de 17 de Setembro
Está reservado às autarquias locais um papel primordial nas realizações necessárias à resolução das múltiplas carências existentes e à consequente melhoria das condições de vida das populações que lhes servem de substracto.A legislação por que se rege a execução e a promoção de empreitadas de obras públicas pelas autarquias locais, os fornecimentos a estas mesmas entidades de bens e serviços e a concessão, por parte dos órgãos autárquicos, da exploração de obras e serviços públicos não foi, porém, ainda objecto de reformulação com vista à sua adaptação à nova realidade autárquica e, nomeadamente, à sua compatibilização com o princípio constitucional da autonomia local, tendo apenas beneficiado de meras actualizações pontuais.
É esta revisão que agora se faz, introduzindo-se algumas inovações, de entre as quais se salientam, por mais relevantes, as seguintes:
a) Atribui-se à assembleia deliberativa competência para fixar, genericamente e sobre propostas do executivo, o valor acima do qual as obras e os fornecimentos deverão, obrigatoriamente, ser feitos mediante concurso público;
b) Alargam-se, no que concerne à execução de obras, as possibilidades de recurso à administração directa, evitando-se os bloqueamentos que a lei vigente vinha impondo e garantindo-se o pleno aproveitamento dos recursos humanos e técnicos de que as autarquias locais disponham, permitindo-lhes que, por si ou através das associações de municípios, assumam, por sua conta e em termos de maior eficácia e racionalidade, a realização de empreendimentos;
c) É facilitado o acesso ao concurso limitado e permitido o ajuste directo, dando-se, por outro lado, no caso de o primeiro concurso haver ficado deserto por falta de concorrentes, a possibilidade de o órgão executivo optar entre o aumento do valor base da licitação e a abertura de novo concurso sem alteração do valor da base de licitação e ao qual poderão também concorrer empreiteiros não possuidores do alvará exigido. Tais medidas visam obviar, tanto quanto possível, à sistemática ausência de concorrentes que ocorre nas zonas menos desenvolvidas, bem como obstar a conluios tendentes a conseguir o encarecimento da obra, o que também não raras vezes vem acontecendo;
d) Estabelece-se a sujeição dos contratos agora regulamentados à fiscalização do Tribunal de Contas, nos termos que os contratos de idêntica natureza celebrados pelo Estado, exigindo-se, em regra, a sua redução à forma escrita e, nalguns casos, a celebração por escritura pública, de molde a garantir-se a definição precisa dos direitos e deveres dos contratantes e a conseguir-se a concomitante redução dos litígios suscitados na interpretação das respectivas cláusulas.
Nestes termos:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Objecto
Artigo 1.º
(Âmbito de aplicação)
1 - O presente diploma aplica-se à execução de trabalhos de construção, reconstrução, restauro, reparação, conservação e adaptação de bens imóveis a cargo das autarquias locais, ao fornecimento de bens e serviços à administração regional e local e à concessão de exclusivos, obras e serviços públicos por parte dos órgãos autárquicos.2 - O disposto no presente diploma é igualmente aplicável às associações de municípios.
CAPÍTULO II
Empreitadas e administração directa
Artigo 2.º
(Concurso público)
1 - Os órgãos deliberativos poderão fixar, sob proposta dos executivos, valor superior ao definido no número seguinte a partir do qual a execução das obras públicas a cargo das autarquias locais se realizará, obrigatoriamente, mediante concurso público, o qual não poderá ser alterado durante o período do mandato dos órgãos autárquicos.2 - Enquanto não for estabelecido pela assembleia deliberativa o valor referido no número anterior, aplicar-se-á aos municípios o limite de competência para autorização de despesas com dispensa de concurso legalmente definido para os órgãos dirigentes dos serviços dotados de autonomia administrativa e financeira.
3 - Os concursos públicos serão precedidos de deliberação, a publicitar por edital afixado, pelo menos, durante 20 dias, relativa à abertura do concurso e da aprovação dos respectivos programa, projecto e caderno de encargos, os quais serão patenteados a todos os interessados durante o prazo fixado no edital.
4 - Se a adjudicação não for efectuada em resultado do primeiro concurso, abrir-se-á novo concurso com aumento não superior a 20% sobre a base de licitação primitiva, ou, se o órgão executivo assim o deliberar, recorrer-se-á a concurso limitado.
5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, e sempre que a adjudicação se não efectue em virtude de o concurso ter ficado deserto, poderá o órgão executivo abrir novo concurso sem aumento do valor da base de licitação, ao qual poderão também ser admitidos empreiteiros inscritos não titulares do alvará exigido em função do valor da obra.
6 - Os empreiteiros a admitir nos termos da parte final do número anterior deverão fazer prova da sua competência técnica, nomeadamente fazendo acompanhar a respectiva proposta de declaração da qual conste a relação do equipamento e do pessoal qualificado de que disponham para a execução da obra.
Artigo 3.º
(Concurso limitado)
1 - Podem ser adjudicadas mediante concurso limitado:a) As obras de valor inferior ao limite estabelecido pela assembleia deliberativa, nos termos do n.º 1 do artigo anterior, ou ao valor previsto no n.º 2 do mesmo artigo, quando for caso disso;
b) As obras, de qualquer valor, que não hajam sido adjudicadas em resultado de concurso público, quando o órgão executivo delibere no sentido do recurso a concurso limitado.
2 - O número dos candidatos a consultar não pode ser inferior a 3.
Artigo 4.º
(Ajuste directo)
1 - Podem ser adjudicadas por ajuste directo:
a) As obras de valor inferior a metade da importância fixada pela assembleia deliberativa ao abrigo do n.º 1 do artigo 2.º ou do limite referido no n.º 2 do mesmo artigo, quando for caso disso;b) As obras que só possam ser feitas convenientemente por determinada entidade ou que, pela sua importância ou urgência, haja interesse em não sujeitar à concorrência.
2 - O recurso ao ajuste directo com base no disposto na alínea b) do número anterior será devidamente fundamentado pelo órgão executivo em proposta que carecerá da aprovação da assembleia deliberativa ou de ulterior confirmação por este órgão quando seja invocada a urgência de realização das obras.
3 - O ajuste directo deverá ser precedido de consulta a, pelo menos, e sempre que possível, 3 entidades.
Artigo 5.º
(Forma do contrato)
1 - O contrato de empreitada será sempre reduzido a escrito.2 - O contrato de empreitada será obrigatoriamente celebrado por escritura pública quando o seu valor seja superior a 2500000$00.
Artigo 6.º
(Administração directa)
1 - Podem ser feitas por administração directa:a) As obras de valor inferior ao limite estabelecido pela assembleia deliberativa nos termos do n.º 1 do artigo 2.º ou ao estabelecido no n.º 2 do mesmo artigo, quando for caso disso;
b) As obras de valor superior ao previsto na alínea a) cuja realização por administração directa haja sido expressamente autorizada pela assembleia deliberativa, na sequência de proposta do órgão executivo;
c) As obras ou reparações imprevistas ou de carácter urgente;
d) As obras que, postas a concurso nos termos dos n.os 3 e 4 do artigo 2.º, não tenham sido licitadas ou não hajam sido adjudicadas.
2 - Não poderão fazer-se desdobramentos de trabalhos da mesma obra cujo valor, no conjunto, atinja verba superior à estabelecida ao abrigo do artigo 2.º, quer se trate de administração ou ajuste directos, ou de concursos público ou limitado.
CAPÍTULO III
Fornecimentos
Artigo 7.º
(Concurso público)
1 - O fornecimento de bens e serviços às autarquias locais e associações de municípios só pode ter lugar por concurso público, a realizar nos termos do disposto nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 2.º 2 - Poderá, porém, ser dispensado o concurso público nos casos e nos termos previstos no artigo seguinte.
Artigo 8.º
(Concurso limitado e ajuste directo)
1 - É dispensada a realização de concurso público relativamente:a) Aos contratos de fornecimento de valor inferior ao limite estabelecido pela assembleia deliberativa nos termos do n.º 1 do artigo 2.º ou nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, se for caso disso;
b) Aos contratos de fornecimento de artigo com preço tabelado pelas autoridades competentes;
c) Aos fornecimentos de artigos cuja fabricação e comércio constituam exclusivo legal.
2 - Pode ser dispensada a realização de concurso público relativamente:
a) Aos fornecimentos avulsos de artigos de expediente ordinário dos serviços;
b) Aos contratos que visem a encomenda ou obtenção de estudos e projectos;
c) Aos contratos para aquisição de obras de arte, objectos e instrumentos, que só poderão ser fornecidos por artista ou técnico de valor comprovado;
d) Aos contratos em que o último concurso público, aberto para o mesmo fim e realizado há menos de 1 ano, tenha ficado deserto ou em que só tenham sido recebidas propostas consideradas inaceitáveis;
e) Aos contratos que, pela sua importância, se reconheça ser inconveniente sujeitar à concorrência;
f) Aos fornecimentos que só possam ser feitos convenientemente por determinada entidade em consequência de aptidão especialmente comprovada em contratos anteriores de que os fornecimentos sejam complemento.
3 - Se for dispensado o concurso público, deverá ser realizado concurso limitado, salvo se este também for dispensado.
4 - A dispensa de concurso, público ou limitado, nos casos previstos no n.º 2 só poderá ser concedida pela assembleia deliberativa, mediante proposta fundamentada do executivo.
5 - No concurso limitado o número de concorrentes convidados não pode ser inferior a 3.
6 - O ajuste directo deverá, sempre que possível, ser precedido de consulta a, pelo menos, 3 entidades, salvo nos casos de tabelamento oficial de preços ou em que o interesse da administração se dirija ao fornecimento de bens ou serviços que constituam exclusivo legal ou por ela preferidos em razão de determinada qualidade.
Artigo 9.º
(Forma do contrato)
1 - O contrato de fornecimento deverá ser celebrado por escrito.2 - A celebração do contrato escrito é obrigatória quando:
a) As aquisições de bens e serviços forem de importância superior a 400000$00, excepto quando se trate do fornecimento de artigos com tabelamento oficial de preço ou de artigos que estejam prontos a ser entregues imediatamente e as relações contratuais se extingam com a entrega;
b) O fornecimento deva exceder 90 dias, salvo quando houver motivo imperioso que justifique a dispensa.
3 - A dispensa de contrato escrito, nos casos em que esta forma não é obrigatória, compete à assembleia deliberativa, mediante proposta fundamentada do executivo.
CAPÍTULO IV Concessões
Artigo 10.º
(Concurso público)
A concessão de exclusivos, obras e serviços públicos por parte das autarquias locais e associações de municípios, depois de autorizada pela assembleia deliberativa, será adjudicada mediante concurso público, ficando os programas, projectos e cadernos de encargos sujeitos a parecer vinculativo e obrigatório das administrações central e regional nos casos expressamente previstos por lei.
Artigo 11.º
(Prazo da concessão e direito de resgate)
1 - Nenhuma concessão pode ser feita por prazo superior a 20 anos.
2 - Em todos os contratos de concessão deve ser previsto o direito a resgate pela entidade concedente, a partir, pelo menos, do décimo ano de exploração.
Artigo 12.º
(Transmissão da concessão)
As concessões adjudicadas não são transmissíveis, total ou parcialmente, ainda mesmo por arrendamento, sem prévia autorização da entidade concedente, sendo nulos e de nenhum efeito os actos e contratos celebrados pelo concessionário com infracção do disposto neste preceito.
Artigo 13.º
(Direito de fiscalização)
No contrato de concessão deve ser expressamente salvaguardado o direito de fiscalização da entidade concedente sobre o concessionário.
Artigo 14.º
(Forma do contrato)
O contrato de concessão constará sempre de escritura pública.
CAPÍTULO V
Disposições gerais
Artigo 15.º
(Legislação subsidiária)
Em tudo o que diga respeito ao regime de empreitadas de obras públicas, fornecimentos e concessões, e que não esteja especialmente regulado neste diploma, observar-se-ão as disposições legais aplicáveis ao Estado, competindo, porém, relativamente às empreitadas, ao órgão executivo da autarquia ou da associação de município resolver sobre a adjudicação e desempenhar as funções cometidas à comissão perante a qual decorre o acto público do concurso de obras do Estado.
Artigo 16.º
(Visto do Tribunal de Contas)
1 - Os contratos de empreitada, de fornecimento e de concessão celebrados pelas autarquias locais e associações de municípios ficam sujeitos ao visto do Tribunal de Contas, nos mesmos termos que os contratos de idêntica natureza celebrados pelo Estado, considerando-se visados 30 dias após a sua remessa.2 - A contagem do prazo do número anterior será interrompida sempre que forem solicitados elementos adicionais ou em falta e até à respectiva satisfação.
Artigo 17.º
(Norma revogatória)
Ficam revogados os artigos 359.º a 362.º do Código Administrativo.
Artigo 18.º
(Entrada em vigor)
O presente diploma entra em vigor 60 dias após a sua publicação, aplicando-se apenas às obras, aos fornecimentos e às concessões objecto de deliberação pelos órgãos autárquicos posterior à sua entrada em vigor.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 1 de Julho de 1982. - Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Promulgado em 26 de Agosto de 1982.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.