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Acórdão 80/86, de 9 de Junho

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Sumário

Declara com força obrigatória geral a inconstitucionalidade da norma do artigo 6.º, n.º 1, do mesmo Decreto-Lei n.º 233/80, enquanto, conjugada com o artigo 5.º, n.º 1, também deste diploma legal, permite que o ajudante de escrivão que transitou para a categoria de escrivão de direito seja provido como escrivão de direito de 1.ª classe, inconstitucionalidade derivada da violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição

Texto do documento

Acórdão 80/86

Processo 148/84

Acordam no Tribunal Constitucional:

I - Enquadramento da questão

1 - O Provedor de Justiça, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 281.º da Constituição e do artigo 51.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, veio requerer a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral das normas dos artigos 5.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei 233/80, de 18 de Julho.

Aduziu, como suporte do pedido, no essencial, o seguinte conjunto de razões:

A aprovação do estatuto dos funcionários de justiça, utilizando a terminologia da parte preambular do Decreto-Lei 450/78, de 30 de Dezembro, visou, além do mais, uniformizar e equiparar situações de vária ordem que se verificavam nos diferentes tribunais;

Assim, o próprio Decreto-Lei 233/80 anunciou a necessidade de reparar uma situação atentatória do princípio legal da equiparação criada naquele estatuto, estabelecendo no seu artigo 1.º que os funcionários das secretarias dos tribunais administrativos têm as categorias, direitos, deveres, incompatibilidades, vencimentos e outros abonos que competem aos funcionários de justiça;

Todavia, o regime de promoção excepcional a escrivão de direito de 1.ª classe definido nos artigos 5.º e 6.º do Decreto-Lei 233/80 afasta-se completamente do princípio da equiparação consagrado no diploma que reestruturou as carreiras dos funcionários de justiça, sem que, para tanto, sejam conhecidas razões aceitáveis nos planos da legalidade e da justiça;

Tal situação, constituindo tratamento discriminatório em relação aos demais escrivães de direito, envolve inconstitucionalidade material dos preceitos em causa, por ofensa ao princípio da igualdade consignado no artigo 13.º da Constituição.

2 - Notificado o Governo, como órgão autor da norma, nos termos do artigo 54.º da Lei 28/82, apresentou a sua resposta portadora das seguintes conclusões:

O Tribunal Constitucional é competente em razão da matéria para conhecer da inconstitucionalidade ou ilegalidade de normas enquanto comandos imperativos, dotados de generalidade e abstracção, típicas das normas jurídicas;

As normas dos artigos 5.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei 233/80 contêm e dão execução apenas a um acto materialmente administrativo, transitório, que se esgotou imediatamente no tempo ao aplicar-se a um só caso concreto, perfeitamente identificado à partida e que determinou a providência correlativa;

Não possuindo a essencialidade e a tipicidade das normas jurídicas, aqueles preceitos são materialmente insusceptíveis de apreciação pelo Tribunal Constitucional em processo de fiscalização abstracta sucessiva;

Assim, deverá abster-se de pronúncia sobre o pedido vertente.

3 - Tendo em atenção o exposto, cumprirá apreciar, desde logo, a questão prévia suscitada na resposta produzida pelo Primeiro-Ministro para, de seguida, na eventualidade do seu desatendimento, considerar então o fundado da questão de constitucionalidade posta no pedido do Provedor de Justiça.

II - A questão prévia

1 - A solução do problema assim colocado depende, primária e essencialmente, do conceito constitucional de norma para efeitos de fiscalização de constitucionalidade. Importa, pois, apurar os precisos contornos desse conceito para, em seguida, verificar se os preceitos cuja constitucionalidade foi posta em crise são ou não subsumíveis ao juízo do Tribunal Constitucional.

2 - A questão em apreço foi já objecto de ampla indagação na nossa jurisprudência constitucional.

Desde logo a Comissão Constitucional dela se ocupou explicitamente em diversas ocasiões, nomeadamente nos pareceres n.os 3/78, 6/78 e 13/82 (Pareceres, vol. 4.º, pp. 221 e 303 e segs., e vol. 19.º, pp. 149 e segs.).

E pode dizer-se que aquela Comissão firmou doutrina no sentido de que o conceito de «norma», para o efeito de fiscalização da constitucionalidade, não abrange apenas os preceitos gerais e abstractos, mas também todo e qualquer preceito, ainda que de carácter individual e concreto, contido em diploma legislativo, mesmo quando constitua materialmente puro acto administrativo.

No parecer 3/78, depois de se afirmar que os preceitos das chamadas leis medida ou leis providência também estão abrangidos na fiscalização da constitucionalidade por serem ainda «normas jurídicas», pondera-se:

Dúvida mais consistente reporta-se a uma espécie de normas contidas em diplomas do género mencionado (leis medida ou leis providência) constituída por aquelas normas que contenham actos administrativos [...] (leis pessoais em sentido estrito e rigoroso).

Tais normas limitar-se-iam a aplicar certa norma anterior, do mesmo ou de outro diploma, tal como faria a Administração ou a jurisdição por acto separado, só com a diferença de se conter dentro de um acto de força formalmente superior. Não seriam, portanto, normas jurídicas, mas actos administrativos ou jurisdicionais; não faria sentido declarar com força obrigatória geral um acto que, por si, não dispunha desta eficácia, mas de uma eficácia pessoal ou individual; e não se veria a utilidade que tal declaração pudesse vir a ter.

Estão argumentação não procede.

Já vimos que o facto de o acto administrativo (se é que assim pode qualificar-se) se conter em norma com força legal e, portanto, geral (com eficácia erga omnes e não apenas inter partes) é suficiente para lhe conferir o carácter de norma para o efeito do n.º 1 do artigo 281.º da Constituição.

[Pareceres, cit., p. 229. Itálicos originários.]

Esta doutrina, a doutrina, em suma, de que, para o efeito da fiscalização da constitucionalidade, havia de se fazer apelo a um conceito formal e não a um conceito material de norma, acha-se especialmente sancionada e desenvolvida no parecer 13/82. A esse respeito, aí se escreveu, com referência ao artigo 281.º, n.º 1, da versão originária da Constituição:

Antes de mais, é esse o significado mais corrente ou imediato da expressão - aquele que a associa (abstraindo agora das normas de direito não escrito) à representação de um «preceito» ou «disposição» estabelecido por acto do poder legislativo ou de um poder regulamentar, e constante do diploma que incorpora esse acto. E esta consideração terá maior valimento se puder dizer-se que a nossa Constituição não fornece «qualquer apoio para uma definição material de lei, como acto legislativo geral e abstracto», e quando a própria distinção entre os conceitos de lei em sentido material e lei em sentido formal se revela em crise na doutrina.

E logo a seguir:

Seja como for, é decerto seguro e indiscutível que a Constituição, ao prever o controle da constitucionalidade das «normas» jurídicas e ao fazê-lo quer no artigo 281.º quer no seguinte, teve em vista não toda a actividade dos poderes públicos, mas apenas um sector dela, a saber, o que se traduz na emissão de regras de conduta ou padrões de valoração de comportamentos (i. e., de «normas»): deste modo, fora deste específico controle ficam os puros actos de aplicação dessas regras ou padrões, que são os actos jurisdicionais e os actos administrativos, stricto sensu.

Mas de imediato se contrapunha:

Simplesmente - e este outro argumento será, em nosso modo de ver, decisivo -, cumpre atentar em que um preceito legal que rege para um caso concreto, e que nessa medida se apresenta com uma eficácia equivalente à de um acto administrativo, nunca é um puro acto de «aplicação» do direito preexistente, pois que simultaneamente se traduz num acto de «criação» de direito novo: é que nele estabelece-se também a regra aplicável ao caso, regra que muitas vezes (se não normalmente) constitui um desvio ou uma excepção às que de outro modo seriam aplicadas, mas que justamente se torna necessária para conferir à providência administrativa adoptada o seu mesmo fundamento (de validade «legal», claro).

E em nota esclarecia-se e reforçava-se aquela asserção:

De todo o modo, ainda quando o preceito em causa não representa qualquer desvio ao direito anterior, e nada lhe acrescenta prima facie, não deixa ele de produzir também um efeito normativo: o de tornar de antemão certo e indiscutível esse direito, no caso concreto.

De tudo isto se concluía que mesmo um preceito ou disposição legal de conteúdo individual e concreto e com eficácia consumptiva contém implícita uma «norma» que não deve ser subtraída à possibilidade de controle previsto no artigo 281.º, n.º 1, da Constituição.

3 - Também o Tribunal Constitucional, depois de haver tratado incidentalmente a questão (cf. os Acórdãos n.os 11/84 e 38/84, Diário da República, 2.ª série, de 8 de Maio de 1984, e Diário da República, 1.ª série, de 7 de Maio de 1984), desenvolveu-a com especial incidência no Acórdão 26/85, Diário da República, 2.ª série, de 16 de Abril de 1985.

Aqui se acentuou, com marcada nitidez, uma linha de rumo semelhante à traçada pela Comissão Constitucional, destacando-se agora, por mais significativos, os pontos seguintes:

a) Se é inquestionável que todo o sistema de fiscalização da constitucionalidade só pode ter por objecto normas (cf. o teor dos artigos 277.º e seguintes da Constituição), não é menos verdade que na averiguação e determinação do que seja «norma», para esse efeito, não pode partir-se de uma noção material, doutrinária e aprioristicamente estabelecida. E, designadamente, a ideia clássica que associa o conceito aos requisitos de «generalidade» e «abstracção» é de todo inservível, quando, cada vez mais, a própria doutrina questiona que tais requisitos constituam características infungíveis do conceito de norma jurídica. (Cf. Norberto Bobbio, «Norma giuridica», Novissimo dijesto italiano, vol. XI, pp. 331 e 333, e Livio Paladin, La legge come norma e come provvedimento, Giurisprudenza Costituzionale, 1969, pp. 871, 873 e 882);

b) A prática constitucional do nosso tempo denuncia a proliferação do fenómeno ou da figura das «leis medida» ou «leis providência», que traduzem a necessidade porventura insuprível, da intervenção directa do poder legislativo na complexa gestão político-administrativa (nas áreas económica, social, etc.) hoje exigida ao Estado, as quais se caracterizam, pelo menos em larga parte do seu conteúdo, por uma índole concreta e individualizada.

Seria manifestamente aberrante que tais leis - ou as suas «normas» integrativas - se subtraíssem ao controle da constitucionalidade, quando é manifesto que relativamente às mesmas é acrescido o risco e o temor do desrespeito pelas regras constitucionais;

c) Assim, o que há-de procurar-se, para o efeito do disposto nos artigos 277.º e seguintes da Constituição, é um conceito funcional de «norma», ou seja um conceito funcionalmente adequado ao sistema de fiscalização da constitucionalidade aí instituído e consoante com a sua justificação e sentido.

O que se tem em vista com esse sistema é o controle dos actos do poder normativo do Estado (lato sensu) - e, em especial, do poder legislativo -, ou seja daqueles actos que contêm uma «regra de conduta» ou «um critério de decisão» para os particulares, para a Administração e para os tribunais.

Não são, por conseguinte, todos os actos do poder público os abrangidos pelo sistema de fiscalização da constitucionalidade previsto na lei fundamental. A ele escapam, por um lado, as decisões judiciais e os actos da Administração sem carácter normativo e, por outro lado, os «actos políticos» ou «actos de governo», em sentido estrito. Uns e outros são actos de aplicação, execução ou simples utilização de «normas», seja de normas infraconstitucionais, seja de normas constitucionais.

Onde, porém, um acto do poder público for mais do que isso e contiver uma regra de conduta para os particulares ou para a Administração, ou um critério de decisão para esta ou para o juiz, aí estaremos perante um acto «normativo», cujas injunções ficam sujeitas ao controle de constitucionalidade.

É o que justamente sucede com os preceitos legais de conteúdo individual e concreto, ainda mesmo quando possuam eficácia consumptiva. Ao cabo e ao resto, estes preceitos têm como parâmetro de validade imediata não a lei («outra» lei), mas a Constituição. Nada justifica, assim, que o seu exame escape à jurisdição e à competência do Tribunal Constitucional.

E esta conclusão não consente que se fale num eventual conflito positivo de competência (ou de jurisdição) entre este Tribunal e os tribunais administrativos.

O controle da constitucionalidade e o controle da legalidade situam-se em «planos distintos» e não têm por que excluir-se mutuamente. No domínio da fiscalização abstracta, de que agora se cura, visa-se a norma contida nos preceitos questionados, enquanto no controle contencioso dos actos administrativos o objecto de apreciação é o acto da aplicação dos respectivos preceitos.

Na esteira das razões sumariamente expostas, adoptou-se o entendimento de que, para o efeito da fiscalização da constitucionalidade, o conceito de «norma» há-de ter um enquadramento formal e não material.

4 - Não existe qualquer razão ou argumentação acrescida para que esta linha jurisprudencial deva ser alterada ou inflectida.

À luz das considerações produzidas, é manifesto que os preceitos do Decreto-Lei 233/80, postas em causa no pedido, devem haver-se por normas para os fins do disposto no artigo 281.º da Constituição.

Tais preceitos têm de haver-se, desde logo, como normas, porquanto se acham vertidos no articulado de um acto formalmente legislativo (um decreto-lei).

Mas, admitindo-se e aceitando-se que o conceito tradicional e corrente de norma jurídica, com as suas características inerentes de generalidade e abstracção, não é já um conceito pacífico, em que a sua univocidade e permanência se possam manter em todas as situações, também numa perspectiva material se pode afirmar que naqueles preceitos se comporta um critério de decisão.

Com efeito, ali se define uma regra de acesso na carreira de escrivão de direito, de sentido diverso da regra geral que se acha estatuída no diploma sobre as carreiras dos funcionários de justiça.

A não ser essa regra e o critério de decisão que ela contém, o direito aplicável ao caso concreto seria outro e conduziria a uma diferente solução no plano material.

Assim, também aqui, dentro embora do circunstancialismo conceitual assinalado, mesmo num visionamento substancial dos preceitos questionados, sempre se poderá falar em normas jurídicas. (Cf. sobre a estrutura da norma jurídica e os critérios materiais e formais de distinção, Oliveira Ascensão, O Direito. Introdução e Teoria Geral, Lisboa, pp. 181 e segs.; Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso curso Legitimador, Coimbra, 1983, pp. 91 e segs.; Franco Modugno, «Norma giuridica», Enciclopedia del Diritto, vol. XXVIII, pp. 328 e segs., e Sérvulo Correia, Direito Administrativo, Lisboa, 1982, pp. 268 e segs.)

Acresce que, ao contrário do afirmado na resposta do órgão autor das normas questionadas, estas não contêm nem dão execução a um acto materialmente administrativo. Com efeito, os provimentos em causa sempre haveriam de se fundar em lista nominativa organizada nos termos e condições ali previstos e depois aprovada e autorizada por despacho ministerial.

Por si só aquelas normas não dão execução a qualquer caso concreto, pois que se limitam a definir um critério de decisão, confiando esta, porém, à esfera da actividade administrativa a exercitar em momento posterior.

Assim sendo, e sem necessidade de outras considerações, conclui-se no sentido da improcedência da questão prévia suscitada na resposta do Governo, prosseguindo-se, em consequência, a apreciação do mérito da causa.

III - Fundamentação legal

1 - Sustenta-se no pedido que as normas dos artigos 5.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei 233/80 se afastam do regime geral consagrado no Decreto-Lei 450/78, sem que para tanto sejam conhecidas razões aceitáveis nos planos da legalidade e da justiça, traduzindo a solução ali perfilhada um tratamento discriminatório em relação aos demais escrivães de direito, com manifesta violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição.

Importa, desde já, assinalar o quadro jurídico em que se inscrevem os preceitos postos em crise, por forma a poder avaliar-se da sua maior ou menor conformidade com os princípios gerais disciplinadores da matéria e da justeza das alterações ali estabelecidas face às situações materiais que as determinaram.

2 - A estrutura organizatória do quadro de oficiais de justiça, assim como as regras gerais de ingresso, acesso e mobilidade, nomeadamente dos escrivães de direito, achavam-se definidas aquando da edição do Decreto-Lei 233/80, no essencial, nos artigos 74.º, 100.º, 101.º, 102.º, 104.º, 105.º, 106.º, 136.º, n.os 1 e 4, e 149.º do Decreto-Lei 450/78, de 30 de Dezembro, que reestruturou as secretarias judiciais e as carreiras dos funcionários de justiça.

Tais preceitos eram do seguinte teor:

ARTIGO 74.º

(Quadro de oficiais de justiça)

1 - O quadro de oficiais de justiça compreende:

a) Secretários de tribunais superiores;

b) Secretários judiciais;

c) Escrivães de direito;

d) Escrivães-adjuntos;

e) Oficiais de diligências;

f) Escriturários judiciais.

2 - Os escrivães de direito são de 1.ª classe e de 2.ª classe.

ARTIGO 100.º

(Preferências)

1 - No provimento de lugares em secretarias de tribunais de competência especializada atender-se-á, de preferência, à formação especializada dos concorrentes.

2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, gozam de preferência sobre os demais concorrentes os funcionários que requeiram transferência, se possuírem classificação de serviço não inferior a Bom.

ARTIGO 101.º

(Transferências)

1 - Os funcionários de justiça podem requerer transferência decorridos dois anos sobre a data da posse.

2 - Constituem factores atendíveis a classe, a classificação de serviço, a antiguidade e a situação pessoal e familiar dos requerentes.

3 - Pode ser dispensado o requisito referido no n.º 1 quando o concurso para provimento de lugares das secretarias judiciais tenha ficado deserto pela segunda vez.

ARTIGO 102.º

(Condições de acesso)

É condição de acesso a prestação de efectivo serviço na categoria ou classe imediatamente inferior pelo período de três anos e a classificação mínima de Bom.

ARTIGO 104.º

(Secretários judiciais)

1 - Os lugares de secretário judicial são providos mediante concurso aberto a escrivães de direito de 1.ª classe declarados aptos em curso a definir por portaria do Ministro da Justiça.

2 - A nomeação efectua-se segundo a ordem de graduação dos candidatos nos respectivos cursos.

ARTIGO 105.º

(Curso para secretário judicial)

1 - A frequência do curso a que se refere o artigo anterior depende de requerimento dos interessados, sendo admitidos, de acordo com o número previsível de vagas, escrivães de direito de 1.ª classe com, pelo menos, três anos de serviço na classe e classificação não inferior a Bom, preferindo os mais bem classificados e, em caso de igualdade, os mais antigos.

2 - Os candidatos excluídos da frequência de curso por motivo injustificado e os julgados não aptos podem frequentar novo curso, por uma só vez, decorridos três anos sobre a conclusão do primeiro.

3 - A validade do curso é de cinco anos, contados sobre a data da sua conclusão.

ARTIGO 106.º

(Admissão ao curso)

1 - O número de candidatos a admitir a cada curso é estabelecido por despacho do Ministro da Justiça.

2 - A inscrição abre-se por aviso publicado no Diário da República, sendo de quinze dias a contar da publicação o prazo para envio dos requerimentos à Direcção-Geral dos Serviços Judiciários.

3 - Nos dez dias posteriores ao termo do prazo referido no número anterior a Direcção-Geral tornará pública a lista provisória dos candidatos admitidos.

4 - Os candidatos excluídos podem reclamar para o Ministro da Justiça no prazo de dez dias, devendo a reclamação ser decidida nos cinco dias subsequentes, publicando-se em seguida a lista definitiva.

ARTIGO 107.º

(Escrivães de direito de 1.ª classe)

1 - O acesso a escrivães de direito de 1.ª classe faz-se por promoção de escrivães de direito de 2.ª classe, de harmonia com a regra da antiguidade e observado o disposto no artigo 102.º

2 - O número de lugares de escrivães de direito de 1.ª classe é o correspondente a metade do total de lugares de chefe de secretaria e de escrivão de direito constantes dos mapas a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º

ARTIGO 108.º

(Escrivães de direito de 2.ª classe)

1 - O acesso a escrivães de direito de 2.ª classe faz-se por promoção, mediante concurso aberto a escrivães-adjuntos declarados aptos em curso organizado no âmbito do Ministério da Justiça.

2 - Ao concurso e à promoção é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 104.º a 106.º

ARTIGO 110.º

(Escrivães-adjuntos)

1 - O acesso a escrivão-adjunto faz-se por promoção, mediante concurso aberto a oficiais de diligências e a escriturários judiciais.

2 - Gozam de preferência os candidatos com melhor classificação de serviço e, em caso de igualdade, os mais antigos.

ARTIGO 136.º

(Transição para novos quadros)

1 - Os actuais secretários dos tribunais superiores, escrivães de direito de 1.ª classe e de 2.ª classe e oficiais de diligências transitam com idêntica categoria para os correspondentes cargos previstos no presente diploma.

2 - ...

3 - ...

4 - Consideram-se integrados:

a) Na 2.ª classe de escrivães de direito, os actuais escrivães de direito de 3.ª classe;

b) Na categoria de escrivão-adjunto, os actuais ajudantes de escrivão;

c) Na categoria de escriturário judicial, os actuais escriturários-dactilógrafos;

d) Na categoria de segundo-oficial, o actual encarregado da biblioteca da Repartição Administrativa da Relação de Lisboa.

5 - ...

ARTIGO 149.º

(Provimento dos lugares de secretário judicial e de escrivão de direito de 2.ª classe)

1 - Enquanto não for organizado o curso a que se refere o artigo 105.º, e até 31 de Julho de 1981, os lugares de secretário judicial são providos por contadores, funcionários do quadro dos antigos chefes de secretaria e escrivães de 1.ª classe se com, pelo menos, três anos de serviço efectivo em qualquer das categorias e classificação não inferior a Bom, preferindo os mais bem classificados e, em caso de igualdade, os mais antigos.

2 - Na situação prevista no número anterior e nas condições nele referidas, os lugares de escrivão de direito de 2.ª classe são providos por escrivães-adjuntos.

O Decreto-Lei 450/78 veio a ser ratificado, com emendas, pela Lei 35/80, de 29 de Julho, mantendo-se integralmente todos os preceitos transcritos, com excepção dos artigos 74.º, 104.º, 107.º e 149.º que sofreram alterações.

Para além do artigo 74.º, em cuja reformulação foi apenas modificada a designação de oficiais de diligências para oficiais judiciais, importa ter presente a redacção atribuída aos outros preceitos. Assim:

ARTIGO 104.º

1 - ...

2 - ...

3 - Os escrivães de direito que à data da publicação do presente diploma tenham pelo menos três anos de serviço na classe e classificação não inferior a Bom serão admitidos ao concurso para secretários judiciais, com dispensa de frequência do curso a que se refere o n.º 1.

4 - A nomeação efectua-se com preferência para os escrivães de direito dispensados da frequência do curso que possuem classificação de serviço superior ou igual à obtida na graduação dos candidatos aos respectivos cursos.

ARTIGO 107.º

1 - ...

2 - ...

3 - Na primeira lista de antiguidades e respectiva graduação dos escrivães de direito de 1.ª classe elaborada após a entrada em vigor deste diploma é dispensado o requisito de tempo de serviço na classe anterior.

ARTIGO 149.º

1 - Enquanto não for organizado o curso a que se refere o artigo 105.º, os lugares de secretário judicial são providos por contadores, funcionários do quadro dos antigos chefes de secretaria e escrivães de 1.ª classe com, pelo menos, três anos de serviço efectivo em qualquer das categorias e classificação não inferior a Bom, preferindo os mais bem classificados e, em caso de igualdade, os mais velhos.

2 - Enquanto não for organizado o curso a que se refere o n.º 1 do artigo 108.º, os lugares de escrivão de direito de 2.ª classe são providos por escrivães-adjuntos, nas condições previstas no número anterior.

No domínio do quadro normativo que vem de se assinalar, o regime de acesso às categorias de escrivão de direito de 1.ª classe e de 2.ª classe achava-se pautado pelos seguintes princípios:

O acesso a escrivão de direito de 1.ª classe é feito por promoção de escrivães de direito de 2.ª classe com, pelo menos, três anos de efectivo serviço na categoria e a classificação mínima de Bom;

O acesso a escrivão de direito de 2.ª classe faz-se por promoção, mediante concurso aberto a escrivães-adjuntos declarados aptos em curso organizado no âmbito do Ministério da Justiça. Enquanto este curso não funcionar, os lugares de escrivão de direito de 2.ª classe são providos por escrivães-adjuntos com, pelo menos, três anos de serviço efectivo na categoria e classificação não inferior a Bom, preferindo os mais bem classificados e, em caso de igualdade, os mais velhos.

Por outro lado, em conformidade com o artigo 83.º do Decreto-Lei 450/78 e a tabela a ele anexa, no plano do estatuto remuneratório foram atribuídas aos escrivães de direito de 1.ª classe e de 2.ª classe e aos escrivães-adjuntos, como letras de vencimento, respectivamente, as letras H, J e M.

Ulteriormente o Decreto-Lei 450/78 e a Lei 350/80 foram revogados pelo Decreto-Lei 385/82, de 16 de Setembro, que veio dispor, no lugar daqueles, sobre as secretarias judiciais e o estatuto do respectivo pessoal. Aliás, este último diploma sofreu depois diversas alterações, introduzidas pelo Decreto-Lei 320/85, de 5 de Agosto, por forma a beneficiar o funcionamento dos serviços e a corrigir alguns aspectos do estatuto do funcionalismo de justiça.

Todavia, os princípios gerais em matéria de organização da carreira de oficiais de justiça e respectivas regras de acesso mantêm-se idênticos, no essencial, aos definidos no Decreto-Lei 450/78 e na Lei 35/80, pelo que as considerações produzidas com referência a tal parâmetro de aferição conservam a sua pertinência quando sotopostas ao ordenamento jurídico ora vigente.

Postas estas considerações, reverte-se à apreciação específica do caso em presença.

3 - O Decreto-Lei 233/80, considerando «a necessidade de reparar uma situação atentatória do princípio legal da equiparação criada pela entrada em vigor do Decreto-Lei 450/78, de 30 de Dezembro», veio prescrever no seu artigo 1.º, n.º 1, que «os funcionários das secretarias dos tribunais administrativos têm as categorias, direitos, deveres, incompatibilidades, vencimentos e outros abonos que competem aos funcionários de justiça».

E, na sequência lógica daquele desiderato, dispôs no artigo 3.º que «as condições de categoria, antiguidade, classificação e habilitações para acesso aos lugares das categorias dos tribunais administrativos são as exigidas para os correspondentes lugares dos tribunais judiciais» (n.º 1), acentuando-se que às vagas dos tribunais administrativos podem concorrer também os funcionários dos tribunais judiciais e às vagas nestes os funcionários dos tribunais administrativos (n.º 2), sem prejuízo de estes últimos gozarem de preferência no provimento de lugares nos tribunais dessa especialidade (n.º 3).

Simplesmente, depois de o artigo 4.º preceituar que a integração dos funcionários do Supremo Tribunal Administrativo e das auditorias administrativas nas novas categorias se fará por lista nominativa aprovada pelo Ministro da Justiça, os artigos 5.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1 (normas postas em causa no pedido do Provedor de Justiça), foram assim formulados:

Art. 5.º - 1 - O lugar de escrivão de direito actualmente vago será preenchido, através da lista a que se refere o artigo anterior, de entre os actuais ajudantes de escrivão com classificação mínima de Bom e mais de três anos de serviço no Supremo Tribunal Administrativo.

2 - ...

Art. 6.º - 1 - Aos funcionários providos em lugares de escrivão de direito pela lista nominativa a que se refere o artigo 5.º é atribuída a categoria de 1.ª classe.

2 - ...

Quer dizer: contrariando a afirmação proclamada no preâmbulo do diploma de «reparar uma situação atentatória do princípio legal da equiparação criada pela entrada em vigor do Decreto-Lei 450/78», acaba por se consentir a transição de um ajudante de escrivão, remunerado pela letra Q, para o lugar de escrivão de direito de 1.ª classe, remunerado pela letra H, à margem das regras gerais de acesso prescritas no Decreto-Lei 450/78.

Na verdade, como das disposições finais e transitórias deste diploma se alcança, consideraram-se integrados na categoria de escrivão-adjunto os então ajudantes de escrivão [cf. o artigo 136.º, n.º 4, alínea b)], razão pela qual, aquando da equiparação dos funcionários das secretarias dos tribunais administrativos aos funcionários judiciais, os lugares de ajudante de escrivão constantes do quadro referido no artigo 6.º do Decreto-Lei 699/73, de 28 de Dezembro, deveriam ser convertidos em lugares de escrivão-adjunto, sendo neles integrados os respectivos titulares.

Todavia, o artigo 5.º, n.º 1, consentiu a transição para a categoria de escrivão de direito de um ajudante de escrivão, enquanto o artigo 6.º, n.º 1, prescreveu que aos funcionários providos em lugares de escrivão de direito pela lista nominativa referida naquele normativo seria atribuída a categoria de 1.ª classe.

Deste modo, sem precedência de concurso e sem a observância dos requisitos indispensáveis da classificação de serviço e do tempo de exercício efectivo de funções na categoria imediatamente anterior, possibilitou-se a transição directa do lugar de ajudante de escrivão para o de escrivão de direito de 1.ª classe.

Em obediência a que razões se operou este desvio às regras gerais assinaladas?

O diploma em que se inscrevem aqueles preceitos é totalmente omisso a este respeito, silenciando por inteiro sobre a eventual justificação daquelas medidas legislativas.

4 - Aqui chegados, cumpre averiguar se a situação excepcional autorizada pelas normas em presença, com as consequências já assinaladas, constitui ou não violação ao princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição.

Sabe-se que o sentido primário deste princípio consiste na proibição de discriminação e de privilégios:

Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, lugar, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.

Este o conteúdo do n.º 2 daquele preceito, cujos indicativos se revestem de natureza meramente exemplificativa.

O âmbito de protecção do princípio da igualdade abrange as seguintes dimensões: proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais; proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre os cidadãos baseadas em categorias meramente subjectivas ou em razão dessas categorias; obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a eliminação, pelos poderes públicos, de desigualdades fácticas de natureza social, económica e cultural. (Cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1.º vol., 2.ª ed., Coimbra, 1984, pp. 149 e segs.)

A proibição do arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controle.

Porém, a vinculação jurídico-material do legislador a este princípio não elimina a liberdade de conformação legislativa, pois lhe pertence, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão-de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente.

Só existe violação do princípio da igualdade enquanto proibição do arbítrio quando os limites externos da discricionariedade legislativa são afrontados por carência de adequado suporte material para a medida legislativa adoptada.

Por outro lado, as medidas de diferenciação devem ser materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da praticabilidade, da justiça e da solidariedade, não se baseando em qualquer motivo constitucionalmente impróprio.

Neste sentido se tem firmado a jurisprudência deste Tribunal (cf., por todos, o Acórdão 44/84, Diário da República, 2.ª série, de 11 de Julho de 1984).

A propósito do princípio de igualdade e dos seus desenvolvimentos doutrinais, cf. Jorge Miranda, o «Regime dos direitos, liberdades e garantias», Estudos sobre a Constituição, vol. III, pp. 50 e segs.; Gomes Canotilho, Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, Coimbra, 1982, pp. 380 e segs.; Lívio Paladin, Il princípio constituzionale d'eguaglianza, Milão, 1965; Claudo Rossano. L'eguaglianza giuridica nell'ordinamento costituzionale, Nápoles, 1966.

5 - A caracterização de uma norma como inconstitucional por violação do princípio da igualdade na sequência do exposto dependerá, em última análise, da ausência de fundamento material suficiente, isto é, falta de razoabilidade e consonância com o sistema constitucional.

No caso em apreço, as normas controvertidas possibilitaram que, no quadro da secretaria do Supremo Tribunal Administrativo, um funcionário com a categoria de ajudante de escrivão transitasse directamente para a categoria de escrivão de direito de 1.ª classe, com manifesto desacatamento dos princípios gerais.

Acaso aqueles preceitos contrariam, na sua formulação, o princípio da igualdade, em qualquer das dimensões que se lhe assinalaram?

Desde logo importa tratar separadamente as previsões contidas no artigo 5.º, n.º 1, e no artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei 233/80, porque se reportam a realidades autónomas e diferentes, se bem que complementares.

No artigo 5.º, n.º 1, consente-se que a vaga de escrivão de direito existente no quadro da secretaria do Supremo Tribunal Administrativo seja preenchida de entre os ajudantes de escrivão com classificação mínima de Bom e mais de três anos de serviço naquele Tribunal.

Achando-se previstos naquele quadro três lugares de escrivão de direito remunerados pelas letras H e J (1.ª classe e 2.ª classe), o provimento seria feito no lugar de ingresso da respectiva categoria (2.ª classe), e não em lugar de acesso (1 .ª classe), não fora a norma excepcional contida no artigo 6.º, n.º 1, que atribui a categoria de 1.ª classe aos funcionários providos em lugares de escrivão de direito ao abrigo da lista nominativa referida no artigo 5.º

Assim, estão em causa duas situações distintas e de conteúdo diferenciado: de um lado, a transição para o lugar de escrivão de direito de 2.ª classe; de outro, a promoção à categoria de escrivão de direito de 1.ª classe. Embora no plano da sua concretização estes dois momentos tenham coincidido, incorporando um único acto autorizador (a lista nominativa que integrou os funcionários do Supremo Tribunal Administrativo no quadro definido pelo mapa I anexo ao Decreto-Lei 233/80), é possível cindi-los quanto ao respectivo suporte legal e quanto à adequação deste ao texto constitucional.

A norma do artigo 5.º, n.º 1, que permitiu a transição de um ajudante de escrivão para o lugar de escrivão de direito de 2.ª classe, quando confrontada com a regra geral de ingresso nesta categoria funcional, revela tão-somente, como traço distintivo, a não realização do respectivo concurso; no mais, considerando a não organização no Ministério da Justiça de cursos para escrivão de direito, mostram-se coincidentes os requisitos ali impostos com os que constavam no Decreto-Lei 450/78.

Para além disso, o Decreto-Lei 233/80 estabeleceu a favor dos funcionários dos tribunais administrativos uma preferência legal no provimento de lugares nos tribunais dessa especialidade, em ordem a garantir a eficiência do serviço e a estabilidade das situações funcionais adquiridas. Assim sendo, mesmo que se tivesse aberto concurso para o provimento do lugar em causa, sempre os ajudantes de escrivão em exercício de funções nos tribunais administrativos beneficiariam de preferência sobre os eventuais candidatos oriundos dos tribunais judiciais, e daí que, no rigor das coisas, o resultado a alcançar seria idêntico ao ali perfilhado.

De tudo isto parece dever concluir-se conter suficiente justificação material a estatuição contida no artigo 5.º, n.º 1, da qual também não se antolha a ocorrência de prejuízos ou possibilidade deles para terceiros, nomeadamente para os funcionários judiciais.

O mesmo não se afirmará quanto ao artigo 6.º, n.º 1.

Como se viu, o acesso a escrivão de direito de 1.ª classe faz-se por promoção de escrivães de direito de 2.ª classe com três anos de efectivo serviço na categoria e a classificação mínima de Bom, de harmonia com a regra da antiguidade.

Ao atribuir a categoria de escrivão de direito de 1.ª classe a funcionários provindos do lugar de ajudante de escrivão, aquela norma não só colide frontalmente com as regras gerais disciplinadoras do acesso dentro da subcarreira de escrivão de direito, como também se revela de todo arbitrária e carente de qualquer justificação material plausível e aceitável.

Por outro lado, ao contrário do que se referiu a propósito da norma anterior, são agora evidentes os prejuízos causados a terceiros, no caso, a todos os escrivães de direito de 2.ª classe com mais antiguidade, que, deste modo, seriam preteridos no acesso à categoria imediatamente superior.

Parece seguro que o artigo 6.º, n.º 1, sem se radicar em qualquer especificidade atendível ou em qualquer situação diferenciada das demais que lhe são próximas e paralelas, acaba por impor uma solução desigual e arbitrária manifestamente para além do âmbito da liberdade de conformação legislativa.

Ao arrepio de qualquer critério justificado, são criadas situações desiguais por forma desrazoável, incoerente e à margem dos princípios e objectivos constitucionais no seu conjunto.

6 - Em conformidade com o artigo 282.º, n.º 1, da Constituição, a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade com força obrigatória geral produz efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional ou ilegal, podendo, porém, o Tribunal Constitucional, quando se verifiquem os pressupostos objectivos estabelecidos no n.º 4 daquele normativo, fixar os efeitos da inconstitucionalidade ou da ilegalidade com alcance mais restrito.

Considerando-se que ao abrigo da norma cuja inconstitucionalidade agora se declara foram praticados um ou mais actos administrativos de provimento, cabe averiguar quais as consequências daquela declaração sobre as situações concretas entretanto desencadeadas e constituídas.

A invalidação retroactiva de uma norma, mercê da declaração da sua inconstitucionalidade, repercute-se, necessária e automaticamente, de modo idêntico, sobre os actos que à sua sombra se praticaram?

No Acórdão 142/85, Diário da República, 2.ª série, n.º 206, de 7 de Setembro de 1985, houve ensejo de se tratar expressamente esta questão, escrevendo-se o seguinte:

Entre nós, no entanto, não existia (nem existe) disposição expressa semelhante. Por isso, na dúvida, e sem prejuízo de um eventual reexame do problema noutra oportunidade, partiremos do princípio de que a solução é diversa e se traduzirá na ineficácia, também retroactiva, dos actos em causa, ou seja na sua invalidade «sucessiva».

É que esse é o resultado que, pelo menos, está na lógica da declaração de invalidade da norma, isto é, do reconhimento, com efeitos ex tunc, da sua inconstitucionalidade: pois, com tal «invalidação», aqueles actos deixaram de ter fundamento legal, e deixaram de tê-lo a partir, naturalmente, do momento em que a mesma «invalidação opera».

Assim é, com efeito.

Sendo a norma nula desde a origem, por força de inconstitucionalidade, tornam-se igualmente inválidos não somente os efeitos directamente produzidos por ela (e daí a reposição em vigor de normas que haja revogado), mas também os actos jurídicos praticados ao seu abrigo (actos administrativos, negócios jurídicos, etc.). Neste sentido, cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 2.ª ed., 2.º vol., 1985, pp. 541 e segs.

No caso em presença, com base na norma do artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei 233/80, foram praticados um ou mais actos administrativos de provimento relativos a funcionários do quadro do Supremo Tribunal Administrativo.

Existem razões de equidade que justificam uma restrição de efeitos da declaração de inconstitucionalidade relativamente às remunerações até agora percebidas pelos funcionários ou funcionário em causa, podendo até sustentar-se que, mesmo na ausência dessa restrição, aqueles direitos sempre seriam salvaguardados.

IV - Decisão

Nestes termos, não se declara a inconstitucionalidade da norma do artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei 233/80, de 18 de Julho.

Todavia, declara-se com força obrigatória geral a inconstitucionalidade da norma do artigo 6.º, n.º 1, do mesmo Decreto-Lei 233/80, enquanto, conjugada com o artigo 5.º, n.º 1, também deste diploma legal, permite que o ajudante de escrivão que transitou para a categoria de escrivão de direito seja provido como escrivão de direito de 1.ª classe, inconstitucionalidade derivada da violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição.

Tendo em atenção razões de equidade, ao abrigo do disposto no artigo 282.º, n.º 4, da Constituição, restringem-se os efeitos da presente declaração de inconstitucionalidade, que não terá eficácia retroactiva relativamente às remunerações recebidas pelo funcionário provido ao abrigo da conjugação daquelas normas.

Lisboa, 11 de Março de 1986. - Antero Alves Monteiro Diniz - Raul Mateus - José Manuel Cardoso da Costa - António Luís Correia da Costa Mesquita - Mário Afonso - Vital Moreira - Messias Bento - José Magalhães Godinho.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2485537.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1973-12-28 - Decreto-Lei 699/73 - Presidência do Conselho

    Introduz alterações na orgânica do Supremo Tribunal Administrativo.

  • Tem documento Em vigor 1978-12-30 - Decreto-Lei 450/78 - Ministério da Justiça

    Reestrutura as secretarias judiciais e as carreiras dos funcionários de justiça.

  • Tem documento Em vigor 1980-07-18 - Decreto-Lei 233/80 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Justiça

    Determina que os funcionários das secretarias dos tribunais administrativos tenham as categorias, direitos, deveres, incompatibilidades, vencimentos e outros abonos que competem aos funcionários de justiça. Aprova e publica em mapas I a III anexos os quadros de pessoal das secretarias dos tribunais administrativos.

  • Tem documento Em vigor 1980-07-29 - Lei 35/80 - Assembleia da República

    Ratifica, com emendas, o Decreto-Lei n.º 450/78, de 30 de Dezembro que reestrutura as secretarias judiciais e as carreiras dos funcionários de justiça.

  • Tem documento Em vigor 1982-09-16 - Decreto-Lei 385/82 - Ministério da Justiça

    Reorganiza as Secretarias Judiciais.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1985-08-05 - Decreto-Lei 320/85 - Ministério da Justiça

    Introduz alterações ao Decreto-Lei n.º 385/82, de 16 de Setembro, que reorganizou as secretarias judiciais.

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