Decreto-Lei 104/87
de 6 de Março
1. A Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV) tem a sua origem no esquema organizativo das regiões demarcadas a que se refere a legislação de 1907-1908 e no seguimento da qual foram posteriormente publicados os regulamentos da produção e do comércio dos vinhos de algumas regiões previstas na referida legislação.
À Região dos Vinhos Verdes, nomeadamente à respectiva CVRVV, refere-se especificamente o Decreto 12866, de 10 de Dezembro de 1926, substituído, entretanto, pelo Decreto 16684, de 22 de Março de 1929, a que foi introduzida uma nova redacção em 11 de Abril seguinte.
O escopo finalístico da designada CVRVV, o seu modo de surgimento e de organização, a qualidade de entidade representativa dos viticultores da Região dos Vinhos Verdes, a sua natureza de organismo associativo, grande parte das suas atribuições e o sentir generalizado dos seus membros traduzem, inquestionavelmente, esta realidade, no plano jurídico, como uma associação regida pelos princípios e normas do direito privado.
Atenta a existência de algumas atribuições e competências de superintendência da produção e comércio dos vinhos verdes, como modo de disciplinar, preservando a designada denominação de origem «Vinho Verde», é manifesto que a CVRVV possui igualmente uma acentuada vertente pública, que lhe confere um regime de utilidade pública, próxima do regime administrativo.
2. É certo que com o advento da administração corporativa, nos anos trinta, se assistiu a um reforço da intervenção estatal no esquema organizativo da associação, acompanhada do reforço das atribuições cometidas a esta. Se, por um lado, o objectivo visado contemplava a defesa da genuinidade da produção vinícola da região demarcada, não é menos certo considerar-se o peso dos objectivos e enquadramento da política governativa então prosseguida como a causa fundamental da progressiva perda de autonomia da CVRVV em face do Estado. Esta mesma evolução acaba por inspirar o recorte do regime jurídico que o legislador foi tecendo para a CVRVV, designadamente através do Decreto-Lei 48857, de 7 de Fevereiro de 1966, que alimenta uma certa confusão quanto à definição jurídica do seu estatuto, facto que se manteve até hoje.
3. Importa, pois, à luz dos novos princípios jurídico-constitucionais imperantes na matéria do direito de associação e em atenção ao Programa do Governo e aos seus princípios de actuação que não visam um acréscimo dos poderes estatais, designadamente quando se mostrem injustificados e cerceadores da autonomia e liberdade dos cidadãos, clarificar, em termos definitivos, a natureza jurídica da associação mencionada.
Para tal aproveitou-se a necessidade de dar cumprimento ao que se dispõe na Lei 8/85, de 4 de Junho, que veio obrigar à revisão e ou criação das regiões demarcadas de vinhos, nos termos do que aí se estipula.
4. Optou-se, finalmente, por não introduzir alterações substanciais ao já anteriormente legislado na matéria da Região Demarcada dos Vinhos Verdes (RDVV). Razões de subsistência da validade, no essencial, do já definido, conjugadas com outras de índole histórica, a que acresce a sua compatibilidade à regulamentação e aos compromissos assumidos com a integração do País na CEE, aconselharam a manutenção dos normativos vigentes, ligeiramente melhorados, em face dos novos condicionalismos legais, históricos e políticos.
O ora reconhecimento da CVRVV como organismo subordinado aos princípios e regras do direito privado, resolvendo-se as dúvidas de natureza e caracterização jurídica que se levantavam, obrigou, porém, a fazer transitar o pessoal ao seu serviço para os quadros do Instituto do Vinho do Porto (IVP), atento o regime jurídico daquele ser o do pessoal vinculado aos organismos de coordenação económica (OCE) e constituir-se este serviço como único que, pela sua natureza e proximidade geográfico, justifica a adopção do referido procedimento, tanto mais quanto permanecerá como o único organismo de coordenação económica do ordenamento jurídico português.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
O presente decreto-lei visa harmonizar a legislação regulamentadora da RDVV aos princípios e normas estabelecidos na Lei 8/85, de 4 de Junho.
Artigo 2.º
Comissão vitivinícola regional
1 - O Governo, para os efeitos do disposto no artigo 5.º da Lei 8/85, de 4 de Junho, reconhece a constituição e a actividade da vigente Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, abreviadamente designada por CVRVV, considerando-a como associação regional, pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública.
2 - É reconhecida à CVRVV a prossecução da sua actividade incentivadora, disciplinadora, regulamentadora e económica, com o objectivo de preservar o património regional e nacional que e a denominação de origem «Vinho Verde», mediante o exercício das competências legalmente cometidas, próprias e adequadas aos relevantes serviços de interesse público prestados pela CVRVV.
3 - Nos casos em que se mostre necessária a adopção de procedimentos regulamentares incidindo sobre a produção e comercialização dos vinhos verdes, a vigorarem no âmbito regional ou nacional, compete à CVRVV propô-los ao Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação (MAPA).
Artigo 3.º
Elaboração dos estatutos
1 - A CVRVV providenciará a elaboração dos estatutos da associação no prazo de 60 dias contados da data da publicação do presente decreto-lei, por forma a adequá-los ao disposto na Lei 8/85, de 4 de Junho.
2 - A modificação dos estatutos, nos termos dispostos no número anterior, deverá ser obtida mediante o recurso ao instrumento notarial adequado, seguido da competente publicação no Diário da República, contendo o texto integral daqueles.
Artigo 4.º
Nomeação do representante do Estado
É da competência do MAPA a nomeação do representante do Estado na CVRVV, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 8.º da Lei 8/85, de 4 de Junho.
Artigo 5.º
Pessoal
1 - O pessoal ao serviço da CVRVV, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei transita para os quadros de pessoal do IVP, que, para o efeito, procederá ao alargamento do seu quadro de pessoal, na estrita medida da necessidade da integração, nos termos expostos, sem encargos adicionais, e no respeito pelas categorias e carreiras e demais direitos adquiridos por aquele, mediante a publicação de portaria contendo os novos lugares do quadro, e no respeito pelo disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei 41/84, de 3 de Fevereiro.
2 - A integração do pessoal, nos termos referidos no número anterior, terá lugar com dispensa de quaisquer formalidades, excepto a anotação do Tribunal de Contas.
3 - Ao pessoal da CVRVV, continua a ser aplicável o regime do pessoal dos OCE.
4 - O exercício da acção disciplinar sobre o pessoal mencionado no número anterior será assegurado pelo IVP.
Artigo 6.º
Celebração do acordo
1 - O IVP e a CVRVV celebrarão um acordo, com duração indeterminada, respeitante à prestação de serviço do pessoal da CVRVV, que manterá as funções que vinha exercendo nesta.
2 - Os encargos resultantes da aplicação do disposto no número anterior serão suportados pela CVRVV.
3 - Em caso algum da aplicação do disposto no presente diploma legal poderá resultar para o IVP qualquer aumento de encargos.
4 - A celebração do acordo referido nos números anteriores constitui condição indispensável para a efectiva produção de efeitos do disposto no artigo 2.º do presente decreto-lei.
Artigo 7.º
Legislação revogada
Mantém-se em vigor a legislação aplicável à RDVV em tudo o que não contrariar o disposto no presente decreto-lei.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 18 de Dezembro de 1986. - Aníbal António Cavaco Silva - Miguel José Ribeiro Cadilhe - Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto - Fernando Augusto dos Santos Martins.
Promulgado em 5 de Fevereiro de 1987.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 12 de Fevereiro de 1987.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.