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Acórdão 74/2009, de 23 de Março

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Sumário

Decide não julgar inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 12.º do Estatuto do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 185/81, de 1 de Julho, na interpretação de que os contratos de provimento do pessoal docente especialmente contratado do ensino superior politécnico caducam quando não haja acto expresso de renovação. (Proc. nº 831/06)

Texto do documento

Acórdão 74/2009

Processo 831/06

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1. Gustavo Gramaxo Roseira propôs uma acção administrativa especial, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, contra o Instituto Politécnico do Cávado e Vale do Ave, pedindo a condenação deste a reconhecer a renovação tácita, por um biénio e com efeitos reportados a 1 de Março de 2005, do contrato administrativo de provimento consigo celebrado em 1 de Março de 2002 (como docente convidado equiparado a assistente) e, a título subsidiário, à prática de acto expresso de renovação

do mesmo contrato e pelo mesmo período.

Por sentença de 24 de Maio de 2006, a acção foi julgada improcedente.

Renunciando aos recursos ordinários, o autor interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro (LTC), visando a apreciação da constitucionalidade das seguintes normas do Estatuto da Carreira Docente do Ensino Superior Politécnico (ECDSP -

Decreto-Lei 185/81, de 1 de Julho):

"- art. 12.º, n.º 2 do ECDESP, no segmento em que aí se faz depender a renovação dos contratos administrativos de provimento do pessoal docente do ensino superior politécnico especialmente contratado de um acto expresso de renovação por parte da

Administração, por:

Inconstitucionalidade orgânica, decorrente de violação da reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República em matéria de função pública, consagrada no artigo 167.º, al. m), da redacção originária da CRP;

Inconstitucionalidade formal, decorrente de violação do direito fundamental de participação das organizações sindicais na elaboração da legislação do trabalho, consagrado no artigo 58.º, n.º 1, al. a), da redacção originária da CRP.

art. 12.º, n.º 2, conjugado com o artigo 14.º al. a), do ECDESP, na interpretação normativa segundo a qual a falta acto expresso de renovação dos contratos administrativos de provimento do pessoal docente do ensino superior politécnico especialmente contratado implica a caducidade destes contratos, não se impondo à Administração (leia-se: aos institutos politécnicos) o dever de proferimento de acto expresso e vinculado de renovação dos mesmos contratos quando estes não tenham sido objecto de denúncia nos termos e prazos previstos no artigo 14.º, al. a), do ECDESP - por inconstitucionalidade material, decorrente de violação dos princípios constitucionais da segurança no emprego e de proibição dos despedimentos sem justa causa, consagrados no artigo 53.º da CRP;"

2. Prosseguindo o recurso, o recorrente apresentou alegações em que sustentou as

seguintes conclusões:

"1.ª Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido nos autos de acção administrativa especial n.º 433/05.6BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga e tem por objecto a fiscalização sucessiva concreta da constitucionalidade do artigo 12.º n.º 2, do Estatuto da Carreira Docente do Ensino Superior Politécnico, aprovado pelo Decreto-Lei 185/81, de 1 de Julho.

2 - Sucede, porém, que o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, tal como foi aplicado sentença recorrida, é inconstitucional: por um lado, aquela norma padece de inconstitucionalidade orgânica e de inconstitucionalidade formal, por outro lado, a interpretação com que a douta sentença recorrida aplicou o complexo normativo formado pelo artigo 12.º, n.º 2, e pelo artigo 14.º, al. a), do ECDESP padece de

inconstitucionalidade material.

Vejamos então,

Quanto à inconstitucionalidade orgânica,

3.ª O ECDESP foi adoptado ainda na vigência da redacção originária da Constituição de 1976, cujo artigo 167.º, al. m), dispunha que as matérias relativas a "regime e âmbito da função pública" se incluíam na reserva relativa da competência legislativa da

Assembleia da República.

4.ª Incidindo o artigo 12.º n.º 2, do ECDESP sobre matéria relativa ao regime da função pública, e tendo o ECDESP sido aprovado por um decreto-lei emitido ao abrigo da competência legislativa concorrencial do Governo (sem autorização legislativa parlamentar), padece aquela norma de inconstitucionalidade orgânica.

5.ª Ainda que seja de prevalecer uma interpretação do artigo 167.º, al. m), da redacção originária da CRP no sentido de restringir o âmbito da reserva parlamentar apenas às "bases gerais" ou aos "princípios fundamentais" relativos ao regime jurídico do emprego público, em nada se altera porém o desvalor constitucional da norma do artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, na parte em que exige a prática de acto expresso de renovação dos contratos de provimento do pessoal docente especialmente contratado.

6.ª No Ac. TC n.º 142/85, esse Tribunal Constitucional teve já a ocasião de se pronunciar no sentido de que uma tal reserva legislativa abrange (realce adicionado) "[..] apenas, e compreensivamente, o estabelecimento do quadro de princípios básicos fundamentas daquela regulamentação, dos seus princípios reitores ou orientadores - princípios esses que caberá depois ao Governo desenvolver, concretizar e mesmo particularizar, em diplomas de espectro mais ou menos amplo (consoante o exigir a especificidade das situações a contemplar), e princípios que constituirão justamente o parâmetro e o limite desse desenvolvimento, concretização e particularização."

7.ª Indo mais longe, no Ac. TC n.º 285/92, esse Colendo Tribunal veio concluir que a inexistência de uma lei-quadro ou lei de bases da função pública "não implica que não existam consagrados em legislação avulsa princípios básicos fundamentais da regulamentação do regime da função pública e, existindo, pode deles extrair-se a existência de verdadeiras bases no sentido constitucional", reafirmando assim a jurisprudência já consagrada no Ac. TC n.º 154/86, segundo o qual, na falta de uma verdadeira e própria lei de bases, devem considerar-se como bases da função pública "todas as normas que, pela natureza e relevância das soluções que contenham, afectem aspectos que hajam de ser considerados como integrantes das bases do regime da

função publica".

8.ª De novo, agora no Ac. TC n.º 233/97, o Tribunal Constitucional veio reafirmar esta sua conclusão, repetindo ipsis verbis nesse aresto que "[F]altando uma lei de bases da função pública, podia o Governo legislar sobre a matéria. Questão é que, ao fazê-lo, não contrariasse os princípios básicos fundamentais, que pudessem extrair-se do ordenamento jurídico então vigente, atinentes a tal matéria. [§] É que - como se sublinhou no citado acórdão 142/85 - , a pretexto da inexistência de uma tal lei de bases, não podia ele editar normas que viessem substituir, modificar ou derrogar as bases efectivamente existentes", conclusão a que o Tribunal já havia chegado no Ac.

TC n.º 285/92.

9.ª Em síntese: apesar de à época da emanação do ECDESP não existir uma lei de bases da função pública, a verdade é que do conjunto dos diplomas então vigentes era possível extrair um núcleo de princípios básicos fundamentais que constituíam, então, as bases do regime jurídico do emprego público; essas bases formavam, pois, uma condição e limite do exercício, pelo Governo, da sua competência legislativa concorrencial, correspondendo a violação daquelas à invalidade constitucional da

formação governamental.

10.ª Ora, o regime geral vigente à data da aprovação do ECDESP era o da renovação tácita e sucessiva dos contratos de provimento na Administração Pública quando não denunciados tempestivamente, tal como resulta expressamente dos artigos 3.º e 4.º do Decreto-Lei 49.397, de 24 de Novembro de 1969 - cf., no mesmo sentido, o Ac.

TC n.º 233/97.

11.ª Trata-se, aliás, de um princípio que se mantém ainda nos dias de hoje como um princípio basilar do direito contratual dos trabalhadores da Administração Pública (cf. a esse propósito o artigo 16.º, n.º 2, do Decreto-Lei 427/89, de 7 de Dezembro): a exigência de acto expresso de renovação, mesmo no caso do contrato não ter sido denunciado tempestivamente, não tem paralelo em nenhum outro sector, corpo ou

carreira da Administração Pública.

12.ª O ECDESP adoptou para os contratos de provimento do pessoal docente especialmente contratado o princípio da renovação expressa - mesmo na falta de denúncia tempestiva do contrato - através da exigência de acto expresso de renovação constante do artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP.

13.ª Ou seja: um regime que é não só claramente diverso, como também flagrantemente oposto ao regime geral - ao quadro básico fundamental - então vigente, que era, como se acima demonstrou, o da renovação tácita previsto nos artigos 3.º e 4.º do

Decreto-Lei 49.397.

14.ª Não se trata, por conseguinte, de uma particularização ou adaptação do regime geral a um sector específico da Administração Pública - trata-se, isso sim, de uma norma excepcional que vem derrogar a aplicação do regime geral.

15.ª Tendo o Governo legislado acerca do regime dos contratos de provimento dos docentes especialmente contratados do ensino superior politécnico em moldes diversos do (e incompatíveis com o) regime básico e geral então vigente (e que se mantém ainda em vigor, embora a coberto de outro diploma legal), sem que para tal se encontrasse munido de adequada credencial parlamentar, a conclusão é simples: o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, na parte em que exige a prática de acto expresso de renovação dos contratos administrativos de provimento do pessoal docente especialmente contratado e assim exclui quanto a estes contratos o regime da renovação tácita e sucessiva quando não tenha havido denúncia nos termos e prazo legalmente previstos, é

organicamente inconstitucional.

16.ª Trata-se de matéria que bole com os princípios fundamentais do regime jurídico do emprego público, para cuja normação era competente apenas a Assembleia da República, ou o Governo com prévia autorização parlamentar desta.

17.ª Nunca poderia caber ao Governo, destituído de uma autorização legislativa parlamentar, desviar-se do regime geral de forma tão significativa, por maiores que fossem as especificidades do concreto sector da Administração Pública a ser alvo da

regulamentação.

18.ª A jurisprudência constante e uniforme do Tribunal Constitucional a respeito desta matéria não deixa margem para dúvidas: o poder normativo do Governo para a adopção de um regime especial aplicável a um particular sector da Administração Pública tem como limite os princípios resultantes das bases do regime jurídico do emprego público; só com adequada autorização parlamentar pode o Governo legislar afastando-se do regime resultante dessas mesmas bases.

19.ª Na falta de adequada autorização parlamentar, as normas emanadas do Governo que estejam em contradição com os princípios básicos do regime jurídico de emprego público são organicamente inconstitucionais.

20.ª Donde: o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, porque se trata de uma norma inserida num diploma legislativo governamental que estabelece um regime particular, contraditório e incompatível com o regime geral que, à época, se aplicava à renovação dos contratos administrativos de provimento dos agentes administrativos ao serviço da Administração Pública (e que resultava dos artigos 3.º e 4.º do Decreto-Lei 49.397), é organicamente inconstitucional, em violação do artigo 167.º, al. m), da

redacção originária da Constituição.

Quanto à inconstitucionalidade formal,

21.ª Há muito que é jurisprudência assente do Tribunal Constitucional que a legislação do trabalho há-de ser a que visa regular as relações individuais e colectivas de trabalho, bem como os direitos dos trabalhadores, enquanto tais, e das suas organizações - cf.

Ac. TC n.º 451/87; Ac. TC n.º 262/90; Ac. TC n.º 61/91; Ac. TC n.º 355/91; Ac. TC n.º 93/92; Ac. TC n.º 124/93; e Ac. TC n.º 430/93.

22.ª Trata-se de um direito ancorado directamente no próprio texto constitucional e independente, quanto à sua eficácia, da mediação do legislador ordinário - mesmo quando falte de todo qualquer tipo de mediação legislativa; e já assim o era na vigência da redacção originária da Constituição - cf. Ac. TC n.º 31/84.

23.ª O artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP seja porque se insere num diploma legal que define o estatuto de uma carreira de trabalhadores da Administração Pública, seja porque regula o modo de renovação dos contratos de provimento do pessoal docente politécnico especialmente contratado é uma norma subsumível no conceito constitucional de legislação do trabalho - cf. em sentido análogo o Ac. TC n.º 93/92.

24.ª Não pode, pois, albergar-se qualquer dúvida de que na elaboração do artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP - a norma cuja aplicação está em causa nos presentes autos - deveriam ter participado as organizações sindicais representativas dos trabalhadores, nos termos do artigo 58.º, n.º 2, al. a), da redacção originária da CRP.

25.ª Do preâmbulo do diploma que aprovou o ECDESP (o Decreto-Lei 185/81, de 1 de Julho) não consta qualquer referência à audição de organizações representativas dos trabalhadores - seja daquelas representativas especificamente dos trabalhadores afectados pelo diploma, seja das organizações sindicais em geral.

26.ª "Uma vez que não consta do preâmbulo do diploma que na sua elaboração foram ouvidas as organizações representativas dos trabalhadores, tem de se presumir que não ocorreu tal audição" (Ac. TC n.º 451/87); "não se fazendo qualquer referência nos textos preambulares dos diplomas a uma eventual audição das organizações representativas dos trabalhadores se há-de presumir que tal audição se não concretizou competindo ao órgão autor da norma operar a sua ilisão" (Ac. TC n.º 93/92).

27.ª É certo que essa falta de menção constitui uma mera presunção do não exercício da participação, podendo tal presunção ser ilidida, mas precisamente porque de uma presunção se trata seria imprescindível que tivesse ficado provado nos autos que a participação das organizações de trabalhadores teve efectivamente lugar para que se pudesse concluir, como se fez na sentença recorrida, por um juízo negativo de

inconstitucionalidade daquela norma.

28.ª É, de igual modo, errado o pressuposto, presente na decisão ora recorrida, de que nenhuma disposição legal impõe, ou impusesse à época da adopção da norma sindicada, este tipo de menção preambular à época impunham, precisamente, uma tal referência no preâmbulo dos decretos-lei governamentais (i) o artigo 7.º, n.º 4, da Lei 3/76, de 10 de Setembro, relativa à publicação, identificação e formulário dos diplomas; e (ii) o artigo 7.º 11.0 2, al. a), da Lei 16/79, de 26 de Maio (relativa à participação das organizações de trabalhadores na elaboração da legislação do

trabalho).

29.ª Mais: o artigo 4.º da cit. Lei 16/79 impunha igualmente a publicação em separata do Boletim do Trabalho e do Emprego dos projectos de diplomas governamentais que incidissem sobre legislação do trabalho, não resultando provado nos autos que uma tal publicação tenha tido lugar.

30.ª Daí que a falta de qualquer menção, no preâmbulo do Decreto-Lei 185/81, à participação das organizações sindicais aliada à circunstância de não ter ficado provado nos autos que essa participação tenha efectivamente tido lugar não pode deixar de conduzir à presunção de que as organizações sindicais não foram chamadas a participar, nem participaram, na elaboração do ECDESP.

31.ª Consequentemente, terá de concluir-se pela formulação de um juízo de inconstitucionalidade do artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, no segmento em que aí se faz depender a renovação dos contratos de provimento do pessoal docente do ensino superior politécnico especialmente contratado de um acto expresso de renovação - segmento normativo cuja aplicação está em causa nos presentes autos - por violação do artigo 58.º, n.º 2, al. a), da redacção originária da CRP.

Quanto à inconstitucionalidade material,

32.ª Na acção a quo formulou-se ainda, a título subsidiário, o pedido de condenação da Entidade Demandada, ora Recorrida, à prática do acto administrativo de renovação do contrato de provimento celebrado com o ora Recorrente, fundamentando-se esse pedido subsidiário no facto de, a ser aplicável o al. 12.º, n.º 2, do ECDESP, a Entidade Recorrida estar em qualquer caso obrigada à prolação do acto administrativo de renovação do contrato, por este se tratar de um acto vinculado quer quanto ao seu

conteúdo, quer quanto à sua oportunidade.

33.ª O acto de renovação dos contratos administrativos de provimento do pessoal docente do ensino superior politécnico especialmente contratado é um verdadeiro acto administrativo - trata-se de uma decisão unilateral de um órgão da Administração ao abrigo de uma norma de direito público e no uso do jus imperii que produz efeitos numa situação individual e concreta constituindo ou modificando uma relação jurídica de

emprego público.

34.ª No fundo, a questão que aqui se coloca resume-se muito simplesmente a uma questão de interpretação jurídica - a de saber se o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP estabelece uma causa de caducidade dos contratos administrativos de provimento ou se, pelo contrário, impõe à Administração uma injunção de prolação de um acto expresso de renovação dos contratos de provimento sempre que não se verifique qualquer uma das situações previstas no artigo 14.º do mesmo diploma legal.

35.ª Com efeito, prevê-se na alínea a) do artigo 14.º a denúncia como uma das causas de extinção da relação jurídica de emprego público dos docentes do ensino superior politécnico providos por contrato de provimento: os contratos podem ser rescindidos por denúncia, de qualquer das partes contratantes, até 30 dias antes do termo do

contrato.

36.ª Ora, a interpretação do artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP tem necessariamente de ser articulada com o disposto no artigo 14.º, al. a), do mesmo diploma estatutário.

37.ª Se por um lado o legislador previu a denúncia como causa de extinção da relação jurídica contratual e se, por outro lado, a renovação do contrato depende da prática pela Administração de um acto expresso de renovação, da conjugação de ambas as disposições se conclui que a prática do acto expresso de renovação constitui, para a Administração, uma conduta vinculada, sempre que o contrato não tenha sido tempestivamente denunciado e não se verifique qualquer uma das outras causas de rescisão contratual previstas no artigo 14.º do ECDESP.

38.ª É esta a única interpretação que concilia o artigo 12.º, n.º 2, e o artigo 14.º, al. a), do ECDESP, permitindo que cada uma delas produza plenamente os efeitos para que

tende.

39.ª Sustenta a sentença recorrida que o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP prescreve uma causa de extinção dos contratos administrativos de provimento do pessoal docente politécnico especialmente contratado, que é autónoma e adicional às causas de rescisão elencadas no artigo 14.º do mesmo diploma: uma tal interpretação, salvo o devido respeito, no sentido da não vinculação para a Entidade Recorrida da prolação do acto de renovação do contrato, quando este não foi tempestivamente denunciado esvazia de qualquer conteúdo útil a previsão da denúncia contratual como causa extintiva da relação jurídica contratual, no artigo 14.º, al. a), do ECDESP.

40.ª E é, além do mais, inconstitucional.

41.ª Entender-se, por conseguinte, que a falta de denúncia tempestiva dos contratos administrativos de provimento do pessoal docente do ensino superior politécnico especialmente contratado, nos termos do artigo 14.º, al a), do ECDESP, não impõe à Administração (leia-se: aos institutos politécnicos) o dever de proferir acto expresso e vinculado de renovação dos mesmos contratos, e que o artigo 12.º n.º 2, do ECDESP importa, nesses casos, a caducidade do contrato, ainda que não tempestivamente denunciado nem se verificando qualquer das restantes causas extintivas estabelecidas no artigo 14.º do referido diploma, corresponde a uma interpretação normativa das normas em causa ferida de inconstitucionalidade material.

42.ª Está em causa, na referida interpretação, o direito fundamental à segurança no emprego (art. 53.º da CRP), em especial na sua dimensão de garantia constitucional de proibição de despedimentos sem justa causa.

43.ª Na interpretação sufragada pela sentença recorrida, o silêncio e a inércia da Administração implicariam a cessação da relação jurídica de emprego (rectius, o despedimento do trabalhador): esta interpretação fere, no seu núcleo mais essencial e de forma desproporcionada, o direito fundamental à segurança no emprego e a garantia de proibição de despedimentos sem justa causa.

44.ª Os agentes administrativos - como é o caso do Recorrente - apesar de não gozarem do princípio da vocação à carreira, não deixam de gozar do direito à segurança no emprego (Ac. TC n.º 154/86 e Ac. TC n.º 258/92), sendo certo que, quanto a estes agentes, o direito à segurança no emprego sofre restrições significativas, mas sempre orientadas pelo princípio da proporcionalidade e pelo respeito pelo conteúdo essencial desse direito fundamental.

45.ª Recordemos que, além do mais, o ECDESP prevê a renovabilidade sucessiva destes contratos de provimento e impõe, no artigo 14.º al. a), um certo prazo dentro do qual é lícito a qualquer uma das partes denunciar o contrato, com vista a impedir a sua

renovação.

46.ª Quer isto dizer então, que quando o contrato não é tempestivamente denunciado (e não se verificando qualquer uma das restantes causas extintivas elencadas no artigo 14.ª do ECDESP) cria-se, nas partes e em especial no trabalhador, uma expectativa relativamente à sua renovação - e esta é uma expectativa digna de tutela constitucional.

47.ª Dito de outro modo: o direito à segurança no emprego, neste particular tipo de situações de contratos precários, protege o direito dos trabalhadores ao emprego durante o exacto período da sua duração, tal como protege as legítimas expectativas quanto à renovação do contrato, naqueles casos em que o contrato não foi denunciado por qualquer das partes nos termos e prazos legalmente previstos.

48.ª Admitir-se, pois, que o silencio e a inércia da Administração empregadora - o simples non far niente - é apto a repercutir-se, com consequências tão drásticas, na esfera jurídica do trabalhador, conduzindo à caducidade da relação de emprego é uma interpretação violadora do artigo 53.º da CRP.

49.ª Repare-se: o artigo 53.º da CRP proíbe os despedimentos sem justa causa: é de todo inadmissível aceitar que o silêncio e a inércia da Administração possam constituir uma causa constitucionalmente justa de despedimento.

50.ª No mínimo, para assegurar a salvaguarda do conteúdo essencial do direito à segurança no emprego seria de exigir à Administração empregadora uma conduta positiva (i. é: um acto de denúncia ou rescisão contratual) que viesse a por termo à

relação jurídica de emprego.

51.ª De outro modo, o trabalhador, que já contava legitimamente com a expectativa de renovação do contrato em face da falta de denúncia, ver-se-á surpreendido inesperadamente e inexpectavelmente pela caducidade do seu contrato de provimento.

52.ª O Tribunal Constitucional, no seu Ac. TC n.º 233/97 veio implicitamente reconhecer o que se acabou de afirmar, ao afirmar neste aresto que "a estabilidade no emprego, vai implicada na garantia da segurança no emprego, compreendendo, embora, o direito a manter o lugar [...] também não obsta a que - ao menos quando o serviço revista certas especificidades - a Administração possa denunciar ou rescindir o

contrato".

53.ª Em síntese: no caso dos trabalhadores da Administração Pública providos por contratos administrativos de provimento, o direito fundamental à segurança no emprego protege também a expectativa do trabalhador na renovação do termo contratual, quando o contrato não tenha sido denunciado ou rescindido nos termos e nos prazos

legais.

54.ª Conclusão que é particularmente reforçada, repita-se, pelo facto de o próprio clausulado do contrato em causa nos presentes autos prever a renovabilidade sucessiva por períodos bienais, sem estabelecer quaisquer limites quanto a essa renovabilidade - isto é, não foram convencionados pelas partes nem um número máximo de renovações, nem um período máximo de vigência contratual para além dos quais o contrato não poderia ser renovado: o contrato, por conseguinte, era renovável ad infinitum por

sucessivos períodos de dois anos.

55.ª Acresce que na sequência da jurisprudência firmada pelos Ac. TC n.º 183/92, Ac.

TC n.º 353/94, Ac. TC n.º 162/95 e Ac. 233/97, o direito fundamental à segurança no emprego e a garantia de proibição de despedimentos sem justa causa, no que aos trabalhadores providos por contratos precários diz respeito, protegem também o direito a uma compensação de natureza indemnizatória pela cessação da relação jurídica de

emprego.

56.ª Ora, a interpretação sufragada na sentença recorrida (no sentido que o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP corresponde a uma causa autónoma de caducidade dos contratos de provimento do pessoal docente politécnico especialmente contratado, mesmo nos caso em que não tenha havido denúncia contratual) suprime totalmente este direito à indemnização protegido pelo artigo 53.º da CRP: admitir-se que um contrato de provimento, renovável por sucessivos períodos bienais, possa caducar por falta de acto expresso de renovação, sem que simultaneamente se assegure ao trabalhador uma indemnização compensatória pela cessação da relação de emprego, viola o direito fundamental à segurança no emprego e a garantia constitucional de proibição de despedimentos sem justa causa, consagradas no artigo 53.º da CRP, agora entendido nesta dimensão de garantia de um direito a uma indemnização pela cessação da relação

jurídica de emprego.

57.ª É pacífico na doutrina que, na presença de várias interpretações possíveis, umas constitucionais outras inconstitucionais, o intérprete deve optar por aquela ou de entre aquelas que sejam constitucionalmente conformes.

58.ª Ora, o complexo normativo formado pelos artigos 12.º, n.º 2, e 14.º, al. a), do ECDESP admite duas interpretações possíveis:

Por um lado, a hipótese sufragada pela sentença recorrida, segundo a qual o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP estatui uma causa autónoma de extinção da relação contratual (: caducidade), cuja verificação se dá sempre que não for proferido, pela Administração, um acto expresso de renovação do contrato, independentemente de ter ou não havido lugar a denúncia contratual com a antecedência e nos termos legalmente

previstos;

Por outro lado, a interpretação segundo a qual aquelas duas disposições do ECDESP tem de ser interpretadas conjugadamente, no sentido em que não obstante se exigir a prolação, pela Administração, de um acto expresso de renovação para que a renovação contratual se opere, esse acto tem natureza vinculada, quanto ao objecto e quanto à oportunidade, sempre que o contrato não tenha sido tempestivamente denunciado nem se verifique qualquer outra das causas extintivas elencadas no artigo

14.º do ECDESP.

59.ª Assim sendo, é manifesto que a primeira daquelas interpretações (precisamente a que foi sufragada na sentença recorrida) viola o direito fundamental à segurança no emprego e a garantia constitucional de proibição de despedimentos sem justa causa consagrados no artigo 53.º da CRP, seja porque constitui um restrição desproporcionada desse direito e garantia, seja porque diminui o alcance e extensão do

seu conteúdo essencial.

60.ª Daí que, a interpretação dada na sentença recorrida ao complexo normativo formado pelos artigos 12.º, n.º 2, e al. a), do ECDESP padeça de inconstitucionalidade material por violação do artigo 53.º da CRP Termos em que, e nos demais de direito, deve o presente recurso de constitucionalidade proceder, julgando-se inconstitucional a norma ou o complexo

normativo impugnados."

O recorrido contra-alegou, concluindo nos termos seguintes:

"1 - No presente recurso do Acórdão emitido nos autos da acção administrativa especial, que correu termos no Proc. n.º 433/05.6BEBRG, vem o recorrente defender a inconstitucionalidade orgânica e a inconstitucionalidade formal do artigo 12.º, n.º 2, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECDESP), aprovado pelo Decreto-Lei 185/81, de 1 de Julho; e, por outro lado, que a interpretação com que o douto Acórdão recorrido aplicou o complexo normativo formado pelo artigo 12.º, n.º 2 e pelo artigo 14.º, alínea a), do ECDESP padece de

inconstitucionalidade material.

No entanto, considera-se que não assiste razão ao Recorrente pelas seguintes razões,

Inconstitucionalidade Orgânica

2 - Importa, antes de mais precisar o seguinte:

Em 1 de Março de 2002 foi celebrado um contrato administrativo de provimento entre o Recorrente e o Recorrido pelo prazo de um ano;

Esse contrato foi renovado com efeitos a 1 de Março de 2003 pelo conselho científico da Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave (artigo

12.º, nº1, do ECDESP);

Não fora a renovação precedida de deliberação favorável do conselho científico e já teria caducado o ajuizado contrato (artigo 12º, nº2, do ECDESP);

Como o contrato administrativo de provimento não foi objecto de nova deliberação favorável por parte do referido conselho científico, em 28 de Fevereiro de 2005, o contrato caducou, extinguindo-se todos os direitos dele emergentes, nomeadamente, o direito aos vencimentos e subsídios legais e o direito à prestação efectiva de trabalho através da distribuição de serviço docente.

3 - Ao contrário do que entende o Recorrente, o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, não sofre de inconstitucionalidade orgânica, porque o facto do mesmo ter sido aprovado pelo Governo, sem estar munido de prévia autorização da Assembleia, não significa que desrespeitou o disposto na alínea m) do artigo 167.º da redacção originária da Constituição da Réplica Portuguesa (CRP) - que corresponde à alínea t) do n.º 1 do artigo 165.º, da actual redacção - e que incluía no âmbito da reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República as matérias atinentes ao "regime e

âmbito da função pública".

4 - Pois, a Jurisprudência é unânime ao defender que: na reserva de competência da Assembleia da República caberia apenas a definição do 'estatuto geral da função pública', aquilo que é comum e geral a todos os funcionários e agentes, aí se compreendendo, designadamente, 'a definição do sistema de categorias, de organização de carreiras, de condições de acesso e recrutamento, do complexo de direitos e deveres funcionais que valem, em princípio, para todo e qualquer funcionário público e que, por isso mesmo, favorecem o enquadramento da função pública como um todo, dentro das funções do Estado ao Governo competiria, para esta jurisprudência, a 'concretização' desse estatuto geral, ou seja, 'quer o desenvolvimento de tais princípios, quer a sua aplicação e adaptação aos sectores que exijam um regime particular específico ou até excepcional' "(Cf. Ac. do n.º 129/99, in http://www.tribunalconstitucíonal Ac. n.º Convencional ACTC6O19, in http://www.dgsi.pt; Ac. n.º 76/86, publicado no DR, 2.ª série, de 12/06/1986; Parecer do Conselho Consultivo da PGR, n.º 27/88, in http://www.dgsi.pt).

5 - Acompanha-se, assim, com a devida vénia o douto Acórdão recorrido que sufraga este entendimento e que está de acordo com a mais avisada opinião da Comissão Constitucional sobre este tema, explanada, nomeadamente, nos seus Pareceres n.º s

22/79 e 12/82.

Pois a redacção da referida norma da Lei Fundamental, à data da emissão do ECDESP, não impedia que o Governo actuasse de forma a regular a aplicação e o desenvolvimento dos referidos princípios da função pública e a sua adaptação a sectores mais específicos, cuja singularidade das funções que lhe estavam acometidas obrigava a soluções e formas de actuação diferenciadas.

6 - O artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, na parte em que exige que a renovação dos contratos administrativos de provimento do pessoal docente especialmente contratado seja precedida de parecer favorável do conselho científico, não viola qualquer princípio básico fundamental da função pública, integrante do ordenamento jurídico vigente, ou seja, o alegado princípio fundamental da renovação tácita e sucessiva dos contratos administrativos de provimento que não sejam tempestivamente denunciados.

Na verdade, não obstante ser correcto dizer-se que, apesar de não existir uma Lei Quadro da Função Pública, existem determinados princípios fundamentais que norteiam a constituição, desenvolvimento e extinção da relação de emprego público, não pode considerar-se "a renovação tácita e sucessiva dos contratos administrativos de

provimento" como um desses princípios.

7 - O Recorrente, com as suas alegações, pretende subverter, a bem da sua pretensão, os fundamentos do regime da função pública, erigindo princípios básicos fundamentais a seu belo prazer e conveniência para, de seguida, quando lhe convém, fazer tábua rasa da própria lei e de tudo o quanto o próprio disse.

Pois, se por um lado fundamenta a sua contratação no artigo 8.º e a renovação do seu contrato, por um biénio, no artigo 12.º, n.º 1, do ECDESP, por outro lado, pretende que o n.º 2 do artigo 12.º do mesmo Estatuto seja considerado inconstitucional.

8 - Na página 13 do Acórdão recorrido está bem patente esta realidade quando se diz

que:

"No que concerne, por último, a alegação de a norma em apreço consagrar princípio aposto ao regime geral vigente à data de entrada em vigor do ECDESP, sempre se dirá que tal não constitui violação da reserva legislativa em apreço, dado o corpo legislativo em apreço ter como escopo regular um regime particular aplicável a um sector especial da função pública - os docentes do ensino superior politécnico - de que constitui aliás, um exemplar flagrante o artigo 8.º do aludido estatuto que permite a contratação de pessoal especialmente contratado sem prévia submissão a concurso, norma que possibilitou a contratação, pelo R., do A. e que também constitui excepção à regra de contratação, mediante concurso prévio, de servidores do Estado em geral"

9 - Ora, o Governo, ao aprovar o ECDESP, limitou-se a definir um regime particular e específico que se pretendia aplica a um sector, um corpo especial da função pública, que pelas características, exigências e especialidade das funções que desempenha, não se coaduna com o regime geral da função pública.

10 - Pelo exposto, o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, na parte em que exclui a renovação tácita e sucessiva dos contratos administrativos - ainda, que não tenha havido denúncia tempestiva - não padece de inconstitucionalidade orgânica.

Inconstitucionalidade Formal

11 - Também, não se aceita a posição do Recorrente quando defende que o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, sofre de inconstitucionalidade formal, porque, segundo o mesmo, aquando da aprovação do referido diploma - tratando-se de uma norma referente à "legislação do trabalho" - como as associações sindicais não participaram na sua elaboração foi violado o disposto na aliena a) do n.º 2 do artigo 58.º, da versão originária da CRP (que corresponde ao artigo 56.º, n.º 2, al. a), da actual CRP).

12 - Impõe-se dizer, por um lado, que não se acompanha a classificação do referido vício que o Recorrente faz - pois, aquela falta de participação, a existir, determinaria, mais precisamente, um vício de procedimento, inserindo-se no tipo de vícios "...que dizem respeito ao procedimento de formação, juridicamente regulado, dos actos normativos." (Prof. Doutor Gomes Canotilho, in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 5 ed., Almedina, pág. 949); por outro lado, desconhece-se se a referida participação foi ou não promovida, pois foi o Governo que aprovou o ECDESP e não foi possível ter acesso aos documentos que serviram de base à sua discussão e

aprovação.

13 - Porém, a existir a referida falta de participação, entende-se que à data de aprovação do ECDESP o direito de participação na elaboração da legislação do trabalho não estava integrado no capítulo dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores do texto originário da Constituição, mas, sim, no capítulo dos direitos e

deveres económicos, sociais e culturais.

Afigura-se, assim, que o mesmo direito não podia beneficiar do regime próprio previsto no artigo 18.º, n.º 1, da versão originária da CRP, que dispunha sobre a aplicação directa dos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias e a vinculação de todas as entidades públicas e privadas ao seu cumprimento. De forma que, para que o referido direito de participação fosse aplicável directamente era necessário que o legislador ordinário o concretizasse num diploma legal.

14 - Sendo que, aquando da data de aprovação do ECDESP, não existia um diploma que regulasse a participação das associações sindicais na elaboração da legislação de trabalho da função pública, pois a Lei 16/79, de 26 de Maio, não se aplicava às relações de emprego público, mas às relações individuais e colectivas de trabalho no

sector privado.

O direito de participação das associações sindicais na elaboração da legislação do trabalho só foi expressamente integrado no capítulo referente aos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores após a revisão constitucional de 1982, o que significa que o referido direito, só após esta data, passou a ser directamente aplicável, ainda, que não estivesse regulamentado pelo legislador ordinário (Cf. Jorge Miranda, Rui Medeiros, in Constituição Portuguesa Anotada, Tomo 1, 2005, Coimbra Editora, pág.555).

15- Esta abertura e incompletude das normas constitucionais que consagravam o direito de participação, no texto originário, e a inexistência de um diploma regulador da matéria da audição das associações sindicais no âmbito da função pública, determinavam que a alínea a) do n.º 2 do artigo 58.º, do texto originário da CRP, não fosse aplicável à elaboração da legislação de trabalho referente à função pública

aquando da data de aprovação do ECDESP.

16 - Com efeito, só com a aprovação do Decreto-Lei 45-A/84, de 3 de Fevereiro, foi regulamentado o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública, constando do próprio preâmbulo a explicação de que a Lei 16/79, de 26 de Maio,

não se lhes aplicava.

17 - Por outro lado, mesmo que assim não se entenda - o que não se concede a não ser, à cautela, a título de hipótese - acompanha-se o expendido na pág. 15 do douto Acórdão recorrido, sobre a ausência de referência à referida participação no preâmbulo do Decreto-Lei que aprovou o ECDESP, pois:

"Não é menos certo, porém, que desse silêncio não é legítimo retirar qualquer ilação, nem a título de mera presunção, assente em dados da experiência, uma vez que nenhuma disposição legal impõe menções desse tipo nem, no caso de leis da Assembleia da República, como o presente, constitui prática incluí-las preambularmente (mesmo quando figurem nos projectos ou propostas de lei não têm acolhimento no texto final, no correspondente Decreto, observa, a propósito dos preâmbulos, António Vitorino, "Preâmbulo e Nota Justificativa ' in A Feitura das Leis, volume II, pág. 129)"

Ora, não se aplicando o disposto na Lei 16/79, de 26 de Maio, aos trabalhadores da função pública - conforme resulta do próprio preâmbulo do Decreto-Lei 45-A/84, de 3 de Fevereiro - é forçoso concluir que não existia nenhuma norma, à data da aprovação do ECDESP, que impusesse a menção à discussão pública no preâmbulo do Decreto-Lei que aprovou o referido Estatuto, pelo que da sua falta não se pode presumir que tal direito não foi exercido se se considerar que o mesmo era directamente aplicável na elaboração da legislação de trabalho no âmbito da função

pública.

18 - Pelo exposto, o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, não padece de inconstitucionalidade formal pelo facto de não terem participado na sua elaboração as organizações sindicais representativas dos trabalhadores, ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 58.º, do texto originário da CRP, nem da falta de menção à referida participação no preâmbulo do diploma que aprovou o ECDESP, donde consta a referida norma, se pode presumir que a mesma não teve lugar.

Inconstitucionalidade Material

19 - Dispõe o artigo 12.º, n.º 1, do ECDESP, que:

"O pessoal docente equiparado nos termos dos n.os 1, 2, 3 e 4 do artigo 8.º do presente diploma, bem como os encarregados de trabalhos a que se refere o n.º 5 do mesmo preceito, serão providos mediante contrato inicial de um ano renovável por

períodos bienais" (sublinhado nosso).

Por outro lado, dispõe o n.º 2 do referido artigo 12.º que:

"...As renovações a que se refere o número anterior deverão ser expressas e fundamentadas em deliberação favorável do conselho científico." (sublinhado nosso).

Se, por um lado, por estes dois motivos e em cumprimento dos mesmos, ficou afastada a validade legal de toda e qualquer renovação tácita ou não fundamentada em deliberação favorável do conselho científico, dos contratos celebrados no seu âmbito, por outro lado o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 12.º só podem existir e ter sentido se forem

lidos conjugadamente.

Porque se o n.º 1 regula a duração dos contratos e determina a possibilidade da sua renovação é no n.º 2 que está prevista a forma a que obedecerá a referida renovação.

20 - Não tendo existido uma deliberação favorável expressa do conselho científico, em 28 de Fevereiro de 2005, o contrato celebrado com o Recorrente não se renovou, pois decorrido que seja o prazo de vigência da renovação do contrato e na falta de deliberação favorável do mesmo órgão, verifica-se a caducidade, a qual opera ope legis e o contrato caducado não pode ser denunciado ou rescindido - Ac do STA de 25-01-2001 (ín Ant. do STA e TCA, Ano lV-Nº2, 2001, pág.97).

Atendendo às palavras, do ilustre Prof. Doutor Marcello Caetano (in Manual de Direito Administrativo, vol. 1, 10.º ed. Almedina, Coimbra, págs. 634, 635 e 636):

"A caducidade do contrato dá-se quando ocorra alguma circunstância que, por força das cláusulas neles estipuladas ou por lei determine a cessação da sua vigência. Assim, o contrato administrativo caduca, quando chegue ao seu termo [...] O termo é uma causa comum de extinção dos contratos. Todos estes contratos são, por via de regra temporários [...] A data em que expira o contrato é, umas vezes, fixada expressamente no contrato; outras, resulta do prazo estipulado para a sua duração".

21 - Em síntese, o Recorrido limitou-se a seguir o entendimento que tem sido sufragado na Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo de que, no caso dos assistentes convidados no ensino superior politécnico, "o contrato caduca, decorrido o prazo da sua vigência e independentemente de manifestação de vontade nesse sentido." (cf. os Ac. de 19/05/87, 16/10/90, 07/03/91, 29/10/98 processos n.os 016024, 027771, 024489, 042292 in http://www.dqsi.pt, respectivamente).

O que significa que se extinguiram todos os direitos emergentes do contrato, nomeadamente, o direito a auferir os vencimentos e subsídios legais e o direito à prestação efectiva de trabalho através da distribuição de serviço docente.

22 - Da leitura conjugada do artigo 12.º, n.º 2, e do artigo 14.º, alínea a), do ECDESP - conforme entendem o Recorrido, a Jurisprudência já citada e o Acórdão recorrido - não se pode inferir que o acto de renovação seja um acto vinculado quer quanto ao seu

conteúdo quer quanto à sua oportunidade.

Pois o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP, em nada contende ou viola o regime jurídico de rescisão dos contratos administrativos de provimento, limitando-se a determinar a necessidade da prática de um acto expresso de deliberação favorável do conselho científico para que o contrato se possa renovar. Este acto, se for praticado, tanto pode consubstanciar um parecer favorável como consubstanciar um parecer desfavorável, sendo uma área que cabe dentro da actuação discricionária da Administração Pública.

É, por isso, destituído de fundamento o argumento de que da conjugação do artigo 12.º, n.º 2, e do artigo 14.º, do ECDESP, resulta que a prática do acto expresso de deliberação favorável de renovação do contrato constitui uma conduta vinculada da Administração, caso não tenha ocorrido qualquer uma das causas de extinção

contratual previstas no mesmo artigo 14.º

23 - Com efeitos, estas figuras legais não são uma e a mesma coisa, não obstante o

Recorrente assim fazer crer, pois:

"A caducidade do contrato dá-se quando ocorre alguma circunstância que, por força das cláusulas nele estipuladas ou por lei, determine a cessação da sua vigência", enquanto "A rescisão é a extinção do contrato, no decurso da sua vigência, por manifestação de vontade de um dos contraentes e pode exercer-se nos termos genericamente fixados na lei ou previstos no contrato" (Prof. Doutor Marcello Caetano, in Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, Almedina, Coimbra págs. 207 a

209).

24 - Destarte, as possibilidades de denúncia ou rescisão do contrato, previstas no artigo 14.º, do ECDESP, "...aplicam-se no pressuposto que não tenha terminado pelo decurso do tempo" (in Ac. do TCA processo 11402/02 e Acórdãos de STA de 19/05/87, 16/10/90 e 07/03/91). Consequentemente, na situação em discussão - não obstante não se ter verificado nenhuma das causas de rescisão ou denúncia do contrato, previstas no artigo 14.º, do ECDESP - o contrato caducou por ter atingido o seu término, defendendo o Acórdão recorrido, que se acompanha com a devida vénia,

que:

"Não encontra assim ao abrigo da lei a tese sustentada pelo A. segundo a qual não tendo sido denunciado o contrato celebrado entre as partes o acto de renovação seria um acto vinculado (quer quanto à oportunidade quer quanto ao conteúdo), dado que, na falta de deliberação expressa no sentido da renovação da mesmo, tal vínculo contratual caduca, não constituindo este entendimento violação do direito de acesso à função pública nem violação do direito de acesso à função pública nem violação da garantia constitucional de proibição de despedimento sem justa causa, que o A. alegou existir, sem contudo concretizar tal alegação."

25 - Também, não colhe, deste modo, o argumento do Recorrente segundo o qual a interpretação sufragada pelo Acórdão recorrido, dos referidos artigos 12.º, n.º 2 e 14.º, alínea a), do ECDESP, está ferida de inconstitucionalidade material, porque supostamente põe em causa o direito fundamental à segurança no emprego (artigo 53.º, da CRP) em especial na sua dimensão de garantia constitucional de proibição de

despedimento sem justa causa.

26 - Esta questão já foi objecto de pronúncia pelo STA no Ac. de 11-05-2005 (Processo 0160/04, in http://www.dgsi.pt), que versa sobre a renovação de contratos do pessoal docente do ensino superior politécnico, que desta feita se passa a

transcrever:

"Relativamente à alegada violação da segurança no emprego, e tendo em conta a situação especial da recorrente, ela somente lhe estava garantida durante o tempo de vigência do seu contrato, incluindo as respectivas prorrogações. Efectivamente, é aqui de aplicar a doutrina do C. de 12.5.93 do Tribunal Constitucional (n.º 93-345-1), desenvolvida no trecho que seguidamente se transcreve: 'O princípio constitucional da segurança do emprego é aplicável aos Trabalhadores da Administração Pública pese embora o particular estatuto funcional de que desfrutam, no qual se compreende um conjunto próprio de direitos, regalias, deveres e responsabilidades e lhes empresta um figurino especial face a relação de emprego típica das relações laborais comuns de raiz privatista. Simplesmente, nem todos os Trabalhadores da Administração Pública beneficiam do estatuto específico dos funcionários públicos (stricto sensu) entendidos estes como 'agentes administrativos providos por nomeação vitalícia voluntariamente aceite ou por contrato indefinidamente renovável, para servir por tempo completo em determinado lugar criado por lei com carácter permanente, segundo o regime legal próprio da função pública'. Haverá assim que distinguir entre aqueles agentes que exerçam a sua actividade como uma profissão certa e permanente e aqueles outros que apenas executam uma relação contratual a título precário e acidental justificando-se plenamente que a lei estabeleça, consoante os casos, diferentes condições de segurança e estabilidade na respectiva relação de trabalho."

27 - No seguimento deste entendimento, consta no Ac. do TC n.º 683/99 (in http://www.tribunalconstitucional. pt), relativamente a outra situação específica de contratação, mas que têm relevância para o presente recurso, que:

"Não constitui violação do princípio da igualdade, nem atenta contra o direito à segurança no emprego, a circunstância de estarem legalmente instituídos regimes específicos para os contratos de pessoal no âmbito da relação de emprego na Administração Pública, substancialmente diferenciados do regime geral vigente no direito laboral comum e adequados ao cumprimento das exigências formuladas pelo n.º

2 do artigo 47.º da Lei Fundamental."

28 - Ora, se é certo que o trabalhador sabe que o contrato pode ser denunciado até 30 dias antes do seu termo, por maioria de razão, o trabalhador que exerce funções de docente equiparado no ensino superior politécnico (com formação superior em Direito) tem de saber que, para que o seu contrato seja renovado, é necessário que o respectivo conselho científico da Escola onde lecciona delibere favoravelmente sobre a referida renovação, pois ambas as situações estão regidas no mesmo Estatuto, aprovado pelo Decreto-Lei 185/81, de 1 de Julho.

De forma que, o Recorrente não pode ter legitimamente formado a expectativa de que o contrato se renovaria em face da falta de denúncia contratual.

29 - Pelo exposto, a interpretação sufragada pelo Acórdão recorrido, dos referidos artigos 12.º, n.º 2 e 14.º, alínea a), do ECDESP, não está ferida de inconstitucionalidade material, porque não põe em causa o direito fundamental à segurança no emprego (artigo 53.º, da CRP) em especial na sua dimensão de garantia constitucional de proibição de despedimento sem justa causa.

30 - Finalmente, não obstante poder dizer-se que não caberá a este Venerando Tribunal conhecer desta questão, se, porventura, o artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP for julgado inconstitucional - por padecer de inconstitucionalidade formal ou inconstitucionalidade orgânica ou inconstitucionalidade material - o Tribunal "a quo" será obrigado a reformar a sua decisão em conformidade com o juízo de inconstitucionalidade com todas as suas implicações. O que significa que terá de considerar o invocado pelo Recorrido sobre a inconstitucionalidade de que outras normas do referido Estatuto padeceriam, caso fosse considerada procedente o pedido de inconstitucionalidade, nomeadamente: o artigo 3.º, na parte em que determina o conteúdo das funções das categorias da carreira do pessoal docente do ensino superior politécnico; bem como o artigo 8.º (que o próprio Recorrente invoca nas alegações do presente recurso), na parte em que determina que a equiparação do pessoal especialmente contratado se faz em relação a uma das categorias da carreira do pessoal docente do ensino politécnico e na parte em que determina que a celebração de contrato administrativo de provimento com os docentes especialmente contratados é precedida de mero convite, com base num relatório subscrito por dois professores da

especialidade.

Pois nenhum Tribunal, aquando da decisão de uma determinada questão, pode aplicar uma norma que seja inconstitucional, conforme dispõe o artigo 204.º, da CRP.

Termos em que

Deverá ser o presente recurso de constitucionalidade ser julgado improcedente, de acordo com as conclusões alinhadas, com os ulteriores efeitos legais.

II - Fundamentos.- 3. No ensino superior politécnico, além do pessoal da correspondente carreira especial, as funções docentes são também cometidas a pessoal docente especialmente contratado ao abrigo do artigo 8.º do Estatuto da Carreira Docente do Ensino Superior Politécnico, aprovado pelo Decreto-Lei 185/81, de 1

de Julho (ECDESP), que dispõe como segue:

"Artigo 8.º

Pessoal especialmente contratado 1 - Poderão ser contratadas para a prestação de serviço docente nos estabelecimentos de ensino superior politécnico individualidades nacionais ou estrangeiras de reconhecida competência científica, técnica, pedagógica ou profissional, cuja colaboração se revista

de necessidade e interesse comprovados.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, as individualidades a contratar serão equiparadas às categorias da carreira do pessoal docente do ensino superior politécnico cujo conteúdo funcional se adeque às funções que terão de prestar.

3 - Os contratos dos equiparados a categorias da carreira do pessoal docente do ensino superior politécnico serão precedidos de convite, fundamentado em relatório subscrito por dois professores da especialidade do candidato e aprovado pela maioria dos membros em efectividade de funções do conselho científico do estabelecimento de

ensino interessado.

[...]."

Os docentes especialmente contratados são providos por contrato administrativo de provimento, com a duração inicial de um ano, renovável por períodos de dois anos, nos termos do artigo 12.º desse Estatuto, que dispõe:

"Artigo 12.º

Provimento do pessoal especialmente contratado 1 - O pessoal docente equiparado nos termos dos n.º s. 1, 2, 3 e 4 do artigo 8.º do presente diploma, bem como os encarregados de trabalhos a que se refere o n.º 5 do mesmo preceito, serão providos mediante contrato com duração inicial de um ano,

renovável por períodos bienais.

2 - As renovações a que se refere o número anterior deverão ser expressas e fundamentadas em deliberação favorável do conselho científico.

3 - Quando tal se justifique, os contratos do pessoal a que se refere o artigo 8.º poderão ser celebrados por período de duração inferior a um ano.

A sentença recorrida interpretou o n.º 2 do artigo 12.º do ECDESP como estabelecendo um regime de caducidade dos contratos de provimento dos docentes do ensino superior politécnico especialmente contratados, extinguindo-se o contrato no termo do período contratual (ou das sucessivas renovações), se não for objecto de renovação expressa. Nesta interpretação, o contrato não se renova tacitamente, por falta de denúncia oportuna; se não houver acto expresso de renovação, caduca no termo do período clausulado ou da renovação em curso. A tanto não obsta o artigo 14.º do mesmo ECDESP que, segundo a sentença, regula outras causas de extinção do

contrato.

É este entendimento que o recorrente põe em causa, atribuindo-lhe uma tripla

inconstitucionalidade:

i) Orgânica, por violação da reserva legislativa da Assembleia da República, constante da alínea m) do artigo 167.º da Constituição, na redacção originária;

ii) Formal, por preterição da audição das associações sindicais na sua elaboração que entende imposta pela alínea a) do n.º 2 do artigo 58.º da Constituição, na versão

originária;

iii) Material, por violação do direito à segurança no emprego e da proibição de despedimentos sem justa causa, consagrados no artigo 53.º da Constituição.

4. Não restam dúvidas que foi a aplicação da norma constante do artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP que determinou, da parte da sentença recorrida, o juízo de caducidade do contrato administrativo de provimento de serviço docente ao abrigo do qual o recorrente exercia funções e que esse foi o fundamento determinante da improcedência tanto do pedido principal como do pedido subsidiário.

Relativamente ao pedido principal, entendeu a sentença recorrida que a norma do artigo 12.º, n.º 2, do ECDESP se mantêm em vigor e era aplicável aos autos, designadamente por não sofrer de qualquer das inconstitucionalidades arguidas pelo

recorrente.

E, quanto ao pedido subsidiário, entendeu que não resulta da conjugação daquela disposição com o artigo 14.º, alínea a), do mesmo diploma que a Administração tenha o dever de prolação de acto expresso de renovação contratual quando nenhuma das partes tenha procedido à denúncia do contrato, porque a caducidade pelo decurso do prazo contratual é uma causa de extinção do vínculo autónoma e distinta da denúncia.

A lógica da sentença é a de que, se a renovação depende de acto expresso, não podem as normas que regulam a denúncia ser interpretadas como fazendo que o silêncio da Administração opere como causa de renovação.

Sucede que, como a transcrição efectuada do requerimento de interposição e das alegações torna patente, o recurso de constitucionalidade versa, aparentemente, sobre duas normas: uma que tem por suporte o n.º 2 do artigo 12.º e outra que resulta da conjugação deste mesmo preceito com a alínea a) do artigo 14.º, ambos do ECDESP.

Trata-se, porém, de uma duplicação artificiosa da mesma questão de constitucionalidade. O que verdadeiramente pode estar em causa é a norma do n.º 2 do artigo 12.º na interpretação de que os contratos de provimento do pessoal docente especialmente contrato do ensino superior politécnico caducam quando não haja acto expresso de renovação. A inexistência de dever de proferir acto expresso e vinculado de renovação do contrato com o docente convidado é consequência desse mesmo entendimento do direito ordinário - que não cumpre ao Tribunal Constitucional censurar, nomeadamente quanto ao modo de compatibilização entre a previsão da alínea a) do artigo 14.º e a regra de caducidade (automática) que se considera decorrer do n.º 2 do artigo 12.º - de que o decurso do prazo (ou da renovação) implica a extinção do contrato por caducidade se não tiver havido acto expresso de renovação que o tribunal a quo extraiu do n.º 2 do artigo 12.º É nesta norma - e só nela - que reside a ratio decidendi do acórdão recorrido quanto aos dois pedidos.

5. Começa o recorrente por sustentar que a norma do n.º 2 do artigo 12.º do ECDESP, inserindo-se num diploma emanado do Governo sem que este estivesse munido de autorização parlamentar, viola o disposto na alínea m) do artigo 167.º da

Constituição, na redacção inicial.

É conclusão a que pretende que se chegue argumentando por duas vias:

Na redacção inicial da Constituição constituía matéria de reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre o "regime e âmbito da função pública", o que é mais extenso do que legislar sobre as "bases do regime e âmbito da função publica" que actualmente consta da alínea t) do artigo 165.º da

Constituição;

Mas, ainda que deva proceder-se a uma interpretação restritiva da alínea m) do artigo 167.º da Constituição, na sua redacção inicial, mantém-se o vício de inconstitucionalidade orgânica, pois que a norma em causa estabelece um regime contrário à regra de renovação dos contratos administrativos de provimento, regra esta que ao tempo constituía uma das bases do regime da função pública.

Vejamos.

5.1. Na vigência do primitivo texto constitucional, já a jurisprudência da Comissão Constitucional sustentava (cf. pareceres n.º s 22/79 e 12/82, Pareceres da Comissão Constitucional, vols. 9.º, p. 48, e 19.º, p. 119, respectivamente) que na reserva de competência legislativa da Assembleia da República, estatuída na alínea m) do artigo 167.º, para legislar sobre o "regime e âmbito da função pública" entrava apenas o "estatuto geral" da função pública, aquilo que "é comum e geral a todos os funcionários e agentes", aí se compreendendo, designadamente, "a definição do sistema de categorias, de organização de carreiras, de condições de acesso e de recrutamento, de complexo de direitos e deveres funcionais que valem, em princípio, para todo e qualquer funcionário público e que, por isso mesmo, favorecem o enquadramento da função pública como um todo, dentro das funções do Estado". Cabia na competência legislativa do Governo a "concretização" desse estatuto geral, a sua "complementação, execução e particularização", ou seja, "quer o desenvolvimento de tais princípios, quer a sua aplicação e adaptação aos sectores que exijam um regime particular específico ou

até excepcional".

O Tribunal Constitucional deu continuidade, nos seus aspectos essenciais, a este entendimento, que não há razões para rever (cf. Acórdão 78/84, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 11 de Janeiro de 1985). Com efeito, como se reconheceu no acórdão 142/85 ao cotejar as normas constitucionais em referência (ATC- 6.º Vol., p. 103), este entendimento restritivo da reserva de competência legislativa parlamentar estabelecida na versão originária da Constituição fundava-se na consideração, plenamente justificada, de que, face à natureza, extensão, complexidade e variabilidade da matéria, não seria praticamente viável, nem harmónico com a posição constitucional do Governo como "órgão superior da Administração Pública", retirar a este toda e qualquer competência autónoma no domínio da função pública e cometer à Assembleia da República a sua "regulamentação esgotante" (a definição da "totalidade"

do seu regime jurídico). Vale por dizer que a reserva legislativa para que a redacção inicial da Constituição apontava na matéria era já, em direitas contas, o que contendesse com os princípios estruturais básicos do regime da função pública.

Nesta perspectiva, que não há razões para reequacionar, a norma em causa, disciplinando um aspecto particular do regime de cessação do contrato administrativo de provimento de uma categoria de pessoal de um sector específico da Administração Pública (o pessoal especialmente contratado do ensino superior politécnico), não cai no âmbito da reserva legislativa da Assembleia da República que constava, à data da emissão do diploma, da alínea m) do artigo 167.º da Constituição.

5.2. Mas não basta concluir que não estamos num domínio onde fosse sempre vedado ao Governo legislar sem prévia credencial parlamentar para dar a questão da inconstitucionalidade orgânica por resolvida. Questão era, como se disse no acórdão 233/97 (ATC, 36.º Vol., p. 503), - e aqui entramos na apreciação do segundo argumento do recorrente - que, ao fazê-lo nos termos em que o fez, o legislador não contrariasse os princípios básicos fundamentais que devessem extrair-se do ordenamento jurídico vigente no tocante à matéria sobre que versa a norma em causa.

Como se sublinhou no acórdão 142/85, embora já a propósito da enunciação da reserva de competência legislativa como respeitando às "bases do regime ... da função pública" (ao tempo, alínea u) do n.º 1 do artigo 168.º; actualmente, alínea t) do n.º 1 do artigo 165.º), mas valendo, por maioria de razão, no domínio de vigência da alínea m) do artigo 167.º da Constituição na versão inicial, o que a reserva implica, na falta de uma lei quadro da função publica, "é a necessidade de, a partir dos numerosos e dispersos textos legais regulamentadores da função pública, e sem, naturalmente perder de vista o respectivo contexto, maxime institucional e histórico, averiguar e estabelecer as linhas de força estruturais dessa regulamentação, os princípios básicos que a informam e caracterizam, pois aí se situará a linha de fronteira entre o que pertence e o que não pertence à competência legislativa exclusiva da Assembleia da República.

Nessa competência entrará só - como é óbvio - o que contenda com aqueles princípios, por importar a sua substituição, modificação ou derrogação; sobre tudo o mais poderá o Governo legislar sem necessidade de qualquer autorização prévia".

Mantendo-se esta linha de orientação, importa determinar qual o regime geral em matéria de renovação dos contratos de provimento dos trabalhadores da Administração Pública vigente no momento da emanação do ECDESP para, mediante o confronto do regime particular deste diploma com esse regime geral, verificar se a norma em causa afronta algum princípio fundamental em tal domínio.

É, aliás, esta a metodologia que o recorrente propõe, invocando como consagradores do regime geral nesta matéria os artigos 3.º e 4.º do Decreto-Lei 49.397, de 24 de

Novembro de 1969.

Dispunham, na parte que interessa, estes preceitos:

"Artigo 3.º

1 - Os contratos de provimento consideram-se celebrados com sujeição às seguintes normas gerais, salvo as especiais constantes do respectivo diploma de provimento:

[...]

b) O contrato é valido pelo prazo de um ano, a contar da data da posse, considerando-se tácita e sucessivamente prorrogado, por iguais períodos, se não for

oportunamente denunciado;

c) A denúncia do contrato pode ser feita por qualquer das partes, com a antecedência mínima de sessenta dias em relação ao termo do prazo;

[...]."

"Artigo 4.º

1 - O disposto no artigo anterior é aplicável, com as devidas adaptações, aos contratos de pessoal além dos quadros, desde que sejam feitos por tempo indeterminado, ou pelo prazo de um ano ou superior, prorrogável.

2.[...] "

Concede-se, acompanhando neste passo o recorrente, que nestas disposições se continham as bases ou princípios efectivamente existentes quanto à celebração, duração e extinção dos contratos de pessoal admitidos na Administração Pública ao tempo da publicação do ECDESP (cf., implicitamente acolhendo esta ideia, acórdão 233/97).

Mas já não é exacto que a norma em causa tenha adoptado uma solução que colida com o que dessa regulamentação pré-existente pode ser erigido em princípios básicos fundamentais na matéria de renovação de tais contratos e que, por isso, para respeitar a reserva prevista na alínea m) do artigo 167.º da Constituição na versão ao tempo vigente, o Governo só pudesse editá-la com autorização parlamentar.

Com efeito, se é certo que a regra era a de que os contratos administrativos de provimento (ou os contratos de pessoal além dos quadros celebrados pelo período de um ano ou superior) se renovavam, tácita e sucessivamente, na falta de denúncia tempestiva por qualquer das partes (alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º), não é menos certo que estava expressamente ressalvada a existência de disposições especiais que estabelecessem regime diverso (n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei 49.397). Esta previsão de regime especial modulava aquela regra e integrava, também ela, o regime

básico.

Deste modo, o n.º 2 do artigo 12.º do ECDESP, ao exigir, como condição necessária à renovação do contrato de serviço docente do pessoal especialmente contratado, um acto expresso e fundamentado de renovação contratual, consagra uma particularização do regime geral então vigente, o qual já consentia o afastamento da regra de renovação tácita do contrato. Limita-se a adaptar esse regime geral a um sector e categoria de pessoal específicos e a fazê-lo de um modo compatível com as disposições que o próprio recorrente elege como reveladoras do quadro básico do regime de contratação

de pessoal para a Administração Pública.

Com efeito, em ordem à satisfação de necessidades específicas de tais estabelecimentos de ensino superior, consentia-se que pudessem ser contratadas, sem observância do regime geral da carreira docente e das regras gerais em matéria de recrutamento e selecção de pessoal mormente da regra do concurso, personalidades a quem se reconheça capacidade para satisfazê-las. É perfeitamente coerente com esse regime de recrutamento que esses docentes do ensino superior politécnico especialmente contratados só vejam o seu vínculo mantido se o órgão competente proceder à verificação actual, expressa e fundamentada da necessidade da contratação e da adequação do interessado à satisfação de tais necessidades. A sua contratação obedece ao pressuposto de que a sua colaboração se reveste de necessidade e interesse comprovados (n.º 1 do artigo 8.º do ECDESP). E é feita por convite, fundamentado em relatório subscrito por dois professores da especialidade do candidato e aprovado pela maioria dos membros em efectividade de funções do conselho científico do estabelecimento de ensino interessado, e não pelo modo normal de recrutamento do pessoal docente do ensino superior politécnico que é o concurso (n.º 3 do artigo 8.º do ECDESP). É perfeitamente razoável e congruente com este regime excepcional de recrutamento que a renovação do contrato seja precedido da verificação pelo órgão competente da existência de necessidade e interesse comprovados em manter a colaboração do docente especialmente contratado.

Deste modo, ao emitir, sem prévia autorização parlamentar, a norma do n.º 2 do artigo 12.º do ECDESP, interpretada no sentido de que a renovação do contrato de provimento do pessoal docente do ensino superior politécnico especialmente contratado depende de acto expresso da Administração, o Governo não invadiu a reserva de competência legislativa da Assembleia da República que constava da alínea m) do artigo 167.º da Constituição, na versão inicial, ao tempo vigente.

Tanto basta para que deva julgar-se improcedente o vício de inconstitucionalidade

orgânica.

6. Cumpre passar à apreciação da inconstitucionalidade formal ou de procedimento que o recorrente imputa à mesma norma e que consiste na violação do direito das associações sindicais consagrado na alínea a) do n.º 2 do artigo 58.º da Constituição, na sua redacção originária, que estabelecia ser direito das associações sindicais "participar na elaboração da legislação do trabalho". Corresponde, ipsis verbis, à alínea

a) do n.º 2 do artigo 56.º actual.

6.1. Na análise desta questão há, desde logo, dois aspectos que podem dar-se por assentes sem exame detalhado, por não serem objecto de controvérsia.

O primeiro consiste em que este direito de participação se estendia, como se estende, às associações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública. O Tribunal tem reconhecido este âmbito de protecção da norma constitucional, sem divergências (cf., entre vários, acórdão 451/87 ATC, Vol. 10.º, págs. 165 -166).

O segundo é que a norma em causa se insere, de pleno, na noção material de legislação do trabalho constitucionalmente operante. Efectivamente, no que à função pública se refere, o Tribunal tem considerado que se integra na legislação do trabalho para este efeito "o que se estatui em matéria de regime geral e especial dessa espécie de vínculo de trabalho subordinado, condições de trabalho, vencimentos e mais prestações de carácter remuneratório, regime de aposentação ou de reforma e regalias sociais e de acção social complementar" (cf., entre muitos, acórdão 360/03). Ora, a norma sob apreciação disciplina um aspecto nuclear da relação de emprego público que é, directamente, a prorrogação do prazo e, reflexa ou indirectamente, a caducidade do

vínculo contratual.

6.2. Onde se registaram divergências e a dúvida pode ainda justificar-se é quanto a saber se, ao tempo, o direito de participação na legislação do trabalho dependia de intermediação legislativa ou era directamente aplicável. Isto é, para encurtar razões, sobre um outro aspecto ou outro ângulo de análise da questão que é o da qualificação do direito fundamental em causa na categoria dos direitos liberdades e garantias, no âmbito temporal de vigência do texto inicial da Constituição (cf. Jorge Bacelar Gouveia, "Os direitos de participação dos representantes dos trabalhadores na elaboração da legislação laboral", in Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, Vol I, págs. 109 e segs., maxime págs. 145/149 e José Manuel Meirim, "A participação das organizações dos trabalhadores na elaboração da legislação do trabalho (aproximação à jurisprudência constitucional", in Revista do Ministério Público, ano 13.º, n.º 52, págs. 9

e segs.)

A interrogação não era dispicienda ou de relevância meramente teórica - pelo menos até à revisão constitucional de 1982 (note-se que o diploma legal em que se insere a norma em causa foi publicado em 1981) que deslocou o direito de participação na legislação do trabalho do âmbito dos "Direitos e deveres económicos, sociais e culturais" para o capítulo dos "Direitos, liberdades e garantias" - , porque a Lei 16/79, de 26 de Maio de 1979, não era aplicável à função pública, só vindo a matéria a ser regulamentada pelo Decreto-Lei 45-A/84, de 3 de Fevereiro.

E, de facto, a Comissão Constitucional (cf. Parecer 18/78, publicado in Pareceres da Comissão Constitucional, 6.º Vol. págs. 4 e segs.), considerou, embora com vozes divergentes, que esta norma constitucional não era exequível por si mesma. Continha um conceito aberto (participação), desprovido de qualquer desenvolvimento a nível constitucional, que só através de uma lei, já não constitucional, era possível integrar e definir. Assim, o direito de participação só se tornaria operativo depois de uma pré-definição jurídica dos meios formais para alcançar o objectivo a que visa, mediante medidas legislativas complementares a cargo do legislador ordinário. Enquanto isso não sucedesse o que poderia eventualmente ocorrer seria uma inconstitucionalidade por omissão (cuja verificação foi, aliás, pedida; cf. Parecer 4/77, in Pareceres da Comissão Constitucional, I Vol. págs. 77 e segs.) Para quem assim entenda, não estando ainda, ao tempo da edição do diploma em causa, regulado o direito de participação dos trabalhadores da função pública, fica excluída a possibilidade de verificação da inconstitucionalidade formal por violação da alínea a) do n.º 2 do artigo 58.º da Constituição (na versão originária).

Sucede que o Tribunal Constitucional adoptou jurisprudência no sentido de que, mesmo na redacção inicial da Constituição, o direito de participação na elaboração da legislação do trabalho beneficiava do regime dos direitos, liberdades e garantias, sendo, em consequência, directamente aplicável com vinculação das entidades públicas e privadas, nos termos dos artigos 17.º e 18.º do mesmo texto constitucional (cf.

acórdãos n.º 31/84 e n.º 451/87, publicados no Diário da República, 1.ª série, de 17 de Abril de 1984 e de 14 de Dezembro de 1987, respectivamente).

Ora, admitindo-se que fosse imperativo constitucional que, no procedimento legislativo que conduziu à adopção da norma em causa, o Governo tivesse procedido à audição das associações sindicais, por se tratar, já na redacção inicial da Constituição, de um direito fundamental de natureza análoga a direitos liberdades e garantias, susceptível de ser exercido sem necessidade estrita de intermediação legislativa, cabe, então, indagar se no respectivo processo de produção legislativa (lato sensu) foi efectivamente assegurado o direito de participação das associações sindicais.

6.3. Na sentença recorrida considerou-se que não podia dar-se como verificada a falta de audição, designadamente por presunção a partir do silêncio do diploma legal a este propósito, porque não existia norma que obrigasse a tal menção.

Tem de reconhecer-se que não há elementos no processo que permitam uma resposta categórica, num ou noutro sentido. Com efeito, o Decreto-Lei 185/81 não contém, designadamente no texto preambular, qualquer referência à audição das organizações sindicais representativas dos trabalhadores potencialmente interessados. E das diligências oficiosamente empreendidas, apenas resultou a informação de que não foi localizado o processo referente à elaboração do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (fls. 450).

Todavia, seria precipitado retirar deste facto qualquer conclusão. Não existindo, ao tempo, regulamentação do direito de participação das associações sindicais neste domínio e não estando, consequentemente, cometida a um serviço determinado a organização e coordenação do respectivo procedimento, como veio mais tarde a suceder com o artigo 14.º do Decreto-Lei 45-A/84, é compreensível que não sejam agora encontrados, passadas mais de duas décadas, os registos correspondentes.

De modo que, na falta de elementos materiais extrínsecos que suportem um juízo positivo em qualquer dos sentidos, só pode concluir-se pela verificação do vício de procedimento legislativo em análise se for de presumir, face ao silêncio do diploma, que

tal audição não teve lugar.

O recorrente invoca neste sentido a jurisprudência do Tribunal, que considera aplicável à situação em análise, de acordo com a qual "não se fazendo qualquer referência nos textos preambulares dos diplomas a uma eventual audição das organizações representativas dos trabalhadores se há-de presumir que tal audição se não concretizou, competindo ao órgão autor da norma operar a sua ilisão" (cf., entre vários, acórdãos n.º 451/87, 15/88, 93/92, o primeiro já citado, e os seguintes publicados no Diário da República, 1.ª série e 1.ª série-A, de 3 de Fevereiro de 1988 e 28 de Maio

de 1992, respectivamente).

Porém, este entendimento de que o silêncio dos actos normativos respeitante às legislações do trabalho quanto à ocorrência da audição das associações sindicais na sua elaboração faz presumir juris tantum que essa audição não teve efectivamente lugar só se justifica no pressuposto de que a ordem jurídica comporta a imposição de que o acto normativo respeitante à legislação dessa natureza contenha tal menção. O incumprimento desse dever de relatar tal ocorrência quando exista é que pode fornecer a base jurídica objectiva para interpretar o silêncio como sinal de omissão do requisito

do procedimento legislativo.

Sucede que à data da publicação do Decreto-Lei 185/81 nenhum preceito legal previa, ainda que de modo indirecto, que a legislação da função pública contivesse tal

menção.

Não pode invocar-se nesse sentido o artigo 7.º da Lei 16/79, de 26 de Maio, uma vez que o regime estabelecido por este diploma não era aplicável aos trabalhadores da função pública e a sua legislação do trabalho. As suas fontes originárias - Projectos de Lei s 92/1 (PCP), 95/1 (PS) e 102/1 (UDP), Diário da Assembleia da República, 2.ª série, respectivamente, n.º s 25, de 11 de Janeiro de 1978, 29, de 19 de Janeiro de 1978, e 41, de 24 de Fevereiro de 1978 - e o respectivo debate parlamentar (Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º s 4 e 5, de 27 e 31 de Outubro de 1978), apontavam claramente nesse sentido. E isso mesmo veio a ser expressamente assumido no preâmbulo do Decreto-Lei 45-A/84, de 3 de Fevereiro, que regulamentou, pela primeira vez, o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública ("... a qual, porque o direito da função pública é um ramo do direito administrativo, não é aplicável nem é, por natureza, susceptível de aplicar em sede de regime da função

pública").

E também não constitui base para tal exigência o disposto no n.º 4 do artigo 7.º da Lei 3/76, de 10 de Setembro, que ao tempo regulava a publicação, identificação e formulário dos diplomas. O que este preceito previa era que, quando no processo legislativo tivesse participado, a título consultivo ou deliberativo, por força da Constituição ou da lei, outro ou outros Órgãos além do órgão de aprovação final, far-se-ia referência expressa a esse facto. Era exigência restrita à participação de órgãos do Estado (lato sensu) com intervenção no processo legislativo (v. gr., os órgãos das regiões autónomas), não aos representantes dos trabalhadores e às associações sindicais que são entidades com direito de participação na elaboração da legislação do trabalho, mas não são órgãos do Estado com participação consultiva ou

deliberativa na feitura de tal legislação.

Assim, essa presunção só têm fundamento a partir do momento em que a ordem jurídica infra-constitucional passou a disciplinar o direito de participação na elaboração da legislação do trabalho por parte dos trabalhadores da Administração Pública, o que somente veio a acontecer em momento posterior ao diploma em que se insere a norma em apreciação, com o Decreto-Lei 45-A/84, de 3 de Fevereiro.

Não se considera, pois, verificado o vício de inconstitucionalidade da norma em causa por violação do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 58.º da Constituição (versão de

1976).

7 - Por último, cumpre apreciar a inconstitucionalidade da norma do n.º 2 do artigo 12.º do ECDESP, acima transcrito, na interpretação de que nela se estatui uma causa autónoma de extinção da relação contratual (: caducidade), cuja verificação se dá sempre que não tiver sido proferido, pela Administração, um acto expresso de renovação do contrato. Dito de outro modo, a interpretação de que o vínculo do docente especialmente contratado se extingue, sem necessidade de prévia denúncia, pelo mero decurso do prazo (inicial ou da renovação em curso), se não for objecto de renovação expressa e fundamentada em deliberação favorável do conselho científico do estabelecimento de ensino superior politécnico.

Alega o recorrente que esta interpretação, sufragada pela sentença recorrida, esvazia de conteúdo útil a norma da alínea a) do artigo 14.º do mesmo Estatuto e, fazendo com que a inércia da Administração implique a cessação da relação jurídica de emprego, fere, no seu núcleo mais essencial e de forma desproporcionada, o direito fundamental à segurança no emprego e a garantia de proibição de despedimentos sem justa causa,

violando o artigo 53.º da Constituição.

Em primeiro lugar, convém lembrar que não cabe ao Tribunal Constitucional apreciar o acerto da interpretação do direito ordinário adoptada pelo tribunal a quo, designadamente, saber se a conjugação do disposto nos artigos 12.º e 14.º do ECDSP impunha um diferente entendimento das causas de extinção do contrato ou, visto o problema pelo ângulo inverso, dos termos da renovação do contrato de serviço docente dos professores especialmente convidados. Ao Tribunal cabe, apenas, apreciar a conformidade da regra aplicada pela decisão recorrida - essencialmente, a de que o contrato se extingue no termo do período contratual se não houver acto expresso de renovação, sem necessidade de denúncia - com normas ou princípios constitucionais, designadamente, com a garantia de segurança no emprego consagrada

no artigo 53.º da Constituição.

Importa notar que não vem questionada a constitucionalidade da norma de que resulta o carácter temporário do vínculo contratual dos docentes especialmente convidados.

Discute-se, apenas, a circunstância de o contrato se extinguir pelo decurso do prazo (isto é, caducar) na falta de um acto expresso de renovação, fundado no reconhecimento da necessidade actual do serviço e da adequação da prestação do docente para satisfazê-lo por parte do conselho científico do estabelecimento de ensino, em vez de a extinção depender de um acto de denúncia que obste à renovação automática. É este efeito diferencial de caducidade por falta de acto expresso de renovação por contraposição à solução de renovação automática na falta de acto expresso de denúncia que o recorrente toma como lesivo da garantia constitucional de

segurança no emprego.

Neste aspecto, a falta de razão do recorrente é manifesta.

Não se nega, por um lado, que o direito à segurança no emprego se não esgota na proibição do despedimento sem justa causa ou por motivos políticos e ideológicos, abrangendo o seu âmbito de protecção todas as situações que se traduzam em injustificada precariedade da relação de trabalho. Nem, por outro lado, a aplicabilidade do princípio à relação de trabalho na relação jurídica de emprego público (cf. por exemplo, acórdão 155/04, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 22 de Abril), embora com os limites ou condicionamentos decorrentes do leque de princípios constitucionais a que a Administração Pública está sujeita (cf., por exemplo, acórdão 368/00, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 30 de Novembro).

Mas não se vislumbra como pode ser atribuído à norma em causa, na medida em que exige um acto expresso e fundamentado do conselho científico da escola para que o contrato de serviço docente se renove, um efeito lesivo desse direito

constitucionalmente protegido.

Efectivamente, essa exigência não introduz maior precariedade na relação de trabalho do que aquela que é inerente à natureza temporária do vínculo, que não está em discussão. E a sujeição da renovação a acto expresso e fundamentado do conselho científico está justificada pelo carácter excepcional desse modo de recrutamento, sendo medida adequada às particularidades deste modo de recrutamento. Esse acto consiste na verificação de que se mantém actual a necessidade e interesse da colaboração do docente, enquanto individualidade a que se reconhece competência científica, técnica, pedagógica ou profissional (artigo 8.º do ECDESP), em termos tais que justifiquem o afastamento da regra do concurso, que seria o modo normal de recrutamento para prestação de serviço docente, até por exigência constitucional (artigo 47.º, n.º 2, da

CRP).

Em conclusão, se algum efeito precarizante da relação de emprego público em causa pode ser imputado à norma em apreciação, esse efeito está constitucionalmente justificado, pelo que improcede a alegação de violação do direito à segurança no emprego consagrado no artigo 53.º da Constituição.

8 - Decisão. - Pelo exposto, decide-se negar provimento ao recurso e condenar o recorrente nas custas com 25 (vinte e cinco) UCs de taxa de justiça.

Lisboa, 11 de Fevereiro de 2009. - Vítor Gomes - Ana Maria Guerra Martins - Carlos Fernandes Cadilha - Maria Lúcia Amaral - Gil Galvão.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2009/03/23/plain-248445.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/248445.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1976-09-10 - Lei 3/76 - Assembleia da República

    Estabelece as disposições relativas à publicação, identificação e formulário dos diplomas.

  • Tem documento Em vigor 1979-05-26 - Lei 16/79 - Assembleia da República

    Regula a participação das organizações de trabalhadores (comissões de trabalhadores e respectivas comissões coordenadoras, bem como associações sindicais) na elaboração da legislação de trabalho. Aprova e publica em anexo o modelo do impresso destinado ao pronunciamento das referidas organizações sobre os projectos e propostas de legislação, nos prazos e condições estipulados neste diploma.

  • Tem documento Em vigor 1981-07-01 - Decreto-Lei 185/81 - Ministério da Educação e Ciência

    Aprova o Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1984-02-03 - Decreto-Lei 45-A/84 - Presidência do Conselho de Ministros

    Regulamenta o direito de negociação dos trabalhadores da Administração Pública, excluindo as Forças Armadas e militarizadas.

  • Tem documento Em vigor 1987-12-14 - Acórdão 451/87 - Tribunal Constitucional

    Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 380/82, de 15 de Setembro ( Estatuto do Pessoal Civil das Forças Armadas )

  • Tem documento Em vigor 1989-12-07 - Decreto-Lei 427/89 - Presidência do Conselho de Ministros

    Define o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na administração pública.

Ligações para este documento

Este documento é referido no seguinte documento (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

  • Tem documento Em vigor 2013-12-09 - Acórdão do Tribunal Constitucional 793/2013 - Tribunal Constitucional

    Pronuncia-se pela inconstitucionalidade da norma do artigo 3.º, n.º 1, do Decreto n.º 22/2013, aprovado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em 21 de outubro de 2013, enviado para assinatura ao Representante da República para a Região Autónoma dos Açores, por violação das alíneas b) e t) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, e pela inconstitucionalidade consequente das restantes normas do mesmo diploma (duração do período normal de trabalho dos trabalhadores da Administração Públic (...)

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