Ministério Público - único órgão do Ministério Público constitucionalmente previsto, para além do Procurador-Geral da República, e a quem, consequentemente, há-se caber velar pela autonomia que a Constituição consagra.

Todavia, já não é possível sustentar que se encontra vedado ao legislador prever a existência de um certo número de vogais nomeados pelo Ministro da Justiça, desde que seja respeitado um critério de proporcionalidade.

Ora, de acordo com um critério de proporcionalidade, seguramente se não pode concluir no caso vertente - único que cumpre aqui analisar - que haja quebra da autonomia do Ministério Público em resultado da referida nomeação de membros do respectivo Conselho Superior pelo Ministro da Justiça, quando se trata tão-só de 2 elementos num total de 19, dos quais 12 - ou seja, até, uma clara maioria - pertencem ao próprio Ministério Público.

Entende-se, pois, que as normas em causa também não violam o preceituado no n.º 2 do artigo 221.º da Constituição, na medida em que não são de molde a poderem atentar contra a prescrição constitucional da autonomia do Ministério Público.

B) Limitação temporal ao exercício do cargo do Procurador-Geral da República
17 - O segundo grupo de normas que vem impugnado refere-se à limitação temporal do exercício do cargo de Procurador-Geral da República e consta dos n.os 4, 5, 6, 7 e 8, pretendidos aditar ao artigo 105.º da Lei 47/86.

Tais normas poderiam conflituar, segundo o Presidente da República, com o disposto na alínea m) do artigo 136.º da Constituição.

Segundo este artigo 136.º, «compete ao Presidente da República, relativamente a outros órgãos», praticar um certo número de actos, entre os quais «nomear e exonerar, sob proposta do Governo, [...] o Procurador-Geral da República» [alínea m)].

A Lei 47/86, no seu artigo 105.º, que reproduz, ipsis verbis, o que já anteriormente constava do artigo 117.º da Lei 39/78, veio dispor o seguinte:

1 - O Procurador-Geral da República é nomeado e exonerado nos termos da Constituição.

2 - A nomeação implica a exoneração de anterior cargo quando recaia em magistrado judicial ou do Ministério Público ou em funcionário do Estado.

3 - Após a cessação de funções, o Procurador-Geral da República nomeado nos termos do número anterior tem direito a reingressar no quadro de origem, sem perda de antiguidade e do direito à promoção.

É a esse artigo que o diploma em apreciação pretende, agora, aditar os seguintes números:

4 - O Procurador-Geral da República é nomeado por um período de cinco anos.
5 - Em caso de vacatura, o Procurador-Geral da República a nomear inicia funções por um novo período de cinco anos.

6 - Não é admitida a nomeação para um terceiro período consecutivo, nem durante o quinquénio imediatamente subsequente ao termo do segundo período consecutivo.

7 - Para efeitos de determinação do âmbito temporal do mandato do Procurador-Geral da República, nos termos dos n.os 4 e 5 deste artigo, não conta o tempo do exercício do cargo anterior à entrada em vigor da presente lei.

8 - Relativamente a Procurador-Geral da República que venha a ser nomeado após a entrada em vigor desta lei, o período de cinco anos, a que se referem os n.os 4 e 5 considera-se iniciado na data da sua posse.

Vejamos, pois, se estes acrescentos ao primitivo artigo 105.º da Lei 47/86 são compatíveis com a Constituição da República Portuguesa.

17 - O aditamento agora proposto tem a sua origem no já referido projecto de lei 88/VI, de Deputados do Grupo Parlamentar do PSD.

Em tal projecto, com efeito, já constavam os novos n.os 4, 5 e 6, respeitantes à «definição temporal do cargo de Procurador-Geral da República», justificados pela intenção de «reforçar a legitimidade e dignificar o exercício de tal cargo, retirando-lhe a natureza de precariedade que agora o caracteriza e introduzindo clareza no lacunoso regime actual».

Quanto aos novos n.os 7 e 8, foram igualmente propostos pelos Deputados do PSD, quando da discussão e votação na especialidade, em Comissão, na sequência de anúncio constante da exposição de motivos do projecto de lei.

Em mais nenhum dos projectos de lei se propunham alterações ao artigo 105.º da Lei 47/86, excepto no projecto do CDS, onde se sugeria que o n.º 1 do artigo passasse a dizer que «o Procurador-Geral da República é nomeado e exonerado pelo Presidente da República, sob proposta do Governo».

18 - Durante o debate parlamentar, duas posições se afrontaram: a primeira, considerando que a limitação temporal do exercício do cargo não era constitucionalmente admissível; a segunda, sustentando que as disposições a introduzir vinham conferir estabilidade ao exercício do cargo, assegurando a autonomia constitucionalmente garantida ao Ministério Público.

Logo na primeira intervenção, quando do debate na generalidade, o Deputado Almeida Santos (PS), depois de afirmar que, nos termos da Constituição, o sistema de nomeação e exoneração do Procurador-Geral da República se configura como um sistema de «dupla confiança», em face do Presidente da República e em face do Governo, pelo que não existiria nenhuma lacuna constitucional quanto ao prazo de exercício do cargo, interrogava: «Dito de outro modo: se a Constituição confere ao Governo e ao Presidente da República competência para, sem limite de tempo, propor e decidir, respectivamente, pode a lei ordinária limitar essa competência?»

E, a esta questão, respondia que «quanto ao Governo, ainda pode a lei acrescentar-lhe novas competências, mas não retirar, limitar ou condicionar as que a Constituição lhe confere. Quanto ao Presidente da República, nem sequer restringi-las nem acrescê-las. A competência do Presidente da República é reserva da Constituição: não pode ser aumentada, nem limitada, nem condicionada, sequer, para que só possa exercer de cinco em cinco anos uma faculdade que agora pode exercer, ia a dizer, caricaturalmente, quase todos os dias».

Em contrapartida, e pedindo esclarecimentos àquele parlamentar, o Deputado Guilherme Silva (PSD) considerou que «a razão da delimitação temporal das funções do Procurador-Geral da República sai reforçada com a inserção da autonomia da revisão constitucional», e isto porque, na situação actual, «o Procurador tem uma situação precária, dado que a qualquer momento, por proposta do Governo, o Sr. Presidente da República pode exonerá-lo».

Assim sendo, perguntava o Deputado Guilherme Silva se tal situação não é «efectivamente atentatória da autonomia do Ministério Público, sendo o Procurador-Geral, como é, uma figura central da sua estrutura» e formulava a seguinte pergunta: «Será que a função do Procurador-Geral da República na dependência constante do poder político, e é só uma dependência do poder político, não afecta efectivamente a sua autonomia e, pelo contrário, a estabilização temporal da sua função não a vai reforçar?»

Também o Deputado Correia Afonso (PSD) apontava o limite temporal como uma expressão da autonomia do Ministério Público, já que, dentro desse limite, a exoneração só poderia ocorrer «se alguma anomalia muito forte suceder», devendo-se encarar a redução de poderes do Presidente da República como uma necessária decorrência da consagração constitucional daquela autonomia.

Finalmente, o Ministro da Justiça, explicitando a posição do Governo sobre a questão, salientou que «é aí, na definição do estatuto do Procurador-Geral da República, que se evidenciam aqueles que, de pleno, advogam a autonomia e, portanto, garantem ao cargo estabilidade política; e aqueles outros que, discursando sobre a autonomia, permitem e defendem afinal a total e permanente dependência do cargo de Procurador-Geral da República de critérios da mais pura discricionariedade política».

Por isso, manifestou expresso apoio do Governo à «nomeação do Procurador-Geral da República por um período de cinco anos renovável uma vez e durante o qual se garanta que a sua exoneração, a ter lugar, apenas poderá ocorrer a pedido seu ou por motivos de natureza disciplinar».

E, fustigando a posição adversa, adiantou que «não se diga também, tentando justificar o inexplicável, que desta forma desaparece, sobre o Procurador-Geral da República, o duplo controlo democrático radicado na possibilidade da sua exoneração a todo o tempo por acordo entre o Governo e o Presidente da República».

Isto, porque «quem tem a independência como atitude, como convicção inferiorizada como conceito claramente assumido não pode deixar de manifestar a sua perplexidade perante uma proposta que, por um lado, se afirma defensora da independência do Procurador-Geral da República enquanto magistrado e, por outro lado, faz dele o único magistrado cuja permanência no cargo depende de um controlo e de uma vontade meramente políticas».

Neste contexto, as referidas modificações ao teor do texto do artigo 105.º da Lei 47/86 acabaram por ser aprovadas apenas com os votos favoráveis dos Deputados do PSD.

19 - A apreciação das normas aprovadas, à luz do projecto de lei que lhe deu origem, designadamente da sua exposição de motivos, e do debate parlamentar que se lhe seguiu, conduz à conclusão que, antes de mais, elas têm como objectivo inequívoco alcançar dois desideratos: em primeiro lugar, estabelecer um prazo certo de exercício do cargo de Procurador-Geral da República, findo o qual se torna necessário proceder a nova nomeação; em segundo lugar, impedir que, no decurso desse prazo, o Procurador-Geral da República possa ser exonerado, salvo por motivo disciplinar ou no caso de ele próprio solicitar a sua exoneração.

Já mais duvidoso se apresenta esclarecer algumas questões complementares.
Por exemplo, se, findo o prazo de exercício do cargo, este cessa automaticamente ou se, pelo contrário, deve ocorrer um acto vinculado de exoneração - e de proposta de exoneração - ou, ainda, se até nova nomeação, se prolonga o exercício do cargo pelo anterior titular (prorrogatio). E, também, qual o tipo de infracções disciplinares que podem justificar a exoneração antecipada e qual o procedimento a seguir em tais casos.

De todo o modo, a questão crucial a colocar é a seguinte: é possível, face ao preceituado na alínea m) do artigo 136.º da lei fundamental, fixar um prazo limite para o exercício do cargo de Procurador-Geral da República e, durante o período normal de exercício desse cargo, limitar os poderes do Governo e do Presidente da República, no que respeita à faculdade de exoneração daquele magistrado?

Esta a questão a que se passará a tentar dar resposta.
20 - A simples circunstância de se encarar a limitação temporal como uma alteração ao regime legal até agora vigente, o qual - recorde-se - dispõe que «o Procurador-Geral da República é nomeado e exonerado nos termos da Constituição», inculcaria a ideia de que se estaria a entrar em contradição com o preceituado na lei fundamental.

Na verdade, se até agora se entendeu pacificamente que a referida disposição legal, ao remeter para o preceito constitucional atinente, havia de ser interpretada no sentido de o Procurador-Geral da República dever exercer o seu cargo sem limite temporal, podendo, em contrapartida, ser exonerado, a todo o tempo, por decisão do Presidente da República, sob proposta do Governo, não quererá isso dizer que esse regime é o que resulta directa e imediatamente da Constituição, tornando-se, assim, ilegítimas as alterações agora pretendidas introduzir?

A este raciocínio imediato se poderá responder, como o parece pretender fazer a exposição de motivos do projecto de lei 88/VI, que o regime em causa não é imposto pela Constituição, antes traduz uma prática resultante da existência de uma lacuna que, agora, se procura colmatar.

Todo o problema gira, pois, em torno da questão de saber em que medida a Constituição terá podido querer remeter para a lei a determinação das condições de exercício dos actos previstos na alínea m) do seu artigo 136.º

21 - A nomeação e a exoneração do Procurador-Geral da República configuram-se como actos políticos «stricto sensu.»

Tais actos - e para usar uma expressão de Afonso Queiró - «representam o exercício de faculdades directamente conferidas pela Constituição» («'Actos de Governo' e Contencioso de Anulação», Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. XLV, 1969, p. 14), ou seja, são «praticados sem sujeição à lei ordinária, fora, portanto, de qualquer propósito de traduzir, mediata ou imediatamente (isto é, com ou sem a mediação de uma norma regulamentar), numa actuação individual e concreta, uma volição prévia do legislador ordinário» (ibidem, p. 16).

Quer isto dizer - e segundo o mesmo autor - «que não devem, portanto, considerar-se actos políticos aqueles cuja prática pelo Executivo é ocasionalmente prevista na constituição, mas cujo conteúdo é fixado ou demarcado por normas de legislação ordinária», como acontece, por exemplo, com «os actos de nomeação de certas categorias de agentes públicos, a competência para cuja prática é conferida por vezes pela própria lei fundamental ao Executivo. E isto sempre pela mesma razão: é que o conteúdo destes actos e os pressupostos da sua prática são disciplinados pela lei ordinária. Estes actos são, portanto, substancialmente consideradas as coisas, actos de aplicação ou execução da lei ordinária e não da constituição».

A determinação pela lei ordinária das condições de exercício das faculdades conferidas pela alínea m) do artigo 136.º da Constituição vem, pois, como que degradar os actos ali previstos de actos políticos em actos administrativos. E se essa desgraduação, no que respeita à nomeação e exoneração de certas categorias de agentes públicos pelo Governo, poderá, em certas circunstâncias, não repugnar - basta recordar o que se dispunha no n.º 4 do artigo 109.º da Constituição de 1933, à data em que foi escrito o citado estudo de Afonso Queiró -, já não parece que possa ser aceitável no que se reporta aos actos constitucionalmente atribuídos ao Presidente da República, no exercício da função política.

Ora, e como se começou por afirmar, afigura-se que, hoje, a nomeação e exoneração do Procurador-Geral da República - ao contrário do que acontecia no domínio da Constituição de 1933, face ao preceituado no seu artigo 109.º, n.º 4 e § 9.º - se inscrevem no quadro constitucional dos actos políticos stricto sensu, revelando o exercício da função política (v. Jorge Miranda, Funções, Órgãos e Actos do Estado, p. 37, contra, todavia, Afonso Queiró, Lições de Direito Administrativo, p. 90).

Por este motivo, e desde logo, a conformação por via legislativa dos termos e condições dessa nomeação e exoneração se afigura como constitucionalmente ilegítima, uma vez que só poderia ocorrer caso existisse expressa remissão constitucional para a lei ou se houvesse necessidade de regulamentação procedimental do seu exercício (cf. J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Os Poderes do Presidente da República, p. 40, nota 42), ou, ainda, se a lei apenas se limitasse a revelar condicionamentos implícitos no próprio texto constitucional, de tal sorte que a eles se poderia - e deveria - chegar através da mera interpretação da Constituição, ainda que lei não houvesse.

Na verdade, parece incontroverso que, em princípio, não é permitido à lei vir regular as condições de exercício dos actos políticos: não podia, por exemplo, vir limitar a escolha do Primeiro-Ministro ou dos membros do Governo entre cidadãos com certa idade ou habilitações mínimas, ou esclarecer qual o sentido da expressão «tendo em conta os resultados eleitorais», a que se reporta o n.º 1 do artigo 190.º da lei fundamental; como não pode, no caso vertente, fixar a limitação temporal do exercício do cargo do Procurador-Geral da República, nem poderia estabelecer que a sua nomeação devia ser feita de entre procuradores-gerais-adjuntos (já as questões de saber se a lei poderia exigir que a nomeação se fizesse de entre juristas, ou estipular que o exercício do cargo cessasse por limite de idade, dependem de se entender - ou não - que tais condicionamentos resultam, embora tão-só implicitamente, da própria Constituição).

22 - Estando os actos previstos na alínea m) do artigo 136.º integrados no exercício da função política, de facto, só a Constituição - ou a lei, se aquela expressamente o autorizasse ou nos restantes casos acima indicados - podia vir dispor sobre um elemento essencial desses actos, a saber, a vontade. É que nesta se há-de integrar a «liberdade de actuação, isto é, a livre opção entre actuar e não actuar e a livre escolha do momento da actuação» (cf. Marcelo Rebelo de Sousa, O Valor Jurídico do Acto Inconstitucional, I, pp. 108 e 142).

Ora, a fixação de um prazo para o exercício do cargo vem limitar de forma clara, em duas vertentes, a liberdade de actuação do Governo e do Presidente da República.

Em primeiro lugar, porque, como vimos, vem condicionar a faculdade de exoneração, durante o período normal de exercício do cargo, à verificação de razões de ordem disciplinar ou ao pedido do próprio.

Em segundo lugar, porque vem obrigar à exoneração - ou a fazer cessar, automaticamente, os efeitos da nomeação - por mero decurso do prazo.

Ora, para além de não poder a liberdade de actuação do Governo e do Presidente da República ser limitada por via legislativa, acontece que ocorrem razões de fundo que levam a supor que a Constituição pretendeu, efectivamente, neste caso, optar por conferir àqueles órgãos de soberania uma total liberdade de actuação, inteiramente incompatível com o sistema agora aprovado e questionado pelo requerente.

23 - A fórmula constitucionalmente prevista da nomeação e exoneração do Procurador-Geral da República pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, traduz a concepção constitucional da posição institucional do Ministério Público: autonomia e não independência, o que implica, quanto ao seu representante máximo - o Procurador-Geral da República -, uma certa estabilidade conjugada com uma íntima e permanente ligação ao poder político considerado no seu todo (que não apenas ao Governo), sendo que é esta ligação que lhe confere a indispensável legitimação democrática.

A íntima ligação ao poder político no seu todo assegura-se, desde logo, por a nomeação traduzir uma dupla confiança política: relativamente ao Governo, que propõe, e ao Presidente da República, que nomeia. E a permanente existência dessa ligação é revelada pelo carácter precário do exercício do cargo, já que ele pode cessar, a todo o tempo, por acordo de vontades entre o Presidente da República e o Governo.

Todavia, é este indispensável acordo de vontades que garante aquele mínimo de estabilidade exigida pela autonomia do Ministério Público, uma vez que se assegura a permanência em funções do Procurador-Geral da República até que se verifique coincidência de opiniões entre Presidente da República e Governo quanto à oportunidade e conveniência de se proceder à sua exoneração, isto é, que ocorra uma dupla perda de confiança.

É exactamente este indispensável acordo de vontades - de indiscutível e superior relevância política - que ora se pretende fazer substituir pelo mero decurso de um prazo.

Tal solução, contudo, não se compagina nem com o texto nem com o espírito da Constituição, como se procurou demonstrar.

24 - As normas em apreço não são, também, susceptíveis de qualquer interpretação conforme à Constituição.

Poder-se-ia, efectivamente, e tendo em conta que se mantém o n.º 1 do artigo 105.º da Lei 47/86, sustentar, por um lado, que se não pretende fazer desaparecer o poder de livre exoneração pelo Presidente da República, a todo o tempo, sob proposta do Governo, mas apenas limitar o período de exercício do cargo a um máximo de cinco anos, renovável uma vez, e, por outro lado, que, findo esse período, o exercício do cargo não cessa automaticamente, sendo sempre necessário o acto de exoneração do Presidente da República, sob proposta do Governo.

Contudo, tal interpretação, presumivelmente conforme à Constituição, não procede.

25 - A interpretação referida, quanto ao primeiro ponto, isto é, quanto à manutenção da faculdade de livre exoneração a todo o tempo, é, como vimos, totalmente contrária aos propósitos expressamente manifestados na exposição de motivos do projecto de lei que deu origem ao diploma sindicato, às intervenções dos Deputados que subscreveram esse projecto de lei e às palavras do Ministro da Justiça, que o defendeu.

Em todos os casos, o novo sistema foi apresentado como tendo por objectivo reforçar a consagrada autonomia do Ministério Público, retirando o carácter precário à nomeação do Procurador-Geral da República.

Ora, não parece curial nem, sequer, admissível que o Tribunal Constitucional proceda a uma interpretação conforme à Constituição que subverta, de forma clara e inequívoca, a vontade presumida do legislador, aproveitando de uma norma tão-só uma das suas partes componentes - in casu, o limite temporal - quando, de acordo com aquela vontade presumida, essa mesma parte da norma é subsidiária da outra que o Tribunal, afinal, rejeita - in casu, a estabilidade do exercício do cargo.

Com efeito, tendo em consideração a referida vontade presumida do legislador, poder-se-á afirmar, o que não é arriscado, face à transparência e abundância dos trabalhos preparatórios, que, perante a pretensa interpretação conforme à Constituição acima avançada, o legislador teria preferido abster-se de legislar sobre a matéria, já que as suas intenções saem, assim, completamente subvertidas.

Em casos destes, não se afigura possível que o Tribunal Constitucional recorra à interpretação conforme à Constituição para salvar a constitucionalidade de uma norma jurídica, porque não existem quaisquer razões de ordem substancial que o justifiquem.

26 - Quanto ao outro ponto, uma eventual interpretação conforme à Constituição afigura-se, afinal, irrelevante.

Efectivamente, se a inconstitucionalidade da norma que fixa o limite temporal, quando interpretada no sentido de impor a cessação automática do exercício do cargo no termo do prazo, se afigura evidente e grosseira, por implicar um termo do exercício de funções sem a prévia exoneração exigida, de forma expressa, na alínea m) do artigo 136.º, a verdade é que aquela norma é igualmente inconstitucional, ainda quando interpretada no sentido de não dispensar aquela exoneração, depois de decorrido o prazo de cinco anos nela previsto.

É que, nesta hipótese, ficavam o Governo, na obrigação de propor, e o Presidente da República, na obrigação de exonerar, vinculados, uma vez decorrido o prazo, à prática de um acto que, pela sua configuração constitucional, é um acto livre.

Por aqui, pois, também se não consegue afastar a contradição da norma em apreço com o artigo 136.º, alínea m), da lei fundamental.

III - Decisão
Nestes termos, decide o Tribunal Constitucional:
a) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade das normas constantes do artigo 1.º, na parte em que dá nova redacção aos artigos 14.º, n.º 2, alínea g), e 26.º, n.º 2, alínea d), da Lei 47/86, de 15 de Outubro, e ainda do artigo 2.º, n.º 2, do Decreto 12/VI, da Assembleia da República, relativo à autonomia do Ministério Público;

b) Pronunciar-se pela inconstitucionalidade da norma constante do artigo 1.º do mesmo diploma, na parte em que adita novos n.os 4, 5, 6, 7 e 8 ao artigo 105.º da referida Lei 47/86, por violação do preceituado na alínea m) do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa.

Lisboa, 2 de Julho de 1992. - Luís Nunes de Almeida - José de Sousa e Brito - Alberto Tavares da Costa - Armindo Ribeiro Mendes - Antero Alves Monteiro Dinis - António Vitorino - Mário de Brito (vencido em parte, nos termos da declaração de voto junta) - Maria da Assunção Esteves (vencida, em parte, nos termos da declaração de voto junta) - Messias Bento [vencido quanto à alínea b), nos termos da declaração de voto junta] - Fernando Alves Correia [vencido quanto à alínea b), nos termos da declaração de voto junta] - Vítor Nunes de Almeida [vencido quanto à alínea b) da decisão pelos fundamentos constantes do voto de vencido do conselheiro Messias Bento, a que adiro integralmente] - Bravo Serra (vencido nos termos da declaração de voto junta) - José Manuel Cardoso da Costa [vencido em parte, quanta à alínea b) da decisão, nos termos da declaração de voto junta].


Declaração de voto
Segundo o artigo 265.º do Estatuto Judiciário de 1944 (Decreto-Lei 33547, de 23 de Fevereiro de 1944), o Ministério Público era imediatamente subordinado ao Ministro da Justiça e constituía uma magistratura amovível, responsável e hierárquica (corpo do artigo), consistindo a amovibilidade na faculdade que tinha o Governo de transferir livremente, dentro da mesma classe ou categoria, os que dessa magistratura faziam parte [alínea a)] e a hierarquia, além do mais, na imediata subordinação do Procurador-Geral da República - que era o «chefe da magistratura» (artigo 106.º) - ao Ministro da Justiça [alínea c)]. Todos os magistrados do Ministério Público eram nomeados, nos termos do artigo 275.º do mesmo Estatuto, pelo Ministro da Justiça, excepto o Procurador-Geral, que era nomeado «nos termos da Constituição», ou seja, por decreto do Governo (Constituição Política de 1933, artigo 109.º).

Esta estrutura foi mantida pelo Estatuto Judiciário, aprovado pelo Decreto-Lei 44278, de 14 de Abril de 1962. Assim, o artigo 170.º falava na «dependência» do Ministério Público em relação ao Ministro da Justiça e o artigo 171.º atribuía a esse membro do Governo, «na superintendência das funções do Ministério Público», entre outros, os seguintes poderes: «estabelecer as directrizes de ordem geral a que deve obedecer a acção dos diferentes órgãos do Ministério Público no exercício das funções da sua competência» [alínea a)]; «nomear, promover, colocar, transferir e exonerar os magistrados do Ministério Público e exercer sobre eles acção disciplinar» [alínea b)]; «ditar normas de procedimento aos agentes do Ministério Público sobre o exercício das suas atribuições relativamente à prevenção e repressão criminal» [alínea c)].

Já depois do «movimento» de 25 de Abril de 1974, o Decreto-Lei 261/74, de 18 de Junho, no seu artigo 3.º, continuou a dar competência, ao Governo, para a nomeação do Procurador-Geral da República e ao Ministro da Justiça, para a nomeação dos restantes magistrados do Ministério Público.

Mas a Constituição de 1976, na sua versão originária, concedeu ao Ministério Público «estatuto próprio» (artigo 224.º, n.º 2), atribuiu ao Presidente da República competência para nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o Procurador-Geral da República [artigo 136.º, alínea l)] e, quanto à competência para a nomeação, colocação, transferência e promoção dos agentes do Ministério Público e o exercício da acção disciplinar, essa passou para a própria Procuradoria-Geral da República (artigo 225.º, n.º 2).

A Lei 39/78, de 5 de Julho, que aprovou a Lei Orgânica do Ministério Público, veio mesmo consagrar a autonomia do Ministério Público «em relação aos demais órgãos do poder central, regional e local, nos termos da presente lei» (n.º 1 do artigo 2.º), dizendo que essa autonomia se caracteriza «pela sua vinculação [do Ministério Público] a critérios de legalidade estrita e de objectividade e pela exclusiva sujeição dos magistrados e agentes do Ministério Público às directivas, ordens e instruções previstas nesta lei» (n.º 2 do mesmo artigo).

Esta autonomia continuou, porém, a não ter assento constitucional, apesar da revisão de 1982.

E só com a revisão de 1989, depois de a nova Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 47/86, de 15 de Outubro) ter repetido no seu artigo 2.º o artigo 2.º da Lei 39/78, tal autonomia passou a fazer parte do texto constitucional: «o Ministério Público goza de estatuto próprio e de autonomia, nos termos da lei» - lê-se no artigo 221.º, n.º 2.

Quanto ao Conselho Superior do Ministério Público:
O Estatuto Judiciário de 1944 só previa a existência de um Conselho da Procuradoria-Geral, formado pelo Procurador-Geral e pelos procuradores em serviço na Procuradoria, que eram em número de quatro (artigos 112.º e 108.º).

No Estatuto de 1962 é que apareceram dois conselhos: o Conselho Consultivo (artigo 205.º) e o Conselho Superior do Ministério Público (artigo 213.º). Nos termos do n.º 1 deste artigo, o Conselho Superior era constituído pelo Procurador-Geral e pelos seus ajudantes em serviço no Supremo Tribunal de Justiça e nas relações.

Com alteração introduzida nesse preceito pelo Decreto-Lei 609/74, de 13 de Novembro, o mesmo Conselho passou a ser constituído pelo Procurador-Geral e pelos seus ajudantes em serviço no Supremo Tribunal de Justiça, na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo e nas relações.

Pela Lei 39/78 passaram a integrar o Conselho Superior (artigo 14.º, n.º 2):

a) O Procurador-Geral;
b) Os procuradores-gerais-adjuntos nos distritos judiciais;
c) Um procurador-geral-adjunto eleito;
d) Dois procuradores da República eleitos;
e) Um delegado do procurador da República eleito;
f) Três personalidades de reconhecido mérito designadas pelo Ministro da Justiça.

A Lei 47/86 manteve no essencial esta composição. As alterações foram duas: em vez de um delegado do procurador da República, passou a haver quatro, e introduziram-se dois funcionários de justiça eleitos, «com intervenção restrita à discussão e votação das matérias relativas à apreciação do mérito profissional e ao exercício da função disciplinar relativos a funcionários de justiça do Ministério Público» (artigo 14.º, n.os 3 e 4).

De acordo com a redacção dada ao n.º 2 do artigo 14.º da Lei 47/86 pelo decreto em apreciação, mantêm-se as alíneas a) a d) do actual n.º 3; acrescenta-se à alínea e) que os delegados do procurador da República devem ser «um por cada distrito judicial»; introduzem-se na composição do Conselho «cinco membros eleitos pela Assembleia da República» [alínea f)], e reduz-se o número de «personalidades de reconhecido mérito designadas pelo Ministro da Justiça» de três para dois [alínea g)].

A introdução dos membros eleitos pela Assembleia da República era reclamada pela 2.ª revisão da Constituição (de 1989), já que o n.º 2 do artigo 222.º ficou com a seguinte redacção:

A Procuradoria-Geral da República é presidida pelo Procurador-Geral da República e compreende o Conselho Superior do Ministério Público, que inclui membros eleitos pela Assembleia da República e membros de entre si eleitos pelos magistrados do Ministério Público.

E, sabido que, tanto pela Lei 39/78 como pela Lei 47/86, faziam parte do Conselho Superior do Ministério Público três personalidades designadas pelo Ministro da Justiça, o texto saído da revisão aponta no sentido da sua exclusão da composição do Conselho.

Mas decisivo nesse sentido afigura-se-me ser o princípio da autonomia do Ministério Público consagrado constitucionalmente, como se disse, com a 2.ª revisão da Constituição (n.º 2 do artigo 221.º).

Uma vez que, no quadro legislativo anterior à Constituição de 1976, o Ministério Público se encontrava na «dependência» do Ministro da Justiça, a consagração da autonomia dessa magistratura não poderá deixar de traduzir-se na «independência» face a esse membro do Governo, «independência» essa incompatível com a presença no Conselho Superior do Ministério Público de qualquer «personalidade» por ele designada.

A norma em questão ofende, pois, em meu entender, o n.º 2 do artigo 221.º da Constituição.

E o artigo 26.º, n.º 2, da Lei 47/86, na nova redacção que lhe é dada pelo artigo 1.º do diploma em apreciação, sofrerá de inconstitucionalidade consequencial ou por arrastamento. - Mário de Brito.


Declaração de voto
Não subscrevi a tese da inconstitucionalidade da norma do artigo 1.º do Decreto 12/VI, na parte em que adita os n.os 4, 5, 6, 7 e 8 ao artigo 105.º da Lei 47/86, de 15 de Outubro.

A dimensão de politicidade dos actos de nomeação e exoneração previstos na norma do artigo 136.º, alínea m), da Constituição - dimensão que é incontroversa - não anula a possibilidade de intervenção conformadora do legislador. O papel do Parlamento como instância de regulação dos actos políticos afigura-se tanto mais emergente quanto nestes se reconhece um lugar de reserva de poder e défice de jurisdição.

Como afirma Gomes Canotilho, «uma Constituição democrática oferece espaço para diferentes 'variáveis' de conformação política, embora esta conformação não se possa entender normativo-constitucionalmente desvinculada» (Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, Coimbra, 1982, p. 148).

O problema não é pois o de saber se a lei pode intervir nos actos políticos previstos na Constituição. É antes o de saber se, ao intervir, a lei atinge ou não o domínio irredutível das normas constitucionais.

Os actos de nomeação e exoneração a que se refere a norma do artigo 136.º, alínea m), como actos políticos, são percebidos no sistema global de referências que é dado pela Constituição. Pressupõem a intuição do sistema como totalidade, existem mesmo numa relação dinâmica com o sistema. E impõem, por isso, uma abertura metodológica a outros lugares da Constituição. Daí o não se poder configurar aquela norma do artigo 136.º como um enunciado fechado.

O Decreto 12/VI, ao estabelecer um tempo de duração do mandato do Procurador-Geral da República, ordena-se às normas conjugadas dos artigos 136.º, alínea m) (competências do Presidente da República e do Governo), e 221.º, n.º 2 (autonomia do Ministério Público), da Constituição. A solução legislativa que contém apresenta-se, assim, normativo-constitucionalmente vinculada. E afigura-se tanto mais legítima quanto, no quadro do nosso sistema de Governo, o Parlamento detém a centralidade na ordenação e controlo do político. - Maria da Assunção Esteves.


Declaração de voto
As razões por que votei vencido quanto à alínea b) da decisão são, no essencial, as seguintes:

1 - A alínea m) do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa atribui ao Presidente da República competência para «nomear e exonerar, sob proposta do Governo, [...] o Procurador-Geral da República».

Da referida alínea m) do artigo 136.º [correspondente à alínea l) da versão originária da Constituição] resulta que:

a) É ao Governo que compete propor a nomeação e a exoneração do Procurador-Geral da República;

b) E, por isso, o Presidente da República não pode tomar a iniciativa de nomear quem entender para tal cargo, nem tão-pouco a iniciativa de exonerar aquele que se achar a exercer essas funções;

c) O que o Presidente da República pode é não nomear a pessoa que o Governo propuser para o efeito, e bem assim não deferir a proposta de exoneração que o Governo lhe faça.

A recusa de nomeação (se o acto de nomeação houver de considerar-se um acto político) representará, então, um autêntico veto político.

Os actos de nomeação e de exoneração do Procurador-Geral da República, cuja prática compete ao Presidente da República - sejam eles actos políticos, assumam antes a natureza de actos administrativos - são, assim, actos condicionados à existência de proposta do Governo nesse sentido. O Conteúdo da decisão do Presidente da República não se acha, porém, vinculado ao teor da proposta.

Vistas as coisas de um outro ângulo: o Procurador-Geral da República - que preside ao órgão superior do Ministério Público, que é a Procuradoria-Geral da República (cf. artigo 222.º, n.os 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa) - acha-se, pois, numa situação de dupla dependência: depende da confiança do Governo, que propõe a sua nomeação, e depende da confiança do Presidente da República, que o nomeia. Pode, no entanto, manter-se em funções, apesar de ter perdido a confiança do Governo ou a do Presidente da República Questão é que o Presidente da República o não exonere, não obstante haver uma proposta do Governo nesse sentido, ou que o Governo não proponha a sua exoneração, apesar de o Presidente da República ter deixado de nele confiar.

2 - O facto de o Procurador-Geral da República se achar nesta situação de dupla dependência e de, por isso, a sua exoneração depender de que o Presidente da República defira a proposta, que o Governo lhe faça nesse sentido, não implica, necessariamente, que ao exercício do cargo não possa fixar-se uma duração determinada, pese, embora, o silêncio da citada alínea m) do artigo 136.º a esse respeito.

Só não seria constitucionalmente admissível que o legislador fixasse um prazo para o exercício do cargo de Procurador-Geral da República se a referida alínea m) do artigo 136.º apontasse para a vitaliciedade desse cargo. Isso, porém, não acontece, até porque tal brigaria com o princípio democrático, de que o artigo 121.º da Constituição é uma concretização.

A referida alínea m) do artigo 136.º da Constituição também não diz nada sobre quem pode ser nomeado Procurador-Geral da República e, no entanto, atentas as funções atribuídas pela Constituição ao Ministério Público (a saber: «representar o Estado, exercer a acção penal, defender a legalidade democrática e os interesses que a lei determinar»: cf. artigo 221.º, n.º 1), não vejo que estivesse vedado ao legislador impor que a pessoa a nomear seja jurista (quiçá, mesmo, jurista de mérito).

Do meu ponto de vista, pois, a intervenção do legislador, fixando uma limitação temporal ao exercício do cargo de Procurador-Geral da República (recte, fixando esse período de exercício em cinco anos, renovável uma vez, como faz a norma aqui sub iudicio), é constitucionalmente legítima.

É que a alínea m) do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa - que é uma norma de competência - há-de ser lida conjugadamente com outros preceitos constitucionais, designadamente com o artigo 221.º, n.º 2, que consagra a autonomia do Ministério Público, e com o artigo 121.º, que estabelece o princípio da renovação dos cargos políticos (ainda que se trate tão-só de cargos políticos lato sensu, como é o caso do cargo de Procurador-Geral da República).

Ora, com a fixação de um limite temporal ao exercício do cargo, o Procurador-Geral da República ganha maior estabilidade. O seu estatuto deixa, com efeito, de ter o selo da precariedade, pois que - salvo a ocorrência de motivos particularmente graves (motivos que não terão de ser de natureza disciplinar, podendo traduzir-se em mera perda de confiança política) -, durante o período previsto na lei, o Procurador-Geral da República não será exonerado.

Este aumento de estabilidade do cargo de Procurador-Geral da República, decorrente de se fixar um prazo de duração para o seu exercício, serve, pois, a autonomia do Ministério Público, consagrada no artigo 221.º, n.º 2, da Constituição. Isto, para além de imprimir uma maior racionalidade ao sistema, pois que tornará impossível o exercício do cargo, por tempo indefinido, por quem tenha perdido a confiança política do Presidente da República ou do Governo, em violação, ao cabo e ao resto, do disposto no artigo 121.º da Constituição.

Claro que esse aumento de estabilidade, que vai implicado na fixação de um período de duração do exercício do cargo de Procurador-Geral da República, se faz à custa de uma limitação dos poderes de exoneração (e de proposta de exoneração) que competem ao Presidente da República e ao Governo, tal como esses poderes se acham consagrados na lei.

Essa limitação traduz-se em que, findo o prazo de cinco anos, se o Governo propuser a exoneração do Procurador-Geral da República, o Presidente da República não pode deixar de o exonerar. E, se a nomeação for renovada, findo o período da renovação, o Procurador-Geral da República tem, necessariamente, de ser exonerado.

O Presidente da República continua, porém, a poder não nomear quem o Governo propuser para o cargo de Procurador-Geral da República e, bem assim, a poder não exonerar este, se a proposta de exoneração for feita antes de completados os cinco anos ou o período de renovação. E, do mesmo modo, é ao Governo que continua a pertencer a proposta da sua nomeação e a da sua exoneração. Isto significa que o Procurador-Geral da República continua a ter o seu estatuto caracterizado pela assinalada dupla dependência do Governo e do Presidente da República). Ora, este é o núcleo essencial da competência, definida pela Constituição, quanto à nomeação e à exoneração do Procurador-Geral da República.

Como se disse, a apontada limitação do poder de exoneração do Presidente da República (e de proposta de exoneração do Governo) é, pois, uma limitação de um poder legal.

De facto, a alínea m) do artigo 136.º - já se anotou - não exclui, ao menos expressamente, a fixação de um prazo de duração do exercício do cargo de Procurador-Geral da República. E, depois, a autonomia do Ministério Público (consagrada no artigo 221.º, n.º 2, da Constituição), conjugada com o princípio da renovação dos cargos políticos (imposto pelo artigo 121.º da lei fundamental), se não postular a fixação de um período de duração para o exercício do cargo de Procurador-Geral da República, há-de, ao menos, justificar que o poder de exoneração do Presidente da República e o poder de proposta de exoneração do Governo sofram a limitação apontada.

3 - Argumenta-se, ex adverso, dizendo que os actos de nomeação e de exoneração do Procurador-Geral da República são actos políticos e que, por isso, o legislador só poderia intervir nos termos em que o fez, se a alínea m) do artigo 136.º remetesse para a lei (o que não faz) ou se houvesse necessidade de uma regulamentação procedimental do exercício da competência aí prevista (o que não sucede).

Esta argumentação é, em nosso entender, improcedente.
De facto, pode, desde logo, questionar-se que os actos de nomeação e de exoneração (e as respectivas propostas) sejam actos políticos, quando, com esta expressão, se pretenda aludir a actos que representam «o exercício de faculdades directamente conferidas pela Constituição, sem sujeição à lei ordinária»; actos cujo conteúdo «não é fixado ou demarcado por normas de legislação ordinária» - as formulações são de Afonso Rodrigues Queiró, Lições de Direito Administrativo, policopiadas, vol. I, Coimbra, 1976, pp. 74-75.

Certa doutrina qualifica, é certo, de competência política do Presidente da República a que lhe é conferida pela alínea m) do artigo 136.º (cf. Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra, 1987, p. 214).

Já, porém, Afonso Rodrigues Queiró sustenta que os actos de nomeação e de exoneração do Procurador-Geral da República traduzem uma sua competência administrativa (cf. Lições citadas, pp. 89-90).

Acresce que, mesmo estando-se em presença de actos políticos - o que parece mais ajustado -, não é forçoso que se conclua que ao legislador só é legítimo intervir nos limitados termos que atrás se apontaram.

No acto político, o que, acima de tudo, importa é que ele seja praticado por um órgão supremo do Estado, ou seja, por um órgão criado directamente pela Constituição, cuja competência seja por esta definida nos seus traços essenciais.

São significativas, a este propósito, as palavras de António Barbosa de Melo, in Direito Administrativo, II (lições policopiadas), Coimbra, 1987, pp. 58-59:

A função política caracteriza-se para efeitos contenciosos, por ser uma actividade [...] de órgãos supremos ou imediatos do Estado (isto é, órgãos criados directamente pela Constituição e cuja missão e competência, nos seus traços essenciais, também ela mesma define) [...]

E o mesmo autor escreve, em conclusão, a p. 62 do citado Direito Administrativo:

Se é possível adiantar qualquer critério geral, suficientemente fiável, para a determinação dos actos políticos (o que se nos afigura, como se disse, muito duvidoso), três características devem ser aí necessariamente incluídas. Por um lado, a actividade política tem de ser qualificada como tal objectivamente - isto é, pela estrutura e função típicas do acto político, e não pela intenção subjectiva do agente. Em segundo lugar, a actividade política tem de realizar imediatamente interesses imputáveis more iuridico à comunidade política como tal (à polis, ao Estado na sua unidade). Finalmente, só pode ser actividade política uma actividade que se encontre, exclusiva ou concomitantemente, regulada pelo direito constitucional.

Eis por que entendo que a norma do artigo 1.º do decreto da Assembleia da República n.º 12/VI (na parte em que dá nova redacção ao artigo 105.º, n.os 4, 5, 6, 7 e 8 da Lei 47/86, de 15 de Outubro) não é inconstitucional. Ela não viola, designadamente, a alínea m) do artigo 136.º da Constituição da República. - Messias Bento.


Declaração de voto
O entendimento a que chegou a maioria do Tribunal no sentido de que é constitucionalmente ilegítima a fixação por lei da Assembleia da República de um período de duração para o exercício do cargo de Procurador-Geral da República merece a minha frontal discordância.

O fundamento de uma tal tese foi buscá-lo o acórdão ao pretenso carácter totalizante ou esgotante da disciplina contida no artigo 136.º, alínea m), da Constituição, quanto à competência do Presidente da República para nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o Procurador-Geral da República. De acordo com a maioria que fez vencimento, qualquer intervenção do legislador ordinário na definição das condições de exercício das competências conferidas pelo aludido preceito da lei fundamental ao Presidente da República e ao Governo, desde que vá para além daquilo que designa por «condicionantes que resultam, embora tão-só implicitamente, da própria Constituição», entra em rota de colisão com o artigo 136.º, alínea m), da Constituição, na medida em que tem como consequência a degradação dos «actos políticos stricto sensu» aí previstos - entendidos estes, na esteira de A. Rodrigues Queiró, como actos individuais e concretos de órgãos supremos do Estado que apliquem directa e exclusivamente a Constituição (cf. Lições de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra, 1976, pp. 74-75) - em actos administrativos.

Embora seja altamente controversa na doutrina e na jurisprudência a definição do critério da função política, no conjunto das funções do Estado, entendo que esta não é incompatível com a sua sujeição, em aspectos complementares, a uma disciplina legal. Para estarmos perante a função política, não é necessário que a Constituição defina, em termos exaustivos, os elementos estruturais do acto político, basta que o defina apenas nos seus aspectos essenciais ou fundamentais. Como refere A. Barbosa de Melo, a função política caracteriza-se por ser uma actividade de órgãos supremos ou imediatos do Estado (isto é, órgãos criados directamente pela Constituição e cuja missão e competência, nos seus traços essenciais, também ela define), de conteúdo normativo globalmente similar ao da actividade administrativa, e à qual, por eminentes razões de interesse público geral ou bem comum, deve atribuir-se, também no Estado de direito, «força jurídica» maior do que a que corresponde à actividade administrativa normal, nomeadamente através da subtracção dos actos jurídicos, em que se analisa, ao controlo dos tribunais [cf. Direito Administrativo II (A Protecção Jurisdicional dos Cidadãos perante a Administração Pública), sumários das lições preferidas na Faculdade de Direito de Coimbra no ano lectivo de 1986-1987, pp. 58-59]. E conclui o mesmo autor nesta obra: «Se é possível adiantar qualquer critério geral, suficientemente fiável, para a determinação dos actos políticos (o que se nos afigura, como se disse, muito duvidoso), três características devem ser aí necessariamente incluídas. Por um lado, a actividade política tem de ser qualificada como tal objectivamente - isto é, pela estrutura e função típicas do acto político, e não pela intenção subjectiva do agente. Em segundo lugar, a actividade política tem de realizar imediatamente interesses imputáveis more iuridico à comunidade política como tal (à polis, ao Estado na sua unidade). Finalmente, só pode ser actividade política uma actividade que se encontre, exclusiva ou concomitantemente, regulada pelo direito constitucional» (cf. ob. cit., p. 62).

Também Jorge Miranda, não obstante afirmar que o acto político é regido pela Constituição, parece admitir que este seja regulado complementarmente pela lei [cf. «Governo (Acto de)», in Polis, Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, vol. III, Lisboa, 1985, p. 70].

Convicto de que no domínio dos actos políticos não está de todo excluída uma intervenção legislativa de natureza intersticial, votei no sentido de que a fixação pelo Decreto 12/VI da Assembleia da República, relativo à autonomia do Ministério Público, de um prazo de duração para exercício do cargo de Procurador-Geral da República não viola o artigo 136.º, alínea m), da Constituição - e o mesmo sucederia seguramente se, por exemplo, a lei estabelecesse como requisito de nomeação do Produrador-Geral da República a posse de formação jurídica -, porque com ela não é beliscado o núcleo essencial dos poderes nele conferidos ao Presidente da República e ao Governo: o primeiro de nomear e de exonerar, ainda que sob proposta do Governo, o Procurador-Geral da República e o segundo de propor a nomeação e a exoneração deste.

A não inconstitucionalidade da fixação de uma limitação temporal de cinco anos, renovável uma vez, ao exercício do cargo de Procurador-Geral da República, tal como o faz a norma do Decreto 12/VI da Assembleia da República, é ainda justificada pelo apelo a dois princípios constitucionais: o princípio da autonomia do Ministério Público, condensado no artigo 221.º, n.º 2, da Constituição, e o princípio da renovação dos cargos políticos - o qual entronca no princípio democrático -, aflorado no artigo 121.º, também da Constituição.

Do princípio da autonomia do Ministério Público, levado ao texto constitucional na revisão de 1989, pode retirar-se a ideia de que a Constituição pretendeu que o cargo de Procurador-Geral da República seja dotado de uma certa estabilidade, pondo termo ao seu estatuto de permanente precariedade - uma ideia, aliás, posta em destaque por alguns deputados e pelo Ministro da Justiça no debate parlamentar que precedeu a aprovação do decreto aqui em causa.

Do princípio da renovação dos cargos políticos pode extrair-se a ilação de que o cargo de Procurador-Geral da República, entendido como cargo político lato sensu, não deve escapar à renovação periódico, assim se refrescando, em lapsos temporais determinados, a legitimidade política do seu titular.

Com a sujeição do cargo de Procurador-Geral da República ao princípio da renovação periódica, o titular do cargo de Procurador-Geral da República verá - e com ele todo o Ministério Público - reforçada a sua legitimidade política, porque assente numa manifestação positiva, em períodos recorrentes, de confiança política por parte do Governo e do Presidente da República, e não apenas numa confiança política de índole negativa, traduzida numa permanência no cargo só porque o Governo e o Presidente da República não conjugam as suas vontades políticas quanto à sua exoneração e substituição.

São estas breves observações que a solução a que chegou o Tribunal me suscita, e que não quis deixar de registar, permitindo-me, quanto aos restantes pontos, remeter, com a devida vénia, para a declaração de voto do Exmo. Conselheiro Messias Bento. - Fernando Alves Correia.


Declaração de voto
1 - Votei o acórdão de que a presente declaração faz parte integrante, no tocante à decisão, no mesmo ínsita, no sentido de se não pronunciar pela inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 1.º - este na parte em que dá nova redacção à alínea g) do n.º 2 do artigo 14.º e à alínea d) do n.º 2 do artigo 26.º, ambos da Lei 47/86, de 15 de Outubro - e 2.º, n.º 2, um e outro do Decreto 12/VI da Assembleia da República, o que fiz pelo essencial das razões avançadas nesse mesmo aresto.

1.1 - No entanto, não poderei deixar de assinalar que não anuo, quanto a esta questão, ao passo do acórdão onde se refere que a autonomia funcional do Ministério Público «há-de encontrar eco numa certa autonomia orgânica».

Na realidade, tenho para mim que a autonomia funcional do Ministério Público, hoje consagrada constitucionalmente, só por si, não postula necessariamente qualquer «dose» de autonomia orgânica.

Esta última só deve existir e impor-se ao legislador ordinário se e na medida em que a Constituição a consagre.

Ora, neste particular, tão-somente descortino no texto da lei fundamental dois apontamentos donde se pode extrair que ela desejou que o Ministério Público desfrutasse de autonomia orgânica, mas unicamente em relação a duas circunstâncias, a saber: a de que a «nomeação, colocação, transferência e promoção dos agentes do Ministério Público e o exercício da acção disciplinar competem à Procuradoria-Geral da República» (n.º 4 do artigo 221.º), e a de que a nomeação do Procurador-Geral da República é feita pelo Presidente da República, sob proposta do Governo [alínea m) do artigo 136.º] (sendo que, relativamente a esta última, dúvidas sobram sobre se com ela se pretendeu uma forma de consagração de autonomia orgânica ou, antes, o seu fim não será o da conferência de legitimação democrática à entidade que preside ao órgão superior do Ministério Público).

2 - Quanto ao mais, já não pude acompanhar o acórdão no que se refere à decisão através da qual o Tribunal se pronunciou pela inconstitucionalidade da norma do mencionado artigo 1.º do Decreto 12/VI, na parte em que aditou ao artigo 105.º da citada Lei 47/86 os novos n.os 4, 5, 6, 7 e 8, cabendo agora, sinteticamente embora, indicar as razões da minha discordância.

Assim:
2.1 - Tenho para mim que a norma constante da alínea m) do artigo 136.º da Constituição é, por si, uma norma self executive, que não necessita da interposição do legislador ordinário para desencadear os respectivos efeitos, nem exige regulamentação procedimental para o seu exercício, não sendo legítimo à legislação infra constitucional restringi-los ou cerceá-los a pretexto de uma definição de procedimento.

No entanto, por outro lado, do meu ponto de vista, tal norma não pode deixar de ser considerada como aberta a outros princípios que se encontrem consignados na lei fundamental e que, como tal, possam modelar os poderes nela conferidos.

2.2 - Perante estes parâmetros, o preceito pretendido introduzir pelo decreto questionado na Lei 47/86 e que corresponderia ao n.º 4 do artigo 105.º da Lei 47/86 jamais poderia, na minha óptica, ser lido ou, se se quiser, interpretado, como consequenciando que, uma vez nomeado o Procurador-Geral da República (nomeação resultante do encontro conjunto de vontades políticas dos órgãos de soberania Presidente da República e Governo), caso não sobreviesse uma actuação passível de procedimento disciplinar ou a demonstração de vontade de exoneração por parte do nomeado, ficasse ele impedido de, no decurso do prazo de cinco anos, ser objecto de exoneração por parte do Presidente da República.

Isso representaria, a meu ver, uma inadmissível constrição dos poderes constitucionalmente cometidos ao Presidente da República e ao Governo levada a cabo pelo legislador ordinário. Constrição essa que, no meu entender, seria até ilógica, visto que não é perceptível que, sendo necessária a existência de uma confiança política comum por banda daqueles dois órgãos de soberania para a nomeação do Procurador-Geral da República, uma vez terminada, também por parte desses dois órgãos, a aludida confiança política, fosse exigível que o nomeado continuasse no desempenho de funções, sendo certo que, então, lhe falecia a «legitimação» que presidira à sua nomeação.

Ora, se assim é, torna-se evidente ser legítima a pergunta consistente em saber se a norma em questão (ou seja, o n.º 4 pretendido introduzir no artigo 105.º da Lei 47/86) não estará irremediavelmente ferida de inconstitucionalidade.

2.3 - A resposta a uma tal questão é, na minha perspectiva, negativa.
Para tanto, todavia, é, como tentarei demonstrar, necessário fazer dessa norma uma interpretação secundum constitucionem.

Não nego que existem fundados perigos nas interpretações conformes à Constituição levadas a cabo pelo Tribunal Constitucional quando exerce a sua actividade em fiscalização abstracta da constitucionalidade das normas.

Na realidade, enquanto a interpretação conforme ao diploma básico, efectuada por este Tribunal na fiscalização concreta da constitucionalidade, vai vincular o órgão de administração de justiça que tem de aplicar a norma desse jeito interpretada (cf. n.º 3 do artigo 80.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro) e ao qual se dirige a decisão do Tribunal Constitucional, já na fiscalização abstracta o juízo interpretativo conforme não é vinculativo para os aplicadores do direito que, desta arte, podem, concretamente, vir a fazer a aplicação da norma não declarada ou não pronunciada como inconstitucional para este Tribunal, e daí que possam surgir situações de produção de efeitos jurídicos decorrentes de normas cujo sentido conferido por esses aplicadores seja contrário à lei fundamental.

Porém, in casu, a situação posta-se em termos algo diferentes.
Efectivamente, e é certo que ela se reconduz a um caso de fiscalização abstracta da constitucionalidade, menos certo não é que o «destinatário» da proferenda decisão deste Tribunal é, desde logo, o próprio Presidente da República.

Isso conduziria, a meu ver, à minimização dos perigos acima referenciados, pois que o «salvamento» da norma questionada - que se reporta a poderes exercitáveis pelo Presidente da República, ou seja, ao próprio «destinatário» do juízo decisório do Tribunal - fundado numa sua interpretação em moldes adequados ao texto e princípios constitucionais, não comportaria o risco de uma sua aplicação por parte de outrem através de conferência de diversa interpretação, esta quiçá feridente da lei básica, porque constritora daqueles poderes.

Por isso, e só por isso, não afastarei a possibilidade de o Tribunal, no presente caso, poder utilizar, se tal fosse adequado, como me parece concretamente ser, a utilização de um juízo interpretativo conforme à Constituição.

2.4 - Essa interpretação será, como facilmente decorre, a de se entender a norma inserida no consagrando n.º 4 do artigo 105.º da Lei 47/86, como não vedando, de todo em todo, a possibilidade de o Presidente da Repúblcia, poder, durante o período de cinco anos no decurso do qual o Procurador-Geral da República iria desempenhar as suas funções (primeiro ou segundo períodos), exonerá-lo das suas funções, ponto seja que haja, de sua parte e do Governo, falta de confiança política no nomeado.

2.5 - Dir-se-ia, então, perante uma tal postura interpretativa, que a mesma deixava de dar relevância ao elemento novo pretendido carrear pela norma, qual seja, justamente, o do estabelecimento do prazo de nomeação pela período de cinco anos.

É evidente que uma tal argumentação não deixa de ser impressiva.
Contudo, possível é também efectuar a leitura segundo a qual o estabelecimento desse período teria em vista, findo ele, uma reafirmação, modelada por critérios de transparência exigível, por parte dos órgãos de soberania, da confiança política, caso existisse em concreto, que continuava a depositar no Procurador-Geral da República, confiança essa que permitiria, e enquanto tal confiança subsistisse (pois que, desaparecida ela, referente e conjuntamente a esses órgãos, nada obstaria a que, iniciado novo período fosse o nomeado exonerado a qualquer tempo), um novo desempenho de funções.

2.5 - O posicionamento interpretativo assim gizado, e que defendo, não tornaria a norma em apreço conflituante com a Constituição, não deixando, porém, de reconhecer que, tal como se dá notícia no acórdão, da exposição de motivos do projecto que deu origem ao decreto sub specie e das intervenções havidas na Assembleia da República, outra seria a vontade presumida do legislador.

Contudo, mesmo assim, entendo que a interpretação que perfilho ainda que eventualmente, de certo modo, subvertesse aquela vontade, nem por isso era liminarmente ilícita, já que, de um lado, tem, na minha perspectiva, um conteúdo mínimo na letra do preceito pretendido consagrar e, de outro, a vontade presumida do legislador não é o único elemento a que se deve o intérprete ater, sendo, inclusivamente, de rejeitar se esse elemento conduzir a uma aplicação contrariante de normas e princípios decorrentes do mais importante corpo normativo de um ordenamento jurídico.

3 - Face à conclusão a que cheguei tocantemente à norma desejada colocar como o n.º 4 do artigo 105.º da Lei 47/86, um outro problema se me lavantará, atenta a visão, já acima explicitada, sobre os poderes consignados na alínea m) do artigo 136.º da Constituição.

Reside ele, precisamente, em saber se, não podendo, o Procurador-Geral da República ser nomeado para exercer tais funções após o desempenho durante um período correspondente a dois quinquénios, isso constituirá uma constrição constitucionalmente vedada da liberdade de actuação (quanto à prática e ao tempo do acto de nomeação e exoneração) do Presidente da República e do Governo.

Já anteriormente, na presente declaração, referi que, em meu entender, a norma ínsita na alínea m) do artigo 136.º da Constituição não pode deixar de considerar-se como aberta a princípios que se encontrem plasmados nesse corpo de leis fundamental e que, consequentemente, podem acarretar alguma modelação dos poderes em tal norma contidos.

O cargo de Procurador-Geral da República é por mim visionado como um cargo político, ao menos lato sensu.

Ora, se assim é, como o creio, então não posso passar em claro um princípio constitucional de extrema relevância democrática, como é o princípio da renovação dos titulares dos cargos políticos, acolhido expressamente no artigo 121.º da lei básica.

Este princípio rector da organização do poder político, na minha visão, não pode deixar de ser tido em consideração e, desta arte, não pode deixar de enformar os poderes políticos, designadamente os conferidos pela alínea m) do artigo 136.º da Constituição.

Daí que conclua que não é ilegítimo que o legislador infraconstitucional, sob a iluminação de tal princípio, ao editar normação sobre o estatuto de um dado titular de um cargo político, nele atente, sequentemente adoptando uma margem da qual se extraia o respeito por tão relevante princípio.

3.1 - Esta adoptção, do meu ponto de vista, não constituirá contradição com a disposição constante da alínea m) do artigo 136.º da Constituição, porquanto, como facilmente se deduzirá do exposto, este normativo está já, por si, aberto à recepção de princípios constitucionais entre os quais se inclui o da renovação dos titulares dos cargos políticos.

Estas, pois, as razões que, em enunciação necessariamente sintética, me levaram propugnar pela não pronúncia de inconstitucionalidade das normas que o acórdão entendeu padecerem de tal vício. - Bravo Serra.


Declaração de voto
Deixando em suspenso problemas de qualificação dogmática, mas ainda admitindo que a competência prevista na alínea m) do artigo 136.º da Constituição se integra no âmbito dos «actos políticos» ou da «função política», entendi, quanto à matéria a que respeita a alínea b) da decisão, que a questão a que importava responder era a de saber se o legislador, ao intervir nessa matéria tal como o fez (ou pretendia fazer) no decreto em apreço da Assembleia da República, punha em causa o que há de ter-se como conteúdo nuclear e irredutível daquele preceito constitucional.

Ora, a meu ver, isso só aconteceria se, e na medida em que, ao estabelecer-se uma determinada duração para o mandato do Procurador-Geral da República, se pretendesse simultaneamente atribuir a esse prazo o carácter de uma garantia - tal que, até ao termo dele, ficasse vedado o exercício, pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, do poder de livre exoneração do titular daquele cargo. Nessa medida, sim, haveria violação do conteúdo nuclear do artigo 136.º, alínea m), da Constituição.

Só que - como insofismavelmente resulta dos trabalhos preparatórios e do debate parlamentar - foi justamente com esse sentido que a Assembleia da República votou a fixação de um prazo de cinco anos para o mandato do Procurador-Geral da República. Daí que - entendida em tais termos - a norma do novo n.º 4 do artigo 105.º da Lei 47/86, aditada pelo diploma em apreço, houvesse de considerar-se inconstitucional.

Eis - cingindo-me, brevitatis causa, ao essencial e prescincindo, por isso, de explicitar mais desenvolvidamente os pressupostos dogmático-constitucionais do meu ponto de vista - o fundamento pelo qual só parcialmente votei a conclusão da alínea b) da decisão, e também não acompanhei, naturalmente, toda a correspondente fundamentação. - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/56580.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1944-02-23 - Decreto-Lei 33547 - Ministério da Justiça

    Promulga o Estatuto Judiciário - Revoga legislação anterior sobre assuntos de que trata este diploma

  • Tem documento Em vigor 1962-04-14 - Decreto-Lei 44278 - Ministério da Justiça - Direcção-Geral da Justiça

    Aprova o Estatuto Judiciário, que se publica em anexo, fazendo parte integrante do presente diploma.Extingue os Tribunais Auxiliares de Investigação Criminal das Comarcas de Lisboa e Porto, passando as suas atribuições para a Polícia Judiciária. Extingue a Tesouraria Judical Privativa de 1ª e 2ª vara cíveis e 1º e 2º juízos cíveis da Comarca do Porto. Publica o quadro de pessoal das secretarias judiciais.

  • Tem documento Em vigor 1974-06-18 - Decreto-Lei 261/74 - Ministério da Justiça

    Promulga várias disposições tendentes a assegurar a independência e a dignificação do Poder Judicial.

  • Tem documento Em vigor 1974-11-13 - Decreto-Lei 609/74 - Ministério da Justiça - Gabinete do Ministro

    Altera o Decreto-Lei n.º 40768, de 8 de Setembro de 1956 e o Estatuto Judiciário.

  • Tem documento Em vigor 1978-07-05 - Lei 39/78 - Assembleia da República

    Aprova a lei orgânica do Ministério Público.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1986-10-15 - Lei 47/86 - Assembleia da República

    Aprova a orgânica do Ministério Público.

  • Tem documento Em vigor 1989-07-08 - Lei Constitucional 1/89 - Assembleia da República

    Segunda revisão da Constituição.

Ligações para este documento

Este documento é referido nos seguintes documentos (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

  • Tem documento Em vigor 2003-07-18 - Acórdão 306/2003 - Tribunal Constitucional

    Pronuncia-se pela inconstitucionalidade e não se pronuncia pela inconstitucionalidade de várias normas do decreto da Assembleia da República n.º 51/IX, que aprova o Código do Trabalho. (Processo nº 382/2003).

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