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Assento 6/79, de 19 de Outubro

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Sumário

Em caso de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens decretados por um tribunal de família, a este compete a regulação consequente do exercício do poder paternal.

Texto do documento

Assento 6/79

Processo 67365. - Autos de recurso para tribunal pleno - Recorrente, o

Ministério Público junto das secções cíveis.

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

O Exmo. Ajudante do Procurador-Geral da Repúbilca junto deste Tribunal, invocando oposição sobre a mesma questão de direito entre os Acórdãos deste Supremo de 2 de Março de 1978, publicado no Boletim, n.º 275, p. 111, e o de 29 de Novembro de 1977, proferido no processo 66905, dele recorre para tribunal pleno, a fim de que se estabeleça por assento a doutrina legal.

Alegou, em tempo oportuno, aquele digno magistrado.

Efectivamente, como se julgou no acórdão a fl. 14, existe manifesta oposição entre aqueles dois arestos, pois, enquanto no primeiro se decidiu ser competente o tribunal de família, onde seguiu seus termos e foi decretado o divórcio, para a providência de regulação do exercício do poder paternal relativamente aos filhos comuns dos divorciados, o segundo sustentou que o tribunal competente para conhecer da referida providência consequente ao divórcio decretado no tribunal de família era o tribunal de menores, por ser o da residência daqueles.

As normas em vigor à data de uma e outra dessas decisões eram, sem qualquer modificação, as dos artigos 39.º, n.º 1, da Organização Tutelar de Menores, 2.º, n.º 1, alínea f), do Decreto 8/72, de 7 de Janeiro, e 1412.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

Cumpre, por isso, resolver este conflito de jurisprudência e determinar qual o tribunal competente para, nessa hipótese, se pronunciar sobre a regulação do exercício do poder paternal.

O direito tutelar é dominado pela necessidade de protecção aos menores e, assim, nos esquemas processuais criados para esse efeito, a maior comodidade destes prevalece sobre a dos seus legais representantes.

Dispunha o n.º 1 do artigo 39.º da Organização Tutelar de Menores que em matéria cível é competente o tribunal da residência do menor no momento em que o processo foi instaurado. Essa regra funda-se no desejo de que os processos sigam os seus termos no tribunal onde seja mais fácil reunir os elementos necessários à conveniente e eficaz defesa dos respectivos interessados. É de admitir, em tese geral, que maiores facilidades poderão ser obtidas através do tribunal da residência daqueles no momento em que se inicia o processo. A doutrina constante desse artigo 39.º, dentro do sistema da Organização Tutelar, sofre, no entanto, desvios, que esse diploma expressamente contempla, designadamente nas hipóteses previstas nos artigos 69.º, n.º 1, e 102.º, n.º 1.

Sendo o conflito suscitado em matéria de competência, é de acentuar que esta emerge necessariamente da lei, mediante a verificação dos pressupostos básicos que a caracterizam, e não de meras circunstâncias ocasionais.

A alínea f) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto 8/72, de 7 de Janeiro, que regulamentou a Lei 4/70, de 29 de Abril, que instituiu, a título experimental, os tribunais de família, preceitua que é da competência exclusiva desses tribunais, criados por aquele diploma, dada a sua específica natureza, a instrução e julgamento das providências civis atribuídas pela lei vigente aos tribunais tutelares de menores quando conexas com as acções referidas nas alíneas anteriores, de entre as quais figuram as de separação de pessoas e bens e de divórcio.

A regulação do poder paternal, necessária em consequência do decretamento do divórcio ou da separação, é conexa das acções daquela natureza.

A conexão supõe, naturalmente, a ideia de nexo, de ligação, e esse nexo é evidente entre aquelas acções e a providência da regulação do poder paternal, na medida em que este é consequência necessária e legal daquela.

O tribunal de família é um órgão jurisdicional de competência especializada para conhecer da providência referente à regulação do poder paternal, a qual deve correr por apenso ao respectivo processo de divórcio ou de separação, como resulta da análise do estatuído no artigo 12.º, n.º 2, do citado Decreto 8/72, e prescreve, actualmente, o n.º 3 do artigo 154.º do Decreto-Lei 314/78, de 27 de Outubro.

O problema assim apreciado reconduz-se a uma questão de competência em razão da matéria, hoje solucionado em diplomas diversos.

É certo que o Decreto 8/72 estabeleceu um regime experimental para a nova jurisdição, mas esta circunstância não impedia, e antes impunha, que durante a sua vigência se cumprissem os preceitos nele contidos, pois só assim seria possível extrair da nova orgânica todo o alcance social que ela comportava e concluir se a experiência vivida foi útil e eficaz. Diplomas posteriores confirmaram a justeza da solução proposta.

O artigo 1905.º do Código Civil, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 496/77, de 25 de Novembro, correspondente ao antigo artigo 1902.º, não menciona já, ao contrário do que sucedia neste último preceito, o tribunal que deverá regular o exercício do poder paternal na falta de acordo dos pais.

Actualmente, face ao preceituado nos n.os 1 e 2 do artigo 1407.º do Código de Processo Civil, as acções de divórcio e de separação iniciam-se com uma tentativa de conciliação, em que o juiz procurará obter o acordo dos pais quanto à regulação do exercício do poder paternal. Este preceito mostra bem o vínculo de conexão existente entre essa providência e a acção respectiva.

O artigo 1412.º, n.º 2, do Código de Processo Civil alude ao tribunal de menores competente, mas esse preceito não invalida os termos do problema, visto interessar, presentemente, determinar se, no caso concreto dos autos, a competência pertence ou não ao tribunal de família.

A solução deste problema deve ser considerada também em face de legislação posteriormente publicada.

Com efeito, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 62.º da Lei 82/77, de 6 de Dezembro, conhecida por lei orgânica dos tribunais, compete aos tribunais de família, relativamente a menores, regular o exercício do poder paternal e conhecer das questões a este respeitantes.

Esse diploma introduziu alterações substanciais à organização dos tribunais, sendo de acentuar as que se referem à competência dos tribunais de família e dos tribunais de menores.

Um dos pontos relevantes das alterações introduzidas pela Lei 82/77 foi a repartição entre os tribunais de menores e os tribunais de família da competência tradicionalmente atribuída aos primeiros, e daí a necessidade de revisão da Organização Tutelar de Menores, levada a efeito pelo Decreto-Lei 314/78, de 27 de Outubro, como aliás se acentua no respectivo relatório.

Na alínea d) do artigo 146.º desse diploma estabelece-se que compete aos tribunais de família, em matéria tutelar cível, regular o exercício do poder paternal e conhecer das questões a este respeitantes.

Com esta solução não se afasta o princípio, anteriormente referido, da necessidade de assegurar, acima de tudo, a protecção dos menores.

A prevalência dos tribunais de família nesta matéria baseia-se, fundamentalmente, na competência especializada desses tribunais e, quando tenha sido instaurado o processo de divórcio ou de separação, no mais profundo conhecimento que os mesmos possuem da situação dos menores e dos interesses destes, conhecimento que lhes advém do estudo dos problemas dos pais e que determinaram a ruptura do respectivo vínculo matrimonial.

O tribunal que viveu o drama dos pais do menor, que se pronunciou sobre a culpabilidade deles na crise verificada, está em melhores condições do que qualquer outro para decidir dos efeitos, quanto aos filhos, do divórcio ou da separação dos pais.

Dispõe o artigo 149.º desse decreto-lei que, fora das áreas abrangidas pela jurisdição dos tribunais de família, cabe ao tribunal da respectiva comarca conhecer das causas que por lei àqueles estão atribuídas. Só nesses casos específicos a solução deste problema pertence ao tribunal de comarca.

Definida, em termos claros, a competência em razão da matéria dos tribunais de família, continua a suscitar-se a questão da competência territorial, visto o n.º 1 do artigo 155.º desse decreto-lei estatuir que para decretar as providências é competente o tribunal da residência do menor no momento em que o processo foi iniciado. Este preceito, de carácter geral, deixa de se observar no caso especial da regulação do poder paternal consequente ao divórcio ou separação decretada por um tribunal de família, porque, nesta hipótese, sendo a providência conexa com a acção que se encontra a correr em tribunal de família, é este o competente para conhecer dela.

Trata-se de competência por conexão, a que alude o n.º 1 do artigo 154.º do mencionado diploma, que adoptou uma solução coincidente, na sua essência, com a perfilhada na alínea f) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto 8/72, de 7 de Janeiro.

O tribunal de família, neste caso, é o competente para conhecer da regulação do exercício do poder paternal.

Não invalida este entendimento o facto de o citado n.º 1 do artigo 154.º aludir a acção que se encontra a correr, pois logo no início do processo respectivo deve o juiz procurar regular o exercício do poder paternal, como preceitua hoje o n.º 2 do citado artigo 1407.º do Código de Processo Civil. A razão continua, aliás, a subsistir, ou seja, a de ser esse tribunal de família o que está em melhores condições para decidir dos efeitos do divórcio ou da separação de pessoas e bens dos pais quanto ao filhos menores, ainda que não seja o da residência destes.

Neste sentido deverá ser resolvido o presente conflito de jurisprudência.

Sem custas.

Pelo exposto, e em harmonia com o douto parecer do digno representante do Ministério Público, é estabelecido o seguinte assento:

Em caso de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens decretados por um tribunal de família, a este compete a regulação consequente do exercício do poder paternal.

Lisboa, 24 de Julho de 1979. - Oliveira Carvalho - Adriano Vera Jardim - João Moura - Rodrigues Bastos - Daniel Ferreira - Abel de Campos - Santos Victor - Miguel Caeiro - Ferreira da Costa - Manuel Alves Peixoto - Costa Soares - Alberto Alves Pinto - Artur Moreira da Fonseca - Eduardo Botelho de Sousa - António de Melo Bandeira - João Vale - António Furtado dos Santos - Octávio Dias Garcia - Henrique Justino da Rocha Ferreira - Ruy de Matos Corte Real - Augusto de Azevedo Ferreira - Hernâni de Lencastre (com a declaração de que: para a regulação do poder paternal, em face das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 314/78, é, sem dúvida, o tribunal de família, havendo acção de separação de pessoas e bens ou de divórcio: porém aquele em que a acção tenha sido proposta, enquanto esta esteja a correr termos; mas o da residência dos menores, quando a mesma já tenha findado, dada a combinação dos critérios da conexão e territorial que ali se mostra adoptada) - Bruto da Costa (vencido, em virtude da declaração de voto que apresento em separado).

Declaração de voto

Salvo o devido respeito, discordo do assento, porquanto leva ao absurdo, ao que aliás procurou obstar o artigo 155.º do Decreto-Lei 314/78, de 27 de Outubro: se um casal se divorcia em Macau, hoje, e tem filhos de meses, e um dos cônjuges vem para Lisboa e com eles vive junto dos avós, com quem eles convivem, a resolução do poder paternal, daqui a quinze anos, será da competência do Tribunal de Macau? Esta é evidentemente do tribunal da residência dos menores e não do que decretou o divórcio.

E, mesmo que se não trate de caso tão evidente, se a mãe sempre conviveu com os menores em Trás-os-Montes e o divórcio foi decretado no Algarve, será o tribunal deste distrito o competente para a regulação do poder paternal? Sempre se entendeu e continua a entender-se que é o tribunal da residência dos menores que mais elementos possuirá para decidir em consciência do que lhes é mais conveniente, e são os interesses destes que acima de tudo devem ser respeitados.

Bruto da Costa.

Está conforme.

Lisboa, 2 de Outubro de 1979. - O Secretário, Manuel Fernandes Júnior.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/1979/10/19/plain-209211.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/209211.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1970-04-29 - Lei 4/70 - Presidência da República

    Autoriza o Governo a instituir tribunais de família, que constituirão órgãos judiciais ordinários de competência especializada.

  • Tem documento Em vigor 1972-01-07 - Decreto 8/72 - Ministério da Justiça - Gabinete do Ministro

    Determina que em cada uma das comarcas de Lisboa e do Porto seja criado um tribunal de família.

  • Tem documento Em vigor 1977-11-25 - Decreto-Lei 496/77 - Ministério da Justiça

    Revê o Código Civil aprovado pelo Decreto Lei 47344, de 25 de Novembro, nos domínios, e quanto à parte geral, do direito internacional privado, fixação da maioridade, regime do domicílio legal dos menores e aquisição da personalidade jurídica das associações. Revê ainda, no direito da família, a disciplina do casamento (e do divórcio), da filiação, da adopção e dos alimentos e, no direito sucessório, a posição do cônjuge sobrevivo.

  • Tem documento Em vigor 1977-12-06 - Lei 82/77 - Assembleia da República

    Aprova a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais.

  • Tem documento Em vigor 1978-10-27 - Decreto-Lei 314/78 - Ministério da Justiça

    Revê a Organização Tutelar de Menores.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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