Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 7/2012
Acórdão do STA de 18-10-2012, no Processo 606/12
Processo 606/12 - Pleno da 1ª Secção
I- RELATÓRIO
O INSTITUTO POLITÉCNICO DE VISEU (IPV) veio interpor recurso para uniformização de jurisprudência, nos termos do artº152º do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido nos autos, a fls. 113 e segs., por o mesmo estar em contradição com o acórdão do Pleno da 1ª Secção do STA de 14.12.2011, Proc. nº 903/10, tirado em sede de recurso para uniformização de jurisprudência, publicado no DR 1ª série, nº35, de 17.02.2012, de que junta cópia a fls. 146 e segs.Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
A) Estão preenchidos, no caso em apreço, os requisitos de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no artº152º do CPTA, concretamente na alínea a) do seu nº1. Efectivamente, B) Existe contradição entre o acórdão do TCASul de 09.02.2012, aqui impugnado e o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STA de 14 de Dezembro de 2011, publicado em DR, I série, de 17.02.2012 sob o nº 2/2012.
C) Tal contradição reside em o Acórdão impugnado considerar aplicável ao pessoal docente universitário e politécnico, o artº17º, nº2 do Decreto Lei 353-A/89, de 16 de Outubro, o mesmo artº17º que o Acórdão do STA aqui apresentado como acórdão fundamento, considera ser de afastar perante a especialidade do regime de promoções contido no nº3 do Decreto-Lei 408/89 de 18 de Novembro.
D) Existe identidade dos pressupostos fácticos em que assentam os acórdãos em contradição já que, do que se trata, em ambos os casos, é do posicionamento de docentes do ensino superior na sequência de promoção a nova categoria, docentes estes, pertencentes a carreiras do ensino superior diferentes, mas às quais se aplica o mesmo estatuto remuneratório (Decreto-Lei nº408/89 de 16 de Outubro).
E) Trata-se da mesma questão fundamental de direito, sucintamente traduzida no problema de saber se o artº17º, nº2 do Decreto-Lei 353-A/89 de 16 de Outubro, se aplica aos docentes do ensino superior universitário e politécnico.
F) O acórdão de uniformização do STA veio resolver tal questão no sentido de que " o Decreto-Lei nº408/89 de 18 de Novembro, contém normas específicas relativamente ao regime de promoção do pessoal docente universitário e do ensino superior politécnico e do pessoal de investigação científica devendo, em consequência, o regime por ele estabelecido, designadamente no seu artº3º, alínea b) in fine, ser considerado como lei especial, prevalecendo sobre as regras gerais para as carreiras da Administração Pública previstas no Decreto-Lei nº353-A/89, de 16 de Outubro, concretamente, a contida no seu artº 17º, nº2.
G) Ao contrariar a jurisprudência assim uniformizada, o acórdão impugnado decidiu erradamente a questão, fazendo uma incorrecta interpretação e aplicação da Lei.
H) Os dois Acórdãos transitaram já em julgado.
I) Acórdão impugnado está, assim, em desconformidade com a jurisprudência recentemente uniformizada e consolidada pelo STA.
J) Deve, pois, ser anulado e substituído nos termos do artº152º, nº6 do CPTA, considerando conforme à Lei o posicionamento da professora Esperança Ribeiro no 2º escalão, índice 230 da categoria de professora coordenadora da carreira docente do ensino superior politécnico.
* Contra-alegou a recorrida, concluindo assim:
Quanto às questões prévias:
A) Não é processualmente idóneo pretender a uniformização de jurisprudência sobre uma questão fundamental de direito já apreciada e sobre ela já fixada recentemente uniformização de jurisprudência.
B) Numa interpretação conjugada e actualista dos artº142º, nº3 c) e nº4 e 150º do CPTA, com os artº 678º, nº2c) e 721º-A do CPC, o recorrente deveria ter optado pelo recurso de revista excepcional (sem depender aqui do valor do pedido/sucumbência face à alçada do STA), invocando que o acórdão impugnado continha decisão contrária a jurisprudência uniformizada do STA e que a admissão do recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, não só porque são múltiplos, potencial e realmente, os casos concretos em apreciação em sede arbitral e jurisdicional e por haver já jurisprudência uniforme recentemente em sentido contrário ao do acórdão impugnado.
C) O prazo para instauração de recurso de revista (trinta dias contados da notificação da decisão impugnada ou da sua presunção), mesmo beneficiando dos três dias de multa (artº 145º, nº5 do CPC), teve o seu termo em 19/3/2012.
D) O recurso foi apresentado no TCASul em 23/3/2012, não podendo sequer o recurso instaurado ser convolado em recurso de revista excepcional, e em consequência está formado caso julgado material sobre a decisão agora recorrida.
E) Considerando-se a decisão recorrida, como irrecorrível, não deve ser admitido o presente recurso para (nova) uniformização de jurisprudência, por inidóneo e intempestivo.
Sem prescindir e quanto à questão fundamental de direito:
F) O DL nº61/92 não se reduz, apenas, a dar execução à última fase de descongelamento de escalões prevista no DL 353-A/89, mas também estabelece ainda as regras de reposicionamento dos funcionários e agentes da Administração Pública nos escalões salariais das respectivas carreiras, conforme se lê no 1º§ do relatório preambular, incluindo aqui, obviamente, a regra do artº3º quanto ao posicionamento em caso de promoção.
G) O diploma não fixa data de termo de vigência, nem se depreende que o reposicionamento remuneratório fique condicionado no tempo ou se esgote apenas no universo dos abrangidos pelo processo de descongelamento, pelo que não configura uma lei temporária com vigência limitada.
H) O DL nº61/92, no seu artº1º, expressamente inclui no âmbito da sua aplicabilidade os docentes do ensino superior politécnico público, por argumento a contrario, comparativamente com as exclusões expressas quanto a outros corpos especiais, vg, os médicos e os docentes dos ensinos básico e secundário, e quanto a estes, apenas na matéria do descongelamento.
I) O princípio da generalidade, subjectiva, objectiva e temporal tem como necessária consequência no caso em apreço que a regra do impulso mínimo de 10 pontos indiciários em caso de promoção de categoria que consta do artº3º, corresponde a uma intenção do legislador de também a este corpo especial, dos docentes do ensino superior politécnico aplicar tal regra, revogando tacitamente a regra inicial do DL nº 408/89.
J) A aceitar-se interpretação contrária, esta violaria o princípio da igualdade vertido no artº13º, conjugado com o artº59º, nº1, al.a), ambos da CRP, porquanto não existe fundamento material para distinguir, discriminar negativamente, os docentes do ensino superior público (em confronto com funcionários de outros regimes gerais, especiais ou corpos especiais, usando terminologia e definição legais anteriores à LVCR), quanto ao impulso indiciário salarial decorrente da promoção de categoria.
K) Julgou em erro o acórdão fundamento uniformizador de jurisprudência, ao não considerar ilegal o reposicionamento da aqui recorrida, pelo IPV em Abril de 2004, no índice 230 (em vez do índice 250 devido pela promoção da recorrente à categoria de professor coordenador), por violador dos artigos 17º, nº2 do Decreto-lei nº353-A/89, de 16 de Outubro e 3º, nº1 do Decreto Lei 61/92, de 15 de Abril, que determinam, em caso de promoção o reposicionamento remuneratório deve respeitar o acréscimo de 10 pontos indiciários.
L) Deve, assim, a recorrida ser ressarcida do valor dos diferenciais entre o índice devido e o efectivamente pago, que ao momento da instauração da acção arbitral, importavam em (euro) 26.824,24, bem como ser reposicionada no referido índice 260 (4º escalão), pelo decurso, até à presente data, dos três anos de permanência no escalão, acrescido de juros de mora até integral execução do julgado.
* Cumprido o artº146º do CPTA, veio o Digno PGA, a fls. 185, emitir parecer no sentido da não admissão do recurso para uniformização de jurisprudência, em concordância com os fundamentos invocados pela recorrida e, caso assim se não entenda, então deverá ser revogado o acórdão recorrido, em conformidade com o acórdão deste STA, que serve de fundamento ao presente recurso.
Notificado tal parecer às partes, veio a entidade recorrente responder no sentido da improcedência dos fundamentos invocados para a não admissão do presente recurso, mas caso assim se não entenda, então requer a sua convolação para recurso de revista, nos termos do artº150º do CPTA.
Foi dada vista aos Exmos. Adjuntos.
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II- OS FACTOS
O acórdão recorrido levou ao respectivo probatório os seguintes factos:1) a demandante é, desde 24 de Fevereiro de 2003, professora-coordenadora, sem agregação, do IPV ( Doc.1, junto com a contestação).
2) aquando desta nomeação encontrava-se no 4º escalão da categoria de professor-adjunto, a que correspondia o índice remuneratório 225, da carreira retributiva dos docentes do Ensino Superior Politécnico.
3) com a nomeação para o cargo de professora-coordenadora, a partir de 24 de Fevereiro de 2003, foi posicionada no 3º escalão da categoria de professor-coordenador sem agregação - índice remuneratório 250.
4) em 31 de Março de 2004, por deliberação do Conselho de Administração da ESEV (Escola Superior de Educação de Viseu), órgão competente para autorizar despesas e pagamentos relacionados com o pessoal docente, foi determinado que os docentes promovidos à categoria de professor coordenador que tivessem sido posicionados no 3º escalão - índice 250, " (...) devem recuar um escalão na escala indiciária (...) com efeitos a partir do mês de Abril (de 2004) (...) não devendo, no entanto, "(...) proceder a qualquer reposição de valores (...)"- DOC. 2, junto com a contestação 5 Anexo 12 à petição inicial).
5) a demandante foi notificada daquela deliberação de 31 de Março de 2004, em 16 de Abril de 2004.
6) a partir do mês de Abril de 2004, na sequência da sobredita deliberação, demandante passou a ser posicionada e remunerada pelo 2º escalão da categoria de professor coordenador sem agregação - índice remuneratório 230 (DOC5), junto com a contestação).
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III- O DIREITO
1. Questões Prévias:A recorrida veio suscitar a questão prévia da inadmissibilidade do presente recurso para uniformização de jurisprudência, porquanto, a seu ver, não é processualmente idóneo pretender uniformizar jurisprudência sobre uma questão fundamental de direito que já foi objecto de um acórdão uniformizador de jurisprudência, pois nesse caso já não existiria o conflito que tal recurso visaria prevenir.
Assim, entende que o meio processual que o aqui recorrente poderia ter utilizado seria o recurso de revista excepcional previsto no artº150º do CPTA, mas tendo o recurso, nesse caso, sido interposto para além do prazo legal, sempre seria de rejeitar, por intempestivo.
O Digno PGA acompanha, nesta parte, as alegações da recorrida.
Contudo, o referido entendimento não tem qualquer suporte legal.
É verdade que o artº152º, nº3 do CPTA visou garantir alguma estabilidade nas decisões dos tribunais superiores, impedindo o recurso de acórdãos destes que estejam de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.
Com efeito, dispõe este preceito legal, que «O recurso não é admitido se a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.» Portanto, se o acórdão, aqui sub judicio, estivesse de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada deste STA sobre a questão fundamental de direito nele decidida, o presente recurso para uniformização de jurisprudência não podia, efectivamente, ser admitido.
Mas não é o que acontece, no presente caso.
O acórdão sub judicio não está de acordo, antes contraria, a jurisprudência mais recentemente consolidada deste STA sobre a mesma questão fundamental de direito que nele foi apreciada e que é a jurisprudência firmada no acórdão do Pleno da 1ª Secção do STA de 14.12.2011, rec. 903/10, que serve de "acórdão fundamento", ao presente recurso.
Ora, assim sendo, não há fundamento legal para não admitir o recurso interposto.
Fica, assim, prejudicada a também invocada intempestividade de uma eventual convolação para recurso de revista excepcional.
* E também se verificam os demais requisitos de admissão do presente recurso para uniformização de jurisprudência, exigidos pelo artº152º, nº1 do CPTA, aliás, não questionados sequer pela recorrida.
Com efeito, ambos os acórdãos se pronunciaram sobre a mesma questão fundamental de direito, que era a de saber se aos ali recorrentes, professores do ensino universitário e politécnico, era ou não aplicável o regime geral previsto no artº17º, nº2 do Decreto-Lei 353-A/89, de 16.10, tendo-a decidido em sentido oposto.
Na verdade, enquanto o acórdão recorrido considerou tal regime aplicável ao pessoal docente universitário e politécnico e, por isso, deferiu a pretensão da recorrente de ser reposicionada em índice e escalão superior e não naquele em que fora posicionada, o acórdão fundamento, pelo contrário, considerou inaplicável aquele regime e negou essa pretensão ao ali recorrente, sendo que em ambos os acórdãos a situação foi apreciada no âmbito do mesmo quadro legal.
Verifica-se, pois, contradição de julgados, pelo que passamos a conhecer da questão controvertida.
* 2. Quanto ao mérito do recurso:
Não vemos razão para divergir da jurisprudência firmada, aliás, por unanimidade, no acórdão deste Pleno, que serve de acórdão fundamento ao presente recurso e cuja fundamentação, no essencial, se passa a transcrever:
«(...) Ao decidir pela aplicação ao caso dos autos do disposto no art. 17º, nº 2 do DL nº 353-A/89, o acórdão recorrido começou por reconhecer que "Tal como nos anteriores diplomas regulamentares do descongelamento dos escalões, o Decreto-Lei 61/92 de 15 de Abril reporta as regras que contém ao disposto no Decreto-Lei 353-A/89 de 16 de Outubro, pelo que, excluindo este as carreiras do regime especial, é aquele diploma regulamentar inaplicável às carreiras especiais naqueloutro previstas", e também que, apesar do estatuído no art. 17º, nº 2 do DL nº 353-A/89, "é o próprio artigo 28.º do Decreto-Lei 353-A/89 que prevê que as escalas salariais dos corpos especiais são fixadas em legislação própria, sendo que o art. 16.º, n.º 2, al. d), considera integradas nos corpos especiais as carreiras docentes", concluindo que "Ora, considerando o dispositivo legal acabado de referir, interpretando literalmente o preceito, a carreira docente não está abrangida pela regra geral da diferença mínima de 10 pontos. É o que o princípio jurídico da especialidade imporia (uma vez que o grupo de funcionários em questão possui estatuto próprio).
Logo, porém, considerou que, face ao disposto no DL nº 61/92, de 15 de Abril (diploma que deu execução à última fase do descongelamento de escalões prevista no DL nº 353-A/89, estabelecendo ainda regras de reposicionamento dos funcionários e agentes da Administração Pública nos escalões salariais das respectivas carreiras), que o art. 1º diz ser aplicável, no que se refere à matéria de descongelamento de escalões, às carreiras de regime geral e especial e aos corpos especiais, com excepções ali especificadas que, porém, não abrangem os docentes do ensino superior universitário ou politécnico, "parece ser efectivamente de aplicar a regra geral da diferença de 10 pontos percentuais", concluindo que, "sendo aplicável aos professores universitários o art. 1.º do Decreto-Lei 61/92, de 15 de Abril, atendendo a uma regra de interpretação segundo parâmetros de equidade dentro do sistema retributivo de referência, a integração da recorrente na sequência da promoção deve ser feita em escalão de categoria a que corresponda um índice não inferior a 10 pontos relativamente àquele a que teriam direito."
Ou seja, o acórdão recorrido entendeu que o conteúdo do art. 1º do DL nº 61/92 era decisivo no sentido de afastar o sentido literal do citado art. 28º do DL nº 353-A/89, considerando que aquele preceito, "ao não incluir nas excepções referidas as carreiras de regime especial reguladas pelo DL. nº 408/89, o referido diploma incorpora motivo adicional para a aplicação ao caso vertente da regra geral prevista no art. 17º, nº 2 do DL n.º 353-A/89".
Não sufragamos tal entendimento.
Atendendo ao disposto no art. 9º do C.Civil, o elemento gramatical ou texto da lei é o ponto de partida da interpretação e tem, desde logo, uma função negativa, qual seja a de delimitar e afastar aqueles sentidos que não tenham na letra da lei qualquer apoio ou um mínimo de correspondência verbal ainda que imperfeitamente expressa.
Mas a letra da lei tem também uma função positiva: no caso de o texto legal comportar apenas um sentido, é esse o sentido da norma; se acaso as normas comportam mais do que um significado, deve optar-se pelo sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas e, designadamente, ao seu significado técnico-jurídico, com a presunção do nº 3 do art. 9º do C.Civil, de que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
Só perante uma inegável insuficiência deste elemento de interpretação (elemento literal) para uma correcta interpretação do sentido da norma, haverá então que convocar o elemento racional, através de outros factores hermenêuticos, designadamente o histórico, o sistemático e o teleológico, em ordem a detectar subsídios de conforto de um dos sentidos literais atrás evidenciados. Trata-se, então, de reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que a mesma é aplicada.
Ora, relativamente à situação dos autos, cremos que o comando legal é suficientemente claro no sentido da não aplicação aos docentes do ensino universitário do disposto no art. 17º, nº 2 do DL nº 353-A/89, justamente porque o DL nº 408/89, publicado um mês depois daqueloutro, regula de forma diversa o estatuto remuneratório e o regime dos escalões de promoção para as carreiras do pessoal docente universitário e do ensino superior politécnico e do pessoal de investigação científica, desse modo se assumindo como lei especial face ao regime geral consignado naquele primeiro diploma para os funcionários e agentes da Administração Pública.
Os dois diplomas - publicados com um intervalo de apenas um mês, e assumindo ambos o objectivo de proceder ao desenvolvimento e regulamentação dos princípios gerais em matéria de emprego público estabelecidos no DL nº 184/89, de 2 de Junho, conforme previsto no seu art.
43º - começam por incluir um preâmbulo cuja introdução é quase integralmente igual, apenas divergindo justamente no que toca às carreiras visadas em cada um deles.
Ambos os preâmbulos referem:
"O Decreto-Lei 184/89, de 2 de Junho, definiu os princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da função pública, circunscrevendo-se nuclearmente à reforma do sistema retributivo, no sentido de lhe devolver coerência e de o dotar de equidade, quer no plano interno, quer no âmbito do mercado de emprego em geral.
Nos termos do artigo 43.º daquele diploma, há que proceder ao desenvolvimento e regulamentação dos princípios gerais nele contidos, designadamente em matéria salarial, objectivo que se cumpre através do presente diploma."
O preâmbulo do DL nº 408/89 acrescenta a este último parágrafo a seguinte expressão: "... para as carreiras do pessoal docente universitário e do ensino superior politécnico, bem como para o pessoal da carreira de investigação científica.".
Por outro lado, os arts. 27º e 28º do DL nº 353-A/89 são claros ao prever a regulamentação por decreto regulamentar das carreiras e cargos não abrangidas por aquele diploma, e a fixação em legislação própria das escalas salariais dos corpos especiais.
Para além disso, e no que toca ao conteúdo das respectivas estatuições, não é verdade, como considerou o acórdão recorrido, que a única especialidade do DL nº 408/89 se cinja às escalas salariais, pois que logo no seu art. 1º (Objecto) se prescreve que o diploma, para além da aprovação das escalas salariais, "estabelece regras sobre o estatuto remuneratório do pessoal docente universitário, do pessoal docente do ensino superior politécnico e do pessoal de investigação científica". E acresce, decisivamente - ainda por cotejo comparativo dos dois diplomas - que o art. 3º do DL nº 408/89 tem uma estrutura e uma redacção similares à do art. 17º do DL nº 353-A/89, sendo aliás igual a respectiva epígrafe ("Escalão de promoção"), o que conforta a tese de que, visando objectivos gerais idênticos (fixados no DL nº 184/89), os dois diplomas têm um âmbito de normação autónoma na parte em que o respectivo conteúdo diverge, justamente o questionado nº 2 daquele art. 17º ("Sempre que do disposto no número anterior resultar um impulso salarial inferior a 10 pontos, a integração na nova categoria faz-se no escalão seguinte da estrutura da categoria."), não incluído no art. 3º do DL nº 408/89, nem salvaguardada neste a sua aplicação, antes substituído neste diploma pelo segmento final deste art. 3º ("... ou para o escalão seguinte, sempre que a remuneração que caberia em caso de progressão na categoria fosse superior.").
Ou seja, estamos perante dois diplomas, publicados no espaço de apenas um mês, prosseguindo objectivos idênticos, mas em que um estabelece o regime geral sobre o estatuto remuneratório dos funcionários e agentes da Administração Pública (DL nº 353-A/89), e outro define o estatuto remuneratório do pessoal docente universitário, do pessoal docente do ensino superior politécnico e do pessoal de investigação científica (DL nº 408/89), ambos contendo regras específicas sobre o regime e os escalões de promoção, e em que os dois preceitos correspondentes, relativos aos escalões de promoção, e com uma estrutura descritiva similar, divergem quanto a um aspecto específico: a salvaguarda, em caso de promoção, de um impulso salarial não inferior a 10 pontos, prevista no nº 2 do art. 17º do DL 353-A/89, e não prevista no art. 3º do DL nº 408/89 que consagra, por seu turno, a salvaguarda da promoção para o escalão seguinte ao consignado na parte inicial da al. b) "sempre que a remuneração que caberia em caso de progressão na carreira fosse superior".
A adopção desses dois regimes específicos de salvaguarda em preceitos correspondentes outro sentido não pode ter do que a aplicabilidade do regime contido no art. 3º, al. b), in fine do DL nº 408/89 às carreiras por ele contempladas, com natural exclusão da regra de regime geral prevista no art.
17º, nº 2 do DL nº 353-A/89.
Ao contrário do que entendeu o acórdão recorrido, não vemos que o art. 1º do DL nº 61/92, diploma que rege sobre descongelamento de escalões, pela circunstância de não excepcionar a sua aplicabilidade às carreiras e aos corpos especiais, forneça subsídios, muito menos em termos decisivos, no sentido de afastar o sentido literal do art. 28º do DL nº 353-A/89, considerando que, "ao não incluir nas excepções referidas as carreiras de regime especial reguladas pelo DL. nº 408/89, o referido diploma incorpora motivo adicional para a aplicação ao caso vertente da regra geral prevista no art. 17º, nº 2 do DL n.º 353-A/89".
O DL nº 61/92 é um diploma de descongelamento de escalões que não conflitua com o regime de promoção e de escalões anteriormente fixado nos dois aludidos diplomas. Consideramos, pois, como correcta a posição sufragada pelo acórdão fundamento, e sustentada pelo recorrente, no sentido da não aplicação à A., ora recorrida, da regra contida no nº 2 do art. 17º do DL nº 353-A/89, de 16 de Outubro, pois que à mesma se aplica o regime especial consagrado no citado DL nº 408/89, concretamente a regra do art. 3º, al. b), in fine, considerada lei especial aplicável aos docentes universitários, especialidade que, aliás, e como bem sublinha o acórdão fundamento, já estava salvaguardada no nº 4 do DL nº 184/89, de 2 de Junho, e no nº 1 do art.
28º do próprio DL nº 353-A/89. Resta acrescentar que, como se deixou já assinalado, o DL nº 408/89 não contém qualquer referência ao dito art. 17º, nº 2 do DL nº 353-A/89, ou em geral ao próprio diploma, estando em causa simplesmente um diferente estatuto remuneratório com regras próprias constantes dos anexos integrantes do diploma. Posição que, aliás, e ainda que de forma indirecta, foi aflorada pelo Ac. deste STA de 01.07.1998, proferido no Rec. 40.748, o qual, versando embora a questão de a agregação constituir ou não uma categoria para efeitos remuneratórios, emitiu pronúncia no sentido de à recorrente "ser atribuído o primeiro escalão índice 285, como resulta claramente da alínea b) do art. 3º do DL 408/89", sem qualquer referência à regra do art. 17º, nº 2 do DL nº 353-A/89.
Diga-se, por fim, que este entendimento em nada afronta o princípio da igualdade, pois que a discriminação proibida pelo texto constitucional, mesmo a reportada à actividade legislativa (proibição do arbítrio legislativo), não contempla situações diferenciadas e desiguais, como é a de diferentes regimes de promoção previstos para carreiras diferentes. Tal violação só poderia afirmar-se se a discriminação de regime se reportasse a pessoas inseridas na mesma carreira, caso em que essa diversidade de regime implicaria então discriminação injustificada ou arbitrária por via legislativa.
Procedem assim as alegações do recorrente, não podendo manter-se o acórdão recorrido, por errada aplicação das normas citadas.(...)» Face ao exposto, procedem todas as conclusões das alegações do recorrente.
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IV- DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes deste Tribunal em conceder provimento ao recurso e, em consequência:a) anular a decisão impugnada e julgar a acção improcedente (art. 152º, nº 6 do CPTA);
b) uniformizar jurisprudência nos seguintes termos:
«O DL nº 408/89, de 18 de Novembro, contém normas específicas relativamente ao regime de promoção do pessoal docente universitário e do ensino superior politécnico e do pessoal de investigação científica, devendo, em consequência, o regime por ele estabelecido, designadamente no seu art.
3º, al. b), in fine, ser considerado como lei especial, prevalecendo sobre as regras gerais para as carreiras da Administração Pública previstas no DL nº 353-A/89, de 16 de Outubro, concretamente a contida no seu art. 17º, nº 2.» Custas pela Autora, ora recorrida, no TCA e neste STA.
Publique-se, nos termos do art. 152º, nº 4 do CPTA.
Lisboa, 18 de Outubro de 2012. - Fernanda Martins Xavier e Nunes (relatora) - Alberto Augusto Andrade de Oliveira - Rosendo Dias José - Alberto Acácio de Sá Costa Reis - Jorge Artur Madeira dos Santos - António Políbio Ferreira Henriques - Luís Pais Borges - Américo Joaquim Pires Esteves - Adérito da Conceição Salvador dos Santos - António Bernardino Peixoto Madureira - António Bento São Pedro.