de 21 de Fevereiro
Num momento em que o País renovado procura restabelecer a justiça que durante as últimas décadas o regime deposto esqueceu e obstruiu, considera-se prioritário julgar os que, tendo praticado o mal à sombra desse regime, por tal conseguiram ficar impunes.Neste domínio, para além de outras soluções legislativas já em vigor, atendeu-se, agora, a todas as ilegalidades que ficaram a salvo pela concessão da garantia administrativa, fórmula pela qual os Poderes Públicos do regime derrubado evitaram o julgamento de alguns dos seus mais directos colaboradores.
Com efeito, o Ministro do Interior, o Ministro do Ultramar e, nalguns casos, o Ministro da Economia podiam proibir o exercício da acção penal contra certas categorias de funcionários deles dependentes, por razões meramente discricionárias, invocando a garantia administrativa.
Desta maneira, muitas prepotências dos citados servidores do governo anterior, quer cometidas no exercício das suas funções, quer cometidas na sua vida meramente particular, eram arquivadas pelo órgão máximo do poder administrativo, ficando o mal por reparar e os seus autores por punir. No entanto, tais prepotências e crimes tinham sido objecto de queixa dos particulares prejudicados e da correspondente instrução processual, onde haviam ficado provados à evidência.
Por assim dizer, a administração fascista julgava e absolvia os seus próprios crimes.
Agora, que tal pode ser reparado e que se pretende julgar e punir com isenção todos esses crimes, achou-se do máximo interesse reabrir os processos em que os arguidos beneficiaram da concessão da garantia administrativa, até porque o trabalho dos órgãos competentes para efectuar justiça estará facilitado por toda a matéria de prova anteriormente coligida.
Logicamente suprime-se também um instituto injustificado no regime deposto e, por maioria de razão, sem lugar no quadro legal que rege hoje a vida democrática do Estado.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pelo artigo 16.º, n.º 1, 3.º, da Lei Constitucional 3/74, de 14 de Maio, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º Ficam revogadas todas as disposições de diplomas legais que concedam garantia administrativa a funcionários públicos, seja qual for a sua classe ou categoria ou o ramo de serviço a que pertençam, designadamente o artigo 412.º do Código Administrativo, o artigo 3.º, n.º 3, do Decreto-Lei 35007, de 13 de Outubro de 1945, o artigo 5.º do regulamento aprovado pelo Decreto-Lei 39931, de 24 de Novembro de 1954, e o Decreto 47605, de 25 de Março de 1967.
Art. 2.º É obrigatória a reabertura dos processos crimes em que tenha sido concedida a garantia administrativa a partir de 11 de Abril de 1933.
Art. 3.º O Ministério da Administração Interna, o Ministério da Economia, pela Secretaria de Estado da Agricultura, e as procuradorias da República informarão os agentes do Ministério Público junto dos tribunais competentes de todos os casos de concessão dessa garantia administrativa.
Art. 4.º Independentemente da informação referida no artigo anterior, o agente do Ministério Público dará cumprimento ao disposto no artigo 1.º sempre que:
a) Tenha conhecimento directo da existência de tais processos;
b) Seja informado dessa existência por qualquer entidade pública ou particular.
Art. 5.º O prazo da prescrição do procedimento criminal pelos crimes objecto de processo em que foi concedida garantia administrativa, bem como o da respectiva responsabilidade civil, considera-se suspenso entre a data em que aquela garantia foi outorgada e a data de reabertura do processo.
Art. 6.º Este diploma entra imediatamente em vigor.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Vasco dos Santos Gonçalves - António de Almeida Santos - Manuel da Costa Brás - Francisco Salgado Zenha - Emílio Rui da Veiga Peixoto Vilar.
Promulgado em 6 de Fevereiro de 1975.
Publique-se.O Presidente da República, FRANCISCO DA COSTA GOMES.
Para ser publicado nos Boletins Oficiais de todos os territórios ultramarinos. - A.
Almeida Santos.