de 9 de Agosto
O presente diploma tem em vista reformular o Contencioso Aduaneiro, aprovado pelo Decreto-Lei 31664, de 22 de Novembro de 1941, na parte relativa ao Contencioso Técnico (livro II), que se mostra bastante desactualizado, quer pelo natural desgaste resultante da sua longa existência, quer por força das profundas alterações verificadas na legislação aduaneira, especialmente como consequência da adesão às Comunidades Europeias.Neste sentido, são revistas as normas reguladoras dos conflitos técnicos relativos à classificação pautal, origem e valor das mercadorias, é criado, como órgão de competência específica na matéria, o Conselho Técnico-Aduaneiro, em substituição dos tribunais técnico-aduaneiros, excluindo-se do âmbito das suas atribuições as consultas prévias que são substituídas pelas informações pautais vinculativas, instituídas pelo Regulamento 1715/90/CEE, do Conselho, de 20 de Junho de 1990, e passam à responsabilidade de outro serviço da Direcção-Geral das Alfândegas.
As alterações introduzidas compreendem, nomeadamente, a supressão da conferência dos reverificadores e dos processos de divergência entre funcionários, a descentralização de competências, a simplificação das formalidades processuais, com uma significativa redução da carga burocrática.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
Pelo presente diploma é criado na Direcção-Geral das Alfândegas o Conselho Técnico-Aduaneiro e estabelecido o regime que regula a sua constituição e funcionamento, bem como a tramitação dos processos de contestação sobre classificação pautal, origem e valor das mercadorias.
Artigo 2.º
Constituição
O Conselho Técnico-Aduaneiro, adiante designado por Conselho, é constituído pelo director-geral das Alfândegas, que preside, e pelos seguintes vogais:a) Um representante do Ministério da Indústria e Energia;
b) Um representante do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação;
c) Um representante do Ministério do Comércio e Turismo;
d) Cinco representantes da Direcção-Geral das Alfândegas;
e) Quatro representantes das actividades económicas.
Artigo 3.º
Composição do Conselho e nomeação dos vogais
1 - Dos representantes da Direcção-Geral das Alfândegas, quatro são vogais aduaneiros permanentes do Conselho, sendo o outro o director dos serviços da área em que se insere a matéria em contestação.
2 - Os vogais aduaneiros permanentes do Conselho são nomeados por despacho do Ministro das Finanças, mediante proposta do director-geral das Alfândegas, de entre funcionários do quadro técnico superior aduaneiro de categoria não inferior a reverificador.
3 - Os representantes dos ministérios são nomeados pelo Ministro das Finanças, sob proposta do ministro respectivo, de entre técnicos nos sectores agrícola, química, têxtil, metalo-mecânica e electrónica.
4 - Os representantes das actividades económicas são nomeados pelo Ministro das Finanças de entre técnicos especializados nos sectores mencionados no número anterior e constantes de listas apresentadas pelas câmaras de comércio e indústria ou por outros organismos técnico-científicos.
5 - Juntamente com os vogais efectivos mencionados nos n.os 3 e 4, são nomeados vogais suplentes.
6 - A duração do mandato dos vogais do Conselho é de três anos.
Artigo 4.º
Substituição do presidente do Conselho
1 - O presidente do Conselho, nos seus impedimentos, designará um subdirector-geral, que o substituirá.
2 - Com excepção dos vogais aduaneiros, todos os outros são substituídos, nos seus impedimentos, pelos vogais suplentes.
Artigo 5.º
Secretário
Nas reuniões do Conselho participa, como secretário, sem direito a voto, um verificador superior designado pelo director-geral das Alfândegas.
Artigo 6.º
Competência do Conselho
Compete ao Conselho decidir sobre as contestações de carácter técnico suscitadas no acto da verificação das mercadorias ou posteriormente ao seu desalfandegamento, relacionadas com a classificação pautal, origem ou valor das mercadorias.
Artigo 7.º
Atribuições dos vogais aduaneiros
Além das atribuições que lhes são próprias como vogais relatores de processos técnicos, compete aos vogais aduaneiros colaborar com o director-geral das Alfândegas sempre que este entenda submeter-lhes individualmente qualquer assunto.
Artigo 8.º
Aprovação
As decisões do Conselho, reunido com um mínimo de sete membros, incluindo o presidente, são aprovadas com o voto favorável da maioria dos presentes, cabendo ao presidente o voto de qualidade.
Artigo 9.º
Homologação
As decisões do Conselho serão homologadas por despacho do Ministro das Finanças.
Artigo 10.º
Momentos em que surge a contestação
1 - Quando, no momento da verificação das mercadorias, os serviços das alfândegas discordem dos elementos da declaração relativos à classificação pautal, origem ou valor das mesmas e o declarante com tal atitude se não conforme, será organizado, por despacho do chefe da estância aduaneira, processo técnico de contestação.2 - A contestação pode ser igualmente suscitada após o desalfandegamento das mercadorias, na sequência de controlo ou fiscalização realizados nos termos da legislação em vigor.
Artigo 11.º
Auto inicial
1 - O funcionário interveniente deverá, no prazo de oito dias a contar da data do despacho referido no n.º 1 do artigo anterior, lavrar o auto inicial do processo técnico de contestação e promover a recolha das amostras necessárias.2 - O auto inicial, redigido em duplicado, será assinado pelo funcionário interveniente e pelo declarante, e deverá conter os seguintes elementos:
a) A identificação do documento de despacho, designadamente natureza, estância aduaneira, números e datas de registo;
b) Os nomes e endereços do dono ou consignatário das mercadorias e do seu representante;
c) O nome e categoria do funcionário interveniente;
d) A descrição da mercadoria em litígio;
e) A classificação pautal, taxas, origem e valor atribuídos pelo declarante e pelos serviços;
f) A enumeração das amostras extraídas, com a indicação de ser ou não pretendida a sua devolução.
Artigo 12.º
Nota justificativa
Nos 15 dias subsequentes à data da elaboração do auto inicial, o funcionário interveniente deverá apresentar nota justificativa da sua discordância quanto aos elementos da declaração.
Artigo 13.º
Resposta do declarante
Nos 15 dias seguintes ao termo do prazo estabelecido no artigo anterior, deverá o declarante apresentar ou declaração de concordância com a posição assumida pela administração aduaneira ou documento fundamentado de contestação àquela posição.
Artigo 14.º
Elementos complementares
Tanto a nota justificativa como a contestação poderão fazer-se acompanhar de cópia de facturas, de certificados de origem, de relatório de análises ou de quaisquer outros elementos relativos às mercadorias.
Artigo 15.º
Efeitos da declaração de concordância ou da falta de contestação
O processo será considerado findo, ultimando-se o despacho, quando o declarante venha juntar aos autos a declaração de concordância referida no artigo 13.º ou quando não apresente a contestação.
Artigo 16.º
Remessa do processo
Logo que a contestação seja recebida, o processo será remetido à sede da alfândega, que, por sua vez, depois de o registar, o remeterá à Direcção-Geral das Alfândegas.
Artigo 17.º
Exame sumário do processo
Depois de um exame sumário dos autos, o director-geral poderá ordenar o prosseguimento do processo ou o seu arquivamento por, neste caso, considerar o Conselho incompetente em razão da matéria ou manifestamente infundadas as razões aduzidas na nota justificativa.
Artigo 18.º
Decisão do director-geral e seus efeitos
1 - A decisão do director-geral, prevista na parte final do artigo anterior, deverá ser fundamentada e notificada ao declarante, sendo o processo devolvido à alfândega respectiva, para ultimação do despacho.
2 - Se, porém, a decisão do director-geral for a de ordenar o prosseguimento do processo, será este remetido ao Conselho.
Artigo 19.º
Tramitação do processo
1 - Quando recebidos no Conselho, os processos de contestação serão registados e distribuídos sequencialmente pelos vogais aduaneiros, para efeitos de elaboração dos relatórios preliminares.2 - O vogal relator e o Conselho poderão solicitar os elementos adicionais, incluindo análises, que se mostrem necessários a uma completa instrução do processo.
3 - Finda esta, os relatórios serão apresentados, no prazo máximo de 30 dias a contar da data do registo referido no n.º 1, ao director-geral, que convocará o Conselho para, no mais curto prazo, proceder ao exame do processo e resolver o litígio.
4 - Os donos ou consignatários das mercadorias ou os seus representantes poderão, mediante pedido dirigido ao presidente do Conselho e formulado com a necessária antecedência, comparecer no início das sessões do Conselho para exporem oralmente as razões que julgarem assistir-lhes, devendo retirar-se antes de iniciada a votação.
5 - As decisões do Conselho, se homologadas nos termos previstos no artigo 9.º, serão transmitidas às alfândegas para notificação aos interessados e ultimação dos despachos.
Artigo 20.º
Revisão das decisões do Conselho
Por razões devidamente fundamentadas, pode o director-geral propor ao Ministro das Finanças a revisão de qualquer decisão do Conselho anteriormente homologada.
Artigo 21.º
Aplicabilidade das decisões do Conselho
As decisões do Conselho são obrigatoriamente aplicadas pelos serviços aduaneiros, não somente aos casos a que directamente digam respeito, mas também a casos idênticos que ocorram a partir da data da homologação.
Artigo 22.º
Validade das decisões do Conselho
As decisões do Conselho, homologadas nos termos do artigo 9.º, são válidas até que sejam:a) Modificadas por outras proferidas pelo Conselho, homologadas pelo Ministro das Finanças ou revistas nos termos do disposto no artigo 20.º;
b) Anuladas por decisão, transitada em julgado, proferida em recurso contencioso;
c) Revogadas por regulamentos comunitários, acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades, alterações das Notas Explicativas da Nomenclatura Combinada ou do Sistema Harmonizado ou acordos sobre a classificação obtidos no Comité da Nomenclatura e consignados em acta da reunião.
Artigo 23.º
Publicação das decisões do Conselho
As decisões do Conselho, após homologação, serão publicadas em circular da Direcção-Geral das Alfândegas, mantendo-se confidenciais os nomes dos intervenientes nos processos e a marca comercial da mercadoria.
Artigo 24.º
Amostras
1 - Sempre que possível, serão retiradas três amostras das mercadorias em contestação, as quais serão seladas e rubricadas pelo declarante e pelo funcionário interveniente.2 - A estância aduaneira onde foi suscitada a contestação conservará uma amostra e enviará as restantes à sede da alfândega acompanhadas do respectivo processo, as quais serão seguidamente remetidas ao director-geral das Alfândegas.
3 - As amostras excessivamente pesadas ou incómodas ficam na estância aduaneira onde foi levantada a contestação, à ordem do director-geral das Alfândegas.
4 - As amostras de mercadorias perecíveis serão entregues na estância aduaneira que o director-geral das Alfândegas designar.
5 - Quando não for possível retirar amostras, os serviços aduaneiros poderão aceitar, em substituição, três exemplares de planos, desenhos, fotografias ou quaisquer outros documentos que permitam identificar as mercadorias em contestação, devendo ser igualmente selados e rubricados por ambas as partes.
Artigo 25.º
Desalfandegamento das mercadorias
As mercadorias em contestação, que não sejam de importação proibida, podem ser desalfandegadas, mediante garantia dos maiores direitos e outras imposições, incluindo uma importância que possa cobrir eventual responsabilidade fiscal e desde que se disponha de todos os elementos necessários à apreciação do litígio.
Artigo 26.º
Abonos
Os vogais do Conselho, excepto os representantes da Direcção-Geral das Alfândegas, serão reembolsados das despesas de deslocação e abonados de uma senha de presença, de montante a fixar por despacho do Ministro da Justiça.
Artigo 27.º
Remissão
Todas as referências a tribunais técnico-aduaneiros e a juízes dos tribunais técnicos, contidas na Reforma Aduaneira, aprovada pelo Decreto-Lei 46311, de 27 de Abril de 1965, e não revogadas expressamente pelo presente diploma, bem como no Decreto-Lei 252-A/82, de 28 de Junho, deverão reportar-se, respectivamente, ao Conselho Técnico-Aduaneiro e aos vogais aduaneiros do Conselho Técnico-Aduaneiro.
Artigo 28.º
Norma revogatória
1 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, são revogados o livro II do Contencioso Aduaneiro aprovado pelo Decreto-Lei 31664, de 22 de Novembro de 1941, bem como os artigos 185.º a 190.º, 192.º, 291.º a 293.º, 329.º, 414.º a 417.º, 424.º e 425.º da Reforma Aduaneira, aprovada pelo Decreto-Lei 46311, de 27 de Abril de 1965.2 - Os processos pendentes à data da entrada em vigor do presente diploma continuarão a reger-se, até ao trânsito em julgado da decisão que lhes ponha termo, pela legislação que lhes era aplicável, exceptuando-se aqueles que ainda não tenham sido apreciados em sessão do tribunal técnico-aduaneiro de 1.ª instância.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 6 de Junho de 1991. - Aníbal António Cavaco Silva - Luís Miguel Couceiro Pizarro Beleza - Arlindo Marques da Cunha - Luís Fernando Mira Amaral - Fernando Manuel Barbosa Faria de Oliveira.
Promulgado em 15 de Julho de 1991.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 16 de Julho de 1991.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.