de 29 de Janeiro
Todo o cidadão minimamente conhecedor da situação conjuntural de crise que afecta as estuturas sociais e económicas da generalidade dos países possui a percepção de que o livre exercício dos direitos que se integram na autonomia da vontade das partes em matérias como a dos agravamentos salariais produz efeitos inevitáveis no processo de contenção da inflação, atenta a necessária correlação que sempre terá de existir entre os custos dos bens e dos serviços, por um lado, e os preços dos mesmos, por outro.Mas a influência dos agravamentos salariais no processo inflacionário não se reflecte apenas na elevação correspondente dos custos e dos preços dos bens e dos serviços, porquanto a propensão para o consumo e o inevitável aumento de produtos importados cresce numa relação próxima da do aumento da inflação.
Por outro lado, os efeitos dos agravamentos salariais têm repercussões na competitividade das nossas exportações, para as quais urge criar e manter condições de expansão, quer pela conquista de novos mercados, quer pela introdução de novos produtos.
Ora, reconhecendo-se que imperativos de interesse público obrigam a adoptar fórmulas de combate à inflação e de redução dos seus índices para valores compatíveis com o desenvolvimento económico e com o bem-estar mínimo da população, há que realizar aquele objectivo com o menor sacrifício possível, tanto para os trabalhadores como para as entidades empregadoras.
E se uma das formas de o alcançar seria o congelamento salarial ou a fixação de um limite máximo para as actualizações salariais - recurso a que têm vindo a lançar mão alguns países europeus -, convir-se-á em que, por qualquer destas vias, seriam principalmente sacrificadas as classes trabalhadoras. Procura-se evitar ou minorar tal inconveniente mediante a adopção de outras medidas que, não se exprimindo na imobilização dos processos de revisão periódica das remunerações de trabalho nem tão-pouco no estabelecimento de um tecto salarial, visam objectivos de combate e controle da inflação, redução do desequilíbrio da nossa balança de transacções correntes e estímulo à formação de poupança necessária ao esforço de investimento.
A criação de uma contribuição extraordinária incidente sobre a parte das remunerações que, eventualmente, exceda o valor percentual fixado em 17% para o ano de 1983 constitui, entre outras, uma forma de não sacrificar drasticamente um dos princípios fundamentais da relação contratual do trabalho, que é a liberdade negocial, conferindo-lhe um sentido redistributivo dos acréscimos marginais e uma função moderadora dos respectivos efeitos inflacionários. Nenhuma contribuição extraordinária incidirá, porém, sobre as entidades empregadoras e sobre os trabalhadores se a parte excedente ao valor percentual acima indicado for totalmente convertida em títulos da dívida pública, os quais poderão ser mobilizados em condições de comprovada urgência.
Do mesmo modo são igualmente excepcionadas da aplicação daquele regime as retribuições líquidas mensais de valor igual ou inferior a 15000$00.
Finalmente, e dado o sentido de adequação à situação real das empresas que se pretende tenha o presente diploma, admite-se, quanto a empresas ou a sectores em crise, que possam ser determinados, precedidos de avaliação objectiva, parâmetros imperativos às negociações adequadas à salvaguarda da própria subsistência das unidades produtivas em causa e dos respectivos postos de trabalho.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º - 1 - Em 1983 o aumento da massa salarial a considerar como componente de custo para efeito de formação dos preços dos produtos e empresas abrangidos pelo estabelecido nos Decretos-Leis n.os 329-A/74, de 10 de Junho, e 75-Q/77, de 28 de Fevereiro, não poderá ser superior a 17% do montante da massa salarial considerada como custo em 31 de Dezembro de 1982, por força do Despacho Normativo 346/81, de 31 de Dezembro.
2 - O mesmo se aplicará às empresas públicas não abrangidas pelo estabelecido nos decretos-leis referidos no número anterior, cujos preços ou tarifas sejam fixados ou autorizados pelo Governo, e, bem assim, aos subsídios, indemnizações compensatórias ou compensações de custos pelo Estado.
Art. 2.º - 1 - Em 1983 o aumento das remunerações dos trabalhadores, decorrente de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, fica sujeito a uma contribuição extraordinária para a segurança social na parte que exceder 17% do montante da retribuição global referente ao posto de trabalho de cada trabalhador em 31 de Dezembro de 1982, sem prejuízo do disposto no n.º 3.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, entende-se por retribuição global, apenas a que é constituída pela remuneração de base, acrescida de eventuais prestações complementares pagas com carácter regular e periódico.
3 - Em caso de promoção do trabalhador ou de alteração do respectivo regime de organização do trabalho, tomar-se-á como base do cálculo a retribuição global correspondente a idêntico posto de trabalho, categoria, escalão, grau ou nível a que o trabalhador vier a ter acesso.
Art. 3.º - 1 - O montante da contribuição a que se refere o n.º 1 do artigo anterior é fixado em 30% para a entidade patronal e igualmente em 30% para o trabalhador.
2 - São inexistentes quaisquer acordos que transfiram entre as partes o encargo da liquidação da contribuição para a segurança social prevista no número anterior.
Art. 4.º Não será devida a contribuição extraordinária prevista no artigo 2.º nos seguintes casos:
a) Se, por acordo entre as partes, a totalidade das remunerações em excesso for paga pela entidade patronal através da entrega de títulos da dívida pública adquiridos para o efeito;
b) Se a retribuição líquida mensal auferida pelo trabalhador após o aumento for igual ou inferior a 15000$00.
Art. 5.º - 1 - Os títulos da dívida pública a que se refere a alínea a) do artigo 4.º têm a natureza de títulos de aforro e são especialmente emitidos para o efeito, com prazo de amortização de 5 anos.
2 - Os títulos da dívida pública adquiridos ao abrigo do disposto no presente diploma serão nominativos e só poderão ser transaccionados nos casos a seguir indicados e em condições a regulamentar por portaria conjunta do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano e dos Ministros do Trabalho e dos Assuntos Sociais:
a) Aquisição de habitação própria e permanente;
b) Desemprego;
c) Morte do cônjuge;
d) Reforma por invalidez ou velhice;
e) Doença grave prolongada.
Art. 6.º - 1 - No caso das empresas públicas em situação económica difícil, com situação líquida negativa ou com défices de exploração efectivos ou previsionais, ou no caso de sectores em crise, poderá o Conselho de Ministros fixar, por resolução, a taxa de variação máxima dos encargos com pessoal em limite inferior à percentagem de 17% referida no artigo 2.º 2 - São inexistentes e de nenhum efeito as cláusulas de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que vierem a dispor em termos de violação da taxa de variação máxima a que se refere o número anterior.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 6 de Janeiro de 1983. - Francisco José Pereira Pinto Balsemão - João Maurício Fernandes Salgueiro - Luís Alberto Ferrero Morales - Luís Eduardo da Silva Barbosa - Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Promulgado em 21 de Janeiro de 1983.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.
Referendado em 25 de Janeiro de 1983.
O Primeiro-Ministro, Francisco José Pereira Pinto Balsemão.