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Portaria 22790, de 22 de Julho

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Sumário

Estabelece novo regime para a comercialização do bacalhau - Revoga a Portaria n.º 19947, com excepção dos seus n.os 1.º e 7.º, os n.os 5.º a 10.º, inclusive, da Portaria n.º 20443, a declaração inserta no Diário do Governo n.º 23, de 28 de Janeiro de 1965, e a Portaria n.º 21099.

Texto do documento

Portaria 22790

1. Decorrido um ano sobre a publicação da Portaria 20443, datada de 17 de Março de 1964, vieram armazenistas de mercearia da província requerer instantemente que fosse revogada, ou pelo menos suspensa, a autorização concedida por esse diploma legal a todos os armazenistas de mercearia para importarem bacalhau. No entender dos requerentes, impunha-se o regresso ao regime anterior, isto é, àquele de que resultava que o referido produto só podia ser colectivamente importado pela Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau ou pelo Grémio dos Armazenistas de Mercearia.

Estudado o assunto, verificou-se que a pretensão se originava, singular ou concomitantemente, nas seguintes razões não alegadas, mas na verdade correspondentes à situação em que os requerentes se encontravam:

a) Dificuldade, se não impossibilidade, de entrarem em contacto com exportadores de bacalhau, por exercerem a sua actividade fora dos grandes centros e não disporem, portanto, de organização comercial extensiva aos mercados externos;

b) Sentirem-se, em consequência, profundamente lesados quando aceitavam, como quando rejeitavam, as propostas dos armazenistas importadores de Lisboa e do Porto para comprarem bacalhau a preço superior ao constante da tabela e ou associado à venda de outras mercadorias de difícil comercialização;

c) Considerarem injusto e lesivo dos seus interesses que as quotas de rateio dos armazenistas importadores pudessem ser aumentadas proporcionalmente às quantidades de bacalhau que importassem, muito embora as transaccionassem com desrespeito do que se encontra legalmente estabelecido.

Às razões que acabam de ser enumeradas outra se acrescentava, esta apresentada pela Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau, em apoio da suspensão tão desejada pelos armazenistas reclamantes. E vinha essa razão do facto de, a par das referidas importações individuais, continuar a Comissão Reguladora a proceder a importações, que chamam colectivas, com vista à regularização do mercado, que não se quis entregar inteiramente à iniciativa privada. Em tais termos, perante a concorrência daqueles que se apresentavam junto dos exportadores com a flexibilidade que lhes resultava da disposição de não respeitar os preços tabelados, era natural que a Comissão Reguladora fosse eliminada, a não ser que se dispusesse a transigir com a alta de preços provocada pelos concorrentes, que depois viesse a ser compensada, em altíssimos limites, à custa dos fundos para tanto instituídos.

Reconhecidos todos estes graves inconvenientes do sistema vigente, foi determinada a suspensão da faculdade concedida aos armazenistas de procederem a importações e regressou-se ao regime anterior, do que, evidentemente, resultou o aplauso dos reclamantes e o mais vivo protesto dos que foram impedidos de intervir no acto da importação.

Acrescenta-se que, como se sabia, da alteração, à parte a poupança de divisas e defesa dos fundos e ainda certa moralização do sector, nenhuns outros efeitos se obtiveram, sobretudo aquele que mais se desejava, ou seja a defesa do interesse do consumidor.

Temos, pois, que, a partir de Junho de 1965, todas as importações de bacalhau são negociadas pela Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau e posteriormente efectuadas pelo Grémio dos Armazenistas de Mercearia, que também tem a seu cargo a distribuição pelos agremiados, de acordo com quotas de rateio há muito fixadas.

Descrito a traços largos o actual regime de importação, vejamos quais os seus resultados.

2. O consumo de bacalhau encontra-se tão enraizado nos nossos hábitos que qualquer perturbação no seu abastecimento constitui um problema que, nas circunstâncias actuais, haverá de entrar no conjunto das preocupações dos mais altos órgãos da administração nacional.

Considere-se ainda, para comprovar a importância atribuída ao abastecimento desse produto, que entre os muito poucos organismos de coordenação económica existentes figura a Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau, com um orçamento de despesa que atinge a quantia de 14000 contos.

E para uma perfeita análise desse mesmo problema, com exacta delimitação das suas consequências, haverá ainda que tomar em conta o capital investido na frota bacalhoeira e os agregados familiares que têm na pesca de bacalhau o seu único rendimento.

Talvez porque o hábito é secular, não terá havido reflexão sobre a conveniência de o manter dentro do presente condicionalismo, antes se verificando inteira subordinação a exigências crescentes daqueles que vêem no bacalhau o mais barato produto alimentar, aos quais se juntam outros que, sem limitações resultantes do poder de compra, o consideram o mais saboroso e, possìvelmente, ainda alguns que julgam que o bacalhau está naturalmente indicado para constituir a base da sua dieta alimentar.

Todavia, abstraindo do hábito, tem-se como certo que a ponderação do mérito das exigências e da razoável possibilidade de as satisfazer conduziria à alteração das coordenadas a partir das quais se vêm, também tradicionalmente, construindo as soluções.

Como, porém, nesta matéria, as solicitações do consumo têm ocupado lugar cimeiro na hierarquia das determinantes da decisão e de tal sorte que todas as outras nem sequer chegam a ser encaradas, o hábito vai sendo dia a dia reforçado, se bem que factores indomáveis progressivamente nos distanciam do equilíbrio entre a oferta e a procura.

E como os acertos se vão sucedendo e sempre o último é apresentado como bastante para corrigir os erros do anterior e assim conduzir à tão desejada plenitude, cria-se o ambiente próprio para formulação do mais fundamentado e irrespondível protesto, que se avoluma, por obra da expansão que os meios actuais extraordinàriamente facilitam, que corre Portugal de lés a lés, que ocupa e preocupa reuniões e assembleias, ainda as mais elevadas, a ponto de assumir proporções que só devem alcançar os autênticos problemas nacionais.

3. Reconhecida a improficuidade dos mais bem intencionados esforços, impõe-se o esclarecimento completo, de que deverá resultar, mais do que compreensão, a solidariedade perante as decisões a tomar. É nessa convicção que seguidamente se revelam os aspectos predominantes deste assunto, que, mais pelas dificuldades de que se reveste do que pela importância assumida, há muito foi designado por «problema do bacalhau».

4. Como se disse atrás, verifica-se, em parte do País, uma preferência crescente pelo bacalhau salgado, até ao ponto de em certas regiões se pretender que este produto constitua a base da dieta alimentar, de modo a sobrepor-se, na composição dessa dieta, à carne e ao peixe fresco ou congelado. E quando se diz que a preferência é notada em parte do País quer-se excluir as províncias ultramarinas, onde as coisas se passam de diferente maneira, isto é, onde o bacalhau não constitui elemento predominante na alimentação.

E porque durante muitos, mas já distantes, anos não surgiram quaisquer impedimentos que se opusessem ao pleno abastecimento, criou-se uma especialização culinária que deu origem a múltiplas fórmulas, as bastantes para que o produto se apresentasse com uma diversidade de paladares que o tornavam sempre apetecido, não obstante a constância com que aparecia na mesa de todas as classes sociais.

A falta de comunicações e a irregularidade dos meios de transporte contribuíram também para manter a procura de um produto que, sem grandes riscos conhecidos para a sua sanidade, podia ser guardado por largo tempo e substituir outros que só ocasionalmente chegavam a determinadas regiões do interior do País; o peixe seco ocupava assim o lugar que mais recomendàvelmente caberia à carne e ao peixe frescos.

5. Alguns destes factores, se não desapareceram, apresentam-se hoje com muito menor relevância, insuficientes, portanto, para justificarem as solicitações sempre veementes e o ardor com que, através dos maiores sacrifícios e inconvenientes graves, elas vão sendo parcialmente atendidas.

6. Começando pela avaliação da possibilidade de equilibrar a oferta com a procura, julga-se que não mais esse equilíbrio será conseguido, a não ser pela selecção de consumos que venha a obter-se através da elevação do preço, aliás, como se verá, já imposta pelas circunstâncias actuais, cujo agravamento se tem como certo.

Para chegar àquela conclusão, haveremos de ter primeiramente em conta que a capacidade da nossa frota bacalhoeira, que em 1935 era de 9726 t, subiu progressivamente até atingir, em 1965, 102000 t.

Apesar deste aumento considerável, em ano algum foi dispensado o recurso à importação, a qual, tendo alcançado, em 1935, o montante de 50173 t, no valor de 132000 contos, não foi, em 1966, além de 19000 t, que custaram, no entanto, 305000 contos. A estas considerações haverá, porém, de acrescentar-se que, enquanto com uma capacidade de pesca de 20000 t a 60000 t, a que tínhamos e plenamente aproveitávamos entre 1940-1950, e com importações cujo valor oscilou entre 80000 e 250000 contos, satisfazíamos nesse decénio as solitações do consumo, hoje, com a elevação dessa mesma capacidade e com uma importação que só no ano de 1966 atingiu, como se disse, o valor de 305000 contos, queixam-se os armadores, lastimam-se os armazenistas, clamam os retalhistas e bramam os consumidores, ao mesmo tempo que a Administração inùtilmente multiplica canseiras e despesas para a todos satisfazer, pois que pressente ou sabe que nas circunstâncias actuais quase todos têm razão.

Na verdade, não só se nota nos últimos anos uma diminuição do rendimento da pesca efectuada em relação à capacidade da frota, de modo que aquela se traduz em 67 a 77 por cento desta, enquanto que nos anos anteriores a mesma percentagem oscilava entre 85 e 95 por cento, como dia a dia se acentuam as dificuldades encontradas nos mercados exportadores para comprar as quantidades de bacalhau que não se consegue obter através da frota nacional.

Os quadros a seguir reproduzidos documentam suficientemente o que se afirmou.

Bacalhau nacional

Produção

Fonte: Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau.

Unidades: Toneladas e 1000$00 (ver documento original)

Bacalhau importado

Fonte: Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau.

Unidades: Toneladas e 1000$00.

(ver documento original)

Quantidade de bacalhau salgado seco entregue ao consumo

Fonte: Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau.

Unidade: Toneladas.

(ver documento original) A diminuição de rendimento da pesca nacional resulta sobretudo, da concorrência de outras frotas, cada vez mais numerosas e que, pelo emprego de novos métodos de pesca, esgotam ràpidamente o peixe disponível e, consequentemente, impossibilitam à frota nacional o pleno aproveitamento da sua capacidade.

No que respeita à contracção da oferta dos exportadores e consequente elevação de preços, é-nos oferecida apenas a seguinte explicação, aliás devidamente comprovada e inteiramente satisfatória.

A transformação do bacalhau fresco em bacalhau salgado é operação demorada e dispendiosa, porque exige o emprego de mão-de-obra cada vez mais rara e, portanto, mais bem remunerada, como atrasa a comercialização, ou seja o reembolso do capital investido. Daí que os países que tradicionalmente se dedicam à pesca desse peixe com vista à exportação hajam nos últimos tempos preferido à salga a filetagem e congelação, operações mecânicas e rápidas, feitas a bordo, das quais resulta um produto de venda fácil a remuneradora.

Estão, pois, condenados a insucesso os nossos esforços para conseguir compensar a insuficiência da pesca nacional, de modo a satisfazer a procura aos preços desejados pelo recurso à importação.

7. Aludiu-se atrás à deficiência dos meios de transporte que teriam conduzido as populações para se abastecerem à preferência por um produto de certa maneira concentrado e que se conservasse por tempo apreciável.

A este respeito importa, porém, não esquecer que os últimos 30 anos modificaram completamente as razões em que uma tal preferência se baseou.

A expansão da camionagem, a aceleração dos transportes ferroviários, o emprego de camiões ou vagões frigoríficos, a construção de novas estradas, o incremento das instalações frigoríficas industriais e domésticas e até a evolução dos regimes alimentares contrastam singularmente com as exigências dos consumidores, reflectidas nas pressões do comércio e dos armadores - tudo a recair nos órgãos da Administração. Não obstante os progressos conseguidos na circulação e na conservação de alimentos, tudo decorre em Portugal como se a salga fosse o único processo conhecido de manter um produto alimentar em condições de ser longamente transportado e mais tarde consumido sem afectação da sua sanidade e do seu paladar.

Mas se este é o comportamento dos consumidores, não pode coincidir com o pensamento do Governo, quando mais não seja porque não há maneira de a ele corresponder.

8. Para além da orientação do consumo no rumo que coincida com o seu autêntico interesse imediato e se conforme com o interesse nacional, implique embora a incompleta satisfação de hábitos que vêm de longe e constituem veneradas tradições, há neste sector uma obra de reconversão a empreender corajosamente.

Para legitimar a substituição daqueles hábitos por outros mais consentâneos com as nossas possibilidades económicas, nem sequer se recorre, porque duras realidades a impõem, ao testemunho de especialistas que nos viessem esclarecer sobre a conveniência de basear a dieta alimentar em produtos salgados e acerca das vantagens da congelação ou frigorificação sobre a salga tão primitiva.

Deixa-se, por enquanto, a questão em aberto àqueles a quem o esclarecimento possa interessar.

O que de momento mais importa neste campo é que o País vá empregando o seu potencial económico de maneira mais rendosa e de modo a melhor servir o interesse dos consumidores.

Não parece assim defensável que se conduza e apoie o investimento numa frota univalente, que só é parcialmente aproveitada, quer no tempo, quer nas espécies do pescado.

O exemplo de outros países, como a Espanha e o Japão, que, de grandes consumidores de bacalhau e outras espécies de peixe salgado, se tranformaram em consideráveis consumidores e exportadores de peixe congelado e hoje dispõem para o efeito de frotas modelares, merece, pela menos, ser atentamente observado.

Entre nós, que continuamos dominados pela preocupação do abastecimento de bacalhau e, portanto, pela sua pesca, os progressos técnicos obtidos vêm-se apenas revelando na substituição dos navios de pesca à linha por arrastões, e mais recentemente nota-se a preferência pela construção segundo o método de pesca à popa. Do desaparecimento dos lugres, ou navios de pesca à linha, resulta, sem dúvida, menor risco e mais comodidade para as tripulações, como advém celeridade na faina da pesca. Em contrapartida, por impossibilidade de selecção, deriva do emprego dos novos métodos de pescar a raridade de peixe graúdo e a sua consequente valorização.

A tanto se tem limitado a orientação dos nossos armadores de pesca do bacalhau, sem que pareçam preocupados pela imobilização de barcos e tripulações durante parte do ano, mais ou menos longa, conforme se fazem uma ou duas viagens.

Não é, assim, de admirar que se aleguem prejuízos e que estes venham a ser cobertos pela concessão de vultosos empréstimos e subsídios, ficando ainda para resolver, através do mecanismo dos fundos de compensação, a venda do produto aos preços tabelados.

9. Crê-se ter dito o bastantes para demonstrar que só através de vários artifícios, muito expressivamente onerosos, que se vão multiplicando e agravando, de modo que em breve teremos de os considerar incomportáveis dentro das nossas possibilidades, se pode ter criado a convicção de que o bacalhau salgado é o alimento que haveremos de destinar às classes econòmicamente menos favorecidas.

Um facto recente ilustrará a demonstração:

Como se referiu, é, no sistema actual, a Comissão Reguladora que procede às negociações tendentes à compra das quantidades de bacalhau que não se obtiverem através da frota nacional.

Atento o condicionalismo que foi exposto, não se podem fazer tempestivas previsões acerca das quantidades a importar e muito menos sobre o preço respectivo. A esta incerteza haverá de juntar-se que as disponibilidades dos poucos países exportadores são escassas e muito disputadas pelos mais países onde o bacalhau salgado é consumido, e que surgem no mercado livres das limitações que resultam de preços tabelados.

Daqui se infere a difícil posição em que se encontram os negociadores portugueses e a impossibilidade de nestas compras se encaminharem para a abertura de concursos - o processo normalmente usado pelos organismos de coordenação económica e corporativos obrigatórios que têm a seu cargo a compra de produtos alimentares essenciais ao consumo público e o único que os põe a coberto de críticas que, embora imerecidas, são de difícil refutação. Compra-se onde há, procura-se o melhor preço, mas não há tempo a perder, porque está à espera o consumidor insaciável, ao qual o bacalhau foi prometido e é devido.

Nestas circunstâncias, não é de admirar que uma partida de bacalhau recentemente importada, cuja quantidade correspondia a vinte dias de abastecimento normal, mas na anormalidade em que vivemos foi consumida em muito menos tempo, tenha excedido em 35000 contos o seu valor quando calculado aos preços tabelados. 35000 contos será, portanto, neste caso, a quantia representativa de parte de um prejuízo que conscientemente se aceitou no propósito de, durante alguns dias, alcançar determinados fins. Essa intenção foi inteiramente frustrada, como adiante sé verá.

10. Como se deduz do quadro atrás inserto, foi de 10400000 contos, aproximadamente, o valor do bacalhau capturado, desde 1934 até 1967 pela frota nacional. Para completar o abastecimento durante o mesmo período procedeu-se a importações cujo valor totalizou 5820000 contos, também aproximadamente.

A impressão desfavorável que porventura possa causar a saída de divisas em tal montante será reforçada se for considerado que só nos últimos nove anos do citado período, precisamente aqueles em que se verificou menor rendimento da pesca nacional, a mesma saída de divisas atingiu a quantia de 2230000 contos, números redondos.

Mas, para além da saída de divisas, há sobretudo que considerar, na apreciação do caso, que a preocupação de assegurar a possibilidade de cumprimento das actuais tabelas de preços, com a atribuição dos lucros legítimos aos vários intervenientes no circuito do produto, desde o armador ao comerciante retalhista, vem exigindo aos mecanismos de compensação de que se dispõe a saída de quantias consideráveis, dir-se-á mesmo de montante actualmente inconciliável com o máximo limite das disponibilidades financeiras desses mecanismos, quando se tenha em conta os seus vastos e transcendentes objectivos. E para demonstrar esta afirmação referir-se-á primeiramente que no ano de 1966, entre subsídios de vária natureza e compensações de preço, o regime de comercialização de bacalhau vigente custou àqueles mecanismos nada menos de 120000 contos.

Todavia, se considerarmos o agravamento dos vário encargos inerentes à exploração da indústria da pesca e o aumento de preço do bacalhau estrangeiro, que há muito se vêm verificando, mas se acentuaram e incidiram particularmente no ano em curso, os mesmos subsídios e compensações subirão, em 1967, a cerca de 400000 contos, a não ser que entretanto se proceda a uma modificação total do regime a que se aludiu.

Citadas estas cifras, é tempo de perguntar se vêm sendo alcançados os fins pretendidos, isto é, chegou a altura de analisar o que presentemente se passa no mercado interno.

Pouco haverá a acrescentar ao que é suficientemente conhecido, se comenta em todos os meios e fornece tema para discussões, artigos de jornais, exposições em papel selado; que constitui, em suma, razão de mal-estar que atinge todas as camadas sociais, sem que interesse averiguar se é justa, se está certa tamanha preocupação, atenta a hierarquia dos muitos problemas que nos rodeiam e tão empenhada e sacrificadamente haveremos de resolver.

As coisas são assim mesmo e é dentro delas que temos de raciocinar e decidir.

11. Apesar de constante, extensa e intensa divulgação sobre o modo como decorre o abastecimento de bacalhau, não será de todo inútil fazer aqui algumas considerações, vindas de uma observação directa do comportamento dos vários circuitos intervenientes na economia do produto.

Não obstante a existência de uma tabela laboriosamente estudada e sem embargo da actuação diligente dos serviços de fiscalização, no propósito de a fazer cumprir, a verdade é que a imperiosa actuação da lei da oferta e da procura eleva os preços reais muito para além dos estabelecidos legalmente e torna pràticamente inoperantes os esforços a que aludiu. E assim se vai acentuando o desprestígio daqueles serviços, como vai engrossando o caudal dos descontentes por não verem cumpridos os compromissos da Administração incondicionalmente assumidos, pois outro não pode ser o significado da concessão de empréstimos e subsídios, da existência de fundos de compensação e da fixação de preços.

Considerada a insuficiência das quantidades de bacalhau obtidas, quer pela frota nacional, quer pela importação, para corresponder a uma procura imensa e crescente, seria de desejar, dir-se-á o mesmo, só se compreenderia, que esse produto alimentar, que em trabalhos e dinheiro tanto custou a obter, fosse de preferência, se não exclusivamente, destinado àqueles que determinaram a fixação dos preços em limite acessível às suas reduzidas possibilidades de compra.

Tudo, porém, se passa ao contrário desse propósito, em lógica obediência à citada lei da oferta e da procura.

O bacalhau é consumido quase exclusivamente pelas classes de mais elevado poder económico e não falta diàriamente nas mesas de hotéis e restaurantes, ainda os mais luxuosos, já que, mercê de requintes de culinária devidamente proclamados, foi elevado à categoria de prato de reputação internacional, que, sem desprimor, pode ser oferecido aos estrangeiros que, por mercê de Deus, nos visitam em cada ano em número que cresce animadoramente.

Para de algum modo contrariar este destino, alargam-se dia a dia, com protesto do comércio, as distribuições directas a cantinas, instituições de assistência e outras onde ainda é possível ir ao encontro imediato de débeis agregados familiares.

E nas presentes circunstâncias pouco mais a Administração pode fazer, resultando inúteis os seus esforços para evitar que os menos escrupulosos condicionem a venda de bacalhau à compra de géneros difìcilmente transaccionáveis ou que os menos timoratos pratiquem afoitamente o crime de especulação, na certeza da cumplicidade dos únicos que os poderiam denunciar, mas que, paradoxalmente, para além de lesados e calados, ficam profundamente agradecidos.

12. Disse-se nas linhas precedentes que no sector do bacalhau há que proceder a uma corajosa reconversão, e cuida-se ter dito ainda o bastante para que tal política se considere plenamente justificada. Esse tema é agora retomado e a partir dele se traçam, sem hesitações, os caminhos do presente e do futuro.

E assim, no que respeita às nossas frotas de pesca - costeira, de altura e longínqua -, todo o apoio financeiro que, directa ou indirectamente, possa ser obtido no Ministério da Economia deve decididamente destinar-se à sua transformação e ampliação, em obediência à melhor técnica e de modo que os navios disponham de apetrechamento actualizado para pesca e armazenagem e permitam o mais amplo aproveitamento da sua capacidade, do produto da faina e do trabalho das tripulações.

Os métodos, cientificamente estudados e suficientemente experimentados, de refrigeração e congelação, impõem-se-nos de tal sorte que não consentem a insistência antieconómica em processas desactualizados de preparação do pescado.

Sempre no propósito de dar satisfação à imperiosa necessidade de abastecer completamente o País de produtos alimentares essenciais, serão reforçadas todas as providências recentemente tomadas que facilitam e aceleram o transporte e distribuição de peixe fresco e congelado e sua adequada conservação.

A par destas deliberações, de que resultará a penetração desse peixe em todas as regiões do interior, continuar-se-á a revisão dos circuitos comerciais, na intenção inflexível de eliminar intervenientes comprovadamente desnecessários e pôr, em consequência, à disposição das populações um alimento básico, em quantidade suficiente, condições de higiene indiscutíveis, de aceitação assegurada e a preço que, sendo remunerador para as actividades produtora e comercial, é, no entanto, compatível com o poder de compra das classes que, até há pouco, à falta de peixe fresco ou congelado, insistente e baldadamente procuravam bacalhau ao preço tabelado.

Escusado será salientar que por todas estas providências se pretende, além de alcançar os objectivos que ficaram definidos, conseguir ainda, com o decorrer do tempo e pela alteração gradual dos hábitos do consumidor, a substituição de parte do produto importado por outro obtido através do trabalho nacional, com a consequente economia de divisas.

A transcendência desta orientação é suficientemente compensadora das reacções que porventura ela possa provocar, vindas decerto daqueles cujos interesses, ou exigências, não podem ser considerados, por a tanto se opor o muito mais elevado interesse nacional.

13. Demonstrada a impossibilidade de fazer respeitar as tabelas de preços em vigor, posto que para tanto intervenham onerosamente os mecanismos de compensação de que se dispõe e reconhecido que o bacalhau pode e deve ser, em grande parte, substituído na alimentação por outros produtos que se obtêm em condições mais económicas, entende-se dever revogar aquelas tabelas e, consequentemente, libertar os preços de venda ao público, fixando-se, no entanto, margens de lucro máximo para o armazenista e para o retalhista.

14. Não se verificam razões que justifiquem seja mantida a suspensão da faculdade concedida aos armazenistas de, individualmente ou agrupados, procederem a importações.

Nestes termos, sem prejuízo dos ajustamentos que for considerado necessário introduzir no condicionalismo vigente e ao abrigo do disposto no artigo 1.º do Decreto 45143, de 17 de Julho de 1963:

Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Secretário de Estado do Comércio, o seguinte:

1.º A venda do bacalhau deixa de estar sujeita a tabelamento.

2.º As margens de lucro ilíquido do comércio armazenista e retalhista não poderão exceder, respectivamente, 8 e 13 por cento sobre o preço de factura.

3.º Quando se verifique a intervenção de mais de um armazenista, a percentagem referida no número anterior será dividida pela forma acordada entre os intervenientes e, na falta de acordo, será dividida em partes iguais.

4.º As importações de bacalhau salgado, verde ou seco poderão ser realizadas por qualquer armazenista de bacalhau inscrito nessa qualidade no Grémio dos Armazenistas de Mercearia, sem prejuízo do pagamento de todas as taxas e tarifas de serviço devidas à Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau e àquele Grémio.

5.º É abolido o regime de quotas de rateio actualmente aplicável na distribuição do bacalhau nacional e do importado.

6.º Os armazenistas de bacalhau, quer sejam ou não simultâneamente importadores, deixam de estar sujeitos à obrigação de adquirir aos armadores nacionais todo o bacalhau pescado por estes.

7.º Sempre que as circunstâncias excepcionais o aconselhem, poderá a Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau, no exercício da competência que lhe é atribuída no artigo 3.º do Decreto 27150, de 30 de Outubro de 1936, importar bacalhau e adquirir bacalhau nacional aos armadores ou estrangeiro aos armazenistas, bem como promover a sua distribuição.

§ único. A distribuição prevista neste número será realizada aos preços que vierem a ser fixados pelo Secretário de Estado do Comércio, sob proposta da Comissão Reguladora, a qual, nessa proposta e quando se trate de bacalhau que não haja importado ou que não tenha sido adquirido directamente aos armadores, terá em conta, entre outros elementos, os preços correntes praticados nas aquisições efectuadas pelos armazenistas.

8.º Os armadores nacionais e os armazenistas deverão fornecer à Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau os elementos informativos que lhes forem solicitados por este organismo, dentro dos prazos indicados.

9.º A Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau deverá elaborar os regulamentos necessários à imediata execução desta portaria.

10.º As dúvidas sobre a aplicação e interpretação da presente portaria serão resolvidas por despacho do Secretário de Estado do Comércio.

11.º A presente portaria entra imediatamente em vigor.

12.º Ficam revogados a Portaria 19947, de 17 de Julho de 1963, com excepção dos seus n.os 1.º e 7.º, os n.os 5.º a 10.º, inclusive, da Portaria 20443, de 17 de Março de 1964, a declaração publicada no Diário do Governo de 28 de Janeiro de 1965 e a Portaria 21099, de 9 de Fevereiro de 1965.

Secretaria de Estado do Comércio, 22 de Julho de 1967. - O Secretário de Estado do Comércio, Fernando Manuel Alves Machado.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/1967/07/22/plain-252863.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/252863.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1936-10-30 - Decreto 27150 - Ministério do Comércio e Indústria - Gabinete do Ministro

    Reorganiza a Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau.

  • Tem documento Em vigor 1963-07-17 - Decreto 45143 - Ministério da Economia - Secretaria de Estado do Comércio

    Revoga as disposições dos artigos 18.º a 22.º e 33.º, n.º 1.º, do Decreto n.º 30002 e determina que o regime de comercialização de bacalhau passe a ser regulado por meio de despacho ou portaria do Secretário de Estado do Comércio.

  • Tem documento Em vigor 1963-07-17 - Portaria 19947 - Ministério da Economia - Secretaria de Estado do Comércio

    Estabelece novo regime de comercialização de bacalhau.

  • Tem documento Em vigor 1964-03-17 - Portaria 20443 - Ministério da Economia - Secretaria de Estado do Comércio

    Fixa as condições especiais que passam a ser exigidas, além das condições genéricas a que se refere o artigo 9.º do Decreto n.º 30002, para efeito de inscrição como armazenista de bacalhau nas 1.ª e 7.ª secções do Grémio dos Armazenistas de Mercearia.

  • Tem documento Em vigor 1965-02-09 - Portaria 21099 - Ministério da Economia - Secretaria de Estado do Comércio - Comissão de Coordenação Económica

    Determina que os armazenistas de bacalhau, como tais inscritos no Grémio dos Armazenistas de Mercearia, enviem à Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau nota mensal das quantidades e tipos de bacalhau salgado, seco, nacional e estrangeiro, transaccionado, com a discriminação dos compradores e sua localização.

Ligações para este documento

Este documento é referido nos seguintes documentos (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

  • Não tem documento Em vigor 1967-09-22 - DECLARAÇÃO DD10795 - MINISTÉRIO DA ECONOMIA

    De ter sido, por despacho do Secretário de Estado do Comércio, esclarecido que as despesas de transporte permitidas pela Inspecção-Geral das Actividades Económicas poderão acrescer às margens de lucro ilíquido do comércio armazenista e retalhista de bacalhau fixadas no n.º 2.º da Portaria n.º 22790, as quais, porém, não incidem sobre essas despesas.

  • Tem documento Em vigor 1974-02-06 - Portaria 87/74 - Ministério da Economia - Secretaria de Estado do Comércio - Comissão de Coordenação Económica

    Determina várias providências relativas ao regime de preços e comercialização do bacalhau salgado seco.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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