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Acórdão 660/2006, de 10 de Janeiro

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Sumário

Julga inconstitucional a norma do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual permite a destruição de elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações, que o órgão de polícia criminal e o Ministério Público conheceram e que são considerados irrelevantes pelo juiz de instrução, sem que o arguido deles tenha conhecimento e sem que se possa pronunciar sobre a sua relevância

Texto do documento

Acórdão 660/2006

Processo 729/2006

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - Sandro Renato Sousa dos Santos interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães do despacho do juiz de instrução criminal do Tribunal Judicial de Valença que o pronunciou pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro. Nas respectivas alegações disse:

"7.ª Acresce que, sem prescindir, o artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa confere ao arguido Sandro Santos o direito fundamental ao contraditório relativamente aos meios de prova de que o Ministério Público se socorre para estribar a sua acusação e para a sustentar em audiência de julgamento.

8.ª A conservação das gravações não transcritas até ao trânsito em julgado da decisão final, podendo o arguido requerer a sua audição em sede de julgamento ou de recurso para contextualizar as conversações transcritas, constitui um direito fundamental do arguido, que neste caso se encontra irremediavelmente precludido, afectando a totalidade da prova colhida com violação daquela norma constitucional.

9.ª Deste modo, o artigo 188.º, n.º 3, do CPP, na medida em que impede ao arguido exercer o contraditório relativamente às escutas telefónicas por não estarem nos autos os registos fonográficos integrais das mesmas é inconstitucional, afectando a totalidade da prova colhida com violação daquela norma constitucional."

O Tribunal da Relação de Guimarães, por Acórdão de 19 de Junho de 2006, considerou o seguinte:

"Defende, por último, o recorrente que é inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, a norma constante do artigo 188.º, n.º 3, do CPP "na medida em que impede ao arguido exercer o contraditório relativamente às escutas telefónicas por não estarem nos autos os registos fonográficos integrais das mesmas".

Vejamos...

Dispõe o artigo 188.º, n.º 3, do CPP, que "[s]e o juiz considerar os elementos recolhidos, ou alguns deles, relevantes para a prova, ordena a sua transcrição em auto e fá-lo juntar ao processo; caso contrário, ordena a sua destruição, ficando todos os participantes nas operações ligados ao dever de segredo relativamente àquilo de que tenham tomado conhecimento".

Por sua vez, o citado artigo 34.º, n.º 5, da CRP preceitua que: "o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório".

Como refere o Prof. Germano Marques da Silva "[e]ste princípio traduz-se na estruturação da audiência em termos de um debate ou discussão entre a acusação e a defesa. Cada um destes sujeitos é chamado a aduzir as suas razões de facto e de direito, a oferecer as suas provas, a controlar as provas contra si oferecidas e a discretear sobre o resultado de umas e outras" - v. Curso de Processo Penal, Verbo, vol. I, p. 72.

Pois bem, não se vê como é que o preceituado no artigo 188.º, n.º 3, do CPP, na parte em que estatui que o juiz ordena a destruição dos elementos que considerar irrelevantes, viola o n.º 5 do artigo 34.º da Constituição da República Portuguesa. A ordem de destruição dos elementos irrelevantes faz parte do acompanhamento judicial da própria execução da operação de intercepção e gravação das comunicações telefónicas, imposto pelo elevado potencial de danosidade social desta intromissão.

Com efeito, se um dos propósitos visados com o acompanhamento judicial é, como se escreve no Acórdão 426/2005, do Tribunal Constitucional, "fazer depender a aquisição processual da prova a um 'crivo' judicial quanto ao seu carácter não proibido e à sua relevância", então dificilmente se concebe que elementos considerados irrelevantes pelo "crivo" judicial pudessem ser utilizados, máxime para contextualizar precisamente o teor de chamadas telefónicas consideradas relevantes, e que foram transcritas integralmente, como ocorreu no caso dos presentes autos [cf. n.os 9), 15) e 22)].

Funcionando, à face da nossa lei, a intervenção judicial como garantia tanto do escutado como de terceiros, com vista a impedir a devassa sobre factos inúteis, isto é, sem relevância para a descoberta da verdade, a não destruição dos elementos considerados irrelevantes permitiria a devassa que precisamente se quis evitar com a intervenção judicial.

Os elementos seleccionados pelo juiz como relevantes e que são transcritos é que constituem prova. E quanto a estes elementos assiste ao arguido, ao assistente e às pessoas escutadas, nos termos do n.º 5 do artigo 188.º do CPP, o direito de examinarem o auto de transcrição por forma a conferirem a conformidade da transcrição com a gravação e a exigirem a rectificação dos erros detectados ou de identificação de vozes. E esta prova, junta ao processo, está sujeita ao contraditório em sede de audiência de julgamento. Nesta sede, o arguido poderá discutir o seu valor probatório, designadamente o sentido da conversação escutada.

Concluindo, entende-se que o citado preceito não viola o artigo 34.º, n.º 5, da CRP."

2 - Veio, então, o arguido interpor recurso de constitucionalidade nos seguintes termos:

"O arguido Sandro Renato Sousa dos Santos, notificado do douto acórdão do venerando Tribunal da Relação de Guimarães;

Inconformado quanto ao conteúdo do mesmo relativamente à improcedência das inconstitucionalidades suscitadas, quer no requerimento de abertura da instrução quer nas alegações apresentadas em juízo:

Vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional;

Para a fiscalização concreta da inconstitucionalidade.

Nos termos e com os fundamentos seguintes:

Disposição legal ao abrigo da qual se interpõe o recurso:

Artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LOFPTC.

Normas cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada:

O artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, porque permite a interpretação, feita no douto acórdão recorrido, segundo a qual o auto de transcrição das fitas gravadas e as referidas fitas podem ser remetidas pelo órgão de polícia criminal ao Ministério Público, uma vez que, "o Ministério Público, como titular da acção penal, não pode ficar alheado do material das escutas";

O artigo 180.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, na medida em que o douto acórdão recorrido interpreta a norma no sentido de permitir a destruição das fitas gravadas ou similares das conversas telefónicas, impossibilitado o contraditório consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa (CRP), pois não lhe é permitido aceder na íntegra à gravação feita pelo órgão de polícia criminal, isto é, o arguido não tem como verificar se as afirmações que aparecem transcritas nos autos correspondem efectivamente às conversas gravadas, se não surgem transcritas fora de um contexto prévio e ou ulterior, ou se contêm conversas que permitam ser utilizadas na defesa do arguido. Por conseguinte, este meio de recolha da prova só pode ser utilizado pela acusação, estando vedado ao arguido utilizar o mesmo meio e a prova que eventualmente daí resulte em benefício da sua defesa.

Normas que se consideram violadas:

Os artigos 32.º, n.os 1, 4, 5 e 8, 34.º, n.os 1 e 4, e 18.º, n.os 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa.

Peças processuais em que foram suscitadas as inconstitucionalidades das normas:

Requerimento de abertura da instrução no Tribunal de Instrução Criminal da Comarca de Valença e alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães.

Termos em que requer-se a VV. Exmas. se dignem admitir o presente recurso, fixando-lhe efeito suspensivo e subida imediata nos próprios autos."

No Tribunal Constitucional foi proferido, pela relatora, o seguinte despacho:

"1 - Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Guimarães, em que figura como recorrente Sandro Renato Sousa dos Santos e como recorrido o Ministério Público, é submetida à apreciação do Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, uma dimensão normativa do artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e uma dimensão normativa do artigo 180.º, n.º 3, do mesmo Código (dimensões identificadas no requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional - fl. 101).

Quanto à questão reportada ao artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, verifica-se que o recorrente, nas alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães e na resposta ao parecer do Ministério Público, não suscitou a inconstitucionalidade da dimensão normativa que pretende agora ver apreciada.

Desse modo, não se verifica, quanto à primeira questão identificada pelo recorrente, o pressuposto do recurso da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na suscitação durante o processo da questão de constitucionalidade normativa. Assim, não se poderá tomar conhecimento da conformidade à Constituição da dimensão normativa do artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, que o recorrente impugna.

2 - Em face do exposto, notifique-se o recorrente para, no prazo de 20 dias, produzir alegações relativamente à questão que tem por objecto o artigo 180.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, suscitando-se a presente questão prévia relativa ao artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, nos termos do artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável nos presentes autos por força do artigo 69.º da Lei do Tribunal Constitucional."

O recorrente apresentou alegações nas quais concluiu:

"1.º Decorre do artigo 11.º, n.º 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de Dezembro de 1948, que: "[t]oda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público, em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas".

2.º Por sua vez, a Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 32.º, n.º 1, garante: "[o]processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso".

3.º O n.º 2 da mesma norma assegura que: "[t]odo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa".

4.º E o n.º 5 prevê: "estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório".

6.º Assim, no direito de defesa conferido ao arguido aflora como corolário o direito ao contraditório relativamente à prova carreada pelo Ministério Público com a colaboração do JIC.

8.º Ora, tendo o JIC ordenado a destruição dos suportes fonográficos previamente seleccionados pelo Ministério Público, relativamente às escutas telefónicas, o arguido fica impedido de utilizar os registos fonográficos em sua defesa, donde resulta um gritante desequilíbrio nos meios de prova e de recolha da prova de que dispõe o Ministério Público para fundamentar a acusação e aqueles que o arguido pode utilizar para contrariar os argumentos e os meios de prova da defesa.

9.º Ora, considerando a Exma. Sr.ª Juíza de Instrução e o venerando Tribunal a quo na interpretação que fizeram do artigo 188.º, n.º 3, do CPP, defendendo que é perfeitamente harmonizável com as disposições fundamentais supracitadas a destruição dos registos fonográficos relativos às conversas telefónicas, o arguido pugna pela declaração de inconstitucionalidade daquela dimensão normativa, devendo o Tribunal Constitucional considerar que para garantir o direito fundamental de defesa do arguido deve-lhe ser garantido o acesso às gravações integrais ordenadas pelo JIC de modo a respeitarem-se, entre outras normas, os artigos 11.º, n.º 1, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de Dezembro de 1948, 6.º, n.º 3, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ratificada pela Lei 65/78, de 13 de Outubro, e 32.º, n.os 1, 2 e 5, da CRP.

Nestes termos e contando sempre com o douto suprimento de VV. Exmas., considerando e acolhendo as conclusões enunciadas farão VV. Exmas. justiça, não permitindo que as escutas realizadas nos presentes autos possam ser utilizadas como meio de prova contra o arguido."

Contra-alegou o Ministério Público concluindo o seguinte:

"1.º A norma do n.º 3 do artigo 188.º do Código de Processo Penal, no segmento em que estabelece a destruição dos elementos não relevantes para a prova, sem prévio acesso e conhecimento por parte do arguido, não é inconstitucional, quando interpretada no sentido de que àquele não está vedado o pleno exercício do contraditório relativamente à prova relevante constante do processo e na ausência de qualquer indicação que o acesso a tais elementos, conhecidos, analisados e controlados pelo juiz de instrução, relevam para o exercício do direito de defesa.

2.º Termos em que deverá improceder o presente recurso."

Cumpre apreciar e decidir, após inscrição do processo em tabela e mudança do relator.

II - Fundamentos. - A) Delimitação do objecto do recurso. - 3 - Importa começar por delimitar o objecto do recurso.

O recorrente indicou como normas cuja constitucionalidade pretendia ver apreciada: o "artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, porque permite a interpretação, feita no douto acórdão recorrido, segundo a qual o auto de transcrição das fitas gravadas e as referidas fitas podem ser remetidas pelo órgão de polícia criminal ao Ministério Público"; e o "artigo 180.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, na medida em que o douto acórdão recorrido interpreta a norma no sentido de permitir a destruição das fitas gravadas ou similares das conversas telefónicas".

A relatora, no despacho que se encontra a fl. 113 dos autos, transcrito supra, suscitou a questão prévia do não conhecimento do objecto do recurso relativamente à dimensão normativa reportada ao "artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal", por falta de suscitação, durante o processo, da questão de constitucionalidade dessa norma. O recorrente não apresentou qualquer argumentação relativamente a este ponto e verifica-se que, efectivamente, nas alegações do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Guimarães, o recorrente apenas suscita a inconstitucionalidade do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.

Desse modo, por falta de preenchimento do requisito, indispensável para se poder conhecer do recurso, previsto nos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional, não se poderá tomar conhecimento do presente recurso no que se refere à norma indicada no requerimento de recurso e no referido despacho da relatora como reportada ao artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

4 - O recorrente impugnou no requerimento de recurso, como se disse, o artigo 180.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de permitir a destruição dos registos magnéticos obtidos mediante intercepção de telecomunicações, que sejam considerados irrelevantes pelo juiz de instrução, e o despacho que determinou a produção de alegações reportou-se igualmente a essa norma.

Como, porém, resulta das alegações do recorrente - e das contra-alegações do Ministério Público - e do confronto entre os artigos 180.º e 188.º do Código de Processo Penal, a indicação daquele primeiro preceito resulta de mero lapso, aliás notado e corrigido pelos próprios recorrente e recorrido: o artigo 180.º refere-se à apreensão em escritório de advogado ou em consultório médico, que não está em causa, sendo, antes, o artigo 188.º do Código de Processo Penal, referente às formalidades das operações de intercepção, gravação e transcrição das telecomunicações, que está em causa, e em particular o seu n.º 3, na interpretação segundo a qual permite a destruição, por ordem do juiz de instrução, dos registos magnéticos que considere irrelevantes. Foi, aliás, a inconstitucionalidade deste artigo 188.º, n.º 3, que foi suscitada durante o processo, perante o tribunal recorrido.

Tendo o lapso sido corrigido sem consequências, tomar-se-á como objecto do presente recurso a apreciação da constitucionalidade de uma dimensão normativa referida ao artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.

5 - A dimensão normativa em causa corresponde, segundo o requerimento de recurso, à interpretação do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal no sentido de "permitir a destruição das fitas gravadas ou similares das conversas telefónicas" sem que ao arguido seja permitido "aceder na íntegra à gravação feita pelo órgão de polícia criminal".

Dispõe o artigo 188.º do Código de Processo Penal:

"Artigo 188.º

Formalidades das operações

1 - Da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é lavrado auto, o qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as operações, com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos considerados relevantes para a prova.

2 - O disposto no número anterior não impede que o órgão de polícia criminal que proceder à investigação tome previamente conhecimento do conteúdo da comunicação interceptada a fim de poder praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova.

3 - Se o juiz considerar os elementos recolhidos, ou alguns deles, relevantes para a prova, ordena a sua transcrição em auto e fá-lo juntar ao processo; caso contrário, ordena a sua destruição, ficando todos os participantes nas operações ligados ao dever de segredo relativamente àquilo de que tenham tomado conhecimento.

4 - Para efeitos do disposto no número anterior, o juiz pode ser coadjuvado, quando entender conveniente, por órgão de polícia criminal, podendo nomear, se necessário, intérprete. À transcrição aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 101.º, n.os 2 e 3.

5 - O arguido e o assistente, bem como as pessoas cujas conversações tiverem sido escutadas, podem examinar o auto de transcrição a que se refere o n.º 3 para se inteirarem da conformidade das gravações e obterem, à sua custa, cópias dos elementos naquele referidos."

Consultando o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães recorrido, verifica-se que, efectivamente, este se baseou numa interpretação do transcrito n.º 3 segundo a qual o juiz de instrução pode ordenar a destruição dos elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações que considere irrelevantes, sem que o arguido deles tenha conhecimento e sem que se possa pronunciar sobre a sua relevância, e mesmo que o órgão de polícia criminal os tenha conhecido integralmente.

Segundo o acórdão recorrido, a "ordem de destruição dos elementos irrelevantes faz parte do acompanhamento judicial da própria execução da operação de intercepção e gravação das comunicações telefónicas, imposto pelo elevado potencial de danosidade social desta intromissão". Com efeito, a "intervenção judicial como garantia tanto do escutado como de terceiros, com vista a impedir a devassa sobre factos inúteis, isto é, sem relevância para a descoberta da verdade, a não destruição dos elementos considerados irrelevantes permitiria a devassa que precisamente se quis evitar com a intervenção judicial".

Importa notar, porém, que o Tribunal da Relação de Guimarães se não baseou, como fundamento para a destruição dos elementos de prova, no facto de estarem em causa intercepções proibidas ou não levadas a cabo nos termos legalmente previstos, ou, sequer, numa concretização, no caso, da referida danosidade social pelo facto de intervirem nas comunicações concretamente destruídas terceiros ou de o seu conteúdo se reportar a terceiros, pela circunstância de, por exemplo, dizerem respeito a matérias sob segredo profissional ou outro tipo de segredo, ou, ainda, de a divulgação daquelas comunicações (cujo risco se mantém quando não são destruídos os seus registos) poder afectar particularmente direitos, liberdades e garantias. Está em causa apenas a destruição dos registos magnéticos das comunicações, por ordem judicial, baseada exclusivamente num juízo sobre a sua relevância para a prova e não em qualquer daquelas outras razões, não sendo, aliás, de excluir que o resultado da ponderação das exigências constitucionais quanto aos direitos do arguido com essas outras razões (por exemplo, direitos de terceiro) possa conduzir a um juízo diverso quanto à questão de constitucionalidade.

Note-se, aliás, que o que está em causa não é a questão de saber se é ao juiz de instrução ou ao arguido que cabe a faculdade de decidir definitivamente sobre a relevância das comunicações e, consequentemente, a destruição dos registos magnéticos. Está apenas em causa saber se o juiz pode ordenar a destruição destes registos exclusivamente com base na sua apreciação da sua relevância, sem que o conteúdo das comunicações possa, pois, ser logo ou posteriormente comunicado, de forma integral e completa, ao arguido, ou para que este possa, pelo menos, fundamentar cabalmente a sua apreciação, possivelmente diversa, sobre a relevância, para o processo, das conversações que o juiz pode ter considerado irrelevantes.

É também claro, por outro lado, que a decisão recorrida admitiu que seja ordenada a destruição dos elementos de prova com base numa apreciação da sua irrelevância efectuada pelo juiz, mesmo que o órgão de polícia criminal e o Ministério Público tomem conhecimento integral do conteúdo das comunicações, resultando tal possibilidade do próprio procedimento para realização das escutas - cf., aliás, o artigo 188.º, n.º 2, do Código de Processo Penal e a parte final do n.º 1, esta aditada pelo Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, por forma a passar a prever que o auto é levado ao conhecimento do juiz "com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos considerados relevantes para a prova" [pelo órgão de polícia criminal e pelo Ministério Público, que dirige o inquérito - artigo 53.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal].

6 - Segundo se lê na decisão recorrida, são os "elementos seleccionados pelo juiz como relevantes e que são transcritos" que constituem prova e é apenas quanto a estes elementos que "assiste ao arguido, ao assistente e às pessoas escutadas, nos termos do n.º 5 do artigo 188.º do CPP, o direito de examinarem o auto de transcrição, por forma a conferirem a conformidade da transcrição com a gravação e a exigirem a rectificação dos erros detectados ou de identificação de vozes", sendo apenas essa prova, junta ao processo, que "está sujeita ao contraditório em sede de audiência de julgamento", aí podendo o arguido discutir o seu valor probatório, designadamente o sentido da conversação escutada.

Invoca o recorrente que, tendo sido ordenada a destruição dos registos das comunicações, "previamente seleccionados pelo Ministério Público", o arguido fica impedido de os utilizar em sua defesa, com "um gritante desequilíbrio nos meios de prova e de recolha da prova de que dispõe o Ministério Público para fundamentar a acusação e aqueles que o arguido pode utilizar para contrariar os argumentos e os meios de prova da defesa". Designadamente o recorrente alega que não pode contraditar a relevância das gravações transcritas, ficando impossibilitado de proceder a uma contextualização das conversas consideradas relevantes.

É certo que o recorrente não concretizou os elementos que tencionava vir a descobrir com o acesso integral ao conteúdo das comunicações interceptadas, limitando-se a referir que necessitava desse acesso para contextualização das gravações que o juiz considerou relevantes.

Tal não pode, porém, constituir obstáculo a que se tome conhecimento do recurso nem, adianta-se desde já, pode influir de modo decisivo na própria decisão da questão de constitucionalidade.

Com efeito, exigir que o arguido justificasse a "contextualização" que pretendia realizar, no caso concreto, com referência ao conteúdo das comunicações interceptadas seria exigir-lhe que avançasse hipóteses, ou que fizesse conjecturas, baseadas no conteúdo de comunicações a que não pôde aceder. Na falta de outros elementos de prova, a referência apenas aos elementos que ficaram registados não é suficiente na medida em que possa estar justamente em causa o seu enquadramento e explicação por outros elementos, os quais foram destruídos. Estar-se-ia, assim, a exigir ao arguido, ainda que apenas para fundamentar substancialmente a relevância do "contexto" dos elementos de prova transcritos, que conjecturasse qual poderia ser o conteúdo das comunicações destruídas, sem que, aliás, tendo em conta tal destruição, pudesse esperar que essas conjecturas ou hipóteses viessem alguma vez a ser comprovadas. Tal ónus não se afigura razoável.

Acresce que o arguido invoca que, com a destruição das gravações, fica impedido de as utilizar em sua defesa, com "um gritante desequilíbrio nos meios de prova e de recolha da prova de que dispõe o Ministério Público para fundamentar a acusação e aqueles que o arguido pode utilizar para contrariar os argumentos e os meios de prova da defesa", o que não se limita à possibilidade de uma contextualização. O acesso ao conteúdo das comunicações interceptadas pode servir ao arguido, para os "utilizar em sua defesa", não só para tal enquadramento ou contextualização dos que se encontram já transcritos nos autos e que foram utilizados pelo Ministério Público, como para a descoberta de novos elementos que o arguido considere relevantes, capazes, por exemplo, de influenciar o seu grau de culpa ou de permitir a invocação de causas de justificação.

7 - Tomar-se-á, pois, conhecimento do recurso, dirigido à apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, no entendimento de que permite a destruição de elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações e que o órgão de polícia criminal conheceu, com base numa apreciação da sua relevância efectuada, e na consequente ordem dada, pelo juiz de instrução, sem que o arguido chegue a tomar conhecimento do seu conteúdo e sem poder, pois, pronunciar-se sobre a sua relevância.

B) Questão de constitucionalidade. - 8 - O recorrente fundamenta a inconstitucionalidade da norma impugnada na violação do artigo 32.º, n.os 1, 2 e 5, da Constituição da República Portuguesa. O primeiro, como se sabe, prevê que o processo criminal assegura "todas as garantias de defesa" e o artigo 32.º, n.º 5, prevê que a audiência de julgamento e os actos que a lei determinar estão subordinados ao princípio do contraditório.

Por sua vez, o artigo 32.º, n.º 2, consagra a presunção de inocência do arguido até ao trânsito em julgado da sentença de condenação. A relevância directa deste último parâmetro para a apreciação da constitucionalidade da norma em causa pode, porém, ser afastada: a possibilidade de destruição de elementos de prova considerados irrelevantes pelo juiz, e conhecidos pela acusação, mas sem conhecimento por parte do arguido, pode ter consequências para a defesa deste no processo, dificultando-a, mas não afecta, só por si, a presunção de inocência. Em abstracto, tal destruição tanto poderá, aliás, facilitar como dificultar um juízo sobre a prática dos factos em causa e a culpabilidade do arguido, como pode simplesmente ser irrelevante.

Inversamente, porém, ocorre ainda a possível convocação, como parâmetros da constitucionalidade das normas em causa, a par da previsão de "todas as garantias de defesa" e do princípio do contraditório (ou contidos nas primeiras e a par deste último), da garantia de que o processo criminal será um processo leal (um due process of law), bem como de uma "igualdade de armas" entre a acusação e a defesa, ínsitos também no princípio do Estado de direito.

9 - O Tribunal Constitucional nunca se pronunciou sobre a constitucionalidade da norma em questão, apesar de ter já uma vasta jurisprudência sobre a matéria das escutas telefónicas. Existem também poucas decisões sobre o problema da destruição dos suportes magnéticos das comunicações interceptadas.

Pode destacar-se, desde logo, o Acórdão 426/2005 (publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 232, de 5 de Dezembro de 2005), pelo qual não foi julgada inconstitucional justamente a norma do artigo 188.º, n.os 1, 3 e 4, do Código de Processo Penal, interpretados "no sentido de que são válidas as provas obtidas por escutas telefónicas cuja transcrição foi, em parte, determinada pelo juiz de instrução, não com base em prévia audição pessoal das mesmas mas por leitura de textos contendo a sua reprodução, que lhe foram espontaneamente apresentados pela Polícia Judiciária, acompanhados das fitas gravadas ou elementos análogos" (itálicos aditados). Nesta decisão, tirada na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional, pode ler-se, com interesse para o presente caso:

"Com base nas referências, por transcrição ou por resumo, das passagens das conversações que o órgão de polícia criminal (que está sujeito a especiais obrigações de objectividade) considera relevantes - indicações essas que, porque necessariamente acompanhadas do envio ao juiz das fitas gravadas ou elementos análogos, merecem, à partida, um juízo de fidedignidade, atenta a possibilidade efectiva de controlo da sua correspondência ao material gravado -, pode o juiz quer determinar de imediato a interrupção da intercepção revelada desnecessária quer formular juízo próprio sobre a admissibilidade e a relevância dos elementos a transcrever.

Acresce que, em rigor, essa selecção dos elementos a transcrever é necessariamente uma primeira selecção, dotada de provisoriedade, podendo vir a ser reduzida ou ampliada. Assiste, na verdade, ao arguido, ao assistente e às pessoas escutadas o direito de examinarem o auto de transcrição, exame que se deve entender não ser apenas destinado a conferir a conformidade da transcrição com a gravação e exigir a rectificação dos erros de transcrição detectados ou de identificação das vozes gravadas mas também para reagir contra transcrições proibidas (por exemplo, de conversações do arguido com o defensor) ou irrelevantes. Inversamente, deve ser facultado à defesa (e também à acusação) a possibilidade de requerer a transcrição de mais passagens que as inicialmente seleccionadas pelo juiz, quer por entenderem que as mesmas assumem relevância própria quer por se revelarem úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens anteriormente seleccionadas.

No presente caso, os recorrentes não questionam a admissibilidade e a relevância das transcrições seleccionadas pelo juiz com base nas indicações fornecidas pelo órgão de polícia criminal, indicações com as quais o Ministério Público manifestou plena concordância. O que, no fundo, os recorrentes acabam por considerar inconstitucional é a circunstância de essa forma de coadjuvação dos órgãos de polícia criminal ter sido prestada sem ter sido previamente solicitada, por forma expressa, pelo juiz de instrução. No entanto, a inequívoca aceitação, por parte deste, dessa coadjuvação torna puramente formal a pretensa irregularidade, que de modo algum pode ser considerada como pondo em risco os valores prosseguidos pela exigência, feita pela jurisprudência constitucional, de acompanhamento judicial contínuo e próximo, temporal e materialmente, da fonte.

Conclui-se, assim, que, independentemente de ser essa, ou não, a melhor interpretação do regime legal vigente, não é constitucionalmente imposto que o único modo pelo qual o juiz pode exercitar a sua função de acompanhamento da operação de intercepção de telecomunicações seja o da audição, pelo próprio, da integralidade das gravações efectuadas ou sequer das passagens indicadas como relevantes pelo órgão de polícia criminal, bastando que, com base nas menções ao conteúdo das gravações, com possibilidade real de acesso directo às gravações, o juiz emita juízo autónomo sobre essa relevância, juízo que sempre será susceptível de contradição pelas pessoas escutadas quando lhes for facultado o exame do auto de transcrição [itálicos aditados]."

O regime da destruição dos registos magnéticos de comunicações interceptadas só foi, porém, objecto de uma apreciação a título principal no Acórdão 4/2006 (publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 32, de 14 de Fevereiro de 2006), embora a propósito de uma questão de certa forma diametralmente oposta à que está agora em causa: não a de saber se é constitucionalmente permitido que o juiz ordene a destruição dos registos com base apenas na sua apreciação sobre a sua relevância, e sem conhecimento pelo arguido, mas antes a de saber se existe uma obrigação constitucional de se proceder à imediata desmagnetização da gravação das intercepções consideradas sem interesse, tendo-se pronunciado no sentido da inexistência de inconstitucionalidade. Para tanto, disse-se no Acórdão 4/2006, tirado também na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

"Como já se assinalou quando se referenciou a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e como já se consignou no Acórdão 426/2005, o que se poderia considerar como constitucionalmente inadmissível seria, pelo contrário, a privação da possibilidade - que a imediata desmagnetização da gravação logo após a audição pelo juiz acarretaria - de a defesa requerer a transcrição de passagens das gravações, não seleccionadas pelo juiz, que repute relevantes para a descoberta da verdade. Por isso, no citado Acórdão 426/2005 se consignou que "deve ser facultado à defesa (e também à acusação) a possibilidade de requerer a transcrição de mais passagens que as inicialmente seleccionadas pelo juiz, quer por entenderem que as mesmas assumem relevância própria quer por se revelarem úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens anteriormente seleccionadas".

Também em termos de direito comparado se assinalou (cf., supra, o n.º 2.8) que: na Bélgica, as gravações são mantidas intactas a fim de as partes as poderem consultar e requerer a transcrição de passagens inicialmente tidas por irrelevantes; em França, as gravações só são destruídas no termo do prazo de prescrição do procedimento criminal; na Alemanha, elas são mantidas e podem ser ouvidas na própria audiência de julgamento; em Itália, só após audição das gravações (cuja guarda compete ao Ministério Público) pela defesa e pronúncia dos diversos intervenientes é que o juiz manda suprimir os registos cuja utilização é legalmente vedada e admite os que não são manifestamente irrelevantes (artigo 268.º, n.º 6, do Código de Processo Penal), sendo os registos conservados até ao trânsito em julgado da sentença final, a menos que, a requerimento dos interessados, com fundamento em tutela da privacidade, o juiz autorize a destruição antecipada (artigo 269.º, n.º 2, do mesmo Código); em Espanha, atenta a exiguidade da regulamentação legal, a jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Tribunal Supremo têm insistido na necessidade de serem os originais das fitas de gravação ou elementos análogos a serem remetidos ao tribunal, ficando à guarda do secretário judicial, que facultará o seu acesso às partes (e ao Ministério Público) e dirigirá a tarefa de transcrição das partes tidas por relevantes (cf. José Luis Rodríguez Lainz, ob. cit. [La Intervención de las Comunicaciones Telefónicas - Su Evolución en la Jurisprudencia del Tribunal Constitucional y del Tribunal Supremo, Barcelona, 2002], pp. 179-186).

E como também já se assinalou, os projectos legislativos apresentados na Assembleia da República previam: a proposta de lei 150/IX, a conservação das fitas gravadas ou elementos análogos até ao trânsito em julgado da decisão final, a menos que, aquando do encerramento do inquérito, o juiz concluísse pela irrelevância da totalidade dos elementos recolhidos e o arguido, notificado para o efeito, não se opusesse à sua imediata destruição (artigo 188.º, n.os 6 e 7); o projecto de lei 519/IX, a destruição das fitas com gravações tidas judicialmente por irrelevantes apenas após o exame concedido ao arguido e às pessoas cujas conversações tiverem sido escutadas para controlarem a conformidade dos autos de transcrição e de destruição que lhes dissessem respeito (artigo 188.º, n.os 5 e 7), e o projecto de lei 424/IX, a conservação das gravações não transcritas até ao trânsito em julgado da decisão final, podendo o arguido requerer a sua audição em sede de julgamento ou de recurso para contextualizar as conversações transcritas (artigo 188.º, n.º 7).

Nenhuma censura constitucional merece, pois, o critério normativo ora em causa, tendo sobretudo em vista o acautelamento dos interesses do arguido e das pessoas escutadas, sendo certo que, para concomitante defesa do direito à privacidade destas, se deve enfatizar o dever de sigilo a que estão obrigados todos os participantes na operação (artigo 188.º, n.º 3, do CPP), dever de sigilo que, no que respeita às passagens das conversações que se consideraram inadmissíveis ou irrelevantes e que, por isso, não chegaram a ser adquiridas para o processo, perdura mesmo para além do termo da fase secreta do processo [primeiro itálico aditado]."

Não resulta, porém, claramente, desta decisão se a referência à inconstitucionalidade da "privação da possibilidade - que a imediata desmagnetização da gravação logo após a audição pelo juiz acarretaria - de a defesa requerer a transcrição de passagens das gravações, não seleccionadas pelo juiz, que repute relevantes para a descoberta da verdade" constituiu verdadeira ratio decidendi no sentido da inexistência de inconstitucionalidade de uma norma que não imponha a obrigação de destruição (pois, como é óbvio, o que é constitucionalmente proibido não pode ser constitucionalmente imposto), ou se, até por se não chegar a tomar posição clara no sentido da inconstitucionalidade da referida privação da possibilidade de requerer a transcrição, pela destruição dos registos, se tratou de um mero obiter dictum.

10 - No Acórdão 4/2006, o Tribunal Constitucional, depois de recortar o parâmetro constitucional atendível no caso, procedeu, retomando em parte passagens do (também citado) Acórdão 426/2005, a historiar a evolução legislativa do regime das escutas e as perplexidades que suscitou e suscita, a recordar a pertinente jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e a referir de forma sumária sistemas jurídicos próximos. Fê-lo nos termos seguintes, que interessam ao presente caso e se recordam:

"Na versão originária do CPP, o artigo 187.º condicionava a intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas a: i) ordem ou autorização por despacho judicial; ii) estarem em causa crimes: 1) puníveis com pena de prisão de máximo superior a 3 anos; 2) relativos ao tráfico de estupefacientes; 3) relativos a armas, engenhos, matérias explosivas e análogas; 4) de contrabando; ou 5) de injúrias, de ameaças, de coacção e de "intromissão na vida privada, quando cometidos através de telefone (o Decreto-Lei 317/95, de 28 de Novembro, substituiu a expressão "intromissão na vida privada", usada no artigo 180.º da versão originária do Código Penal, por "devassa da vida privada e perturbação da paz e sossego", em conformidade com as designações dos ilícitos previstos nos artigos 192.º e 190.º, n.º 2, do Código Penal, revisto pelo Decreto-Lei 48/95, de 15 de Março); e iii) haver razões para crer que a diligência se revelará de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova (n.º 1). Proibia-se, porém, a intercepção e a gravação de conversações ou comunicações entre o arguido e o seu defensor, salvo se o juiz tivesse fundadas razões para crer que elas constituíam objecto ou elemento do crime (n.º 3). As formalidades das operações eram estabelecidas no artigo 188.º, que determinava que: i) da intercepção ou gravação fosse lavrado auto, o qual, juntamente com as fitas gravadas ou elementos análogos, devia ser imediatamente levado ao conhecimento do juiz que ordenara ou autorizara as operações (n.º 1); ii) o juiz, se considerasse os elementos recolhidos, ou alguns deles, relevantes para a prova, fá-los-ia juntar ao processo, ou, caso contrário, ordenava a sua destruição, ficando todos os participantes nas operações ligados por dever de sigilo relativamente àquilo de que tivessem tomado conhecimento (n.º 2); iii) o arguido e o assistente, bem como as pessoas cujas conversações tiverem sido escutadas, podiam examinar o auto para se inteirarem da conformidade das gravações e obterem, à sua custa, cópia dos elementos naquele referidos (n.º 3), excepto se, tratando-se de operações ordenadas no decurso do inquérito ou da instrução, o juiz tivesse razões para crer que o conhecimento do auto ou das gravações pelo arguido ou pelo assistente podia prejudicar as finalidades do inquérito ou da instrução (n.º 4). Nos termos do artigo 189.º, todos os requisitos e condições referidos nos artigos 187.º e 188.º eram estabelecidos sob pena de nulidade e o artigo 190.º estendia o disposto nos três artigos anteriores às conversações ou comunicações transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone.

As normas contidas nos referidos artigos 187.º, n.º 1, e 190.º foram apreciadas, em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade, pelo Tribunal Constitucional, que, no Acórdão 7/87, não se pronunciou pela sua inconstitucionalidade, por entender que, "face à natureza e gravidade dos crimes a que se aplicam [...] se afigura que tais restrições [ao direito à intimidade da vida privada e familiar, consagrado no artigo 26.º, n.º 1, da CRP] não infringem os limites da necessidade e proporcionalidade exigidos pelos citados números [n.os 2 e 3] do artigo 18.º da Constituição".

A regulamentação legal da matéria em causa na versão originária do CPP, pelo seu relativo laconismo, suscitou diversas dúvidas de interpretação e de aplicação: qual o prazo de duração das escutas; quem tem legitimidade para as requerer ao juiz; qual o relacionamento entre órgão de polícia criminal, magistrado do Ministério Público e juiz de instrução; se a proibição do n.º 3 do artigo 187.º é extensível a conversações com pessoas que, para além do defensor, estejam legitimadas a recusar depoimento em nome de outros tipos de sigilo profissional (artigo 135.º) ou que, em geral, possam recusar-se a depor como testemunhas (artigo 134.º); qual o conteúdo do auto de intercepção e gravação; qual a oportunidade de efectivação da transcrição e da destruição; como se efectiva o acesso do arguido, do assistente e das pessoas escutadas ao auto e às gravações; se a nulidade referida no artigo 189.º respeita a nulidade da prova ou a nulidade processual e se, neste caso, é sanável ou insanável, etc.

Foi neste contexto que foi emitido o parecer (complementar) n.º 92/91, do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, de 17 de Setembro de 1992 (cuja fundamentação foi integralmente transcrita no n.º 2.4 do citado Acórdão 426/2005), cuja doutrina foi sintetizada nas seguintes conclusões:

"1.ª Da intercepção e gravação das comunicações telefónicas ou similares é lavrado um auto (artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal - CPP).

2.ª O referido auto deve inserir a menção do despacho judicial que ordenou ou autorizou a intercepção e da pessoa que a ela procedeu, a identificação do telefone interceptado, o circunstancialismo de tempo, modo e lugar da intercepção, bem como o conteúdo da gravação necessária à decisão judicial sobre o que deverá ou não constar do processo penal respectivo.

3.ª A transcrição do conteúdo da gravação a que se refere a alínea anterior deverá abranger a integralidade dos elementos da comunicação telefónica ou similar interceptada que a entidade responsável pelas operações considere de interesse para a descoberta da verdade ou para a prova dos crimes previstos no artigo 187.º, n.º 1, do CPP.

4.ª O conteúdo da gravação, que àquela entidade se revelar destituído de interesse para a descoberta da verdade ou para a prova dos crimes referidos na conclusão anterior, deverá ser mencionado naquele auto, tão-só de modo genérico com a mera referência à sua natureza ou tema, sob a égide do respeito do direito à intimidade da vida privada dos cidadãos.

5.ª Lavrado o referido auto, é imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado a intercepção telefónica ou similar (artigo 188.º, n.º 1, do CPP).

6.ª O juiz, por despacho, ordenará a junção ao processo dos elementos relevantes para a prova e a destruição dos irrelevantes, incluindo a desmagnetização das 'cassetes' ou bandas magnéticas (artigo 188.º, n.º 2, do CPP).

7.ª O juiz, se o entender necessário à prolação da decisão referida na conclusão 2.ª, poderá ordenar a transcrição mais ampla ou integral da parte objecto da menção referida na conclusão 4.ª

8.ª Os participantes nas operações de intercepção, gravação, transcrição e eliminação de elementos recolhidos ficam vinculados ao dever de sigilo quanto àquilo de que em tais diligências tomaram conhecimento (artigo 188.º, n.º 2, do CPP).

9.ª As 'cassetes' ou as bandas magnéticas cujo conteúdo seja inserido nos autos devem a estes ser apensos ou, se isso se tornar impossível, guardadas depois de seladas, numeradas e identificadas com o processo respectivo (artigos 10.º, n.os 1 e 2, do Código Civil e 101.º, n.º 3, do CPP).

10.ª O arguido, o assistente e as pessoas escutadas podem examinar o referido auto a fim de controlarem a conformidade dos elementos recolhidos e objecto de aquisição processual com os registos de som respectivos e desses elementos constantes do auto obterem cópias (artigo 188.º, n.º 3, do CPP).

11.ª O arguido e o assistente não podem proceder ao exame referido na conclusão anterior se a intercepção telefónica ou similar ocorrer no decurso do inquérito ou da instrução e o juiz decidir que o conhecimento por eles do auto ou das gravações é susceptível de prejudicar a respectiva finalidade (artigo 188.º, n.º 4, do CPP)."

Foi ainda na vigência da redacção originária do artigo 188.º do CPP que o Tribunal Constitucional proferiu o Acórdão 407/97, que constitui a sua primeira decisão sobre questão de constitucionalidade suscitada a propósito dessa norma, embora centrada (como os posteriores Acórdãos n.os 347/2001, 528/2003, 379/2004 e 223/2005) na interpretação do conceito de "imediatamente" reportado à apresentação, ao juiz que tiver ordenado ou autorizado a operação, do auto de intercepção e gravação, juntamente com as fitas gravadas ou elementos análogos. Após referências aos parâmetros constitucionais pertinentes e ao direito comparado, o Acórdão 407/97 fundou o seu juízo de inconstitucionalidade por violação do disposto no n.º 6 (actual n.º 8) do artigo 32.º da CRP, da norma do n.º 1 do artigo 188.º do CPP - "quando interpretado em termos de não impor que o auto da intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir atempadamente sobre a junção ao processo ou a destruição dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e, bem assim, também atempadamente, a decidir, antes da junção ao processo de novo auto da mesma espécie, sobre a manutenção ou alteração da decisão que ordenou as escutas" nas seguintes considerações:

"Trata-se aqui de precisar o conteúdo constitucionalmente viável do trecho do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, onde surge a expressão 'imediatamente'. Ora, partindo do pressuposto consubstanciado na proibição de ingerência nas telecomunicações, resultante do n.º 4 do artigo 34.º da lei fundamental, a possibilidade de ocorrer diversamente (de existir ingerência nas telecomunicações), no quadro de uma previsão legal atinente ao processo criminal (a única constitucionalmente tolerada), carecerá sempre de ser compaginada com uma exigente leitura à luz do princípio da proporcionalidade, subjacente ao artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, garantindo que a restrição do direito fundamental em causa (de qualquer direito fundamental que a escuta telefónica, na sua potencialidade danosa, possa afectar) se limite ao estritamente necessário à salvaguarda do interesse constitucional na descoberta de um concreto crime e punição do seu agente.

Nesta ordem de ideias, a imediação entre o juiz e a recolha da prova através da escuta telefónica aparece como o meio que melhor garante que uma medida com tão específicas características se contenha nas apertadas margens fixadas pelo texto constitucional.

O actuar desta imediação, potenciadora de um efectivo controlo judicial das escutas telefónicas, ocorrerá em diversos planos, sendo um deles o que pressupõe uma busca de sentido prático para a obrigação de levar 'imediatamente' ao juiz o auto da intercepção e 'fitas gravadas ou elementos análogos', de que fala a lei.

13 - Vejamos, a este propósito, o discurso interpretativo subjacente à decisão recorrida. De sublinhar nesta, desde logo, a afirmação de que o artigo 188.º, n.º 1, do CPP, ao não fixar um prazo certo, 'acaba por relativizar muito as coisas'. Há que reter esta ideia que torna patente a existência de um espaço aberto à procura de um sentido, enfim, de um espaço aberto à interpretação.

Não obstante, mais adiante, a decisão recorrida parece apontar para uma impossibilidade de alcançar o sentido da expressão 'imediatamente' no contexto normativo em causa (ao dizer a fl. 102: 'Não sabemos. Não dispomos de qualquer critério para decidir sobre isso. Nem sequer é possível estabelecer e assentar num critério de razoabilidade a tal propósito').

Ora, já se indicou que o critério interpretativo neste campo não pode deixar de ser aquele que assegure a menor compressão possível dos direitos fundamentais afectados pela escuta telefónica. Também já se assentou - e importa lembrá-lo de novo - que a intervenção do juiz é vista como uma garantia de que essa compressão se situe nos apertados limites aceitáveis e que tal intervenção, para que de uma intervenção substancial se trate (e não de um mero tabelionato), pressupõe o acompanhamento da operação de intercepção telefónica. Com efeito, só acompanhando a recolha de prova, através desse método em curso, poderá o juiz ir apercebendo os problemas que possam ir surgindo, resolvendo-os e, assim, transformando apenas em aquisição probatória aquilo que efectivamente pode ser. Por outro lado, só esse acompanhamento coloca a escuta a coberto dos perigos - que sabemos serem consideráveis - de uso desviado.

Com isto, não se quer significar que toda a operação de escuta tenha de ser materialmente realizada pelo juiz. Contrariamente a tal visão maximalista, do que aqui se trata é, tão-só, de assegurar um acompanhamento contínuo e próximo temporal e materialmente da fonte (imediato, na terminologia legal), acompanhamento esse que comporte a possibilidade real de em função do decurso da escuta ser mantida ou alterada a decisão que a determinou.

14 - Refere-se ainda o acórdão a dificuldades práticas que a situação é susceptível de criar ('Sabemos, isso sim, que a Polícia Judiciária como muitos outros departamentos do Estado, nos quais se incluem os tribunais, seguramente carece, cronicamente, de meios técnicos e humanos que lhe não permitem cumprir, muitas vezes, as suas tarefas em tempo normal'), moldando, no que não deixa de ter um certo sentido correctivo, o conceito de 'imediatamente' ('usado por um legislador excessivamente preocupado com a aceleração processual, porém esquecido das grandes lacunas e dos grandes estrangulamentos do sistema') ao que qualifica de entendimento 'em termos hábeis'. A saber: aquele em que 'imediatamente' equivale a 'no tempo mais rápido possível'. Ora, o 'mais rápido possível' significou aqui longos períodos de tempo em que as escutas não foram acompanhadas (igual a controladas) pelo juiz e, mais ainda, espaços muito significativos de tempo em que as escutas já haviam terminado e o processo continuava sem ter qualquer conhecimento do seu teor (v. as conclusões 2.ª e 4.ª a fl. 4 v.º, tendo-se presente que as datas aí indicados obtêm confirmação nos autos).

É a teorização interpretativa que sufraga esta situação que de modo algum se pode ter por conforme ao disposto no artigo 34.º, n.º 4, da Constituição, lido à luz do princípio da proporcionalidade. Se é certo que se não podem ignorar, pura e simplesmente, os aspectos práticos de uma situação, designadamente as dificuldades técnicas que esta ou aquela opção interpretativa possa ocasionar, não é menos verdade que o ónus dessas dificuldades técnicas, num processo crime, sempre correrá por conta do Estado (a quem compete ultrapassá-las), jamais por conta do arguido.

Poder-se-ia aqui relembrar o dilema, já relatado, do juiz Holmes, sobre o 'mal maior' e o 'mal menor'. Obviamente que no processo criminal de um Estado de direito democrático, face a 'dificuldades técnicas', o 'mal menor' sempre será a hipotética impunidade de eventuais criminosos.

15 - Trata-se, pois, de fixar a interpretação constitucionalmente conforme do artigo 188.º, n.º 1, do CPP no segmento em que se insere a expressão 'imediatamente', sendo certo ser tal expediente possível ainda nos limites da interpretação.

Assim sendo, 'imediatamente' não poderá, desde logo, reportar-se apenas ao momento em que as transcrições se mostrarem feitas (pois ficaria aberto o caminho à existência de largos períodos de falta de controlo judicial à escuta sempre que a transcrição se atrasasse). Em qualquer dos casos, 'imediatamente', no contexto normativo em que se insere, terá de pressupor um efectivo acompanhamento e controlo da escuta pelo juiz que a tiver ordenado, enquanto as operações em que esta se materializa decorrerem. De forma alguma 'imediatamente' poderá significar a inexistência, documentada nos autos, desse acompanhamento e controlo ou a existência de largos períodos de tempo em que essa actividade do juiz não resulte do processo.

Em qualquer caso, tendo em vista os interesses acautelados pela exigência de conhecimento imediato pelo juiz, deve considerar-se inconstitucional, por violação do n.º 6 do artigo 32.º da Constituição, uma interpretação do n.º 1 do artigo 188.º do CPP que não imponha que o auto de intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir atempadamente sobre a junção ao processo ou a destruição dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e bem assim, também atempadamente, a decidir, antes da junção ao processo de novo auto de escutas posteriormente efectuadas, sobre a manutenção ou alteração da decisão que ordenou as escutas.

É esta, exposta com a minúcia possível, a interpretação conforme à Constituição. A ela importa vincular o intérprete - 'juiz incluído' como este Tribunal tem repetidamente referido em situações onde faz uso deste recurso interpretativo.

Sublinhar-se-á apenas, como nota final, que as consequências a retirar da interpretação da norma com o sentido apontado se encontram já fora do âmbito da intervenção do Tribunal Constitucional, situando-se claramente no domínio de intervenção do Tribunal recorrido."

Considerou, assim, o Tribunal Constitucional que a especial danosidade da intromissão traduzida pela intercepção telefónica impunha uma intervenção substancial do juiz no decurso da mesma, através de um acompanhamento contínuo e próximo temporal e materialmente da fonte, acompanhamento esse que comportasse a possibilidade real de, em função do decurso da escuta, ser mantida ou alterada a decisão que a determinou, sublinhando, contudo, que o exigente critério assumido não significava "que toda a operação de escuta tenha de ser materialmente realizada pelo juiz", posição que corresponderia a uma "visão maximalista", que o Tribunal não subscreveu.

2.3 - A nível legislativo, a primeira alteração a assinalar foi a levada a cabo pela Lei 59/98, de 25 de Agosto, que alterou a redacção, entre outros, dos artigos 188.º e 190.º do CPP.

Estas alterações não constavam da proposta de lei 157/VII, que esteve na génese daquela lei, antes resultaram de propostas de alteração apresentadas pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista (cf. Código de Processo Penal - Processo Legislativo, vol. II, t. II, ed. Assembleia da República, Lisboa, 1999, pp. 114-115), que viriam a ser aprovadas por unanimidade (ob. cit., p. 107), tendo as relativas ao artigo 188.º sido justificadas, na declaração de voto dos deputados do Partido Socialista relativa à votação final global dessa iniciativa legislativa, nos seguintes termos (ob. cit., p. 153):

"As alterações levam em conta o parecer da Procuradoria-Geral da República n.º 92/91 (complementar), as dificuldades práticas da 'vida judiciária', o n.º 4 do artigo 18.º da lei de segurança interna e o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 407/97 (Diário da República, 2.ª série, de 18 de Julho de 1997), que anulou as escutas porque a transcrição não foi imediata.

Tornava-se necessário clarificar: quem selecciona os elementos a transcrever; se o agente de investigação pode ter contacto com a conversa (uma vez que a operação é feita por técnico de telecomunicações, mas não pode excluir-se a presença da polícia, sob pena de a diligência não ter sentido ou eficácia); o que é que o juiz ouve (sabendo-se que, não ouvindo, manda transcrever a totalidade dos registos, o que é excessivamente moroso, oneroso e inútil), e esclarecer o procedimento.

O n.º 1 do artigo refere que da intercepção é lavrado auto (mas não distingue entre auto de intercepção e auto de transcrição, sendo certo que importa clarificar que são duas coisas diferentes). Assim, fica claro que uma coisa é o auto de intercepção (n.º 1) e outra o auto de transcrição (n.º 3).

O n.º 2 permite que a polícia ouça e possa intervir de imediato, por exemplo, para fazer uma apreensão de droga combinada telefonicamente e 'apanhar o flagrante'.

Os n.os 3 e 4 tornam claro que é o juiz quem selecciona, que é o responsável pelo conteúdo da transcrição, mas que é auxiliado materialmente pela polícia, o que é importante em termos de execução."

As modificações operadas pela Lei 59/98 no artigo 188.º do CPP consistiram:

No aditamento de um novo n.º 2, do seguinte teor: "O disposto no número anterior não impede que o órgão de polícia criminal que proceder à investigação tome previamente conhecimento do conteúdo da comunicação interceptada a fim de poder praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova";

Na passagem do primitivo n.º 2 a n.º 3, dispondo agora, na sua primeira parte, que "Se o juiz considerar os elementos recolhidos, ou alguns deles, relevantes para a prova, ordena a sua transcrição em auto e fá-lo juntar ao processo", enquanto anteriormente apenas dizia que o juiz "fá-los juntar ao processo", mantendo-se inalterada a segunda parte: "caso contrário, ordena a sua destruição, ficando todos os participantes nas operações ligados por dever de segredo relativamente àquilo de que tenham tomado conhecimento";

No aditamento de um novo n.º 4, do seguinte teor: "Para efeitos do disposto no número anterior, o juiz pode ser coadjuvado, quando entender conveniente, por órgão de polícia criminal, podendo nomear, se necessário, intérprete. À transcrição aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 101.º, n.os 2 e 3";

Na passagem do primitivo n.º 3 a n.º 5, com especificação de que o auto cujo exame é facultado ao arguido, ao assistente e às pessoas escutadas, "para se inteirarem da conformidade das gravações e obterem, à sua custa, cópias dos elementos naquele referidos", é "o auto de transcrição a que se refere o n.º 3" (a redacção originária referia-se a "examinar o auto", sem mais); e

Na eliminação do primitivo n.º 4 (que ressalvava "do disposto no número anterior o caso em que as gravações tiverem sido ordenadas no decurso do inquérito ou da instrução e o juiz que as ordenou tiver razões para crer que o conhecimento do auto ou das gravações, pelo arguido ou pelo assistente, poderia prejudicar as finalidades do inquérito ou da instrução"; trata-se de eliminação algo enigmática, pois nada no debate parlamentar foi referido para a justificar ou sequer enunciar).

No artigo 190.º, a extensão originária da aplicabilidade do disposto nos artigos 187.º, 188.º e 189.º "às conversações ou comunicações transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone" foi complementada com o seguinte aditamento: "designadamente correio electrónico ou outras formas de transmissão de dados por via telemática, bem como à intercepção das comunicações entre presentes".

2.4 - A segunda alteração legislativa com especial relevância para as questões que constituem objecto do presente recurso resultou do Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, que aditou ao n.º 1 do artigo 188.º do CPP ("Da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é lavrado auto, o qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as operações") a expressão "com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos considerados relevantes para a prova".

Este inciso final corresponde à utilização da autorização legislativa concedida pela Lei 27-A/2000, de 17 de Novembro, que autorizou o Governo a rever o Código de Processo Penal, com o sentido e extensão definidos nos artigos seguintes (artigo 1.º), entre os quais, segundo o artigo 4.º: "Permite-se que o juiz possa limitar a audição das gravações às passagens indicadas como relevantes para a prova, sem prejuízo de as gravações efectuadas lhe serem integralmente remetidas." Esta norma não constava da proposta de lei 41/VIII (Diário da Assembleia da República, VIII Legislatura, 1.ª sessão legislativa, 2.ª série-A, n.º 59, de 15 de Julho de 2000, pp. 1891-1898), tendo surgido no texto de substituição elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, e aí aprovada por unanimidade (Diário da Assembleia da República, VIII Legislatura, 2.ª sessão legislativa, 2.ª série-A, n.º 10, de 23 de Outubro de 2000, pp. 218-224), tal como no plenário (Diário, cit., 1.ª série, n.º 13, de 20 de Outubro de 2000, p. 498).

Para terminar a recensão do quadro legal aplicável, resta referir que a Lei 5/2002, de 11 de Janeiro, que estabeleceu um regime especial de recolha de prova, quebra do segredo profissional e perda de bens a favor do Estado relativa, entre outros, aos crimes de associação criminosa, lenocínio e lenocínio e tráfico de menores, estes quando praticados de forma organizada [artigo 1.º, n.os 1, alíneas f) e h), e 2], estatuiu no seu artigo 6.º, ("Registo de voz e de imagem"):

"1 - É admissível, quando necessário para a investigação de crimes referidos no artigo 1.º, o registo de voz e de imagem, por qualquer meio, sem consentimento do visado.

2 - A produção desses registos depende de prévia autorização ou ordem do juiz, consoante os casos.

3 - São aplicáveis aos registos obtidos, com as necessárias adaptações, as formalidades previstas no artigo 188.º do Código de Processo Penal."

2.5 - No que concerne à jurisprudência do Tribunal Constitucional, há a assinalar, para além do já citado Acórdão 407/97, a prolação dos Acórdãos n.os 347/2001, 528/2003, 379/2004 e 223/2005 e da decisão sumária n.º 324/2004, todos incidindo sobre a questão da "imediatividade" da apresentação ao juiz do auto de intercepção e gravação prevista no artigo 188.º, n.º 1, do CPP (o primeiro acórdão reportado à redacção anterior à Lei 59/98, o segundo à redacção dada por esta lei, os dois últimos quer à redacção anterior quer à posterior ao Decreto-Lei 320-C/2000 e a decisão sumária a esta última redacção), e ainda os Acórdãos n.os 411/2002 {que julgou inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, a interpretação normativa que torna inaplicável ao prazo de arguição de nulidade respeitante a escutas telefónicas ocorrida durante o inquérito o que vem consagrado no artigo 120.º, n.º 3, alínea c), do CPP [até ao encerramento do debate instrutório] e aplicável o estabelecido no artigo 105.º do mesmo Código [10 dias a contar da notificação da acusação, terminando antes do fim do prazo para requerer a instrução]} e 198/2004 (que não julgou inconstitucional a norma do artigo 122.º, n.º 1, do CPP, entendida como autorizando, face à nulidade/invalidade de intercepções telefónicas realizadas, a utilização de outras provas, distintas das escutas e a elas subsequentes, quando tais provas se traduzam nas declarações dos próprios arguidos, designadamente quando tais declarações sejam confessórias).

Nos três primeiros acórdãos citados (o quarto - Acórdão 223/2005 - incidiu sobre uma situação de incumprimento do Acórdão 379/2004), o Tribunal Constitucional reiterou o critério decisório definido no Acórdão 407/97, que conduziu, nos casos em cada um desses arestos apreciados, à emissão de similares juízos de inconstitucionalidade.

No Acórdão 347/2001 - que julgou inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 8, 34.º, n.os 1 e 4, e 18.º, n.º 2, da CRP, a norma constante do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, na redacção anterior à que foi dada pela Lei 59/98, de 25 de Agosto, quando interpretada no sentido de não impor que o auto da intercepção e gravação de conversações e comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz e que, autorizada a intercepção e gravação por determinado período, seja concedida autorização para a sua continuação sem que o juiz tome conhecimento do resultado da anterior -, após se sumariarem as ideias chave do Acórdão 407/97, consignou-se:

"Ora, no caso dos autos, a norma do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, com a interpretação acolhida no acórdão impugnado, não se isenta do mesmo vício de inconstitucionalidade.

Na verdade, fazer equivaler o inciso 'imediatamente' ao 'tempo mais rápido possível', em termos de 'cobrir' situações como a de o auto de transcrição ser apresentado ao juiz meses depois de efectuadas a intercepção e a gravação das comunicações telefónicas, mesmo tendo em conta a gravidade do crime investigado e a necessidade daquele meio de obtenção da prova, restringe desproporcionadamente o direito à inviolabilidade de um meio de comunicação privada e faculta uma ingerência neste meio para além do que se considera ser constitucionalmente admissível.

Ficar no desconhecimento do juiz, durante tal lapso de tempo, o teor das comunicações interceptadas, significa o desacompanhamento próximo e o controlo judiciais do modo como a escuta se desenvolve, o que se entendeu no citado Acórdão 407/97 - como aqui se entende - colidir com os interesses acautelados pela exigência de conhecimento imediato pelo juiz. E impede, ainda, a destruição, em tempo necessariamente breve, dos elementos recolhidos sem interesse relevante para a prova, a que, só por si, não obsta a fixação pelo juiz de um prazo para a intercepção, no termo da qual esta deve findar.

Por outro lado, autorizar novos períodos de escuta, a mero requerimento do Ministério Público, sem que a autorização seja precedida do conhecimento judicial do resultado da intercepção anterior, continua a significar a mesma ausência de acompanhamento e de controlo por parte do juiz, o que pode até traduzir-se em longos períodos (um dos postos telefónicos foi interceptado desde 3 de Novembro de 1995 a 15 de Novembro de 1996 e o outro desde 3 de Abril a 12 de Novembro de 1996 e de novo entre 31 de Março e 5 de Setembro de 1997) de utilização deste meio de obtenção de prova na disponibilidade total dos órgãos de investigação.

É certo que, tal como a decisão recorrida no Acórdão 407/97, o acórdão impugnado faz apelo às dificuldades práticas - a reconhecida carência de meios técnicos e humanos - para justificar o entendimento dado ao referido inciso 'imediatamente', num quadro de exigências de repressão da criminalidade grave, praticada por redes altamente organizadas.

A esse argumento se respondeu, ainda no Acórdão 407/97, em termos que também aqui se acolhem, que tais dificuldades constituem, num processo crime, ónus do Estado de direito democrático, ónus que não pode estar a cargo do arguido, ainda que, no limite, isso signifique deixar impunes alguns criminosos. Não é de todo admissível num Estado de direito democrático, caracterizado pela publicização do ius puniendi, fazer reverter contra o arguido o ónus da escassez de meios e dificuldades na obtenção de prova para o condenar.

Note-se que na nova redacção dada ao artigo 188.º (em especial, no n.º 3) pela Lei 59/98 (actualmente pelo Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro) se procurou obviar às alegadas dificuldades de transcrição imediata dos elementos recolhidos, pois esta só será judicialmente ordenada depois de o juiz considerar tais elementos relevantes para a prova.

Resta acrescentar que o Tribunal Constitucional tem apenas poderes para verificar a constitucionalidade de normas, pelo que lhe está vedado 'declarar inválidos todos os actos que dependerem das intercepções telefónicas realizadas, conforme os artigos 122.º e 189.º do CPP', como o recorrente pretende.

Isto significa que é ao tribunal recorrido que compete reformar a sua decisão em conformidade com o presente juízo de constitucionalidade, extraindo dele as consequências pertinentes ao nível do direito infraconstitucional e do concreto processo crime em causa."

A validade da jurisprudência assim definida foi reafirmada no Acórdão 528/2003 - que julgou inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 8, 34.º, n.os 1 e 4, e 18.º, n.º 2, da CRP, a norma constante do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, na redacção anterior à que foi dada pelo Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, quando interpretada no sentido de não impor que o auto da intercepção e gravação de conversações e comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz -, o qual, após transcrição da fundamentação relevante dos Acórdãos n.os 407/97 e 347/2001, acrescentou:

"Agora apenas se referirá que, mais recentemente, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem voltou a ter oportunidade para reiterar a sua jurisprudência em matéria de escutas telefónicas. Tal aconteceu, nomeadamente, nos casos PG e JH v. Reino Unido (Acórdão de 25 de Setembro de 2001) e Prado Bugallo v. Espanha (Acórdão de 18 de Fevereiro de 2003). Neste último acórdão, aquele Tribunal voltou a sublinhar a necessidade de preenchimento, pelas legislações nacionais, das condições exigidas pela sua jurisprudência, designadamente nos acórdãos Kruslin v. França e Huvig v. França, para evitar os abusos a que podem conduzir as escutas telefónicas. Referiu-se, então, nomeadamente, à necessidade de definição das infracções que podem dar origem às escutas, à fixação de um limite à duração de execução da medida, às condições de estabelecimento dos autos das conversações interceptadas, bem como às precauções a tomar para comunicar intactas e completas as gravações efectuadas, de modo a permitir um possível controlo pelo juiz e pela defesa.

Assim sendo, verifica-se que a jurisprudência do Tribunal Constitucional atrás referida, que, como se salientou já, mantém inteira validade e a que aqui integralmente se adere, conduz a que, também no caso dos autos, tenha de considerar-se inconstitucional a interpretação do n.º 1 do artigo 188.º do Código de Processo Penal, na redacção anterior à que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, que foi acolhida pela decisão recorrida. Com efeito, entender que situações como as que ocorreram no presente processo - em que os autos de intercepção e gravação de conversações telefónicas que tinham sido entretanto autorizadas só foram levados ao conhecimento do juiz que as ordenou 38 dias depois de elas terem tido início - são ainda abrangidas pela expressão 'imediatamente' colide frontalmente com os interesses que se pretendem acautelar com aquela exigência, na medida em que impede o seu acompanhamento próximo pelo juiz.

Resta apenas acrescentar, de modo semelhante ao que se fez nos acórdãos deste Tribunal citados supra, que o Tribunal Constitucional somente tem poderes para verificar a constitucionalidade de normas, situando-se já fora do âmbito da sua intervenção retirar as consequências da interpretação da norma com o sentido apontado. Isto significa que é ao tribunal recorrido que compete reformar a sua decisão em conformidade com o presente juízo de constitucionalidade, extraindo dele as consequências pertinentes ao nível do direito infraconstitucional e do concreto processo crime em causa."

Por seu turno, o Acórdão 379/2004 - que julgou inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 8, 43.º, n.os 1 e 4, e 18.º, n.º 2, da CRP, a norma constante do artigo 188.º, n.º 1, do CPP, quer na redacção anterior quer na posterior à que foi dada pelo Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, quer quando interpretada no sentido de uma intercepção telefónica, inicialmente autorizada por 60 dias, poder continuar a processar-se, sendo prorrogada por novos períodos, ainda que de menor duração, sem que previamente o juiz de instrução tome conhecimento do conteúdo das conversações, quer na interpretação segundo a qual a primeira audição, pelo juiz de instrução criminal, das gravações efectuadas pode ocorrer mais de três meses após o início da intercepção e gravação das comunicações telefónicas -, após sumariar as três decisões anteriormente referidas, acrescentou:

"Ora, verifica-se que esta jurisprudência do Tribunal Constitucional, para cuja fundamentação se remete e se dá aqui por reproduzida, mantém inteira validade para o caso em apreço, o que leva a que se considere inconstitucional a norma constante do artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de a intercepção telefónica, inicialmente autorizada por 60 dias, poder continuar a processar-se, sendo prorrogada por dois novos períodos (de 30 dias cada um), sem que previamente o juiz de instrução controle e tome conhecimento do conteúdo das conversações, por violação dos artigos 32.º, n.º 8, 34.º, n.os 1 e 4, e 18.º, n.º 2, da Constituição, bem como a mesma norma, na interpretação segundo a qual a primeira audição da gravação das escutas telefónicas pelo juiz de instrução pode ocorrer durante o aludido segundo período de prorrogação."

Foi a jurisprudência delineada nos Acórdãos n.os 407/97, 347/2001, 528/2003 e 379/2004 que a decisão sumária n.º 324/2004, sem considerações complementares, invocou para julgar inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 32.º, n.º 8, 43.º, n.os 1 e 4, e 18.º, n.º 2, da CRP, a norma constante do n.º 1 do artigo 188.º do CPP, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, quando interpretada no sentido de que a primeira audição, pelo juiz de instrução criminal, das gravações efectuadas pode ocorrer seis meses após o início da intercepção e gravação das comunicações telefónicas.

Da explanação da jurisprudência do Tribunal Constitucional (o texto integral dos acórdãos e decisão sumária anteriormente citados está disponível em www.tribunalconstitucional.pt), cujos traços essenciais foram logo desenhados pelo Acórdão 407/97, resulta que se entendeu constitucionalmente justificado que a admissibilidade da intromissão nas comunicações telefónicas fosse não só alvo de prévia autorização judicial mas também objecto de acompanhamento judicial ao longo da sua execução. O que se exige é, pois, um "acompanhamento próximo" e um "controlo do conteúdo" das conversações, com uma dupla finalidade: i) fazer cessar, tão depressa quanto possível, escutas que se venham a revelar injustificadas ou desnecessárias; e ii) submeter a um "crivo" judicial prévio a aquisição processual das provas obtidas por esse meio (cf. José Manuel Damião da Cunha, "A jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria de escutas telefónicas", Jurisprudência Constitucional, n.º 1, Janeiro-Março de 2004, pp. 50-56). Mas - repete-se - o exigente critério assumido não significa "que toda a operação de escuta tenha de ser materialmente realizada pelo juiz", posição que corresponderia a uma "visão maximalista", que o Tribunal não subscreveu.

2.6 - Da exposição precedente já resultam claramente evidenciadas as dúvidas e perplexidades que o regime legal das escutas telefónicas tem suscitado. Mas se, ao nível da jurisprudência constitucional, elas incidiram quase exclusivamente sobre o tempo de acompanhamento judicial da execução da operação (sobre o modo desse acompanhamento apenas incidiu o citado Acórdão 426/2005, que não julgou inconstitucional a norma do artigo 188.º, n.os 1, 3 e 4, do CPP, "interpretado no sentido de que são válidas as provas obtidas por escutas telefónicas cuja transcrição foi, em parte, determinada pelo juiz de instrução, não com base em prévia audição pessoal das mesmas, mas por leitura de textos contendo a sua reprodução, que lhe foram espontaneamente apresentados pela Polícia Judiciária, acompanhados das fitas gravadas ou elementos análogos"), já a nível da doutrina e da prática judiciária elas têm também incidido sobre os requisitos da autorização da operação, reportados ao artigo 187.º do CPP, quer na perspectiva da adequação do "catálogo" de crimes enunciado no seu n.º 2, quer no que concerne a uma clara definição das pessoas cujas conversações podem ser colocadas sob escuta quer quanto à ausência de uma definição legal da duração das escutas. Designadamente no que respeita à execução da operação, é indefinida a forma de articulação entre órgão de polícia criminal, Ministério Público e juiz, registam-se oscilações quanto à definição do conteúdo do auto (ou dos autos) a elaborar e tem sido salientado o inconveniente da imediata destruição das gravações que o juiz reputou irrelevantes, por assim se eliminar irreversivelmente o aproveitamento de passagens que eventualmente seriam consideradas importantes quer pela acusação quer pela defesa (cf. indicações bibliográficas constantes do n.º 2.9 do Acórdão 426/2005).

Em resultado dessas perplexidades e reflexões, as iniciativas legislativas relativas à revisão do Código de Processo Penal apresentadas na última legislatura - projecto de lei 424/IX, apresentado pelo Bloco de Esquerda, proposta de lei 149/IX e projecto de lei 519/IX, apresentado pelo Partido Socialista (Diário da Assembleia da República, 2.ª série-A, IX Legislatura, 2.ª sessão legislativa, n.º 50, de 3 de Abril de 2004, pp. 2214-2219, e 3.ª sessão legislativa, n.º 17, de 20 de Novembro de 2004, pp. 21-40, e n.º 20, de 3 de Dezembro de 2004, pp. 6-118, respectivamente) - propugnam, designadamente: i) a elevação de 3 para 5 anos do máximo da pena de prisão aplicável aos crimes que consentem a autorização de escutas; ii) a restrição da admissibilidade destas apenas quando não existir outro meio lícito para atingir a descoberta da verdade ou se revelar de superior interesse, face aos demais meios de prova, para esse objectivo; iii) a definição das pessoas cujas conversações podem ser interceptadas; iv) a instauração de regimes especiais atenta a qualidade dos escutados; v) a exigência de especial fundamentação do despacho autorizador das escutas; vi) o estabelecimento de limites temporais para a execução das escutas e respectivas prorrogações; vii) o alargamento dos casos de proibição de transcrições. Quanto aos limites temporais, o projecto de lei 519/IX (PS) propugnava que o despacho judicial que autorizasse ou ordenasse a intercepção fixasse "o prazo máximo da sua duração, que, com dilação de 5 dias após a data da prolação, não pode ultrapassar 30 dias, prorrogáveis no limite até cinco vezes, reconhecida em cada caso essa necessidade, e desde que cumpridas, em cada período autorizado, as formalidades exigíveis para a operação", não podendo o tempo da intercepção ultrapassar, "em nenhum caso, o prazo máximo em concreto admitido para a duração do inquérito ou da instrução" (artigo 187.º, n.º 3); enquanto a proposta de lei 150/IX previa que o referido despacho, além de fundamentado, fixasse "o prazo de duração máxima das operações, por um período não superior a três meses a contar da sua prolação, sendo renovável por períodos idênticos até ao encerramento do inquérito, desde que se mantenham os respectivos pressupostos de admissibilidade" (artigo 187.º, n.º 5).

No que especificamente respeita ao acompanhamento judicial da operação, o projecto de lei 424/IX (BE) propõe: i) a fixação do prazo máximo de vinte e quatro horas para ser levado ao conhecimento do juiz o auto de intercepção e gravação, com as fitas gravadas e a indicação das passagens consideradas relevantes para a prova; ii) a supervisão de todo o processo, especialmente a transcrição em auto, pelo Ministério Público; iii) a conservação das gravações não transcritas até ao trânsito em julgado da decisão final, podendo o arguido requerer a sua audição em sede de julgamento ou de recurso para contextualizar as conversações transcritas. A proposta de lei 150/IX estabelece, designadamente, que: i) os autos de intercepção e gravação, com as fitas, são levados ao conhecimento do juiz, de 15 em 15 dias, com indicação por parte do Ministério Público das passagens consideradas relevantes para a prova; ii) o Ministério Público é ouvido pelo juiz antes de este seleccionar os elementos a consignar em suporte autónomo e a transcrever em auto; iii) as fitas e elementos análogos são conservados até ao trânsito em julgado da decisão final, tendo a eles acesso o arguido para efeitos de selecção de mais excertos que entenda relevantes. Por último, o projecto de lei 519/IX (PS) prevê que seja o juiz o fixar o período findo o qual o auto com as fitas é levado ao seu conhecimento, acompanhado ou da indicação das passagens e dos dados considerados relevantes para a prova ou mesmo da respectiva transcrição provisória, cabendo ao juiz determinar a transformação desta transcrição provisória em definitiva ou, se não considerar os elementos nela contidos como relevantes, determinar a sua eliminação.

2.7 - Grande parte das questões referenciadas no precedente número têm por suporte a apreciação da adequação do sistema legal actualmente vigente entre nós com as exigências que nesta matéria têm sido estabelecidas pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, face ao disposto no artigo 8.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que proclama o direito de qualquer pessoa ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência (n.º 1) e proíbe ingerências da autoridade pública no exercício desse direito, excepto se essa exigência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do País, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades dos outros (n.º 2).

Na síntese apresentada por Ireneu Cabral Barreto ("A investigação criminal e os direitos humanos", Polícia e Justiça - Revista do Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais, 3.ª série, n.º 1, Janeiro-Junho de 2003, pp. 43-85, em especial pp. 57-63; e "A jurisprudência do novo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem", Sub Judice - Justiça e Sociedade, n.º 28, Abril-Setembro de 2004, pp. 9-32, em especial pp. 20-21; cf. ainda, do mesmo autor, A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada, 3.ª ed., Coimbra, 2005, anotações I, n.º 3.3, e II, n.os 4 e 6.4, ao artigo 8.º, a pp. 184, 196 e 199; e João Ramos de Sousa, "Escutas telefónicas em Estrasburgo: O activismo jurisprudencial do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem", Sub Judice, cit., pp. 47-55):

"A jurisprudência de Estrasburgo, tendo em conta a gravidade da ingerência na vida das pessoas que representa a escuta telefónica, precisou que não basta uma lei a prever essa possibilidade.

Para prevenir o risco de arbítrio que o uso desta medida poderia acarretar, entende-se que uma tal lei deve conter uma série de garantias mínimas:

Definir as categorias de pessoas susceptíveis de serem colocadas em escutas telefónicas;

A natureza das infracções que podem permitir essa escuta;

A fixação de um limite de duração dessa medida;

As condições do estabelecimento de processos verbais de síntese consignando as conversas interceptadas;

As precauções a tomar para comunicar, intactos e completos, os registos realizados, para o controlo do juiz e da defesa;

As circunstâncias nas quais pode e deve proceder-se ao apagamento ou destruição das fitas magnéticas, nomeadamente após uma absolvição ou o arquivamento do processo."

Como refere Gérard Cohen-Jonathan ("La cour européenne des droits de l'homme et les écoutes téléphoniques", Revue Universelle des Droits de l'Homme, vol. 2, n.º 5, de 31 de Maio de 1990, pp. 185-191), impõe-se a existência de uma lei que preveja a possibilidade de autorização de escutas, lei que deve ser acessível e precisa, e que se estabeleçam garantias adequadas, desde logo definindo com precisão quais as autoridades competentes para ordenar ou autorizar as escutas, quais os crimes cuja gravidade justifica o uso deste meio de produção de prova e o grau de suspeita exigível, não podendo a ingerência ser meramente exploratória. Depois, o acompanhamento da operação há-de ocorrer em três estádios: no momento da ordem ou da autorização, no decurso da operação e após o seu termo, possibilitando às pessoas colocadas sob escuta o direito de acesso às gravações e respectivas transcrições, o direito à eliminação das passagens irrelevantes ou interditas e o direito à destruição ou restituição dos respectivos suportes.

Mas para além das "escutas judiciárias", são ainda admissíveis "escutas administrativas", determinadas pelo poder executivo visando objectivos de segurança interna e externa, as quais devem oferecer igualmente garantias adequadas que afastem o risco de utilização abusiva, garantias que serão naturalmente diferentes das previstas para as "escutas judiciárias", mas que sempre exigirão a possibilidade de recurso aos tribunais, embora apenas a posteriori. Essas garantias passam, nalguns países, pela intervenção de entidades independentes, por vezes de origem parlamentar, que acompanham a actuação do executivo (cf. o Acórdão Klass, de 1978, em que o Tribunal Europeu considerou suficientes os recursos judiciais a posteriori previstos no direito alemão em caso de intercepção de conversações determinada pelo Governo Alemão, para defesa da ordem e segurança numa sociedade democrática e para evitar infracções, sem controlo judicial prévio, e a decisão da Comissão Europeia dos Direitos do Homem de 10 de Maio de 1985, relativa ao Luxemburgo, ambos citados no artigo de Gérard Cohen-Jonathan).

De particular relevância para o presente recurso (em que, como se verá, a recorrente reclama a imediata destruição das gravações tidas por irrelevantes pelo juiz de instrução) reveste-se a constante chamada de atenção, por parte do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, para a necessidade de as legislações nacionais tomarem precauções no sentido de assegurar "a comunicação intacta e completa das gravações efectuadas, para efeito de controlo pelo juiz e pela defesa" e estabelecerem as circunstâncias em que se pode operar o apagamento ou a destruição das gravações, designadamente após o arquivamento definitivo do processo ou o trânsito em julgado da condenação final (cf. os n.os 34 do Acórdão Huvig, de 24 de Abril de 1990, 35 do Acórdão Kruslin, da mesma data, 59 do Acórdão Valenzuela Contreras, de 30 de Julho de 1998, e 30 do Acórdão Prado Bugallo, de 18 de Fevereiro de 2003).

2.8 - A análise de ordenamentos jurídicos de países cujas normas constitucionais relevantes na matéria são similares às portuguesas revela que o legislador ordinário tem moldado de modo diversificado o regime das escutas telefónicas, designadamente no que respeita à intervenção do juiz, quer na fase de autorização, quer na fase de acompanhamento da operação (cf. Mario Chiavario e outros, Procedure Penali d'Europa, 2.ª ed., Milão, 2001).

Na Bélgica, de acordo com as leis de 10 de Junho de 1998 e de 10 de Janeiro de 1999, a regra é a da autorização pelo juiz de instrução, mas, em casos de urgência, a escuta pode ser determinada pelo Ministério Público, embora sujeita a validação judicial. Só se procede à transcrição das passagens consideradas relevantes, mas mantêm-se intactas as gravações, podendo as partes consultá-las e requerer a transcrição de passagens inicialmente tidas por irrelevantes (ob. cit., pp. 75-76).

Na França, segundo os artigos 100.º e seguintes do Código de Processo Penal, alterados pela lei de 10 de Julho de 1991, a ordem de intercepção é dada pelo juiz de instrução, o qual, porém, pode delegar num oficial de polícia judiciária o acompanhamento da operação. As gravações só são destruídas no termo de prescrição do procedimento criminal (ob. cit., pp. 139-140).

Na Alemanha também é de regra a autorização pelo juiz, mas, em caso de urgência, a intercepção pode ser determinada pelo Ministério Público, sujeita a validação judicial. A ordem de intercepção implica o poder de registo. No julgamento, o juiz pode optar entre a audição das gravações ou a leitura das transcrições (ob. cit., p. 204).

Diversamente, na Inglaterra, as escutas são determinadas pelo Ministro do Interior ou pelas autoridades policiais, com mandado ministerial, não tendo o juiz qualquer poder de controlo sobre as intercepções, existindo possibilidade de recurso para uma comissão integrada por advogados nomeados pelo Governo, que verifica o cumprimento das condições legais da intercepção (ob. cit., pp. 258-259).

Na Itália, a regra é a de que compete ao juiz de instrução autorizar as intercepções, mas em caso de urgência elas podem ser ordenadas pelo Ministério Público, com subsequente validação judicial (ob. cit., pp. 321-322). As comunicações interceptadas são registadas em acta, aí sendo transcrito, ainda que sumariamente, o conteúdo da comunicação interceptada (artigo 268.º do Código de Processo Penal italiano). O registo da intercepção e a acta são transmitidos imediatamente ao Ministério Público, que os deposita na secretaria, sendo de seguida dado conhecimento ao defensor, que pode escutar os registos e examinar os actos, e só então, face às posições assumidas pelas partes interessadas quanto à admissibilidade e relevância das comunicações interceptadas, é que o juiz de instrução manda suprimir os registos cuja utilização é legalmente vedada e admite os que não são manifestamente irrelevantes (artigo 268.º, n.º 6, do mesmo Código) - cf. J. A. Mouraz Lopes, A Tutela da Imparcialidade Endoprocessual no Processo Penal Português, Coimbra, 2005, pp. 145-146, n. 388.

Em Espanha, face à natureza genérica que, mesmo após a modificação introduzida pela Lei Orgânica 4/1998, de 25 de Maio, aos artigos 553.º e 559.º da Ley de Enjuiciamiento Criminal - que se limitam a permitir que o juiz autorize, por decisão fundamentada, pelo prazo máximo de três meses, susceptível de prorrogação por períodos similares, a vigilância de comunicações telefónicas de pessoas relativamente às quais existam indícios de responsabilidade criminal -, tem sido sobretudo obra da jurisprudência a definição das condições de admissibilidade das interferências nas comunicações. A jurisprudência do Tribunal Constitucional espanhol, para utilizar a síntese feita no fundamento jurídico 5.º da sentença n.º 171/99, tem consignado que "uma medida restritiva do direito ao segredo das comunicações só pode considerar-se constitucionalmente legítima na perspectiva deste direito fundamental se, em primeiro lugar, está legalmente prevista com suficiente precisão - princípio da legalidade formal e material [...]; se, em segundo lugar, é autorizada por autoridade judicial no âmbito de um processo [...], e, em terceiro lugar, se se realiza com estrita observância do princípio da proporcionalidade; é dizer, se a medida é autorizada por ser necessária para alcançar um fim constitucionalmente legítimo, como - entre outros -, para a defesa da ordem e prevenção de delitos qualificáveis como infracções puníveis graves, e é idónea e imprescindível para a investigação dos mesmos e existem indícios sobre o facto constitutivo do delito e sobre a conexão com o mesmo por parte das pessoas investigadas. [...] A execução da intervenção telefónica deve ater-se aos estritos termos da autorização tanto quanto aos limites materiais da mesma como às condições da sua autorização [...] e, finalmente, deve levar-se a cabo sob controlo judicial"."

11 - Adiantando a resposta à questão de constitucionalidade em causa no presente recurso, entende-se resultar destes arestos (cf., sobre eles, José Manuel Damião da Cunha, "A mais recente jurisprudência constitucional em matéria de escutas telefónicas - Mero aprofundamento de jurisprudência? Anotação aos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 426/2005 e 4/2006", in Jurisprudência Constitucional, n.º 8, 2005, pp. 46-55) que a dimensão normativa em causa nos presentes autos não pode deixar de ser considerada inconstitucional. É logo o que decorre da afirmação contida no Acórdão 426/2005 para justificar a possibilidade de a selecção das passagens a transcrever ser determinada pelo juiz de instrução com base, não em prévia audição pessoal das mesmas, mas por leitura de textos contendo a sua reprodução que lhe foram espontaneamente apresentados pela Polícia Judiciária, de que se trata apenas de uma "primeira selecção, dotada de provisoriedade, podendo vir a ser reduzida ou ampliada", pois deve "ser facultado à defesa (e também à acusação) a possibilidade de requerer a transcrição de mais passagens que as inicialmente seleccionadas pelo juiz, quer por entenderem que as mesmas assumem relevância própria, quer por se revelarem úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens anteriormente seleccionadas". Mas é também o que se disse - embora sem tomar posição definitiva, pois era outra a questão que havia então que decidir - no citado Acórdão 4/2006, com apoio em abundante fundamentação na qual já se notou, designadamente: que se exige, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que a lei que prevê a possibilidade de realização de escutas telefónicas deve definir "as precauções a tomar para comunicar, intactos e completos, os registos realizados, para o controlo do juiz e da defesa", possibilitando às pessoas colocadas sob escuta o direito de acesso às gravações e respectivas transcrições, e "as circunstâncias nas quais pode e deve proceder-se ao apagamento ou destruição das fitas magnéticas, nomeadamente após uma absolvição ou o arquivamento do processo", e que o nosso sistema, na medida em que permite a destruição dos registos das comunicações sem conhecimento da defesa, mas apenas do Ministério Público, e segundo a apreciação da sua relevância pelo juiz, se encontra isolado no contexto das ordens jurídicas mais próximas.

Vejamos estes dois pontos mais em pormenor.

12 - A afirmação de que as legislações nacionais devem tomar precauções para assegurar "a comunicação intacta e completa das gravações efectuadas, para efeito de controlo pelo juiz e pela defesa" e estabelecerem as circunstâncias em que se pode operar o apagamento ou a destruição das gravações, designadamente após o arquivamento definitivo do processo ou o trânsito em julgado da condenação final, encontra-se em várias decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

Assim, esse Tribunal disse nos n.os 34 e 35 dos Acórdãos Huvig e Kruslin, de 24 de Abril de 1990, sobre legislação francesa em matéria de escutas, que "o sistema não oferece de momento as garantias adequadas contra diversos abusos a recear. Por exemplo, nada define as categorias de pessoas susceptíveis de serem colocadas sob escuta judiciária, nem a natureza das infracções que podem dar lugar a elas; nada vincula o juiz a fixar um limite à duração da execução da medida; e também nada precisa as condições de realização de procedimentos verbais de síntese consignando as conversações interceptadas, nem as precauções a tomar para comunicar intactas e completas as gravações realizadas, com o fim de controlo eventual pelo juiz - que não pode de todo deslocar-se ao local para verificar o número e a duração das fitas magnéticas originais - e pela defesa, nem as circunstâncias em que pode ou deve realizar-se o apagamento ou a destruição das ditas fitas", designadamente após absolvição ou trânsito em julgado (itálico aditado).

Tais "garantias mínimas, necessárias para evitar abusos, que devem figurar na lei", mencionadas no Acórdãos Kruslin e Huvig e que incluem as "precauções a tomar para comunicar, intactas e completas, as gravações realizadas, com o fim de controlo eventual pelo juiz e pela defesa", foram recordadas também no Acórdão Valenzuela Contreras, de 30 de Julho de 1998 (n.os 46, IV, e 59) e no Acórdão Prado Bugallo, de 18 de Fevereiro de 2003 - Neste último pode ler-se, a propósito de legislação espanhola sobre escutas telefónicas, que o Tribunal entende "que a garantias introduzidas pela lei de 1988 não respondem a todas as condições exigidas pela jurisprudência do Tribunal, nomeadamente nos acórdãos Kruslin c. França e Huvig c. França, para evitar os abusos. É o caso da natureza das infracções que podem dar lugar às escutas, da fixação de um limite para a duração da execução da medida e das condições de realização dos procedimentos verbais de síntese consignando as conversações interceptadas, tarefa que é deixada à competência exclusiva do funcionário do tribunal. Estas insuficiências dizem igualmente respeito às precauções a tomar para comunicar intactas e completas as gravações realizadas, com o fim de um controlo eventual pelo juiz e pela defesa. A lei não contém qualquer disposição a este respeito" (itálico aditado).

Resulta desta jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, referida já nos Acórdãos n.os 528/2003, 426/2005 e 4/2006, que a privação da possibilidade, pela imediata destruição da gravação que o juiz entende irrelevante (aliás, segundo o referido Acórdão 426/2005, possivelmente sem a ouvir, e apenas com base em transcrições), de a defesa requerer a transcrição de passagens não seleccionadas pelo juiz, e que não foram objecto de uma comunicação intacta e completa para controlo pela defesa, corresponde a uma diminuição das garantias da defesa - o que também já se consignou nos referidos Acórdãos n.º 426/2005 e 4/2006. Também por isso (como se nota neste último aresto) se disse no citado Acórdão 426/2005 que "deve ser facultado à defesa (e também à acusação) a possibilidade de requerer a transcrição de mais passagens que as inicialmente seleccionadas pelo juiz, quer por entenderem que as mesmas assumem relevância própria, quer por se revelarem úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens anteriormente seleccionadas".

13 - Quanto à comparação da solução que está em apreciação repete-se: a da destruição imediata dos suportes das escutas com base na apreciação da sua relevância pelo juiz, sem que o arguido se possa pronunciar sobre ela - com o regime vigente em outras ordens jurídicas europeias mais próximas da nossa, pode igualmente remeter-se para o Acórdão 4/2006 (n.º 2.8), para se verificar que aquela solução se encontra isolada (v. também, para o que se segue, Mireille Delmas-Marty e Mário Chiavario, Procedure Penali d'Europa, 2.ª ed., CEDAM, Padova, 2001).

Assim, recorde-se que, como se disse no Acórdão 4/2006, na Bélgica, as gravações são mantidas intactas a fim de as partes as poderem consultar e requerer a transcrição de passagens inicialmente tidas por irrelevantes; em França, as gravações só são destruídas no termo do prazo de prescrição do procedimento criminal; em Itália, só após audição das gravações (cuja guarda compete ao Ministério Público) pela defesa e pronúncia dos diversos intervenientes é que o juiz manda suprimir os registos cuja utilização é legalmente vedada e admite os que não são manifestamente irrelevantes (artigo 268.º, n.º 6, do Código de Processo Penal), sendo os registos conservados até ao trânsito em julgado da sentença final, a menos que, a requerimento dos interessados, com fundamento em tutela da privacidade, o juiz autorize a destruição antecipada (artigo 269.º, n.º 2, do mesmo Código); em Espanha, atenta a exiguidade da regulamentação legal, a jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Tribunal Supremo têm insistido na necessidade de serem os originais das fitas de gravação ou elementos análogos a serem remetidos ao tribunal, ficando à guarda do secretário judicial, que facultará o seu acesso às partes (e ao Ministério Público) e dirigirá a tarefa de transcrição das partes tidas por relevantes".

Também na Alemanha os limites da possibilidade da destruição são discutidos, apesar de o § 100b, n.º 6, da Strafprozessordnung mandar destruir imediatamente, sob fiscalização do Ministério Público, os elementos [unterlagen] que já não sejam necessários para a perseguição penal (v. Gerhard Schäfer, em Löwe/Rosenberg, Die Strafprozessordnung und das Gerichtsverfassungsgesetz - Grosskommentar, 25.ª ed., Berlin, W. de Gruyter, 2003, anotação n.º 38 ao §100b e anotações n.os 103 e segs. ao § 100c, dizendo que só pode destruir-se o material de prova seguramente já desnecessário, porque o seu conteúdo está entretanto confirmado por outros meios de prova, pelo que, se o material for ainda possivelmente utilizado como meio de prova na audiência de julgamento, nunca é de considerar uma destruição, antes deve ser guardado juntamente com os meios de prova). O Tribunal Constitucional Federal alemão já declarou, mesmo (na decisão de 3 de Março de 2004, in Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts, vol. 109, pp. 279 e segs.), a inconstitucionalidade desse § 100b, n.º 6, embora apenas em conjugação com a remissão que para ele fazia o § 100d, n.º 4, frase 3, que o mandava aplicar à destruição dos registos de vigilância acústica em espaços habitacionais (o chamado grosser Lauschangriff), por violação da garantia do acesso à via judiciária, que a destruição dificultava ou tornava mesmo impossível. Salientou-se, nessa decisão, que "pode surgir uma situação específica de conflito por, de uma parte, corresponder à protecção de dados o apagamento de dados já não necessários e, por outra, com o apagamento se dificultar, quando não mesmo impossibilitar, uma protecção jurídica efectiva, porque um controlo dos actos só é em limitada medida possível depois do apagamento dos elementos" (v. também, já antes, a decisão de 14 de Julho de 1999, in Entscheidungen... cit., vol. 100, pp. 313 e segs. e 400, onde se considerou condição do respeito pela garantia do acesso à via judiciária o facto de os registos serem conservados até seis meses depois da notificação dos actos ao atingido). Na sequência da citada decisão de 2004, foi aprovada uma "lei de aplicação da decisão do Tribunal Constitucional Federal de 3 de Março de 2004", que alterou o referido §100d, passando a prever que os dados são destruídos se não forem necessários "para a prossecução da acção penal e para uma eventual comprovação judicial" e que, na medida em que a destruição seja adiada por esta última razão, "os dados devem ser encerrados e só podem ser utilizados para esse fim".

Aliás, também entre nós têm sido propostas várias soluções no sentido de evitar que os registos das conversações possam ser logo destruídos, antes sendo assegurada a possibilidade de controlo (incluindo a "contextualização" e a descoberta de novos elementos) também pela defesa (cf. as propostas legislativas referidas no n.º 2.6 do citado Acórdão 4/2006). E refira-se, aliás, como mera nota marginal, que é também diferente da que está em apreciação a solução prevista no anteprojecto de revisão do Código de Processo Penal que foi tornado público pelo Ministério da Justiça já em 2006. Segundo o seu artigo 188.º, n.º 6, a destruição imediata apenas é determinada pelo juiz em relação a "suportes técnicos e relatórios manifestamente estranhos ao processo" e que: disserem respeito a conversações em que não intervenham o suspeito ou arguido, pessoa "relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido ou vítima de crime, mediante o respectivo consentimento, efectivo ou presumido"; abranjam matérias cobertas pelo segredo profissional, de funcionário ou de Estado; ou cuja "divulgação possa afectar gravemente direitos, liberdades e garantias". Fora desses casos, prevê-se que, a partir do encerramento do inquérito, o assistente e o arguido possam "examinar os suportes técnicos das conversações ou comunicações e obter, à sua custa, cópia das partes que pretendam transcrever para juntar ao processo", sendo os suportes técnicos referentes a conversações ou comunicações que não forem transcritas para servirem como meio de prova "guardados em envelope lacrado, à ordem do tribunal, e destruídos após o trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo" (artigo 188.º, n.os 8 e 12, do citado anteprojecto).

14 - Poderia - é certo - defender-se que estas soluções legislativas se enquadram dentro da liberdade de conformação do legislador, sendo possíveis várias soluções no plano infraconstitucional. Dir-se-ia, neste sentido, que bastaria o controlo da relevância dos elementos de prova pelo juiz de instrução, procedendo ao controlo da legalidade, da necessidade e da relevância desses elementos.

Estes argumentos não podem, porém, considerar-se procedentes.

Na verdade, a destruição (permitida pela norma em apreço) de elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações, que o arguido poderia pretender utilizar em seu benefício e que apenas foram conhecidos pelo órgão de polícia criminal e pelo Ministério Público, com base na apreciação da sua relevância, e na consequente ordem de destruição, apenas pelo juiz de instrução, sem conhecimento pelo arguido, constitui logo, só por si, uma compressão inaceitável, e desnecessária, das garantias de defesa do arguido, particularmente notória na comparação da sua posição com a da acusação. Com efeito, o arguido, que já sofreu uma intervenção restritiva determinada e justificada apenas por razões de necessidade - nos seus direitos fundamentais ao ser objecto de escutas telefónicas, vê destruídos os registos dessas comunicações, de cujo conteúdo não chega a tomar conhecimento, e não pode sequer pronunciar-se sobre a sua relevância, enquanto a acusação (rectius, o órgão de polícia criminal e o Ministério Público) teve acesso ao conteúdo integral e completo das comunicações e pode (deve mesmo) seleccionar e indicar as partes que considera relevantes (artigo 188.º, n.º 1, parte final), tendo uma intervenção substancial anterior à apreciação do juiz e à sua decisão sobre a relevância, que pode influenciar.

Contra isto não basta argumentar, nem com o facto de a destruição dos registos inúteis visar ela própria a protecção de direitos fundamentais de terceiros ou do próprio arguido, nem com as garantias resultantes da intervenção do juiz de instrução, como "juiz das garantias" do arguido, ou com uma alegada possibilidade de contraditar a prova no momento do julgamento.

Quanto a esta última possibilidade, ela torna-se evidentemente ilusória, quanto ao que pudesse depender das conversações cujo conteúdo o arguido não conheceu, a partir do momento da destruição dos respectivos registos. Aliás, repete-se que não está apenas em causa a utilização das comunicações para enquadrar os elementos transcritos, mas igualmente com relevo autónomo.

Quanto ao primeiro ponto, recorda-se que está apenas em causa, na dimensão normativa em apreço, a ordem de destruição dos registos com base exclusivamente na apreciação da relevância das conversações para a prova, por parte do juiz, e não na ilegalidade das escutas ou na protecção dos direitos de terceiros ou do arguido (aliás, quanto a este último, sempre poderia duvidar-se da indisponibilidade de uma tal "protecção contra si próprio"). A invocação da protecção de terceiros - aliás, não concretizada no caso em apreço - contra intromissão na vida privada apenas poderia, pois, situar-se no plano abstracto da presunção de que todas e quaisquer escutas podem (criam o risco de) pôr em causa esses direitos de terceiros. Sem deixar de sublinhar a importância das garantias contra a indevida circulação do conteúdo das conversações interceptadas, ou, até, do estabelecimento de mecanismos que tutelem o risco da violação de direitos fundamentais como o segredo das comunicações, a alegação de um tal risco não pode, porém, sobrepor-se aos concretos direitos do arguido, de organizar a sua defesa controlando o conteúdo das conversações e utilizando-as em sua defesa, seja enquadrando as transcrições existentes, seja com relevância autónoma.

15 - No que toca à intervenção do juiz, para apreciar a relevância das comunicações interceptadas "em lugar" da apreciação que o arguido poderia pretender efectuar, é certo que ela representa uma garantia suplementar em relação a um sistema que deixasse a apreciação da relevância e a selecção exclusivamente na dependência da acusação (cf., aliás, concedendo especial importância ao parâmetro da "reserva do juiz", e ao artigo 32.º, n.º 4, da Constituição no regime das escutas telefónicas, J. M. Damião da Cunha, A Mais Recente Jurisprudência..., cit., pp. 51 e segs.).

Todavia, tal garantia não pode considerar-se suficiente sob dois pontos de vista: por um lado, e como se referiu, enquanto o órgão de polícia criminal e o Ministério Público podem influenciar a decisão do juiz sobre a relevância, devendo mesmo indicar as passagens das comunicações que consideram relevantes antes de aquele tomar uma decisão (que, recorda-se, pode, sem inconstitucionalidade, ser tomada sem audição da integralidade das conversações, e apenas com base em partes transcritas que lhe são facultadas, como se decidiu no Acórdão 426/2005), o arguido não chega sequer a ter conhecimento do conteúdo das comunicações antes da sua destruição, muito menos podendo fazer valer, ou fundamentar, a sua apreciação sobre a sua relevância, ficando, por isso, colocado numa posição de inferioridade, ou desigualdade, que objectivamente põe em causa as suas garantias de defesa; por outro lado, sendo ao arguido que compete organizar a sua defesa, contraditando os elementos invocados pela acusação e utilizando-os para se defender, tem de lhe ser deixada a possibilidade de ser ele a ajuizar, com base no conteúdo das conversações em causa, sobre a sua relevância, para, pelo menos, a poder justificar (por exemplo, porque entende que dela resulta um atenuação da sua culpa, ou até uma causa de justificação), sem que esse juízo possa ser antecipadamente inviabilizado pela destruição dos suportes magnéticos com base numa apreciação alheia (ainda que do juiz de instrução). Aliás, não está apenas em causa a possibilidade de conhecimento pelo arguido do conteúdo das comunicações, para efectuar e fundamentar a sua apreciação sobre a sua relevância, mas também a própria possibilidade de um controlo judicial da decisão de destruir os registos das conversações, ou, mesmo, da própria realização das escutas (em relação ao material destruído).

Sob este aspecto, a consideração de que a norma em causa apenas faz sentido no pressuposto de uma total irrelevância dos registos, com possibilidade (ou mesmo dever) de o juiz realizar esta avaliação, falha o alvo, justamente porque o que está em causa é esta possibilidade de avaliação e a intervenção nela do arguido - ou seja, saber se o arguido também há-de poder, pelo menos, influenciar com devido conhecimento a apreciação da relevância das conversações.

Não pode, aliás, excluir-se em absoluto que a apreciação pelo juiz de instrução, na sequência dos elementos que lhe são facultados pelo órgão de polícia criminal, e ainda que apenas de uma irrelevância clara, ou manifesta, dos elementos em questão, possa não estar objectivamente correcta, podendo vir a ser posta em causa pelo desenrolar futuro do processo ou por outros acontecimentos (sendo que a destruição dos registos inviabiliza, porém, a comprovação). E, de todo o modo, pelo menos quando não estejam em causa situações de ilegalidade das escutas ou de outras qualificadas afectações de direitos fundamentais justificadas em concreto, é ao arguido que tem de competir a possibilidade de controlar essa correcção e de fundamentar a sua própria apreciação sobre a relevância dos elementos em causa, o que só pode ser conseguido, como tem salientado o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, mediante precauções no sentido da comunicação integral e completa das conversações interceptadas ao arguido, as quais são radicalmente postergadas pela imediata destruição dos registos.

16 - Em suma, conclui-se que é inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido, asseguradas pelo artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, e em particular da garantia de um processo leal e do princípio do contraditório, a interpretação do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal que permite que sejam destruídos elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações, que o órgão de polícia criminal conheceu, com base na apreciação da sua relevância efectuada e na consequente ordem dada pelo juiz de instrução, e de cujo conteúdo o arguido não chega a tomar conhecimento, sem poder, pois, pronunciar-se sobre a sua relevância.

Há, assim, que conceder provimento ao presente recurso, determinando-se a reforma da decisão recorrida em conformidade com o presente juízo de inconstitucionalidade. Sublinhar-se-á apenas, como nota final, que as consequências a retirar do presente juízo de inconstitucionalidade para os elementos de prova constantes dos autos, incluindo as comunicações interceptadas aí transcritas, se encontram já fora do âmbito da intervenção do Tribunal Constitucional, situando-se claramente no domínio de intervenção do Tribunal recorrido.

III - Decisão. - Com estes fundamentos, o Tribunal Constitucional decide:

a) Não tomar conhecimento do recurso quanto à norma do artigo 180.º, n.º 1, do Código de Processo Penal;

b) Julgar inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, a norma do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual permite a destruição de elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações, que o órgão de polícia criminal e o Ministério Público conheceram e que são considerados irrelevantes pelo juiz de instrução, sem que o arguido deles tenha conhecimento e sem que se possa pronunciar sobre a sua relevância;

c) Consequentemente, conceder provimento ao recurso e determinar a reforma da decisão recorrida em conformidade com o presente juízo de inconstitucionalidade.

Lisboa, 28 de Novembro de 2006. - Paulo Mota Pinto - Mário José de Araújo Torres - Benjamim Rodrigues (vencido de acordo com a declaração de voto anexa) - Maria Fernanda Palma (vencida nos termos da declaração de voto junta) - Rui Manuel Moura Ramos.

Declaração de voto

1 - Votei vencido quanto ao conhecimento da questão de constitucionalidade e quanto à decisão de mérito.

2 - Na parte que concerne ao conhecimento, porque entendo que o recorrente não suscitou, nas alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, a questão de constitucionalidade da dimensão normativa do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal (CPP), de que o acórdão conheceu, pelo que este Tribunal não curou, nem teria de curar dela, nem, tão-pouco, esse preceito foi aplicado para decidir qualquer questão concreta relativa ao seu sentido, que o recorrente houvesse colocado ao tribunal de recurso, concernente às escutas concretamente não destruídas, constantes dos autos, ou a concretas escutas que houvessem sido efectivamente destruídas, donde resulta que o juízo de inconstitucionalidade poderá ser irrelevante para o resultado do juízo probatório a fazer pelo tribunal sobre as escutas que não foram apagadas, após a contradita do recorrente a efectuar com base em outros instrumentos de prova.

3 - No que importa à não suscitação.

Nas alegações para a Relação, o recorrente alegou, relativamente à questão de constitucionalidade, apenas o seguinte:

"7 - Acresce que, sem prescindir, o artigo 32.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, confere ao arguido Sandro Santos o direito fundamental ao contraditório relativamente aos meios de prova de que o Ministério Público se socorre para estribar a sua acusação e para a sustentar em audiência de julgamento.

8 - A conservação das gravações não transcritas até ao trânsito em julgado da decisão final, podendo o arguido requerer a audição em sede de julgamento ou de recurso para contextualizar as conversações transcritas, constitui um direito fundamental do arguido, que neste caso se encontra irremediavelmente precludido, afectando a totalidade da prova colhida com violação daquela norma constitucional."

Ora, o acórdão conheceu, segundo a sua própria formulação, da questão de "constitucionalidade da norma do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, no entendimento de que permite a destruição de elementos de prova obtidos mediante intercepção de telecomunicações e que o órgão de polícia criminal conheceu, com base numa apreciação da sua relevância efectuada, e na consequente ordem dada, pelo juiz de instrução, sem que o arguido chegue a tomar conhecimento do seu conteúdo e sem poder, pois, pronunciar-se sobre a sua relevância".

Como se constata, perante a alegação transcrita, o recorrente não suscitou a questão de constitucionalidade de que se conheceu. E a entender-se haver alguma alegação de uma questão de constitucionalidade, ela mostrar-se-ia feita, relativamente ao preceito do artigo 188.º, n.º 3, do CPP, em termos abstractos, ou seja, independentemente de uma sua aplicação como ratio decidendi de uma questão concreta relativa às escutas cuja resolução houvesse sido pedida ao tribunal de recurso.

4 - No que tange à não aplicação da dimensão normativa conhecida.

O recorrente não colocou ao tribunal de recurso qualquer questão concreta relativa à relevância probatória a conferir - no sentido de poder fundar ou de não poder fundar, na elaboração do juízo judicial, um resultado de convincência concernente a concretos e específicos factos - a determinadas e identificadas escutas transcritas. Nomeadamente, o recorrente não questionou perante o tribunal de recurso que as escutas transcritas, constantes dos autos, não pudessem fundar qualquer juízo de convincência acerca da existência dos factos afirmados com base nelas, porque o sentido com que haveriam de ser entendidas era não aquele que lhe foi atribuído pelo juiz de instrução, mas um outro diferente. Mais, o recorrente não alega, sequer, que a destruição das escutas o impedisse de fazer prova destes ou daqueles factos em sede de julgamento, mas apenas que a conservação das gravações não transcritas até ao trânsito em julgado da decisão final constitui um direito fundamental, "podendo o arguido requerer a sua audição em sede de julgamento ou de recurso para contextualizar as conversações transcritas" (itálico aditado). Ou seja, o recorrente alega a contextualização das escutas transcritas como necessidade eventual da defesa no acto de julgamento ou no recurso, ou seja, em nome de um direito geral de defesa que poderá, então, hipoteticamente, traduzir-se em actos de defesa concreta, relacionados com as escutas ou não. Isto equivale por dizer que o recorrente se apoia num princípio de que tudo o que vai sendo adquirido pelo processo, no seu decurso, tem de permanecer nele até ao trânsito em julgado da decisão definitiva, porque o arguido poderá, eventualmente, detectar, nesses meios de prova, elementos factuais relativos aos próprios meios de prova ou à realidade cuja existência os mesmos tendem a demonstrar de que poderá beneficiar na sua defesa.

Ora, o nosso processo penal não está estruturado sobre esse princípio, nem decorre da Constituição penal e processual penal essa exigência de acautelar uma hipotética, eventual e indeterminada estratégia de defesa no exercício do direito de defesa.

A questão relativa à destruição das escutas, cuja colocação se entende que o arguido deveria colocar para se ver nela uma aplicação do critério normativo de cuja constitucionalidade se conheceu, não é, como se deixa entrever do acórdão, que o "arguido justificasse a "contextualização" que pretendia realizar" em termos equivalentes ao "exigir-lhe que avançasse hipóteses ou que fizesse conjecturas, baseadas no conteúdo de comunicações a que não pode aceder", mas que, com referência às escutas transcritas, pusesse em crise o concreto sentido com que as mesmas foram entendidas pelo tribunal, dentro da sua liberdade de convincência e de apreciação, com base em outros elementos de prova ou até - na total ausência de outras provas com base em outras leituras, racionalmente, possíveis da linguagem transcrita.

O teste de que a dimensão normativa, de cuja constitucionalidade se conheceu, não constituiu ratio decidendi de qualquer questão concreta, relativa à validade de uma ponderação probatória das concretas escutas transcritas, está no facto, admitido implicitamente no final do acórdão, de que as escutas transcritas poderão, ainda, ser objecto de alguma valoração ou ponderação probatórias, a concretizar pelo tribunal depois do contraditório efectuado sobre elas.

5 - No que importa ao fundo, revejo-me na fundamentação do voto de vencido da conselheira Fernanda Palma. - Benjamim Rodrigues.

Declaração de voto

1 - Votei vencida a presente decisão pois entendo que a norma contida no artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, nos termos da qual o juiz de instrução pode ordenar a destruição das fitas gravadas ou de materiais similares de conversas telefónicas interceptadas consideradas irrelevantes, não deve ser julgada inconstitucional. Em minha opinião, tal norma consagra, em termos constitucionalmente admissíveis, a possibilidade de correcção pelo tribunal de uma intromissão injustificada na reserva da intimidade da vida privada do arguido ou de terceiros (artigo 26.º, n.º 2, da Constituição).

A argumentação do acórdão parte da ideia de que, uma vez realizada a intercepção, se tornará secundário assegurar os valores e interesses cuja restrição foi afectada, por as garantias de defesa e o contraditório (artigo 32.º, n.os 1 e 5, da Constituição) se terem tornado prevalecentes relativamente à reserva da intimidade da vida privada do próprio arguido ou de terceiro. Em termos simples, subjaz ao acórdão este raciocínio: uma vez realizada a escuta, ainda que desnecessária ou irrelevante, o eventual prejuízo que provocou já não deve ser valorizado: por um lado, porque a reserva da intimidade da vida privada já foi prejudicada pela intercepção e subsequente audição; por outro, porque o prejuízo para a reserva da intimidade da vida privada é superado pelo eventual benefício obtido pela defesa mediante a utilização dos respectivos elementos probatórios.

Nesta perspectiva, seria um mal maior - e intolerável segundo a Constituição - a devassa da reserva da intimidade da vida privada de qualquer pessoa não poder ser usada em benefício do arguido. Porém, esta linha de orientação, levada ao extremo, transfiguraria actos ilegítimos a priori em actos legítimos a posteriori. Numa aplicação sui generis do chamado teorema de Thomas, o que é errado (ilegítimo) na sua génese passaria a ser certo e legítimo nas suas consequências, desde que não invalidado. Assim, o arguido disporia, em última análise, de escutas ilegítimas de terceiros para sua defesa.

Acresce que o facto de uma intercepção ter sido já realizada e de a correspondente conversação ter sido ouvida por órgãos de polícia criminal e autoridades judiciárias não torna irrelevante o prejuízo para a reserva da intimidade da vida privada que pode advir da conservação dos respectivos suportes. Com efeito, essa conservação gera sempre um perigo acrescido de reprodução e de devassa, como tem revelado a experiência recente em sede de violação do segredo de justiça.

Uma outra ordem de considerações, que excede a esfera estrita do direito à reserva da intimidade da vida privada, aponta para a possibilidade de as fitas gravadas ou os materiais similares conterem elementos irrelevantes para o processo que estejam cobertos pelo segredo de Estado ou pelo segredo profissional. Nesta hipótese, acautelada pela proposta de revisão do Código de Processo Penal aprovada pelo Governo em 16 de Novembro de 2006 (artigo 188.º, n.º 6), há outros interesses constitucionalmente tutelados (artigos 35.º, n.º 1, e 26.º, n.º 1, parte final, da Constituição), que devem também ser ponderados em confronto com as garantias de defesa e o contraditório (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição).

2 - O legislador ordinário poderia solucionar o conflito de interesses dando sempre preponderância às garantias de defesa e ao contraditório, desde que a intercepção fosse legítima. Todavia, entender que o juiz de instrução está proibido de ordenar a destruição de quaisquer gravações de escutas que considere, segundo a sua análise e ponderação, manifestamente irrelevantes constitui uma interpretação desproporcionada das exigências constitucionais no processo penal.

Não se infere da Constituição que o legislador ordinário esteja impedido, nesta situação, de procurar salvaguardar outros interesses - que também têm, de resto, a dignidade de direitos fundamentais. Além disso, o contraditório vale na audiência de julgamento e noutros actos que a lei determinar (artigo 32.º, n.º 5, da Constituição), mas não forçosa e ilimitadamente no debate, em sede de inquérito, de todos os meios de investigação e de obtenção de prova na fase de inquérito.

Aliás, não está em causa, como parece transparecer do acórdão, uma delimitação "paternalista" dos interesses do arguido, quando se atribui ao juiz de instrução a competência para decidir se uma gravação é irrelevante. O juiz de instrução tem precisamente por função assegurar os direitos, liberdades e garantias - do arguido, de outros sujeitos processuais e de quaisquer terceiros -, como decorre do n.º 4 do artigo 32.º da Constituição. O processo penal não é um domínio em que, por exemplo, os direitos de terceiros se tornem livremente disponíveis pelo arguido e por outros sujeitos.

Se assim sucedesse, a pretexto do "garantismo", estaria aberto o caminho para que todas as violações de direitos fundamentais (mesmo envolvendo só terceiros) e as correspondentes actividades de investigação e de obtenção de prova (intercepção de comunicações e até outras) se viessem a consolidar na ordem jurídica para ulterior satisfação de uma arbitrária vontade do arguido. A efectividade da proibição dependeria sempre do arguido e a actividade proibida tornar-se-ia processualmente vantajosa, atraiçoando-se, desse modo, o sentido da nulidade (absoluta) cominada no n.º 8 do artigo 32.º da Constituição e da "inutilizabilidade" da prova decretada no artigo 126.º do Código de Processo Penal.

É constitucionalmente aceitável que o legislador queira impedir as violações de direitos fundamentais e acautelar interesses constitucionalmente tutelados (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição), permitindo a selecção das gravações efectivamente relevantes, promovendo a reversibilidade de excessos cometidos e submetendo a prova disponível pelo Tribunal a um princípio de autocontenção do "poder probatório" (ou de investigação) do Estado no processo penal.

Pretender que, uma vez realizada, a escuta irrelevante passe a poder servir a defesa, segundo a vontade arbitrária do arguido, implica concluir que a Constituição impõe uma dissolução dos limites de actuação da autoridade pública, que são limites do Estado de direito, na recolha da prova em função de um hipotético e não necessariamente demonstrado interesse da defesa.

3 - O argumento de que a qualificação de irrelevante pelo juiz de instrução tem de ser sempre, segundo a Constituição, sujeita a contraditório ou até, mais radicalmente, nunca pode ser formulada, corresponde a uma leitura excessiva do contraditório em face da estrutura acusatória "mitigada" do processo penal português.

Na fase do inquérito, o juiz intervém para garantir a não violação dos direitos fundamentais e a não ultrapassagem dos limites autorizados aos órgãos que actuam na recolha e produção da prova (artigo 32.º, n.º 4, da Constituição). A atribuição de competência para decidir da ilegitimidade ou da irrelevância de uma escuta é, a esta luz, uma decorrência normal da estrutura acusatória mitigada pelo princípio da investigação, que vigora no processo penal português.

É claro que pode haver situações em que o arguido venha sustentar uma necessidade concreta de contextualização ou de narrativa para a qual necessitaria de escutas consideradas irrelevantes entretanto destruídas. Estaremos, então, perante uma questão diversa da que os autos configuram. Nessa outra hipótese, uma necessidade de contextualização plausível em função das insuficiências dos suportes não destruídos pode demonstrar que o juízo de irrelevância do julgador foi duvidoso ou errado. O julgador pode ter utilizado até um critério inconstitucional, na destruição das fitas gravadas ou de materiais similares, tornando a matéria recolhida insuficiente ou incorrecta a sua interpretação.

Mas esta questão excede o terreno da constitucionalidade normativa da destruição de gravações de escutas irrelevantes. Ela pode referir-se à constitucionalidade ou à legalidade da própria decisão de destruição, em si, ou ao seu critério normativo, que assentará então numa interpretação ilegítima do conceito de "irrelevância". Uma tal interpretação normativa pode ser inconstitucional e, caso afecte a validade de uma prova por a descontextualizar, é passível de censura pelo Tribunal Constitucional nos termos gerais.

Em todo o caso, a argumentação do recorrente confronta o Tribunal Constitucional com a norma que permite a destruição de escutas irrelevantes sem mais, mesmo que tais escutas sejam manifestamente irrelevantes para qualquer observador - isto é, abstraindo de qualquer fundamentação do interesse concreto da defesa.

As escutas manifestamente irrelevantes, que ponham em causa direitos ou interesses constitucionalmente tutelados ou que abranjam só terceiros sem qualquer conexão com o processo passam, nesta interpretação do Tribunal Constitucional, a ter de estar integradas no processo para que a defesa (ou, quiçá, a acusação também, em nome do contraditório) decida, em última instância, sobre a sua relevância.

Ora, um tal critério normativo não resulta de exigências constitucionais do artigo 32.º, n.os 1, 4 e 5. Esse critério é antes enformado por um modo de configuração do processo penal radicalmente acusatório, que desvaloriza o papel do "juiz das liberdades" e em que o princípio contraditório domina todo o inquérito - e não apenas os "actos instrutórios que a lei determinar", como prescreve o artigo 32.º, n.º 5, da Constituição.

4 - Por seu turno, os argumentos retirados do direito comparado não têm em conta a estrutura global do processo penal nos ordens jurídicas invocadas.

No caso da Alemanha, vigora uma orientação próxima do artigo 188.º, n.º 3, do nosso Código. Com efeito, o § 100 b, n.º 6, do Código de Processo Penal alemão prevê que: "Não sendo os documentos obtidos já necessários para a prossecução da acção penal, devem ser destruídos imediatamente sob fiscalização do Ministério Público. Da destruição deve fazer-se acta." A ponderação feita pelo legislador alemão dá, como se vê, prevalência a um autêntico dever de destruição dos dados desnecessários, em função de uma estrita contenção da intervenção da autoridade pública no círculo da esfera privada dos cidadãos.

Por seu lado, a sentença citada do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem refere-se apenas à comunicação integral e completa das conversações interceptadas ao arguido. Ainda assim, esse aresto pressupõe um nível de relevância delimitado, pelo menos, em função do âmbito subjectivo das escutas, não se opondo à destruição dos materiais irrelevantes referentes a conversações em que o arguido não intervenha.

5 - Por todas as razões expostas, não pude acompanhar o juízo de inconstitucionalidade contido no acórdão.

No plano das consequências, importa observar ainda que a única ilação a extrair da decisão do Tribunal Constitucional seria a invalidade de todas as provas recolhidas através das escutas, sempre que qualquer fita gravada ou material similar fossem destruídos. Não faz qualquer sentido (e, a meu ver, será até contraditório) que um juízo de inconstitucionalidade que radica na violação das garantias de defesa devido à falta de oportunidade de contextualização das transcrições (por terem sido destruídas gravações consideradas irrelevantes) implique apenas a invalidade do despacho que ordenou essa destruição. Dessa forma, a função do juízo de inconstitucionalidade seria totalmente defraudada, o julgamento de inconstitucionalidade seria tendencialmente ineficaz e o requisito processual do interesse em agir nem sequer seria tido em conta no recurso de constitucionalidade.

Assim, também não acompanho o distanciamento preconizado no presente acórdão quanto às possíveis consequências do juízo de inconstitucionalidade. Esse "distanciamento" tem uma outra sede própria que é a admissibilidade constitucional de destruição de fitas gravadas ou de materiais similares manifestamente irrelevantes e cuja conservação pode afectar direitos ou interesses constitucionalmente tutelados. - Maria Fernanda Palma.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1537232.dre.pdf .

Ligações deste documento

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  • Tem documento Em vigor 1978-10-13 - Lei 65/78 - Assembleia da República

    Aprova, para ratificação, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, também designada Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, concluída em Roma, em 4 de Novembro de 1950, cujo texto em francês e respectiva tradução portuguesa acompanham o presente diploma. São, igualmente, aprovados para ratificação: - o Protocolo nº1 Adicional à Convenção, concluído em Paris, em 20 de Março de 1952; - o Protocolo nº2, que confere ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem competência (...)

  • Tem documento Em vigor 1987-02-09 - Acórdão 7/87 - Tribunal Constitucional

    Declara não se pronunciar pela inconstitucionalidade dos artigos 108.º, n.º 2, alínea b); 135.º, n.os 2 e 3; 174.º, n.os 3 e 4; 177.º, n.º 2, com referência ao artigo 174.º, n.º 4, alíneas a) e b); 178.º, n.º 3; 187.º, n.º 1; 190.º; 200.º; 250.º, n.º 3; 251.º, n.º 1; 252.º, n.º 3; 263.º; 270.º, n.º 1; 281.º, n.os 3 e 5, salvo, quanto a este último número, consequencialmente, na parte em que ele remete para o n.º 4; 286.º, e 337.º n.os 1, alínea a), e 3, e pronunciar-se pela inconstitucionalidade dos artigos (...)

  • Tem documento Em vigor 1993-01-22 - Decreto-Lei 15/93 - Ministério da Justiça

    Revê a legislação do combate à droga, definindo o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas.

  • Tem documento Em vigor 1995-03-15 - Decreto-Lei 48/95 - Ministério da Justiça

    Revê o Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, e procede à sua republicação.

  • Tem documento Em vigor 1995-11-28 - Decreto-Lei 317/95 - Ministério da Justiça

    Revê o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87 de 17 de Fevereiro.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-25 - Lei 59/98 - Assembleia da República

    Altera o Código do Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87 de 17 de Fevereiro, na redacção introduzida pelos Decretos-Leis 387-E/87, de 29 de Dezembro, 212/89, de 30 de Junho e 317/95, de 28 de Novembro. Republicado na integra, o referido código, com as alterações resultantes deste diploma.

  • Tem documento Em vigor 2000-11-17 - Lei 27-A/2000 - Assembleia da República

    Autoriza o Governo a alterar o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei nº 78/87, de 17 de Fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis nºs 387-E/87, de 29 de Dezembro, 212/89, de 30 de Junho, 317/95, de 28 de Novembro, e pela Lei nº 59/98, de 25 de Agosto.

  • Tem documento Em vigor 2000-12-15 - Decreto-Lei 320-C/2000 - Ministério da Justiça

    Altera o Código de Processo Penal, estabelecendo medidas de simplificação e combate à morosidade processual.

  • Tem documento Em vigor 2002-01-11 - Lei 5/2002 - Assembleia da República

    Estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira e altera a Lei nº 36/94, de 29 de Setembro, bem como o Decreto-Lei nº 325/95, de 2 de Dezembro.

  • Tem documento Em vigor 2006-03-17 - Acórdão 4/2006 - Supremo Tribunal de Justiça

    Fixa jurisprudência no seguinte sentido: a Portaria n.º 248/2001, de 22 de Março, revogada pela Portaria n.º 1179/2002, de 29 de Agosto, não era uma lei temporária, pelo que, por via daquela revogação, os factos nela tipificados e ocorridos na sua vigência deixaram de ser punidos, por força do n.º 2 do artigo 2.º do Código Penal, ex vi o artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.

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