A Avenida teve a sua génese no Passeio Público setecentista, reconfigurado, no século XIX, ao gosto romântico, e até então o mais elegante jardim da cidade, correspondendo a destruição deste ao desejo de inaugurar na capital um largo boulevard à francesa, referencial comum dos planos de extensão das cidades europeias de oitocentos e epicentro da nova sociabilidade burguesa.
O projeto, aprovado entre 1877 e 1879 e inaugurado em 1886, incluiu os troços das Ruas Oriental e Ocidental do Passeio, desde a Praça dos Restauradores até a Praça da Alegria, terminando na zona da futura Praça do Marquês de Pombal, já em articulação com o plano da «Avenida das Picoas ao Campo Grande», eixo central das futuras Avenidas Novas.
Os cerca de 90 metros de largura por 1270 de comprimento da Avenida articulam-se em troços de diferentes dimensões, em função das artérias que a entrecortam transversalmente, encontrando-se as três ruas paralelas separadas por largos passeios pedonais arborizados pontuados por fontes, estátuas e monumentos. Encaixada num amplo vale entre o monte de São Roque e o monte de Santana, ligando a zona mais baixa da cidade às colinas que a ladeiam, possui luminosidade e ambiente únicos, acrescidos das magníficas perspetivas sobre as encostas em anfiteatro e sobre o rio Tejo.
Embora os edifícios que a ladeiam, logo a partir da Praça dos Restauradores, se tenham construído em múltiplas etapas e em diversos estilos, as suas tipologias foram naturalmente condicionadas pela lógica de quarteirão do traçado urbano e pela sua relação com as colinas da cidade, cuja transformação assume aqui valor identitário. Do conjunto merecem particular destaque os imóveis à altura das aspirações iniciais, cujos exemplos maiores serão o Hotel Avenida Palace, de José Luís Monteiro, o Cinema Tivoli, de Raul Lino, o Hotel Vitória, de Cassiano Branco, o Cinema São Jorge, de Fernando Silva, ou o edifício do Diário de Notícias, de Pardal Monteiro, para além de diversos prédios de rendimento e palacetes, incluindo os Palácios Foz e Conceição e Silva.
A Avenida da Liberdade representa a um só tempo a rutura entre a cidade romântica e a cidade progressista e liberal, e a continuidade do plano iluminista da Baixa, conservando a vocação de espaço de lazer do antigo Passeio Público nas faixas centrais ajardinadas e arborizadas que oferecem o palco lisboeta por excelência para festividades e manifestações públicas.
Assim se fundem nela a dimensão metropolitana e a dimensão humana, tornando ainda hoje possível a convivência entre a circulação automóvel própria de um eixo viário principal e a manutenção do hábito do passeio a pé, numa zona com características cenográficas e monumentais notáveis, reforçadas pelo comércio de prestígio, hotéis, teatros e edifícios históricos aí presentes.
O conjunto edificado, nas suas distintas e ininterruptas fases construtivas, assume valor fundamental para a história e para a identidade de Lisboa, apresentando-se como espaço público de notável carga simbólica e de projeção nacional.
A classificação da Avenida da Liberdade reflete os critérios constantes do artigo 17.º da Lei 107/2001, de 8 de setembro, relativos ao caráter matricial do bem, ao seu interesse como testemunho notável de vivências e factos históricos, ao seu valor estético, técnico e material intrínseco, à sua conceção arquitetónica, urbanística e paisagística, à sua extensão e ao que nela se reflete do ponto de vista da memória coletiva e às circunstâncias suscetíveis de acarretarem diminuição ou perda da sua perenidade ou integridade.
Tendo em vista a necessidade de salvaguardar o conjunto, nos termos do n.º 1 do artigo 54.º do Decreto-Lei 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis e 115/2011, de 5 de dezembro.º 265/2012, de 28 de dezembro, são fixadas restrições.
A zona especial de proteção do conjunto agora classificado será fixada por portaria, nos termos do disposto no artigo 43.º da Lei 107/2001, de 8 de setembro.
Procedeu-se à audiência dos interessados, na modalidade de consulta pública, nos termos gerais e de acordo com o previsto no artigo 25.º do Decreto-Lei 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis e 115/2011, de 5 de dezembro.º 265/2012, de 28 de dezembro.
Foi também promovida a audiência prévia da Câmara Municipal de Lisboa.
Assim:
Sob proposta dos serviços competentes, nos termos do disposto no artigo 15.º, no n.º 1 do artigo 18.º, no n.º 2 do artigo 28.º e no artigo 43.º da Lei 107/2001, de 8 de setembro, conjugado com o disposto no n.º 2 do artigo 30.º e no n.º 1 do artigo 48.º do Decreto-Lei 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis e 115/2011, de 5 de dezembro.º 265/2012, de 28 de dezembro, e no uso das competências conferidas pelo n.º 11 do artigo 10.º do Decreto-Lei 86-A/2011, de 12 de julho, manda o Governo, pelo Secretário de Estado da Cultura, o seguinte:
Artigo único
Classificação
1 - É classificada como conjunto de interesse público a Avenida da Liberdade, em Lisboa, freguesias do Coração de Jesus, de São José, de Santa Justa e de São Mamede, concelho e distrito de Lisboa, conforme planta constante do anexo à presente portaria, da qual faz parte integrante.2 - Nos termos do n.º 1 do artigo 54.º do Decreto-Lei 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis e 115/2011, de 5 de dezembro.º 265/2012, de 28 de dezembro, são fixadas as seguintes restrições:
a) Não são admitidas alterações à volumetria, morfologia, alinhamento e cérceas, cromatismo e revestimento exterior dos edifícios sem apresentação de relatório prévio, da responsabilidade de técnico habilitado com formação superior adequada e cinco anos de experiência profissional após a obtenção do título académico, no qual devem participar igualmente os técnicos especialistas competentes em função da natureza do bem cultural e do tipo de obras ou intervenções a realizar, designadamente um historiador de arte;
c) Os projetos de operações urbanísticas que impliquem qualquer impacto ao nível do subsolo são acompanhados, obrigatoriamente, de plano de trabalhos aprovado pelo órgão competente da administração central, o qual deve contemplar a avaliação de impactos ao nível do subsolo, descrevendo e fundamentando as ações e medidas a adotar para assegurar a identificação, preservação e registo de valores arqueo-lógicos;
d) v) Todos os imóveis devem suscitar o exercício do direito de preferência, em caso de venda ou dação em pagamento;
d) vi) Todos os imóveis ficam sujeitos ao regime de obras ou intervenções previsto no Decreto-Lei 140/2009, de 15 de junho.
5 de junho de 2013. - O Secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto
Xavier.
ANEXO
(ver documento original)
13792013