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Acórdão 424/2001/T, de 14 de Novembro

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Texto do documento

Acórdão 424/2001/T. Const. - Processo 625/99. - Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:

1 - Relatório. - O Provedor de Justiça, no exercício da competência que lhe foi atribuída pelo artigo 283.º, n.º 1, da Constituição, requereu a este Tribunal que aprecie e verifique a inconstitucionalidade por omissão de medidas legislativas que confiram exequibilidade à parte final do artigo 239.º, n.º 4, da Constituição.

Fê-lo, em síntese, com os fundamentos seguintes:

A Lei Constitucional 1/97, de 20 de Setembro, ampliou a possibilidade de apresentação de candidaturas por grupos de cidadãos eleitores a todos os órgãos autárquicos, na redacção que deu ao n.º 4 do artigo 239.º da Constituição da República Portuguesa;

Por força da nova norma contida neste preceito constitucional, foi especificamente devolvido para a lei os termos em que aquela possibilidade deveria ser concretizada;

Sendo certo que, anteriormente, a Constituição possibilitava a apresentação dessas candidaturas para as eleições das assembleias de freguesia (artigo 246.º, n.º 2, na versão originária) e a lei (artigo 5.º do Decreto-Lei 701-A/76, de 29 de Setembro) regulara tal apresentação (o que para o efeito será bastante), já no que concerne aos órgãos dos municípios não existe no ordenamento jurídico português norma que dê o mínimo cumprimento à referida disposição constitucional;

Neste domínio está o legislador vinculado a aprovar a correspondente lei, pois só da sua emissão depende a exequibilidade da norma constitucional;

A verdade é que, até à data do pedido, decorreram dois anos sobre a Lei Constitucional 1/97, sem que tivesse sido tomada qualquer iniciativa legislativa sobre a matéria;

Muito embora a Constituição não fixe prazo para a emissão da lei e apenas no corrente ano de 2001 viessem a ocorrer eleições autárquicas, sempre poderia haver lugar a eleições intercalares, nas quais estaria vedada a participação de candidaturas de cidadãos eleitores;

Não podendo interpretar-se o artigo 239.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa como dando ao legislador a faculdade de escolher qual ou quais os órgãos autárquicos em que é admissível "a iniciativa popular de candidaturas", verifica-se, assim e na medida indicada, uma omissão legislativa.

Dada a competência legislativa atribuída à Assembleia da República nos termos do artigo 164.º, n.º 1, alínea l), da Constituição da República Portuguesa e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da LTC, foi notificado o Presidente daquele órgão de soberania que, na sua resposta, ofereceu o merecimento dos autos; informou, ainda, que fora admitido em 13 de Dezembro de 1999, e anunciado em 14 de Dezembro de 1999, um projecto de lei, da iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que "assegura a possibilidade de candidaturas de cidadãos independentes à eleição dos órgãos das autarquias locais", projecto esse registado sob o n.º 39/VIII e publicado no Diário da Assembleia da República, 2.ª série-A, n.º 10, de 18 de Dezembro de 1999, de que juntou um exemplar.

Cumpre conhecer.

2 - Fundamentação. - No Acórdão 276/89 deste Tribunal, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 13.º vol., I, pp. 135 e segs., salientou-se a complexidade dos problemas que suscita a exacta delimitação do âmbito do conceito de "omissão legislativa" com vista ao mecanismo do controlo previsto no artigo 283.º da Constituição da República Portuguesa, evocando-se, a propósito, a jurisprudência da Comissão Constitucional (Pareceres n.os 4/77, 8/77, 11/77, 9/78 e 11/81, em Pareceres da Comissão Constitucional, 1.º vol., pp. 77 e segs. e pp. 145 e segs., 2.º vol., pp. 3 e segs, 5.º vol., pp. 21 e segs, e 15.º vol., pp. 71 e segs., respectivamente) e a doutrinação de Gomes Canotilho (Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, pp. 325 e segs.), Jorge Miranda (Manual de Direito Constitucional, t. II, 2.ª ed., 1983, pp. 393 e segs.) e Vieira de Andrade (Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Coimbra, 1983, pp. 300 e segs.).

À luz da doutrina geral então exposta - para que se remete - e de modo semelhante à situação que foi apreciada no Acórdão 276/89, na situação em apreço, à data do pedido, estavam reunidas as circunstâncias típicas de uma "omissão legislativa" (mesmo acolhendo uma visão restritiva do conceito), pois se configurava uma muito concreta e específica incumbência cometida pela Constituição ao legislador, perfeitamente definida no seu sentido e alcance, sem deixar qualquer margem de liberdade quanto à sua decisão de intervir ou não, mostrando-se cumprido o desiderato constitucional logo que emitidas as correspondentes normas.

Haveria, apenas, que ponderar se o tempo entretanto decorrido desde a entrada em vigor da Lei Constitucional 1/97 - isto para quem entenda tratar-se de aspecto essencial na configuração de uma das situações previstas no artigo 283.º da Constituição da República Portuguesa - era, ou não, bastante para o cumprimento da tarefa legislativa em causa.

Não terá, porém, o Tribunal que se pronunciar sobre a questão, uma vez que, com a Lei Orgânica 1/2001, de 14 de Agosto, que substituiu integralmente os Decretos-Leis n.os 701-A/76 e 701-B/76, com as respectivas alterações, se passou a contemplar a possibilidade de apresentação de candidaturas por "grupos de cidadãos eleitores" para todos os órgãos autárquicos [artigo 16.º, n.º 1, alínea c)].

No mesmo diploma são detalhadamente regulados os requisitos para a organização e apresentação de tais candidaturas e as específicas exigências a que estão sujeitas (cf., entre outros, artigo 19.º e diversos números do artigo 23.º), adaptando-se, ainda, em conformidade, a lei relativa ao financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais (artigo 2.º, que altera os artigos 19.º, 20.º, 23.º e 29.º da Lei 56/98, de 18 de Agosto, na redacção da Lei 23/2000, de 23 de Janeiro).

Certo é, assim, que se não verifica, neste momento, qualquer "omissão" do legislador relativamente à incumbência que lhe foi cometida pelo artigo 239.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, na redacção da Lei Constitucional 1/97.

Ora, tendo em conta o princípio consagrado no artigo 663.º, n.º 1, do Código de Processo Civil - que deve considerar-se um "princípio geral de processo" -, a situação que se deixa referida conduz não ao não conhecimento do pedido por inutilidade superveniente, mas a uma decisão de mérito que corresponda a essa situação agora existente (no mesmo sentido, citado Acórdão 276/89 e Acórdão 638/95, em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 32.º vol., p. 12).

3 - Decisão. - Pelo exposto e em conclusão, o Tribunal Constitucional decide não dar por verificado o incumprimento da Constituição por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequível a norma constante da parte final do n.º 4 do artigo 239.º da Constituição da República Portuguesa.

Lisboa, 9 de Outubro de 2001. - Artur Maurício - Paulo Mota Pinto - José de Sousa e Brito - Guilherme da Fonseca - Maria Fernanda Palma - Maria Helena Brito - Maria dos Prazeres Beleza - Alberto Tavares da Costa - Bravo Serra - Luís Nunes de Almeida - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1952056.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1976-09-29 - Decreto-Lei 701-A/76 - Ministério da Administração Interna

    Estabelece as normas relativas à estrutura, competência e funcionamento dos órgãos do município e da freguesia.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-20 - Lei Constitucional 1/97 - Assembleia da República

    Aprova a quarta revisão da Constituição da República Portuguesa, de 2 de Abril de 1976, e fixa normas para aplicação no tempo de alguns dos preceitos revistos. Publica, em anexo, o novo texto constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-18 - Lei 56/98 - Assembleia da República

    Regula o regime aplicável aos recursos financeiros dos partidos políticos e das companhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 2000-08-23 - Lei 23/2000 - Assembleia da República

    Primeira alteração às Leis 56/98, de 18 de Agosto (financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais), e 97/88, de 17 de Agosto (afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda).

  • Tem documento Em vigor 2001-08-14 - Lei Orgânica 1/2001 - Assembleia da República

    Aprova a lei que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais. Altera o regime de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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