Decreto-Lei 387-H/87
de 30 de Dezembro
O presente diploma visa adequar a legislação reguladora da competência da Polícia Judiciária aos princípios fixados pelo Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87, de 17 de Fevereiro.
Trata-se de solução que não prejudica a reestruturação orgânica daquela Polícia, na qual desde já se trabalha.
As alterações circunscrevem-se, por isso, ao capítulo I do Decreto-Lei 458/82, de 24 de Novembro, relativo à natureza, atribuições e competência da Polícia Judiciária.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º Os artigos 1.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 9.º, 10.º, 11.º e 14.º do Decreto-Lei 458/82, de 24 de Novembro, passam a ter a seguinte redacção:
Artigo 1.º
Natureza e atribuições
1 - A Polícia Judiciária é um órgão de polícia criminal organizado hierarquicamente na dependência do Ministro da Justiça e fiscalizado pelo Ministério Público.
2 - São atribuições da Polícia Judiciária a prevenção e a investigação criminal, bem como a coadjuvação das autoridades judiciárias, nos termos dos artigos seguintes.
3 - A Polícia Judiciária actua, no processo, sob a direcção e na dependência funcional da autoridade judiciária competente.
4 - As acções solicitadas e os actos delegados pela autoridade judiciária são realizados pelos funcionários designados pelas entidades da Polícia Judiciária para o efeito competentes.
Artigo 3.º
Competência em matéria de prevenção criminal
1 - Em matéria de prevenção criminal compete, designadamente, à Polícia Judiciária:
a) Vigiar e fiscalizar os estabelecimentos e locais, incluindo os que pertençam ao sector público ou nacionalizado, em que se proceda a transacções de penhores, de adelo, ferro-velho, antiguidades e móveis usados, de compra e venda de livros usados, de ourivesaria e oficina de ourivesaria, relativamente a objectos usados, de aluguer, compra e venda de veículos e seus acessórios e as garagens, oficinas e outros locais de recolha ou reparação de veículos;
b) Vigiar e fiscalizar hotéis, casas de pernoita, restaurantes, cafés, bares, tabernas, locais onde se suspeite da prática de prostituição e outros semelhantes;
c) Vigiar e fiscalizar locais de embarque e de desembarque de pessoas ou de mercadorias, fronteiras, meios de transporte, locais públicos onde se efectuem operações comerciais, de bolsa ou bancárias, estabelecimentos de venda de valores selados, casas ou recintos de reunião, de espectáculos ou de diversões, casinos e salas de jogo, parques de campismo e quaisquer locais que possam favorecer a delinquência;
d) Realizar acções destinadas a limitar o número de vítimas da prática de crimes, motivando os cidadãos a adoptarem precauções ou a reduzir os actos e as situações que facilitem ou precipitem a ocorrência de condutas criminosas.
2 - Os proprietários, administradores, gerentes ou directores dos estabelecimentos mencionados na alínea a) do número anterior entregam no departamento da Polícia Judiciária com jurisdição na área em que se situam, até quarta-feira da semana seguinte àquela a que respeitam, relações completas, com identificação dos intervenientes nas transacções e dos respectivos objectos, conforme modelo exclusivo cuja cópia lhes é facultada.
3 - A Polícia Judiciária pode determinar que a obrigação referida no número anterior seja estendida a quem tiver a exploração de simples locais nos quais se proceda às transacções aí mencionadas.
4 - As companhias de seguros comunicam ao departamento da Polícia Judiciária com jurisdição na área em que se situam, até ao dia 5 do mês seguinte àquele em que a regularização ou a transacção se tenha efectuado, as existências ou as vendas de salvados de incêndios florestais e de salvados de veículos automóveis, com indicação, conforme os casos, da identidade do comprador, do preço de venda e dos elementos identificadores do veículo a que respeitam.
5 - Os objectos adquiridos pelos estabelecimentos e locais mencionados na alínea a) do n.º 1 não podem ser modificados antes de decorridos quinze dias contados da entrega das relações a que se referem os n.os 2 e 4.
6 - A infracção ao disposto nos n.os 2, 3, 4 e 5 constitui contra-ordenação punida com coima de 20000$00 a 100000$00. A negligência é punível. A aplicação cabe ao director-geral, que determina a autoridade a quem compete a investigação.
7 - As acções a que se referem as alíneas b) a d) do n.º 1 são realizadas sem prejuízo das atribuições dos restantes órgãos de polícia criminal.
Artigo 4.º
Competência em matéria de inquérito e investigação criminal
1 - Presume-se deferida à Polícia Judiciária em todo o território a competência para a investigação dos seguintes crimes:
a) Tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas;
b) Falsificação de moeda, títulos de crédito, valores selados, selos e outros valores equiparados ou a respectiva passagem;
c) Fraude na obtenção ou desvio de subsídio, subvenção ou crédito;
d) Corrupção;
e) Organizações terroristas e terrorismo;
f) Contra a segurança do Estado, com excepção dos que respeitem à mutilação para isenção de serviço militar e à emigração para dele se subtrair e dos relativos ao processo eleitoral;
g) Participação em motim armado;
h) Captura ou perturbação dos serviços de transporte por ar, água e caminho de ferro;
i) Contra a paz e a humanidade;
j) Escravidão, sequestro e rapto ou tomada de reféns;
l) Roubos em instituições de crédito ou repartições da Fazenda Pública;
m) Executados com bombas, granadas, matérias ou engenhos explosivos, armas de fogo proibidas e objectos armadilhados;
n) Homicídio voluntário, desde que o agente não seja conhecido;
o) Furto de coisa móvel que tenha valor científico, artístico ou histórico e que se encontre em colecções públicas ou acessíveis ao público, que possua elevada significação no desenvolvimento tecnológico ou económico ou que, pela sua natureza, seja substância altamente perigosa;
p) Associações criminosas;
q) Incêndio, explosão, exposição de pessoas a substâncias radioactivas e libertação de gases tóxicos ou asfixiantes, desde que, em qualquer caso, o facto seja imputável a título de dolo;
r) Tráfico de veículos furtados ou roubados e viciação dos respectivos elementos identificadores;
s) Falsificação de cartas de condução, livretes e títulos de propriedade de veículos automóveis, de certificados de habilitações literárias, de passaportes e de bilhetes de identidade.
2 - O procurador-geral da República, ouvido o director-geral da Polícia Judiciária, pode deferir à Polícia Judiciária competência para a investigação de determinados tipos de crime.
Nas comarcas de Lisboa, Porto e Coimbra, o procurador-geral da República pode ainda deferir à Polícia Judiciária competência para a investigação de quaisquer crimes de que esta Polícia tome conhecimento ou lhe sejam denunciados.
3 - Os restantes órgãos de polícia criminal devem, sem prejuízo do disposto no artigo 248.º do Código de Processo Penal, participar à Polícia Judiciária os factos de que tenham conhecimento relativos à preparação e execução dos crimes referidos no n.º 1 e praticar, até à sua intervenção, os actos cautelares e urgentes para assegurar os meios de prova.
4 - O disposto no presente artigo não prejudica a competência estabelecida para os tribunais militares.
Artigo 5.º
Delegação de competência para a investigação criminal e coadjuvação das autoridades judiciárias
O procurador-geral da República pode deferir à Polícia Judiciária, ouvido o respectivo director-geral, a competência para a realização da investigação e de coadjuvação das autoridades judiciárias relativamente a crimes não previstos no artigo anterior, desde que as circunstâncias da sua prática ou a complexidade da investigação o justifiquem.
Artigo 6.º
Competência em matéria de coadjuvação das autoridades judiciárias
Compete à Polícia Judiciária a coadjuvação das autoridades judiciárias em processos relativos a crimes a cuja investigação lhe incumba proceder.
Artigo 9.º
Dever de comparência
Qualquer pessoa, quando devidamente notificada ou por outra forma convocada, tem o dever de comparecer no departamento da Polícia Judiciária respectivo, sob pena das sanções previstas na lei de processo.
Artigo 10.º
Autoridades de polícia criminal
1 - São autoridades de polícia criminal, nos termos da alínea d) do artigo 1.º do Código de Processo Penal, os seguintes funcionários da Polícia Judiciária:
a) Director-geral;
b) Directores-adjuntos:
c) Subdirectores;
d) Directores do Arquivo Central de Registos e Informações e do Gabinete Nacional da Interpol;
e) Assessores de investigação criminal;
f) Inspectores-coordenadores;
g) Inspectores;
h) Subinspectores que se encontrem a chefiar subinspecções ou inspecções.
2 - As autoridades referidas no número anterior são competentes para ordenar a detenção nos termos do artigo 257.º do Código de Processo Penal.
3 - Os funcionários mencionados no n.º 1, bem como o pessoal de investigação, podem ordenar a identificação de qualquer pessoa, nos termos do artigo 250.º do Código de Processo Penal.
Artigo 11.º
Livre trânsito
1 - Aos funcionários mencionados nos n.os 1 e 3 do artigo 10.º, desde que devidamente identificados e em missão de serviço, é facultada a entrada livre nos estabelecimentos e locais a que se refere o n.º 1 do artigo 3.º e naqueles onde realizem acções de prevenção criminal.
2 - Para a realização de diligências de investigação ou de coadjuvação judiciária, os funcionários mencionados no número anterior, bem como o director do Laboratório de Polícia Científica, e o pessoal de coadjuvação judiciária, de criminalística, de perícia médico-psicológica, de perícia financeiro-contabilística, de identificação judiciária de telecomunicações e de segurança, podem entrar, desde que devidamente identificados e em missão de serviço, em quaisquer repartições ou serviços públicos, empresas comerciais e industriais, escritórios e outras instalações.
3 - O director-geral, quando as circunstâncias e o tipo de funções o justifiquem, pode emitir, fora dos casos previstos nos números anteriores, credenciais que servem de livre trânsito nos locais e durante o período que nelas sejam fixados.
4 - ...
5 - ...
Artigo 14.º
Segredo de justiça
1 - As acções de investigação criminal e de coadjuvação das autoridades judiciárias estão sujeitas a segredo de justiça, nos termos da lei de processo.
2 - ...
Art. 2.º O presente diploma entra em vigor simultaneamente com o Código de Processo Penal.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 25 de Novembro de 1987. - Aníbal António Cavaco Silva - Joaquim Fernando Nogueira.
Promulgado em 22 de Dezembro de 1987.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 23 de Dezembro de 1987.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.