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Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 11/2013, de 19 de Julho

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Sumário

Fixa a seguinte jurisprudência: a alteração, em audiência de discussão e julgamento, da qualificação jurídica dos factos constantes da acusação, ou da pronúncia, não pode ocorrer sem que haja produção de prova, de harmonia com o disposto no n.º s 1 e 3 do art. 358.º do CPP. (Proc. n. º 788/10.0gebrg.g1-A.S1- 3.ª)

Texto do documento

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 11/2013

Proc. n.º 788/10.0gebrg.g1-A.S1- 3.ª

Recurso para fixação de jurisprudência

Conferência

Acordam no Pleno das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça:

I - O Exmo Magistrado do Ministério Publico junto do Tribunal da Relação de Guimarães, face ao trânsito em julgado do acórdão de 09/01/2012, proferido no recurso penal n.º 788/10.0gebrg.g1, e inconformado com a decisão, agindo por obrigação legal, nos termos do artigo 437.º do CPPenal apresentou recurso extraordinário de fixação de jurisprudência desse acórdão para este Supremo Tribunal, apresentando as seguintes conclusões na motivação:

1 - O acórdão recorrido considerou legal a modificação da matéria de facto realizada na audiência de julgamento sem que nela fosse produzida qualquer prova e sem que nela fosse dado cumprimento ao disposto no art. 358 do CPPenal, desqualificando, na sequência dessa alteração, a concreta imputação efectuada ao arguido dum crime de ofensa à integridade física qualificada em ofensa à integridade física simples, apelando para tanto ao próprio citado artigo 358.º e à não ofensa à estrutura acusatória vigente no processo penal;

2 - Diverge-se desta decisão porquanto se persegue o entendimento de que tendo sido recebida a acusação e designado dia para julgamento, não pode o juiz, no início da audiência, após a sua abertura, decidir que os factos da acusação não integram o crime nela mencionado, mas sim outro;

3 - E assim acontece porquanto o entendimento diverso viola o princípio da identidade do objecto da acusação fixado por via da pronúncia ou do despacho que recebeu a acusação, variabilidade criadora de incerteza e de desrespeito pela segurança jurídica decorrente do recebimento por decisão judicial, incondicionada, de tal imputação formal.

4 - Nada obsta ao conhecimento do recurso extraordinário porquanto o acórdão recorrido, transitado em julgado e com a posição jurídica supra mencionada, se apresenta em plena oposição ao que foi proferido a 06/07/2005 pelo Tribunal da Relação do Porto, no processo 0541884.

Foi violado, por isso, o disposto nos artigos 311.º, 358.º e artigos 338.º, n.º 1 e 368.º, n.º 1, todos do CPPenal.

V. Exa.s, com ponderação e saber, farão JUSTIÇA II - Instruído o recurso, e indo os autos à conferência, acordou-se em concluir pela oposição de julgados, prosseguindo o recurso nos termos da 2.ª parte do artigo 441.º n.º 1, e cumprindo-se o disposto no artigo 442.º n.º 1, ambos do CPP.

III - O Digníssimo Magistrado recorrente, nas alegações que apresentou, apresentou as seguintes CONCLUSÕES:

1.ª A inserção sistemática do artigo 358.º do CPP no capítulo que define as regras e princípios que regulam a actividade da produção de prova, leva a concluir que o mecanismo da alteração da qualificação jurídica do n.º 3 daquele preceito foi previsto e tem aplicação já após a discussão da causa, após produção de prova.

2.ª Ora, considerando que o referido n.º 3 é uma norma integrada no contexto global do mecanismo da "alteração não substancial dos factos", prevista no artigo 358.º CPP, e que a alteração dos factos (n.º 1) só pode ocorrer, necessariamente, após produção de prova, estabelecendo o n.º 3 que aquele n.º 1 "é correspondentemente aplicável" à alteração da qualificação jurídica, não faria sentido que a alteração da qualificação jurídica pudesse ocorrer em momento processual diferente;

3.ª O n.º 4 do artigo 339.º do CPP estabelece qual é, em sede de audiência, o objecto da discussão da causa, reservando para tal momento, para além do mais e independentemente do regime aplicável à alteração dos factos que o tribunal possa vir considerar, a discussão de todas as soluções jurídicas pertinentes, independentemente da qualificação jurídica dos factos resultantes da acusação ou da pronúncia;

4.ª O artigo 338.º, n.º 1, do CPP, nos actos introdutórios, momento imediatamente anterior à discussão da causa, apenas prevê a possibilidade de o juiz conhecer de questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa, acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo conhecer;

5.ª A apreciação sobre a qualificação jurídica efectuada na acusação, para além de ser questão sobre a qual já houve decisão (artigo 311.º) e que não obsta à apreciação do mérito da causa, não integra o conceito de questão prévia ou incidental;

6.ª Tendo o legislador consagrado a irrecorribilidade do despacho que recebe a acusação nos seus precisos termos e designa data para o julgamento (artigo 313.º, n.º 4), é incoerente com o sistema o entendimento que permita ao próprio juiz de julgamento alterar decisão já proferida, tanto mais que, não se tratando de despacho de mero expediente, a sua prolação esgota o poder jurisdicional sobre tal matéria;

7.ª Este entendimento é o que respeita o princípio do acusatório, consagrado constitucionalmente no artigo 32.º n.º 5 da CRP, do qual decorre que a entidade que julga é diferente da entidade que acusa;

8.ª Um dos corolários do acusatório é o princípio da vinculação temática, consubstanciado, na solução adoptada pelo nosso CPP, na ideia de que já na fase preliminar do julgamento se deve uma observância estrita do princípio do acusatório, com vinculação temática do juiz de instrução ao objecto formulado na acusação;

9.ª Fora da instrução, decorre do mesmo princípio não ser possível ao juiz efectuar uma fiscalização e controlo da actividade do Ministério Público, nomeadamente, de fazer um controlo substantivo da acusação.

10.ª Ora, considerando que a acusação, definidora do objecto do processo, integra, para além dos factos, as disposições legais aplicáveis, ou seja, a qualificação jurídica (um dos requisitos obrigatórios da acusação cuja omissão acarreta rejeição - artigo 283.º, n.º 3, alínea c), do CPP), a alteração da qualificação efectuada pelo juiz de julgamento mais não é do que um proibido controlo substantivo da acusação.

11.ª A tese do acórdão recorrido conduz a uma solução inadmissível, pois a qualificação jurídica feita pelo Ministério Público seria mero exercício anódino.

O juiz, previamente ao julgamento do mérito, passaria a poder ingerir-se em competências alheias, estruturando substancialmente a acusação, elegendo e impondo aos sujeitos do processo a qualificação correcta, que nenhum previamente (na fase própria) contestara.

Propõe-se, pois, que o Conflito de Jurisprudência existente entre os acórdãos Relação de Guimarães, de 5 de Novembro de 2012 (recorrido), e da Relação do Porto, de 6 de Julho de 2005 (fundamento), seja resolvido nos seguintes termos:

Aberta a audiência de discussão e julgamento, não pode o juiz, sem que se proceda à produção de prova, alterar a qualificação jurídica dos factos constante da acusação.

Deverá, assim, o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, fixar-se a jurisprudência acima proposta.

IV - Por sua vez, o arguido, concluiu assim as suas alegações de recurso:

i) As doutas Sentenças decidiram e bem pela aceitação da alteração da qualificação jurídica dos factos e pela extinção do procedimento criminal atendendo à desistência de queixa.

ii) Não existe fundamento para a aludida violação dos artigos 32.º n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, 311.º n.º 1, 338 n.º 1 358.º e 368, n.º 1 todos do Código de Processo Penal.

iii) Saliente-se que o Ministério Público não discordou da qualificação jurídica, em concreto, efectuada pelo Meritíssimo Juiz "a quo", mas tão só com o momento em que a mesma é operada.

iv) Ora, no que respeita ao momento da alteração da qualificação jurídica dos factos importa seguir as orientações do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 03/10/2007 segundo o qual, e desde logo "...não estamos na presença da uma alteração de factos. Antes, o tribunal, qualifica de forma diferente os factos que constam da acusação ou da pronúncia, sem nada lhes editar ou modificar" e dos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 29.09.2010, da Relação de Guimarães de 04.11.2002 e da Relação de Lisboa de 04.11.2009.

v) Importa pois atender, desde logo, que é o que sucede no caso em apreço.

Trata-se meramente da diferente qualificação jurídica dos mesmos factos constantes da acusação; O Mm. Juiz. "a quo" não modifica nem adita quaisquer factos constantes da acusação, antes os qualifica de forma diversa, por entender que não preenchem o tipo legal de crime de que o arguido vinha acusado.

vi) Desta forma, à luz da factologia descrita na acusação, entendeu o Mm, Juiz "a quo" que mereciam os factos outra qualificação Jurídica, tratando-se de um crime de ofensa à Integridade física simples a não qualificada, vii) Cumpre, salientar que está em causa uma alteração da qualificação jurídica que é atribuída aos factos na acusação, pelo que, é unânime tratar-se de uma alteração não substancial nos termos do artigo 368.º n.º 3 do Código de Processo Penal, veja-se a este propósito o Assento 2/93 do Supremo Tribunal de Justiça. Ora, dada a palavra ao arguido não se opôs o mesmo à alteração feita pelo Tribunal "a quo", tendo sido observado o seu direito de defesa e o princípio do contraditório.

viii) Não se configurando qualquer violação à estrutura acusatória do processo penal e, consequentemente ao artigo 32.º n.º 5 da Constituição da República Portuguesa.

O tribunal continua vinculado ao conhecimento dos factos constantes da acusação, que fixam, como se disse, objeto de processo. Pelo que se respeita a vinculação temática em todas as suas dimensões; da Identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção. Mantém-se uma clara separação entre a entidade acusadora e o Juiz de julgamento, ix) Decorre da própria Constituição que "os tribunais são Independentes e apenas estão vinculados a lei" e que administram "a justiça em nome do povo", conforme artigos 203.º e 202.º n.º 1. Pelo que, a sua atuação deva ser orientada pela aplicabilidade da lei e pela procura da solução justa e adequada para o caso concreto. Desta forma, deve aceitar-se que o juiz proceda à diferente qualificação jurídica dos factos, em sede de despacho de saneamento. O próprio texto constitucional e, de acordo com uma Interpretação teleológica do mesmo, legitima este entendimento;

x) Além de ser o que melhor respeita o princípio da economia processual, por se afigurar excessivo e dispensável, a realização de todo o julgamento cujo desfecho certamente seria o mesmo no que respeita à alteração da Incriminação. De facto, parece-nos excessivo que por respeito a normas processuais, que visam obter um fim, não sendo dotadas de valor intrínseco em si mesmas, perpetuasse o tribunal a discussão de factos que, a priori, no momento do despacho de saneamento, se havia apercebido enquadrarem um tipo legal de crime diferente do que vinha acusado o arguido. Isto seria persistir num erro percecionado aquando da receção da acusação, o que de todo viola o princípio da economia processual e se traduziria numa atuação sem utilidade, por mero respeito a normas processuais, que como se disse, não têm valor intrínseco.

xi) Parece-nos que a motivação do recurso do Ministério Público enferma desse vício centrando-se numa Interpretação contrária a princípios gerais do Direito.

xii) Decorre do próprio artigo 203.º da Constituição da República portuguesa, que os tribunais são independentes, apenas estando vinculados à lei. Ora, à lei e não à interpretação legal ou ao enquadramento Jurídico dos factos feito pelo Ministério Público.

xiii) Pelo que nos parece de todo aceitável que no despacho de saneamento conheça já o tribunal da alteração da qualificação jurídica dos factos, porquanto, ainda que não tivesse existido desistência de queixa e se tivesse prosseguido para a fase de julgamento, o tribunal teria já descrito os factos e a correta qualificação jurídica dos mesmos a discutir.

xiv) Como bem refere, o citado acórdão da Relação do Porto de 03.10.2006 A não ser assim cairíamos no absurdo de o processo prosseguir para, em fase posterior, nomeadamente, na prolação da sentença, se decidir que os factos constantes da acusação, todos provados, e nada mais provado, importam diferente alteração da incriminação jurídica.

xv) No que respeita ao pedido de Indemnização civil, ofendido e -arguido chegaram a acordo, tendo ultrapassado os diferendos de forma consensual e obtido uma solução que lhes parece justa, atendendo a todos os danos de natureza moral e patrimonial, sofridos. De modo que não se justificaria que o tribunal contribuísse por qualquer forma para o prolongamento do conflito, antes devendo contribuir para a estabilidade da resolução, como o fez.

xvi) O que, de resto, se traduz numa situação capaz de, promover a pacificidade social e a reparação dos bens lesados, por uma via, menos onerosa para todos os envolvidos.

xvii) Pelo que, bem decidiu o Mm. Juiz "a quo" ao homologar a desistência de queixa, atendendo à natureza do crime, à qualidade do assistente e à não oposição do arguido.

xviii) Não se configura qualquer violação aos artigos 51.º, 311.º, 338.º n.º 1, 356.º e 368.º n.º 1, todos do Código de Processo Penal e 116.º do Código Penal.

Por tudo isto, deve fixar-se a Jurisprudência no sentido seguido pelo acórdão recorrido e que, de resto, corresponde já a uma vertente maioritária das decisões jurisprudenciais.

TERMOS EM QUE.

Farão Vossas Excelências a habitual JUSTIÇA! V - Da oposição de julgados Uma vez que a decisão sobre a oposição de julgados, não vincula o Pleno, há que reapreciar essa questão.

Reapreciando:

A exigência de oposição de julgados, de que não se pode prescindir na verificação dos pressupostos legais de admissão do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, nos termos do artigo 437.º, n.º 1, do CPP, é de considerar-se preenchida quando, nos acórdãos em confronto, manifestamente de modo expresso, sobre a mesma questão fundamental de direito, se acolhem soluções opostas, no domínio da mesma legislação.

A estes requisitos legais, o STJ, de forma pacífica, aditou a incontornável necessidade de identidade de factos, não se restringindo à oposição entre as soluções de direito (1).

O recorrente interpôs recurso para fixação de jurisprudência, do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 5 de Novembro de 2012, proferido nos autos de recurso penal n.º 788/10.0gcbrg.g1 da mesma Relação, oriundo do Tribunal Judicial de Esposende, e apresenta como fundamento o acórdão de 6 de Julho de 2005, do Tribunal da Relação do Porto, proferido no proc. n.º 0541884 da mesma Relação.

Ambos os acórdãos transitaram em julgado, tendo o acórdão recorrido transitado em julgado em 19 de Novembro de 2012.

Como resulta dos acórdãos em confronto - recorrido e fundamento - a questão fáctica é idêntica e assenta na alteração pelo juiz, no início da audiência, após a sua abertura, da qualificação jurídica dos factos constante da acusação remetida e recebida para julgamento, antes de se iniciar a produção de prova.

Ambos os acórdãos apreciaram um despacho proferido após abertura da audiência de julgamento, que homologou a desistência de queixa, por esse despacho ter considerado que não se verificava o crime de ofensas à integridade física qualificada constante da acusação, mas sim o crime de ofensas à integridade física, alterando, para tanto, a qualificação jurídica constante da acusação, sem que tenha havido produção de qualquer prova, vindo o Ministério Público a interpor recurso desse despacho.

O acórdão recorrido refere:

"O Ministério Público veio interpor recurso do despacho do Mmo Juiz do 1.º Juízo do Tribunal de Esposende que homologou a desistência de queixa apresentada pelo assistente na sequência da alteração da qualificação jurídica dos factos constante da acusação.

[...] Resulta dos autos:

. o Ministério Público deduziu acusação contra Carlos Manuel da Silva Gonçalves, imputando-lhe a autoria material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos artºs 143.º, n.º 1, e 145.º, n.os 1, alínea a), com referência ao art.º 132.º, n.º 2, alínea e), todos do CP; [Fls.

145-146] . remetidos os autos ao tribunal de julgamento, o Mmo Juiz do 2.º Juízo de Esposende recebeu a acusação nos seus precisos termos, fácticos e jurídicos, e designou os dias 14 e 28/02/2012 para a realização da audiência;

[Fls. 201-202] . na 1.ª data marcada, depois de declarada "aberta a audiência de discussão e julgamento", o assistente-demandante e o arguido-demandado chegaram a acordo quanto ao pedido cível, o qual foi judicialmente homologado; e logo após, o assistente desistiu da queixa, o que o arguido "aceitou", tendo havido "oposição" por parte do Ministério Público "atenta a natureza pública do crime em causa"; [Fls 232-233] . é sobre essa declaração de desistência que recai o despacho ora impugnado".

E considerou:

"Estatui o invocado art.º 358.º do CPP (no que ora interessa):

"1 - Se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa.

2 - [...] 3 - O disposto no n.º 1 é correspondentemente aplicável quando o tribunal alterar a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação ou na pronúncia."

Da "mera leitura do preceito e ao contrário do sustentado pela Digna Recorrente, resulta que o juiz é livre de modificar o enquadramento jurídico dos factos da acusação ou da pronúncia e em qualquer momento da audiência de julgamento (princípio, meio ou fim); desde que - naturalmente - dê ao arguido a possibilidade de se pronunciar ou lhe conceda, sendo requerido, tempo para a reorganização da defesa. [Pressupostos que aqui não importa desenvolver por não terem sido postos em causa neste recurso] Igualmente se não vê que uma interpretação exclusivamente literal do citado art.º 358.º do CPP impeça a alteração da qualificação jurídica, "não tendo havido produção de qualquer tipo de prova"

Assim mesmo já decidiu esta Relação, em aresto sumariado nos seguintes termos:

"I - A alteração não substancial dos factos por diversidade de qualificação jurídica, tanto da acusação como da pronúncia, actualmente expressamente prevista no artigo 358.º, n.º 3 do C. P. Penal, na sequência de anterior discussão jurisprudencial sobre o assunto, pode ter lugar logo no início da audiência e antes de qualquer produção de prova.

II - Nos termos da citada disposição legal, ao juiz do julgamento é conferida liberdade de dar aos factos, descritos quer na acusação quer no despacho de pronúncia, o tratamento jurídico criminal que achar mais adequado, sendo certo que, também o n.º 1 do mesmo artigo não indica qualquer limite temporal a partir do qual tal prerrogativa possa ser exercida [Acórdão da RG de 04/11/2002, proc. 911/02-1, www.dgsi.pt] [...] por outro lado, não há que esperar pela revelação de meios de prova quando a requalificação jurídica dela não depende mas antes decorre, tão-só, do texto da acusação.

[...] [...] o Mmo Juiz a quo não procedeu a qualquer "reapreciação dos indícios recolhidos em sede de inquérito" nem "apreciou os factos" da acusação, a não ser na estrita vertente da adequação às disposições legais nela indicadas; a alteração da qualificação jurídica teve lugar no "decurso do efectivo julgamento" (a audiência de julgamento é "efectiva" a partir da sua abertura 11); e é evidente que não faria sentido proceder à produção da prova no domínio da virtualidade pura, para concluir-se, eventualmente, pela qualificação do crime de ofensa à integridade física através de uma outra das alíneas previstas no artigo 132.º, n.º 2, do CP".

[...] Em conclusão: não se vê óbice, no caso sub judice, à alteração da qualificação jurídica operada no despacho do Mmo Juiz do 1.º Juízo de Esposende; consequentemente, inexiste motivo para o revogar, também na parte homologatória da desistência de queixa formulada pelo assistente-demandante.

Em consequência, decidiu negar provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e confirmar decisão recorrida.

Por sua vez como refere o acórdão fundamento:

"Distribuídos os autos no Tribunal a quo, ao abrigo do disposto pelos artigos 311.º e 312.º, ambos do Código de Processo Penal [CPP], foi essa acusação recebida pelos factos e qualificação dela constantes, bem como foram designadas datas para a realização da audiência de julgamento.

1.2 - No início desta diligência, a Mma. Juiz que a ela presidia proferiu despacho através do qual procedeu à alteração da qualificação jurídica da factualidade inserta naquela acusação pública, na parte relativa aos indiciados crimes de ofensa à integridade física qualificada imputados às arguidas G e H, no entendimento de que tal acusação não continha materialidade bastante que consubstanciasse a especial censurabilidade e perversidade, elementos constitutivos do tipo legal de que vinham acusadas, mas tão só um crime de ofensa à integridade física simples, p.p.p. artigo 143.º, n.º 1.

Os ofendidos declararam depois desistir das queixas apresentadas contra os arguidos e estes aceitaram tais desistências.

O Ministério Público, discordando do mencionado despacho que alterou a qualificação jurídica dos factos imputados às arguidas G e H, declarou opor-se à homologação de tais desistências de queixa, apenas na parte relativa aos crimes qualificados, atenta a respectiva natureza pública.

Não obstante, a Mma. Juiz homologou tais desistências e declarou extinto o procedimento criminal veiculado nos autos contra todos os arguidos.

1.3 - Persistindo naquela primitiva discordância, o Ministério Público recorreu do despacho mencionado"

O acórdão fundamento pronunciou-se sobre a mesma temática que sintetizou da seguinte forma:

"Determinar se após prolação do despacho de fls. 224, que recebeu a acusação tal como deduzida pelo Ministério Público e designou datas para audiência de julgamento, estava vedado à Mma. Juiz recorrida, sem que a ele procedesse, proferir novo despacho alterando por forma diversa a qualificação jurídica dos factos que além fizera? - Concedendo-se a possibilidade de um tal género de despacho, se, em todo o caso, da acusação constava materialidade suficiente para que sempre subsistisse até então a qualificação jurídica constante da acusação? O que se nos afigura determinar em concreto sendo, porém, certo que a resposta afirmativa à primeira das questões prejudicará a apreciação da segunda, porque inútil então."

E considerou:

"Depois de recebida a acusação e antes da prolação da sentença, após realização da audiência de discussão e julgamento, o juiz não pode conhecer do mérito da acusação, mas tão-só de questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa - artigos 338.º, n.º 1 e 368.º, n.º 1, ambos do CPP.

Da acusação devem constar, nomeadamente, a enumeração dos factos delituosos praticados pelo agente da infracção e a respectiva qualificação jurídica - artigo 283.º, n.º 3, alíneas b) e c). O juiz ao proferir o despacho do seu recebimento pode, se assim o entender, qualificar diversamente os factos dela constantes, sendo, então, esta nova qualificação que persiste até à prolação da sentença. O que é distinto do caso dos autos em que a Mma.

Juiz a quo acabou por, sem que houvessem surgido circunstâncias supervenientes que devessem ser ponderadas, veio a desdizer um juízo de mérito sobre a relação jurídico-processual estabelecida.

Relembram as decisões citadas que esta era forma de dar o dito por não dito, contrariar a estabilidade de uma decisão jurisdicional, o que se mostra intolerável, sob pena de se criar a desordem, incerteza, confusão. Apenas o tribunal superior pode, por via de recurso, alterar ou revogar uma decisão que não seja de simples expediente. Não se mostra viável, ao invés, que o próprio juiz autor de uma decisão ou outro posteriormente, antes de efectuado o julgamento, e sem a emergência das apontadas circunstâncias supervenientes, venha proferir decisão totalmente oposta.

Tudo a significar, então, que se mostrava vedado à Mma. juiz recorrida proferir, nos termos em que o fez, o despacho exarado no início da audiência de julgamento, relativamente aos factos apontados às duas mencionadas arguidas."

E, em consequência, decidiu conceder provimento ao recurso e, consequentemente, revogar o despacho recorrido na parte respeitante às arguidas [...] devendo a Mma. Juiz a quo proferir despacho a designar data para a continuação do seu julgamento.

Em resumo:

O acórdão fundamento entendeu que "Depois de recebida a acusação e antes da prolação da sentença, após realização da audiência de discussão e julgamento, o juiz não pode conhecer do mérito da acusação, mas tão-só de questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa - artigos 338.º, n.º 1 e 368.º, n.º 1, ambos do CPP.

Da acusação devem constar, nomeadamente, a enumeração dos factos delituosos praticados pelo agente da infracção e a respectiva qualificação jurídica - artigo 283.º, n.º 3, alíneas b) e c). O juiz ao proferir o despacho do seu recebimento pode, se assim o entender, qualificar diversamente os factos dela constantes, sendo, então, esta nova qualificação que persiste até à prolação da sentença. [...].

[...] Não se mostra viável, ao invés, que o próprio juiz autor de uma decisão ou outro posteriormente, antes de efectuado o julgamento, e sem a emergência das apontadas circunstâncias supervenientes, venha proferir decisão totalmente oposta.

Tudo a significar, então, que se mostrava vedado à Mma. juiz recorrida proferir, nos termos em que o fez, o despacho exarado no início da audiência de julgamento,"

Por sua vez o acórdão recorrido defendeu que: ""No decurso da audiência"

significa desde que começa até que finda e "ubi lex non distinguít nec nos distinguere debemus" [Brocardo latino em matéria de hermenêutica que quer dizer, como é sabido, que não deve o intérprete criar distinções que não figuram na lei]; por outro lado, não há que esperar pela revelação de meios de prova quando a requalificação jurídica dela não depende mas antes decorre, tão-só, do texto da acusação." e, "Em conclusão: não se vê óbice, no caso sub judice, à alteração da qualificação jurídica operada no despacho do Mmo Juiz do 1.º Juízo de Esposende; consequentemente, inexiste motivo para o revogar", despacho esse que tinha considerado:

"Quando se trata de simples alteração da qualificação jurídica do acervo factual carreado pela acusação, a lei prevê apenas mecanismos tendentes a assegurar o contraditório do arguido, como o previsto no artigo 358.º, n.º 3, do CPP, que não limitam substancialmente a liberdade do julgador quanto à aplicação das normas penais.

Daí que se, face ao teor de uma acusação, o tribunal conclui desde logo por uma qualificação diversa, nada o impede de a tomar na fundamentação de um despacho de homologação de desistência de queixa."

Segundo o acórdão recorrido:

"Igualmente se não vê que uma interpretação exclusivamente literal do citado art.º 358.º do CPP impeça a alteração da qualificação jurídica, "não tendo havido produção de qualquer tipo de prova"

[...] por outro lado, não há que esperar pela revelação de meios de prova quando a requalificação jurídica dela não depende mas antes decorre, tão-só, do texto da acusação."

Como então sintetizou o Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo:

"Vale por dizer, em síntese, que, no domínio da mesma legislação e em situações idênticas - após prolação dos despachos a que alude o artigo 311.º do CPP, que receberam acusações públicas por crimes de ofensas corporais qualificadas (do artigo 145.º, 2, do CP - embora com referência a circunstâncias diferentes do artigo 132.º, 2, do CP) - o acórdão recorrido decidiu «o juiz é livre de modificar o enquadramento jurídico dos factos da acusação ou da pronúncia e em qualquer momento da audiência de julgamento (princípio, meio ou fim)», devendo, apenas, notificar o arguido nos termos do artigo 358.º, n.º 3, do CPP, enquanto que o acórdão fundamento claramente repudia tal solução, assentando o juiz não pode alterar a qualificação jurídica dada na acusação ou na pronúncia, ou seja, «Depois de recebida a acusação e antes da prolação da sentença, após a realização da audiência de discussão e julgamento, o juiz não pode conhecer do mérito da acusação, mas tão-só de questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa...».

Ambos os acórdãos - recorrido e fundamento assentaram, pois, em soluções de direito opostas e no domínio da mesma legislação, sobre situação de facto idêntica.

Assim, conclui-se pela oposição entre os julgados.

VI - O thema decidendum A questão objecto do presente recurso, como assinala o acórdão recorrido "diz respeito à possibilidade ou não de o juiz alterar a qualificação jurídica dos factos operada na acusação depois de recebida esta - ou de ter havido despacho de pronúncia - e sem produção de prova em julgamento", ou seja, se é ou não permitido ao juiz, depois de ter sido declarada aberta a audiência de discussão e julgamento, alterar a qualificação jurídica dos factos, indicada na acusação, - ou no despacho de pronúncia - nomeadamente desqualificando a ilicitude imputada na acusação, sem que haja produção de prova.

VII - A posição da jurisprudência A jurisprudência dos Tribunais da Relação, tem sido díspar:

1 - Assim, a título de exemplo, no sentido de que a alteração da qualificação jurídica tanto da acusação como da pronúncia, pode ter lugar logo no início da audiência e antes de qualquer produção de prova os seguintes identificados acórdãos, antecedidos pelo processo a que respeitam, todos disponíveis em www.dgsi.pt:

Tribunal da Relação de Guimarães 911/02-1, Acórdão de 04-11-2002 Tribunal da Relação do Porto 0110835, Acórdão de 31-10-2001; 0511622, Acórdão de 06-07-2005; 0041157, Acórdão: de 10-01-2001; 437/06.1TAVNF.P1, Acórdão de 16-02-2011 Tribunal da Relação de Lisboa 0034219, Acórdão: de 02-05-2002 2 - Em sentido contrário à posição jurisprudencial anterior, por exemplo, os seguintes acórdãos, publicados em www.dgsi.pt:

Tribunal da Relação de Guimarães Proc. 1178/09.1TAGMR, Acórdão de 16-05-2011; Proc.: 411/09.6TABRG - Acórdão de 22-02-2010; 1632/07-2, Acórdão de 29-10-2007 Tribunal da Relação do Porto 0314510, Acórdão de 19-11-2003; 0415044, Acórdão de 03-11-2004; 0040588, Acórdão de 21-06-2000; 9440425, Acórdão de 21-06-1995; 0011325, Acórdão de 07-02-2001; 4024/06.6TDPRT.P1, Acórdão de 09-12-2009; 0111118, Acórdão de 09-01-2002 Tribunal da Relação de Coimbra 298/10.6TAVIS.C1, Acórdão de 02-11-2011 Tribunal da Relação de Lisboa 0059325, Acórdão de 26-10-1999; 0003793, Acórdão de 08-05-2002; 0015179, Acórdão de 08-06-2000; 0009971, Acórdão de 12-03-1996; 0056543, Acórdão de 25-02-1998; 2014/07-9, Acórdão de 29-03-2007; 2001/07-9 Acórdão de 29-03-2007; 2008/2007-3,; Acórdão de 07-03-2007; 4853/2004-5, Acórdão de 09-11-2004;7186/2006-3; Acórdão de 04-10-2006; 2189/05.3TDLSB.L1-3, Acórdão de 03-03-2010 1439/07.6PASNT.L1-5, Acórdão de 12-01-2010 Tribunal da Relação de Évora 85/09.4 PTFAR.E1, Acórdão de 14.04.2010; 17/07.4 GBORQ.E1, Acórdão de 10.12.2009; 2736/07-1, Acórdão de 26.02.2008 VII - Da legislação pertinente No vigente Código de Processo Penal têm interesse as seguintes normas:

Artigo 1.º

Definições legais

Para efeitos do disposto no presente Código considera-se:

a) «Crime» o conjunto de pressupostos de que depende a aplicação ao agente de uma pena ou de uma medida de segurança criminais;

b) [...] c) [...] d) [...] e) [...] f) «Alteração substancial dos factos» aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis;

LIVRO VII

Do julgamento

TÍTULO I

Dos actos preliminares

Artigo 311.º

Saneamento do processo

1 - Recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhecer.

2 - Se o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha no sentido:

a) De rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada;

b) De não aceitar a acusação do assistente ou do Ministério Público na parte em que ela representa uma alteração substancial dos factos, nos termos do n.º 1 do artigo 284.º e do n.º 4 do artigo 285.º, respectivamente.

3 - Para efeitos do disposto no número anterior, a acusação considera-se manifestamente infundada:

a) Quando não contenha a identificação do arguido;

b) Quando não contenha a narração dos factos;

c) Se não indicar as disposições legais aplicáveis ou as provas que a fundamentam; ou d) Se os factos não constituírem crime.

Artigo 312.º

Data da audiência

1 - Resolvidas as questões referidas no artigo anterior, o presidente despacha designando dia, hora e local para a audiência. [...]

Artigo 313.º

Despacho que designa dia para a audiência

1 - O despacho que designa dia para a audiência contém, sob pena de nulidade:

a) A indicação dos factos e disposições legais aplicáveis, o que pode ser feito por remissão para a acusação ou para a pronúncia, se a houver;

[...]

Artigo 338.º

Questões prévias ou incidentais

1 - O tribunal conhece e decide das nulidades e de quaisquer outras questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar.

2 - A discussão das questões referidas no número anterior deve conter-se nos limites de tempo estritamente necessários, não ultrapassando, em regra, uma hora. A decisão pode ser proferida oralmente, com transcrição na acta.

Artigo 339.º

Exposições introdutórias

1 - Realizados os actos introdutórios referidos nos artigos anteriores, o presidente ordena a retirada da sala das pessoas que devam testemunhar, podendo proceder de igual modo relativamente a outras pessoas que devam ser ouvidas, e faz uma exposição sucinta sobre o objecto do processo.

2 - Em seguida o presidente dá a palavra, pela ordem indicada, ao Ministério Público, aos advogados do assistente, do lesado e do responsável civil e ao defensor, para que cada um deles indique, se assim o desejar, sumariamente e no prazo de dez minutos, os factos que se propõe provar.

3 - O presidente regula activamente as exposições referidas no número anterior, com vista a evitar divagações, repetições ou interrupções, bem como a que elas se transformem em alegações preliminares.

4 - Sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos, a discussão da causa tem por objecto os factos alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da prova produzida em audiência, bem como todas as soluções jurídicas pertinentes, independentemente da qualificação jurídica dos factos resultante da acusação ou da pronúncia, tendo em vista as finalidades a que se referem os artigos 368.º e 369.º

Artigo 358.º

Alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na

pronúncia

1 - Se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa.

2 - Ressalva-se do disposto no número anterior o caso de a alteração ter derivado de factos alegados pela defesa.

3 - O disposto no n.º 1 é correspondentemente aplicável quando o tribunal alterar a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação ou na pronúncia.

Artigo 359.º

Alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia 1 - Uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, nem implica a extinção da instância.

2 - A comunicação da alteração substancial dos factos ao Ministério Público vale como denúncia para que ele proceda pelos novos factos, se estes forem autonomizáveis em relação ao objecto do processo.

3 - Ressalvam-se do disposto nos números anteriores os casos em que o Ministério Público, o arguido e o assistente estiverem de acordo com a continuação do julgamento pelos novos factos, se estes não determinarem a incompetência do tribunal.

4 - Nos casos referidos no número anterior, o presidente concede ao arguido, a requerimento deste, prazo para preparação da defesa não superior a 10 dias, com o consequente adiamento da audiência, se necessário.

Artigo 424.º

Deliberação

1 - Encerrada a audiência, o tribunal reúne para deliberar.

2 - São correspondentemente aplicáveis as disposições sobre deliberação e votação em julgamento, tendo em atenção a natureza das questões que constituem o objecto do recurso.

3 - Sempre que se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na decisão recorrida ou da respectiva qualificação jurídica não conhecida do arguido, este é notificado para, querendo, se pronunciar no prazo de 10 dias.

VIII - Apreciando A - A questão em análise está a jusante do despacho inerente aos artigos 311.º a 313.º do CPP; situa-se após a prolação desse despacho, e, por conseguinte, situa-se em audiência de julgamento depois de ter sido iniciada, e integra-se no mérito da causa.

Por outro lado, a mesma questão não se confunde com o conteúdo permitido pelo artigo 338.º n.º 1 do CPP: - "O tribunal conhece e decide das nulidades e de quaisquer outras questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar."

Como refere Paulo Pinto de Albuquerque (2): "O conhecimento das questões prévias ou incidentais inclui o conhecimento dos pressupostos processuais, da conexão de processo na mesma fase processual e da separação de processos, dos impedimentos, recusas e escusas dos peritos, intérpretes e funcionários de justiça, das questões atinentes à assistência por defensor, à substituição de defensor e à representação judiciária dos assistentes, da remessa das partes civis para os tribunais civis, da questão da produção de meios de prova oficiosamente ou a requerimento na audiência de julgamento e das proibições de prova"

E como aduz Maia Gonçalves (3):

"As questões prévias aqui referidas, e em outros lugares do Código, são todas as que, além das incidentais, ou seja das que surgem no decurso da audiência, podem obstar ao conhecimento do mérito. Essas questões podem ter natureza substantiva (morte do arguido, amnistia, prescrição, etc.) ou adjectiva (incompetência do tribunal, ilegitimidade do acusador, etc.). A apreciação das questões prévias de natureza adjectiva deve proceder à apreciação das de natureza substantiva, e dentre aquelas deve ser apreciada prioritariamente a questão da competência, pois que se o tribunal se declarar incompetente deve cessar a sua intervenção, para que o tribunal competente aprecie todas as questões.

As questões prévias devem ser apreciadas tão cedo quanto possível (cfr., v.g.

artigo 311.º, n.º 1), mas podem também ser decididas na sentença final (artigo 368.º, n.º 1) e assim terá que suceder necessariamente sempre que a solução estiver dependente de prova a produzir na audiência."

B - A historicidade processual da temática, na jurisprudência, e na doutrina nacional.

A questão da alteração ou modificação da qualificação jurídica em fase de julgamento - na audiência de discussão e julgamento - foi sendo debatida ao longo de vários anos, sendo representativa a jurisprudência fixada, deste Supremo.

1 - No Assento 2/93, de 27-01-1993 (4), decidiu-se que "Para os fins dos artigos 1.º, alínea f), 120.º, 284.º, n.º 1, 303.º, n.º 3, 309.º, n.º 2, 359.º, n.os 1 e 2, e 379.º, alínea b), do Código de Processo Penal, não constitui alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica (ou convolação), ainda que se traduza na submissão de tais factos a uma figura criminal mais grave."

Disse-se nesse Acórdão: - "Tal referência cuidadosa e nitidamente intencional do legislador ao termo «factos» é demonstrativa de que aquele quis adoptar um regime análogo ao que resultava do artigo 447.º do Código anterior, segundo o qual o juiz poderia «condenar por infracção diversa daquela pela qual o arguido tivesse sido condenado, ainda que mais grave, desde que os seus elementos constitutivos constassem do despacho de pronúncia ou equivalente».

É que a ideia fundamental é, em ambos os casos, a mesma, expressa, de resto, igualmente nos princípios gerais do processo civil: a determinação do direito, ou enquadramento jurídico dos factos apurados, por constituir o cerne da função judicial, não está sujeita a limitações decorrentes de um errado enquadramento feito pelas partes ou pessoas interessadas no processo, sob pena de total desvirtuamento dessa função, e de, inclusivamente, incumprimento do disposto nos artigos 205.º a 207.º da Constituição, tal como eles se mostram esclarecidos e interpretados pelos artigos 3.º e 4.º da Lei 21/85 (Estatuto dos Magistrados Judiciais), de 30 de Julho.

A submissão, ao princípio do contraditório, da audiência do julgamento e dos actos instrutórios indicados pela lei, estipulada pelo artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, tem os limites reais e práticos que resultam da consideração como um todo das normas acima referidas e do desenvolvimento dos princípios fundamentais sobre o âmbito e limites da função de julgar.

E nem sequer se pode dizer que o arguido, pronunciado por um determinado enquadramento jurídico dos factos que lhe são imputados, pode ficar surpreendido e em situação de desfavor perante um diverso enquadramento, feito mais tarde, no momento próprio para a respectiva qualificação final, porque aquilo que é vedado modificar, sem sua autorização, é tão-somente a narração dos factos reputados como ilícitos. É quanto a tais factos, efectivamente, que ele tem de se defender, primariamente, pois só numa segunda fase lógica lhe é possível dizer que, mesmo que tais factos correspondam à realidade, não se pode ou não se deve proceder ao respectivo enquadramento jurídico nos moldes propostos pela acusação, em virtude de deverem ter um diverso tratamento ou de, inclusivamente, não poderem ser considerados como ilícitos.

De resto, é a aceitação destes princípios que faz com que se tenha sempre entendido que, por exemplo, a prova de uma legítima defesa, ou de um estado de provocação, em relação ao arguido, mesmo que os não tenha alegado, não constitui uma alteração substancial dos «factos» descritos na acusação ou na pronúncia que implique o cumprimento dos citados artigos 338.º e 339.º do Código de Processo Penal.

E isso porque a qualificação dos dados de facto que conduzem à existência de tais figuras é um mero problema de aplicação do direito, não enquadrável na figura da «alteração substancial dos factos» contemplada pelos artigos 359.º e 379.º acima referidos.

[...] A nossa legislação processual penal, no propósito de evitar que os arguidos possam ser vítimas de uma atrabiliária modificação do objecto da acusação, e na esteira de uma longa evolução jurídico-doutrinária, adoptou, desde há longos anos, o princípio da submissão da lei de processo penal à regra da chamada proibição da reformatio in pejus.

Ao fazê-lo, no entanto, acabou por definir o âmbito dessa proibição em moldes diversamente estruturados consoante as diversas leis que se foram sucedendo, o que se compreende perfeitamente se se tiver em atenção que o princípio filosófico da non reformatio in pejus é susceptível de abarcar uma realidade mais ou menos ampla, em função do maior ou menor relevo que o legislador queira dar aos aspectos de justiça formal ou aos de justiça substancial na apreciação da infracção criminal, aos aspectos de defesa e segurança do cidadão, como tal, ou aos de defesa e segurança da sociedade, etc., tudo dentro da procura do adequado equilíbrio entre a satisfação das diferentes necessidades resultantes da vivência em sociedade, muitas vezes contraditórias entre si.

É esta realidade que tem de ser tida em consideração ao proceder-se à análise do problema dos presentes autos.

Com efeito, o legislador do Código de Processo Penal pretendeu consignar neste diploma um regime específico de defesa da segurança do cidadão que seja arguido num processo criminal, regime este que pode ser sintetizado através da indicação dos seguintes cinco aspectos:

1) É «alteração substancial dos factos» «aquela que tiver como efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis» [artigo 1.º, alínea f), do Código de Processo Penal];

2) Uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, e a verificação da sua existência determina ou a obrigatoriedade de abertura de inquérito quanto a eles, se ocorrer na fase do encerramento da instrução (artigo 303.º, n.º 3 do Código), ou a sua equiparação a denúncia ao Ministério Público, para que ele proceda pelos novos factos, quando ocorra na fase do julgamento e quando este magistrado, o arguido e o assistente estejam de acordo com a continuação do julgamento pelos novos factos, desde que estes não determinem a incompetência do tribunal (artigo 359.º, n.os 1 e 2, do mesmo diploma);

3) A infracção das regras respeitantes à proibição da tomada em consideração de uma alteração substancial dos factos acusados (ou constantes da pronúncia) conduz à anulabilidade da pronúncia, quando se verifique nesta peça processual (artigo 309.º, n.º 2, do mesmo Código), ou à nulidade da sentença, quando se verifique na decisão final [artigo 379.º, alínea b), desse diploma], nulidade esta que, por não incluída na previsão do artigo 119.º do aludido Código, deverá ser considerada como sanável e dependente de arguição (artigo 120.º do mesmo);

4) Relativamente a crimes públicos e semipúblicos, o assistente só pode acusar por factos que não importem uma alteração substancial dos que constam da acusação do Ministério Público (artigo 284.º, n.º 1);

5) A verificação, em julgamento, da existência de uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, e com relevo para a decisão da causa, implica unicamente a possibilidade de concessão de prazo ao arguido para preparação da defesa quanto a tal alteração e desde que ela não resulte da matéria que por ele já tenha sido alegada (artigo 358.º do referido Código)"

2 - Mais tarde, o Assento 4/95, de: 07-06-1995 (5), veio fixar jurisprudência, no sentido de que "O tribunal superior pode, em recurso, alterar oficiosamente a qualificação jurídico-penal efectuada pelo tribunal recorrido, mesmo que para crime mais grave, sem prejuízo, porém, da proibição da reformatio in pejus."

Considerou esse acórdão de 7 de Junho de 1995:

"É inaceitável que o julgador seja mero espectador em grande parte naqueles casos em que, não estando em debate uma qualificação jurídica errada dos factos ou até uma medida de uma pena indevida, ele se deva pronunciar tão-só sobre as questões suscitadas no recurso e que não tenham a ver com tal circunstancialismo.

A solução em processo penal não pode - não deve - distanciar-se da que foi adoptada em processo civil e que se encontra condensada no artigo 664.º do Código desta última forma de processo nos termos seguintes:

O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, salvo o que vai disposto nos artigos 514.º e 665.º Nas duas formas de processo pode dizer-se, como José Alberto dos Reis (Código de Processo Civil, vol. V, p. 92), que o citado artigo define a relação entre a actividade do juiz e a actividade das partes no tocante aos materiais do conhecimento; e define-a assim: "pelo que respeita ao direito, a acção do juiz é livre; pelo que respeita aos factos, a sua acção está vinculada".

Daí que, desde o direito romano, se mostrem consagradas - e respeitadas - as máximas jura novit cura e da mihi facta, dabo tibi jus.

Claro que, no actual processo penal, o respeito pela proibição da reformatio in pejus não consente uma agravação da pena nos casos que se explicitam no respectivo Código, embora seja bem mais razoável o sistema que vigorava nesta área no domínio do Código de 1929 - artigo 667.º -, que consentia uma justiça bem mais real do que a imposta pelo actual artigo 409.º do Código de Processo vigente (6).

Do mesmo modo, não se poderá ultrapassar a limitação do recurso nos casos em que este é permitido - artigo 403.º - embora se tenha de aceitar que a parte não impugnada contém erros que são autênticas denegações de justiça.

E se o dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo - artigo 8.º, n.º 2, do Código Civil -, tal não impede que o aplicador do direito não possa - nem deva - denunciar os defeitos da lei que conduzem ou podem conduzir a uma denegação da justiça que, como se disse, é função sua promover.

Vem a propósito reproduzir o pensamento do Prof. Beleza dos Santos, já citado pelo Exmo. Procurador-Geral-Adjunto no seu douto parecer, quando aquele extraordinário jurista considerou ser "injustificado e vexatório que se vinculasse o tribunal que tem de julgar a certa interpretação da lei seguida pelo mesmo juiz que pronunciou" e que seria "exorbitante e injustificado" que se atribuísse ao réu a vantagem de beneficiar com qualquer erro de apreciação jurídica feita no despacho de pronúncia ou equivalente."

3 - O acórdão do Tribunal Constitucional n.º 445/97, de 25 de Junho de 1997 (7), veio, porém, declarar inconstitucional, com força obrigatória geral - por violação do princípio constante do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição -, a norma ínsita na alínea f) do n.º 1 do artigo 1.º do Código de Processo Penal, em conjugação com os artigos 120.º, 284.º, n.º 1, 303.º, n.º 3, 309.º, n.º 2, 359.º, n.os 1 e 2, e 379.º, alínea b), do mesmo Código, quando interpretada, nos termos constantes do Acórdão lavrado pelo Supremo Tribunal de Justiça em 27 de Janeiro de 1993 e publicado, sob a designação de «assento 2/93», na 1.ª série-A do Diário da República, de 10 de Março de 1993 - aresto esse entretanto revogado pelo Acórdão 279/95 do Tribunal Constitucional -, no sentido de não constituir alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica, mas tão-somente na medida em que, conduzindo a diferente qualificação jurídica dos factos à condenação do arguido em pena mais grave, não se prevê que este seja prevenido da nova qualificação e se lhe dê, quanto a ela, oportunidade de defesa.

Na verdade, como referiu este acórdão do Tribunal Constitucional.

"3.1 - No domínio do Código de Processo Penal aprovado pelo Decreto 16 489, de 15 de Fevereiro de 1929, os poderes cognitivos do tribunal quanto ao enquadramento jurídico dos factos constavam dos artigos 447.º e 448.º, sendo que, segundo o primeiro, era lícita a condenação por infracção diversa daquela pela qual o réu foi acusado, desde que os respectivos elementos constassem do despacho de pronúncia ou equivalente (respeitada que fosse a competência do tribunal - cf. seu § 1.º).

Essa disposição foi objecto de acentuado labor doutrinal, sendo conhecidas obras de fôlego a esse respeito elaboradas, tais como, a título exemplificativo, o estudo de Beleza dos Santos publicado nos anos 63.º a 65.º da Revista de Legislação e de Jurisprudência e subordinado ao título «A sentença condenatório e pronúncia em processo penal», a obra de Eduardo Correia, Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, além do tratamento que lhe conferiram, por entre outros, Silva e Sousa (no artigo «Condenações penais de surpresa», publicado na Revista dos Tribunais, 67.º), Cavaleiro de Ferreira (Curso de Direito Penal, III) e Castanheira Neves (Scientia Iuridica, n.º 78).

No vigente Código de Processo Penal não se encontram disposições semelhantes às acima citadas do seu antecessor, estatuindo-se no n.º 1 do artigo 359.º que uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, cominando-se a sentença com o vício de nulidade caso nela venha a impor-se condenação por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia [artigo 379.º, alínea b)].

Perante essas disposições, surgiu determinada jurisprudência e até certa doutrina que, fundada no entendimento de que o arguido se deve defender da imputação fáctica que lhe é assacada, cabendo aos tribunais, até por via do artigo 206.º da Constituição, a qualificação jurídica, sustentaram que o legislador, ao estatuir os artigos 359.º, n.º 1, e 379.º, alínea b), não desejou afastar-se em muito do que fora consagrado no artigo 447.º do Código de Processo Penal de 1929 (cf. Frederico Isasca, Alteração Substancial dos Pactos e a Sua Relevância no Processo Penal Português, e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Junho de 1991 - publicado na Colectânea de Jurisprudência - Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, 1991, III, pp. 29 e segs. - e de 26 de Fevereiro de 1992, este proferido no processo 42 222, justamente o aresto que foi objecto do recurso extraordinário originador do «assento 2/93»).

Todavia, outra jurisprudência, nomeadamente do Supremo Tribunal de Justiça, de que é exemplo o Acórdão de 18 de Janeiro de 1991, (in Colectânea, citada, 1991, I, p. 5), enveredou por outro caminho, precisamente suportada na abrangência do princípio do contraditório, quer quanto à matéria de facto quer quanto «ao tratamento que a esta é dado para o efeito de a subsumir aos preceitos incriminadores».

3.2 - No seu Acórdão 173/92 (Diário da República, 2.ª série, de 18 de Setembro de 1992), a propósito da norma ínsita no n.º 2 do artigo 418.º do Código de Justiça Militar e na parte em que permite que o tribunal condene por infracção diversa daquela pela qual o arguido foi acusado, ainda que seja mais grave, desde que os factos que subsumem o tipo se encontrem descritos no libelo acusatório, interrogava-se este Tribunal, após discretear sobre os fundamentos e «alcance do princípio do contraditório, expresso na regra da tramitação contraditória de determinadas fases do processo», se um tal princípio seria respeitado pela norma então em apreciação, tendo concluído pela negativa.

Na verdade, escreveu-se aí: "[...] A acusação, libelo ou requerimento acusatório, bem como o despacho judicial que os aprecia, representam a síntese da pretensão punitiva do Estado-Administração face ao arguido. São o coroar de todo um trabalho de investigação e de análise jurídica tendente à apresentação da causa ao tribunal do julgamento. Ora, assim como parece perfeitamente razoável que a defesa, na fase do julgamento, possa beneficiar, em princípio, de quaisquer deficiências da acusação em matéria de descrição dos factos, assim também não repugnará que a defesa beneficie de quaisquer deficiências da acusação em matéria de qualificação jurídico-penal desses mesmos factos, principalmente quando sobre a acusação recaiu uma pronúncia feita por um juiz, pronúncia que, ao fim e ao cabo, constitui um primeiro crivo de apreciação dos fundamentos factuais e jurídicos de tal acusação.

Pelo menos, essa solução não parece menos razoável do que permitir a possibilidade de uma condenação que manifestamente exceda a pretensão punitiva constante da acusação e recebida na pronúncia.

[...] Mas, de qualquer modo, quando não se queira subordinar o poder de julgamento do tribunal a um eventual erro de qualificação da acusação e da pronúncia, então indispensável será obter um dispositivo processual que permita uma correcta qualificação sem que isso implique prejuízo para a defesa do arguido.

É que o arguido não tem de ser sacrificado no altar da correcta qualificação jurídico-penal da matéria de facto; e uma eventual alteração final do enquadramento jurídico desta não tem necessariamente de fazer-se à custa do sacrifício dos seus direitos de defesa.

[...]» E, no enfrentamento específico da questão de constitucionalidade, observou-se:

«[...] É certo que a necessidade desta indicação [reportava-se ao dever de a acusação e pronúncia indicarem a lei que proíbe e pune os factos, com o fito de destinar esclarecer principalmente o arguido sobre a imputação jurídico-penal que lhe era dirigida] não decorre de norma constitucional expressa; mas decorre necessariamente do princípio do contraditório, e particularmente do princípio da acusação e da defesa, na medida em que tal defesa não pode ser eficazmente assegurada se não puder ter por referência e por objecto uma incriminação legal precisa, mesmo que eventualmente se admita a possibilidade de uma rectificação posterior [...] Como tem sido enfatizado pelas doutrina e jurisprudência constitucionais, as «garantias de defesa não podem deixar de incluir a possibilidade de contrariar ou contestar todos os elementos carreados pela acusação» (palavras do Acórdão 54/87 deste Tribunal, publicado no Diário da República, 1.ª série, de 17 de Março de 1987), sendo um dos significados jurídico-constitucionais do princípio do contraditório «o direito do arguido [...] de se pronunciar e contraditar [...] argumentos jurídicos trazidos ao processo» (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., p.

206).

Pois bem:

Sendo facilmente admissível, perante a realidade das coisas, que diferente pode ser a estratégia da defesa consoante a qualificação jurídico-criminal dos factos cujo cometimento é imputado ao arguido, há-de reconhecer-se que - independentemente da liberdade que deve ser concedida ao tribunal do julgamento para proceder a uma correcta subsunção jurídica - uma alteração da qualificação que foi acolhida na acusação ou na pronúncia pode vir a ter, e até por vezes acentuadamente, repercussão nos objectivos pelos quais aquela estratégia foi delineada.

Para obstar a um tal inconveniente não é forçoso que a porventura incorrecta qualificação jurídico-penal levada a efeito na acusação ou na pronúncia venha a subsistir na decisão do julgamento. Bastará que a perspectiva assumida pelo tribunal do julgamento seja transmitida ao arguido e lhe seja dada oportunidade de, quanto a ela e caso o deseje, se defender.

3.2.2 - Ora, a norma constante da alínea f) do n.º 1 do artigo 1.º do Código de Processo Penal, na sobreposição interpretativa do «assento 2/92» e com a projecção que tem, inter alia, no n.º 1 do artigo 359.º e na alínea b) do artigo 379.º, não só não contempla a dação daquela transmissão, como também não faculta ao arguido a possibilidade de se defender quanto à nova qualificação, pelo que, nessa medida, se posta como contrária aos ditames que se extraem da expressão condensada «garantias de defesa», utilizada no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição".

4 - Posteriormente, o Assento 3/2000, de 15 de Dezembro de 1999 (8), reformulou o Assento 2/93 e fixou a seguinte doutrina, constitutiva de jurisprudência, obrigatória para os tribunais judiciais (artigo 445.º do Código de Processo Penal):

"Na vigência do regime dos Códigos de Processo Penal de 1987 e de 1995, o tribunal, ao enquadrar juridicamente os factos constantes da acusação ou da pronúncia, quando esta existisse, podia proceder a uma alteração do correspondente enquadramento, ainda que em figura criminal mais grave, desde que previamente desse conhecimento e, se requerido, prazo ao arguido da possibilidade de tal ocorrência, para que o mesmo pudesse organizar a respectiva defesa." (9) 5 - Com o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 7/2008, de 25-06-2008 (10), fixou-se a seguinte jurisprudência: «Em processo por crime de condução perigosa de veículo ou por crime de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, não constando da acusação ou da pronúncia a indicação, entre as disposições legais aplicáveis, do n.º 1 do artigo 69.º do Código Penal, não pode ser aplicada a pena acessória de proibição de conduzir ali prevista, sem que ao arguido seja comunicada, nos termos dos n.os 1 e 3 do artigo 358.º do Código de Processo Penal, a alteração da qualificação jurídica dos factos daí resultante, sob pena de a sentença incorrer na nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 379.º deste último diploma legal.» Como se disse neste referido Acórdão:

"A questão que vem colocada ao pleno das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça prende-se directamente com temas fundamentais do processo penal, designadamente o do seu fim e o das garantias de defesa do arguido.

Num Estado de direito democrático é a procura da verdade material e a realização da justiça que constituem o fim último do processo penal.

No entanto, num Estado de direito democrático a procura da verdade material e a realização da justiça não podem ser alcançadas a qualquer preço.

De há muito se vem reconhecendo e entendendo que a cadeia de actividades e procedimentos dirigidos à constatação, positiva ou negativa, do facto criminoso, para fins de aplicação da sanção penal ao seu autor, tem de respeitar rigorosamente o Direito Constitucional, com destaque para os direitos, liberdades e garantias pessoais, bem como os princípios gerais de processo penal, nomeadamente os decorrentes de textos de Direito Internacional, designadamente a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

Daí que a investigação e a procura da verdade, no âmbito do procedimento penal, se hajam de processar de acordo com as garantias constitucionais e os princípios gerais de processo penal.

[..] O objecto do processo é o objecto da acusação, o qual se mantém até ao trânsito em julgado da sentença, protegendo o arguido contra arbitrários alargamentos da actividade cognitória e decisória do tribunal, assegurando os direitos ao contraditório e à audiência, direitos essenciais à defesa do arguido e à democraticidade do processo penal, que se traduzem no direito de o arguido ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte [alínea b) do n.º 1 do artigo 61.º do Código de Processo Penal], bem como no direito a que todos os actos e procedimentos processuais, na fase de julgamento, sejam susceptíveis de oposição e de discussão, o que implica uma efectiva participação neles, com possibilidade de os discretear, mediante a apresentação de razões e argumentos de facto e de direito.

A vinculação do tribunal, porém, quer no que concerne aos factos descritos na acusação quer no que tange ao enquadramento jurídico dos mesmos ali operado, não é absoluta.

Com efeito, em certos casos e situações, por razões várias, já depois de deduzida a acusação, algumas vezes no decurso do julgamento, outras já na fase de recurso, vêm-se a descobrir novos factos ou a constatar que os factos constantes da acusação foram deficientemente ou insuficientemente descritos ou deficientemente ou incorrectamente qualificados, possibilitando a lei, limitadamente, desde que salvaguardadas as garantias de defesa do arguido, a alteração dos factos e ou a alteração da sua qualificação jurídica, para que o processo possa alcançar o seu concreto fim, isto é, a descoberta da verdade e a realização da justiça.

É através do instituto denominado da alteração dos factos, instituto previsto nos artigos 358.º e 359.º, do Código de Processo Penal, que se estabelece e regula a possibilidade de alteração dos factos descritos na acusação e na pronúncia, bem como a alteração da sua qualificação jurídica.

[...] Prevê a lei, ainda, a possibilidade de alteração da qualificação jurídica, situação em que, não ocorrendo alteração factual, se verifica, porém, necessidade de modificar a qualificação jurídica que na acusação ou na pronúncia se atribuiu aos factos nas mesmas descritos, situação que o legislador entendeu submeter ao regime aplicável à alteração não substancial dos factos - n.º 3 do artigo 358.º"

[...] Com as alterações introduzidas pela Lei 59/98, de 25 de Agosto, o legislador entendeu dever tomar posição perante as diversas posições doutrinais e jurisprudenciais assumidas, tendo consagrado, por via de aditamento de um número ao artigo 358.º, o 3, a solução da livre qualificação jurídica dos factos pelo tribunal do julgamento, com reserva da obrigatoriedade de prévia comunicação ao arguido da alteração da qualificação jurídica e da concessão, a requerimento daquele, do tempo necessário à preparação da defesa, ressalvando os casos em que a alteração derive de alegação feita pela defesa - n.º 2 do artigo 358.º E com a publicação da Lei 48/07, de 29 de Agosto, através de aditamento de um número ao artigo 424.º (n.º 3), alargou a possibilidade de a alteração da qualificação jurídica poder ser feita no tribunal de recurso (bem como de a alteração poder incidir sobre os factos descritos na decisão em recurso, desde que não substancial), alteração que, obviamente, no caso de ser desconhecida do arguido, terá de lhe ser comunicada para o mesmo, querendo, sobre ela se pronunciar.

Certo é que este alargamento já era jurisprudencialmente admitido, consabido que este Supremo Tribunal através do acórdão 4/95 fixou jurisprudência obrigatória no sentido de que o tribunal superior pode em recurso alterar oficiosamente a qualificação jurídico-penal efectuada pelo tribunal recorrido, mesmo que para crime mais grave, sem prejuízo, porém, da proibição da reformatio in pejus.

Com tudo isto, porém, não resulta pacífico o entendimento sobre a obrigatoriedade de comunicação ao arguido da alteração da qualificação jurídica e concessão ao mesmo de prazo para a defesa.

Com efeito, para além da ressalva contida no n.º 2 do artigo 358.º, segundo a qual a alteração não carece de ser comunicada ao arguido, o que bem se percebe, visto que a mesma é resultado de alegação por si produzida, vem-se entendendo que outros casos ocorrem em que é inútil prevenir o arguido da alteração da qualificação jurídica, razão pela qual se considera não dever ter lugar a comunicação"

6 - Conforme já explanava o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 173-92, de 07-05-92 (11): Desde logo, dir-se-á que a possibilidade conferida ao tribunal de enquadrar juridicamente os factos em diferente tipo incriminador, e portanto também em diferente moldura penal abstracta, não parece condizer com a obrigatoriedade de indicar na acusação e na pronúncia a lei que proíbe e pune os factos. Porque tal indicação? Por mero preciosismo? Para facilitar o trabalho ao tribunal? Parece que não. Parece que, antes de tudo, a mesma se destina a esclarecer, quer o tribunal, quer principalmente o arguido, sobre a imputação jurídico-penal que sobre este impende, e portanto sobre o quadro argumentativo e o peso relativo das provas que a acusação utilizará no decorrer do julgamento - para que o arguido possa preparar convenientemente a sua defesa, mas também para que o tribunal possa ponderar o interesse das provas oferecidas pelos intervenientes processuais.

É certo que a necessidade desta indicação não decorre de norma constitucional expressa; mas decorre necessariamente do princípio do contraditório, e particularmente do princípio da acusação e da defesa, na medida em que tal defesa não pode ser eficazmente assegurada se não puder ter por referência e por objecto uma incriminação legal precisa (mesmo que eventualmente se admita a possibilidade de uma rectificação posterior dessa incriminação, que é justamente a matéria que aqui se discute). Aliás, essa menção da incriminação tem sido uma constante em toda a história do nosso direito processual penal moderno, e parece estar intimamente ligada a uma concepção acusatória do mesmo.

Na verdade, como se refere no Ac. TC 279-95, de 31-05-95 (12):

"É da essência das garantias de defesa que a operação de subsunção que conduz o juiz à determinação do tipo penal correspondente a determinados factos, seja previamente conhecida e, como tal, controlável pelo arguido.

Através da narração dos factos e da indicação das disposições legais aplicáveis, na acusação ou na pronúncia (v. artigos 283.º, n.º 3 e 308.º, n.º 2 do CPP), é fornecido ao arguido um modelo determinado de subsunção constituído por aqueles factos entendidos como correspondendo a um específico crime. Tal modelo serve de referência à face do julgamento - destinando-se esta, aliás, à sua comprovação - e é em função dele que o arguido organiza a respectiva defesa. Importa aqui sublinhar que o conhecimento pelo arguido desse modelo, tornando previsível a medida em que os seus direitos podem ser atingidos naquele processo, constitui como se disse um imprescindível ponto de referência na estratégia de defesa, funcionando, assim, como importante garantia de exercício desta.

As limitações quanto à possibilidade de conhecimento de novos factos (artigos 358.º e 359.º do CPP) visam precisamente impedir que o arguido seja confrontado com uma subsunção diversa daquela em função (na previsão) da qual preparou a sua defesa. Ora, é diverso - e num processo após a acusação ou a pronúncia é novo - tanto o modelo de subsunção que recaindo sobre novos factos leva a uma incriminação diversa, como o modelo que baseando-se nos mesmos factos tem como ponto de chegada uma incriminação diversa».

Neste sentido se compreende o n.º 3 do artigo 424.º do CPP, aplicável em recurso, e introduzido pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto, sendo certo que como salienta Maia Gonçalves (13), "qualquer alteração terá sempre que ser feita respeitando o objecto do processo talqualmente vem definido no artigo 339.º, n.º 4, a vinculação temática do recurso e a proibição de reformatio in pejus."

C - A estrutura acusatória do processo e o princípio do contraditório.

1 - O desiderato garantístico exposto tem natureza e consagração constitucionais, pois que como se sabe, nos termos do artigo 32.º da Constituição Política da República Portuguesa:

1 - O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso.

[...] 5 - O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório.

2 - Como J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira (14) elucidam:

"O princípio acusatório (n.º 5, 1.ª parte) é um dos princípios estruturantes da constituição processual penal. Essencialmente, ele significa que só se pode ser julgado por um crime precedendo acusação por esse crime por parte de um órgão distinto do julgador, sendo a acusação condição e limite do julgamento. Trata-se de uma garantia essencial do julgamento independente e imparcial. Cabe ao tribunal julgar os factos constantes da acusação e não conduzir oficiosamente a investigação da responsabilidade penal do arguido (princípio do inquisitório).

A «densificação» semântica da estrutura acusatória faz-se através da articulação de uma dimensão material (fases do processo) com uma dimensão orgânico-subjectiva (entidades competentes). Estrutura acusatória significa, no plano material, a distinção entre instrução, acusação e julgamento; no plano subjectivo, significa a diferenciação entre juiz de instrução (órgão de instrução) e juiz julgador (órgão julgador) e entre ambos e órgão acusador.

O princípio da acusação não dispensa, antes exige, o controlo judicial da acusação de modo a evitar acusações gratuitas, manifestamente inconsistentes, visto que a sujeição a julgamento penal é, já de si, um incómodo muitas vezes oneroso e não raras vezes um vexame.

Logicamente, o princípio acusatório impõe a separação entre o juiz que controla a acusação e o juiz de julgamento (cf. Acs TC n.os 219/89 e 124/90)."

3 - Teresa Pizarro Beleza, com a colaboração de Frederico Isasca e Rui Sá Gomes (15), refere: - "O Código de Processo Penal estabelece que quem dirige a investigação é o Ministério Público, e é ele que acusa. Pode haver uma segunda fase de investigação que é a fase de instrução em que já há um juiz a presidir; mas o juiz do julgamento será sempre uma pessoa diferente destas. O juiz do julgamento é necessariamente um juiz (não só em termos institucionais mas a própria pessoa tem de ser) diferente do juiz que presidiu à instrução. Neste sentido, a estrutura do Processo Penal Português têm claramente uma estrutura acusatória. Mas não é suficiente uma diferença de identidade entre quem acusa e quem julga para se poder dizer que um processo tem uma estrutura acusatória. Independentemente do sentido histórico que a estrutura acusatória assume há pelo menos um outro aspecto que deriva aliás, do primeiro, em relação ao qual podemos dizer que, a estrutura acusatória do processo é ou não evidente. Se deve haver uma entidade diferente a investigar e a acusar da entidade que julga, se a entidade que julga pudesse à vontade investigar e procurar factos novos para decidir determinada causa, poderia dizer-se que a estrutura acusatória era puramente formal e que de facto o juiz acabava por ter poderes para se pronunciar sobre os factos que entendesse. Isto não pode acontecer no Direito Português isto é, a estrutura acusatória do processo implica também aquilo que normalmente se define em termos restritos como o Princípio da Acusação ou Princípio da Vinculação temática. O Juiz que julga está tematicamente vinculado aos factos que lhe são trazidos pela entidade que acusa. É por isso que é muito importante verificar quando, em que momento, e como é que no processo português se fixa o objecto do processo. Quando o Ministério Público deduz acusação ou, em alternativa, quando é requerida a abertura da instrução pelo assistente, nesse momento fixam-se os factos dos quais o juiz do julgamento vai poder conhecer. Isto é, a estrutura acusatória do processo implica também, além da diferença de identidade entre acusador e julgador, que o julgador está vinculado ao tema do processo que lhe é trazido pelo acusador. O juiz do julgamento só pode pronunciar-se sobre os factos que lhe são trazidos, em princípio pelo Ministério Público. É nesse sentido que se diz que a estrutura acusatória do processo implica também o princípio da acusação ou o princípio da vinculação - temática."

4 - Quanto ao princípio do contraditório, refere Figueiredo Dias (16):

"O princípio do contraditório opõe-se, decerto, a uma estrutura puramente inquisitória do processo penal, em que o juiz pudesse proferir a decisão sem previamente ter confrontado o arguido com as provas que contra ele houvesse recolhido - e não faltaram exemplos históricos de processos penais assim estrutura dos - ou sem lhe ter dado, em geral, qualquer possibilidade de contestação da acusação contra ele formulada. Excepção feita, porém, a casos de estrutura mais asperamente inquisitória, o princípio, encabeçado sobretudo na pessoa do arguido, mereceu sempre geral aceitação - nos direitos antigos (tanto no grego como no romano) como nos medievais (após a recepção do direito romano, logo em seguida obscurecida, como se sabe, pelo processo inquisitório) e, de forma inquestionável, nos processos penais «reformados» consequentes à Revolução Francesa 4.

Esta persistência e geral aceitação explica-se, ao que cremos, pela circunstância de o princípio do contraditório, com os fundamentos apontados, surgir dotado de uma natureza acentuadamente formal e quase privado de conteúdo e sentido autónomos."

D - A dimensão factual do objecto do processo e o direito de defesa 1 - Quer a estrutura acusatória, quer o princípio do contraditório se circunscrevem no - e integram o - objecto do processo, vinculado ao chamado princípio da unidade ou indivisibilidade, segundo o qual "deve o tribunal conhecer e julgar o objecto que lhe foi proposto («Thema decidendum» e «Thema probandum») na sua totalidade, isto é, unitária e indivisivelmente." como assinala Mário Paulo da Silva Tenreiro (17).

Como refere este Autor (18).

Se pensarmos, como Eduardo Correia, que o objecto do processo é afinal uma concreta e hipotética violação jurídico-criminal acusada teremos que a identidade do mesmo coincide com a do direito substantivo.

E acrescenta (19):

"Para Figueiredo Dias o objecto do processo não é já a «concreta e hipotética infracção acusada», mas não é tão-pouco «o facto na sua existência histórica, que importa averiguar no decurso do processo» (Cavaleiro Ferreira, representante da concepção naturalística em Portugal), e em relação ao qual a identidade teria de se estabelecer com base na conexão naturalística. O objecto do processo será antes um recorte, um pedaço da vida, um conjunto de factos em conexão natural (e não já naturalística, por tal conexão não ser estabelecida com base em meros juízos procedentes de uma racionalidade própria das ciências da natureza) analisados em toda a sua possível relevância jurídica, ou seja, à luz de todos os juízos jurídicos pertinentes. O objecto do processo será assim uma questão-de-facto integrada por todas as possíveis questões-de-direito que possa suscitar."

2 - Aliás, como acentua Figueiredo Dias (20) "Segundo o princípio da acusação [...] a actividade cognitória e decisória do tribunal está estritamente limitada pelo objecto da acusação.

Deve pois afirmar-se que o objecto do processo penal é o objecto da acusação, sendo esta que, por sua vez, delimita e fixa os poderes de cognição do tribunal (actividade cognitória [...]) e a extensão do caso julgado (actividade decisória [...]) É a este efeito que se chama a vinculação temática do tribunal e é nele que se consubstanciam os princípios da identidade, da unidade ou indivisibilidade e da consunção do objecto do processo penal."

3 - Mas na esteira do ensinamento de Mário Paulo da Silva Tenreiro (21), o exposto não arreda a necessidade de assegurar "um efectivo direito de defesa ao arguido face às alterações operadas no objecto, tal qual ele fora considerado na acusação, uma vez que insignificantes alterações dos factos podem pôr em causa toda a defesa do arguido. Mas também quando se trata de uma mera alteração na qualificação jurídica (independentemente de qualquer alteração nos factos) o contraditório deve ser assegurado, não podendo o arguido ser surpreendido na sentença com uma incriminação diversa da acusada. É isto mesmo que diz Ludwig, citado por Eduardo Correia: «Uma condenação com base em preceitos penais diferentes dos enunciados na acusação só será admissível depois que o arguido seja especialmente prevenido de tal modificação de ponto de vista jurídico e lhe seja dada oportunidade para o esclarecer» O respeito pelo direito de defesa do arguido pode bastar-se com a simples prevenção dos interessados acerca dos novos aspectos (de facto ou de direito) que vão ser encarados. A mais disso pode contudo exigir um adiamento ou uma interrupção da audiência a fim de permitir o carreamento para o processo de novo material que permita a contradição dos novos elementos que o tribunal pretende considerar.

Só assim se respeitará o princípio do contraditório, constitucionalmente garantido, que consiste, na lição de Figueiredo Dias, na «oportunidade conferida a todo o participante processual de influir, através da sua audição pelo tribunal, no decurso do processo». Oportunidade essa que terá de ser efectiva e eficaz e que, por isso, terá de respeitar as condições mínimas (de tempo, de meios) que possibilitem uma afirmação do princípio em termos não meramente platónicos."

4." Efectivamente, o problema central do objecto do processo penal é o da procura do equilíbrio entre o interesse público da aplicação do direito criminal, mediante a eficaz perseguição dos delitos cometidos, e o direito impostergável do arguido a um processo penal que assegure todas as garantias de defesa. Assim, "a identidade do objecto do processo não poderá definir-se tão rígida e estreitamente que impeça um esclarecimento suficientemente amplo e adequado da infracção imputada e da correlativa responsabilidade, mas não deverá também ter limites tão largos ou tão indeterminados que anule a garantia implicada pelo princípio acusatório e que a definição do objecto do processo se propõe justamente realizar"

(Castanheira Neves, Sumários Criminais, apud M. Simas Santos e M. Leal Henriques, Código de Processo Penal, II vol., pág. 413). Ora, ao privilegiar as máximas da identidade (o objecto do processo deve manter-se idêntico da acusação à sentença definitiva) e da consunção (a decisão sobre o objecto do processo deve considerar-se como tendo definido jurídico-criminalmente a situação em tudo o que podia e devia ser conhecido) e a celeridade, sobrelevando a segurança e a paz jurídica do arguido relativamente à busca da verdade material, o legislador ordinário não rompeu de modo manifesto esse equilíbrio, movendo-se no espaço de discricionariedade legislativa constitucionalmente consentido" (22).

5. "A circunstância de os factos novos não autonomizáveis surgirem para o processo apenas na fase de julgamento tanto poderá resultar de opção ou de incúria do titular da acção penal ou dos órgãos de polícia criminal, como de vicissitudes da investigação que estes não tenham podido dominar (confissão do arguido, novas declarações de testemunhas ou do ofendido, meios de prova até então desconhecidos, etc.). O inexorável sacrifício parcial do conhecimento da verdade material que daí decorre é consequência comportável - embora não necessária ou inevitável - da "orientação para a defesa" do processo penal e da posição diferenciada dos sujeitos processuais, designadamente a que decorre da estrutura acusatória do processo. Que o consequente deficit de realização do direito penal substantivo seja o resultado de opções ou contingências da actuação do Ministério Público (e dos órgãos de polícia criminal na fase em que o Ministério Público dirige o processo) é inerente ao modelo de processo penal e de separação funcional das magistraturas que decorre da Constituição. É certo que em audiência se revelarão factos, relevantes sob a perspectiva da prossecução das finalidades do processo penal da verdade material e da defesa dos interesses colectivos, cuja desconsideração definitiva poderá comportar desvio objectivo ao princípio da legalidade da promoção da acção penal. Mas só um repudiado modelo inquisitório, que deixasse até ao último momento em aberto o objecto do processo, seria eficaz para evitar totalmente esse risco. No processo de estrutura acusatória, as funções de acusador e de julgador haverão de ser exercidas por órgãos diferenciados e autónomos, e o julgador, nos quadros da dialéctica processual decorrente do próprio princípio do acusatório, sempre haverá de estar confinado ao solucionamento da questão penal tal como ela lhe é proposta pelo Ministério Público ou pela parte acusadora privada. A opção do legislador que está em análise, ainda que não fosse a única compatível com a Constituição (recorde-se o acórdão 237/2007), coaduna-se com a qualidade do Ministério Público como titular da acção penal, ao qual compete deduzir a pretensão punitiva do Estado e assumir a correspondente responsabilidade funcional pelos termos desse exercício (artigo 219.º, n.º 1, da Constituição)" (23).

E - Factualidade e qualificação jurídica 1 - Como assinala Frederico Isasca na Revista Portuguesa de Ciência Criminal (24): Tudo aponta no sentido de que o momento processualmente adequado para o tribunal de julgamento se pronunciar sobre a qualificação jurídica do objecto do processo é necessariamente posterior à decisão sobre a factualidade imputada.

E, debruçando-se sobre a questão da qualificação jurídica, escreve:

Face ao C.P.P. vigente e em estreita relação com o conceito de alteração dos factos, seja esta substancial ou não, a questão que se coloca é a de saber se o tribunal é livre no exercício da qualificação, ou se, pelo contrário, alguma limitação se lhe impõe naquela sua função. A resposta, qualquer que ela seja, deverá surgir das disposições legais e ser, num segundo momento, apreciada à luz dos princípios fundamentais do nosso Direito Processual Penal.

Um primeiro ponto importa, porém, desde já esclarecer. O do objecto da qualificação jurídica. Objecto da qualificação jurídica são factos. São os factos que formam um acontecimento da vida: debilitado no espaço e no tempo, e que se imputam a certo sujeito Objecto da qualificação jurídica é, portanto, o facto processual, i. e., o objecto do processo. Qualificar um determinado facto do ponto de vista jurídico-penal é subsumir um determinado acontecimento na descrição abstracta de uma preposição penal, i. e., verificar se aquele comportamento concreto daquele agente, corresponde ou não, ao comportamento abstractamente descrito numa dada lei penal como constituindo um crime. Nisto e só nisto consiste a qualificação jurídico-penal (25).

A liberdade do tribunal, no que concerne à apreciação da questão de direito, é, numa outra perspectiva, uma decorrência lógica do dever que sobre ele impende de uma apreciação esgotante de todo o objecto do processo. A posição que quanto a esta questão aqui se tome, terá os seus reflexos na questão do âmbito e dos efeitos do caso julgado. Entendemos pois, que só uma apreciação esgotante da matéria de facto, i. e., a sua apreciação sob todos os pontos de vista jurídicos possíveis, é compatível com a posição que acolhemos em sede de caso julgado e por sua vez coerente com a liberdade de qualificação que aqui se defende." (26).

2 - Por isso, como salienta Germano Marques da Silva (27): A partir do momento em que a lei deixou de presumir o conhecimento da lei incriminadora ou pelo menos deixou de considerar irrelevante para efeitos de punição o seu desconhecimento e considera que a consciência da ilicitude é elemento essencial da culpabilidade, entende-se também a necessidade da indicação da lei aplicável na própria acusação e no despacho de pronúncia, sob pena de nulidade. É que, agora, contrariamente ao regime do Código Penal anterior, a consciência da ilicitude é essencial para a punibilidade do facto e, por isso, a existência dessa consciência tem de ser objecto de acusação e de prova, é pressuposto da punição e, portanto, faz parte também do objecto do processo.

Como assertivamente este Autor esclarece (28):

"I. O objecto do processo corresponde à matéria sobre que ele versa, ao quid sobre que recai.

O processo, nas suas fases declarativas, recai também sobre a qualificação jurídica dos factos. A valoração ou qualificação jurídica vai-se progressivamente elaborando no decurso do procedimento, sendo algum tanto fluida (como aliás, a matéria de facto) até à acusação, mas devendo estabilizar-se na acusação (arts. 283.º a 285.º) ou no requerimento de instrução (em caso de este ser deduzido na sequência de arquivamento do inquérito - artigo 287.º, n.º 2).

Ora, se assim é, e tendo presente que da qualificação jurídica dos factos depende ou pode depender não só a pena a aplicar como a própria responsabilidade penal do agente, não se entenderia a razão pela qual a lei cercaria de garantias a delimitação do pressuposto factual objectivo do crime e do processo e havia de deixar inteira liberdade ao tribunal no que concerne à qualificação jurídica, o que representaria, ultima ratio, a irrelevância para o processo do pressuposto factual subjectivo consistente na consciência da ilicitude, em clara contradição com as exigências do direito substantivo.

Não há razão para tal assimetria. Sobretudo não há razão quando se considere, como deve agora, perante o direito penal substantivo emergente do Código Penal vigente, que a consciência da ilicitude do comportamento por parte do arguido é elemento da culpabilidade, não bastando já a simples possibilidade de conhecer, de distinguir o bem do mal, o lícito do ilícito, a mera susceptibilidade de imputação, como foi a orientação predominante em face da lei penal anterior ao Código Penal de 1982."

3 - E sobre a problemática de que a qualificação jurídica dos factos pode e deve ser encarada numa perspectiva de facto, adianta:

"Com efeito, enquanto a consciência da ilicitude do facto é agora elemento essencial da culpabilidade e a culpabilidade é pressuposto essencial da punibilidade, a consciência da ilicitude é também um elemento do crime que há-de ser objecto da prova, e é também um facto processual incluído no thema probandi.

Os factos jurídico-processuais que hão-de constar da acusação são, por isso, todos os que integram os pressupostos necessários à procedência do pedido (a aplicação da sanção solicitada).

O agente, para poder ser punido a título de dolo, há-de ter tido consciência da ilicitude do seu comportamento. Esta consciência da ilicitude é, por isso, também pressuposto da punição a esse título e necessariamente objecto de prova no processo.

Ora, em muitos casos, a ilicitude do comportamento só pode aferir-se por referência às normas incriminadoras e daí a necessidade, sob pena de nulidade, de essas normas serem indicadas na acusação.

A norma incriminadora não faz parte do facto, como já referimos, mas é a referência à norma que dá ao facto o concreto sentido de ilicitude.

O facto com relevância penal é o facto com significado e esse significado é-lhe dado pela referência à norma incriminadora. Por isso que a alteração da norma incriminadora pode alterar a significação do facto, logo a sua relevância jurídico-penal.

A referência à norma revela o interesse tutelado e os limites em que o bem jurídico é tutelado pelo direito penal e o que a lei penal exige é o conhecimento da protecção penal desse interesse, e dos termos em que é protegido, do desvalor jurídico do comportamento objecto da acusação. Ora, para esse conhecimento, para que o agente tenha consciência da ilicitude do seu comportamento, não é de exigir necessariamente o conhecimento da norma proibitiva, mas basta a consciência da existência da protecção penal do interesse violado.

A norma indicada na acusação dá o critério de valoração, revela ao acusado que é em função do desvalor penal que aquela norma traduz que é requerido o seu julgamento. Enquanto a variação do tipo incriminador não implicar alteração do critério essencial de valoração do interesse, o arguido não fica defraudado no seu direito de defesa." (29) 4 - Nesta medida se compreende o conteúdo do n.º 4 do artigo 339.º do CPP:

supra referido, nomeadamente no que ora se realça em itálico "- Sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos, a discussão da causa tem por objecto os factos alegados pela acusação e pela defesa e os que resultarem da prova produzida em audiência, bem como todas as soluções jurídicas pertinentes, independentemente da qualificação jurídica dos factos resultante da acusação ou da pronúncia, tendo em vista as finalidades a que se referem os artigos 368.º e 369".

Como salienta a propósito, Paulo Pinto de Albuquerque (30):

"A Lei 59/98, de 25.8, introduziu o novo n.º 4. Ela visa rejeitar as teses herdeiras da teoria do fait qualifié, que vinculam o objecto do processo à incriminação da acusação ou da pronúncia. O objecto do processo não é constituído pela incriminação imputada ao arguido, mas antes pelos factos que lhe são imputados. O legislador nacional quis, portanto, verter para o direito português a norma, segundo a qual "a investigação e a decisão abrangem o facto descrito na acusação e as pessoas imputadas pela acusação. Dentro destes limites estão os tribunais autorizados e obrigados a uma actividade autónoma e, em especial, eles não estão vinculados na aplicação da lei penal aos requerimentos feitos" [...] Ou seja, o tribunal está apenas vinculado tematicamente pelo "facto histórico unitário" descrito na acusação (prozessualer Tatbegriff, Claus Roxin/Hans Achenbach, 2006:146), não pela qualificação jurídica dada ao facto na acusação. Portanto, o MP, o arguido e o assistente têm o direito de discutir a qualificação jurídica dos factos sem quaisquer restrições durante a audiência e o juiz tem o dever de suscitar essa discussão, caso pondere como plausível uma qualificação jurídica dos factos distinta da que consta da acusação ou da pronúncia."

5 - Em suma, como observa o mesmo Autor (31), "A solução da imodificabilidade da qualificação jurídica no momento do saneamento judicial dos autos é a única consentânea com a proibição da sindicância do uso pelo Ministério Público da faculdade do artigo 16.º, n.º 3, por via da sindicância da imputação penal feita na acusação [...] Em síntese, o legislador quis que a qualificação jurídica dos factos feita pela acusação (pública ou particular) ou, havendo instrução, pela pronúncia fosse discutida na audiência de julgamento e só nesse momento (acórdão do TC n.º 518798), podendo então os sujeitos processuais proceder a essa discussão jurídica sem quaisquer restrições ou vinculações à qualificação feita em momento anterior. Razão pela qual o juiz, aquando da prolação do despacho do artigo 311.º, não deve rejeitar a acusação e devolvê-la ao MP para as corrigir erros "claros" de qualificação jurídica dos factos, sendo certo que a "clareza" do direito não é indiscutível.

O tribunal não pode, no início da audiência de julgamento, proferir despacho a alterar a qualificação jurídica dos factos imputados ao arguido na acusação [...] Esta conclusão não prejudica o exercício do poder do tribunal durante a audiência nos termos do artigo 358.º n.º 3 (32).

O juiz não pode, no início da audiência, proferir despacho que implique o conhecimento do mérito da causa quanto às questões relacionadas com a matéria de facto, por exemplo, considerando que não estão indiciados suficientemente certos factos atinentes à especial censurabilidade e convertendo, por isso, a imputação de um crime de ofensa à integridade física qualificado num crime simples (acórdão do STJ, de 20.11.1997, in BMJ, [...])"

(33).

6 - Como claramente refere o supra citado acórdão de Uniformização de Jurisprudência 7/2008, de 25-06-2008:

"O instituto da alteração dos factos descritos na acusação ou na pronúncia visa assegurar as garantias de defesa ao arguido. O que a lei pretende é que aquele não venha a ser julgado e condenado por factos diferentes daqueles por que foi acusado ou pronunciado, por factos que lhe não foram dados a conhecer oportunamente, ou seja, venha a ser censurado jurídico-criminalmente com violação do princípio do acusatório, sem que haja tido a possibilidade de adequadamente se defender.

Ao alargar o âmbito de aplicação do instituto à alteração da qualificação jurídica dos factos o legislador visou, também, assegurar as garantias de defesa do arguido, de acordo, aliás, com a Constituição da República, que impõe sejam asseguradas todas as garantias de defesa ao arguido - n.º 1 do artigo 32.º consabido que a defesa do arguido não se basta com o conhecimento dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, sendo necessário àquela o conhecimento das disposições legais com base nas quais o arguido irá ser julgado.

Assim e atenta a ratio do instituto, vem-se entendendo que só nos casos e situações em que as garantias de defesa do arguido - artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República - o exijam (possam estar em causa), está o tribunal obrigado a comunicar ao arguido a alteração da qualificação jurídica e a conceder-lhe prazo para preparação da defesa. Por isso, se considera que a alteração resultante da imputação de um crime simples ou "menos agravado", quando da acusação ou da pronúncia resultava a atribuição do mesmo crime, mas em forma qualificada ou mais grave, por afastamento do elemento qualificador ou agravador inicialmente imputado, não deve ser comunicada, visto que o arguido ao defender-se do crime qualificado ou mais grave se defendeu, necessariamente, do crime simples ou "menos agravado", ou seja, defendeu-se em relação a todos os elementos de facto e normativos pelos quais vai ser julgado.

O mesmo sucede quando a alteração resulta na imputação de um crime menos grave do que o da acusação ou da pronúncia em consequência de redução da matéria de facto na sentença, quando esta redução não constituir, obviamente, uma alteração essencial do sentido da ilicitude típica do comportamento do arguido, ou seja, quando não consubstanciar uma alteração substancial dos factos da acusação.

Tal acontece, ainda, face a alteração decorrente da requalificação da participação do agente de co-autoria para autoria, bem como perante alteração resultante da requalificação da culpa do agente de dolo directo para dolo eventual.

[...] A qualificação jurídica dos factos em sede de acusação não se circunscreve à indicação da norma que prevê o tipo de crime ou crimes que aqueles preenchem.

Com efeito, a lei - alínea f) do n.º 3 do artigo 283.º - impõe a indicação das disposições legais aplicáveis, ou seja, de todas as disposições legais aplicáveis.

Deste modo, para além da indicação da norma que prevê o tipo de crime ou crimes, terão de ser indicadas as normas que estabelecem a respectiva punição, ou seja, a espécie e a medida das sanções aplicáveis.

Pretende a lei que ao arguido seja dado conhecimento do exacto conteúdo jurídico-criminal da acusação, ou seja, da incriminação e da precisa dimensão das consequentes respostas punitivas, dando-se assim expressão aos princípios da comunicação da acusação e da protecção global e completa dos direitos defesa, este último estabelecido no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição Política, princípios a que já fizemos referência.

Só assim o arguido poderá preparar e organizar a sua defesa de forma adequada.

É que o arguido não tem que se defender apenas dos factos que lhe são imputados na acusação. A vertente jurídica da defesa em processo penal é, em muitos casos, mais importante E esta para ser eficaz pressupõe que o arguido tenha conhecimento do exacto significado jurídico-criminal da acusação, o que implica, evidentemente, lhe seja dado conhecimento preciso das disposições legais que irão ser aplicadas.

Por isso, qualquer alteração que se verifique da qualificação jurídica dos factos feita na acusação ou na pronúncia (com excepção dos casos atrás referidos), nomeadamente qualquer alteração que importe um agravamento, terá necessariamente de ser dada a conhecer ao arguido para que este dela se possa defender, sob pena de se trair o favor defensionis.

Por outro lado, como deixámos assinalado nas considerações preliminares tecidas, a declaração do direito do caso penal concreto é tarefa conjunta do tribunal e dos sujeitos processuais, na qual o arguido é também chamado a intervir, porém, para isso terá de participar e de ser ouvido, nos diversos actos processuais, de acordo com o quadro jurídico pelo qual vai ser julgado e não com base noutro quadro jurídico. Assim, se o quadro jurídico que lhe foi dado a conhecer através da comunicação da acusação ou da pronúncia é alterado, disso terá de ser informado para que possa influir, se assim o entender, na declaração do direito.

Aliás, o processo penal é um processo equitativo e justo, não sendo configurável, num Estado de direito, a possibilidade de ao arguido ser aplicada uma pena sem que disso seja prevenido, isto é, sem que lhe seja dado oportuno conhecimento da possibilidade de que nela pode vir a ser condenado."

Neste sentido, de forma reflexa, em tal âmbito, sobre a alteração de factos em audiência, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 90/2013, de 7 de Fevereiro de 2013 (34), veio decidir [...], "p) Não julgar inconstitucional a norma constante dos artigos 358.º, 360.º e 361.º, do Código de Processo Penal, interpretados com o sentido de que é possível proceder à alteração dos factos da pronúncia até ao encerramento da audiência de julgamento, após terem sido produzidas as alegações orais, sem a verificação de circunstâncias de excecionalidade ou superveniência."

7 - Em síntese, e como bem acentua o Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo, em suas doutas alegações:

"Ora, tendo em conta a inserção sistemática do preceito [o artigo 358.º do CPP] no capítulo que define as regras e princípios que regulam a actividade da produção de prova, não se suscitam grandes dúvidas de que o mecanismo da alteração da qualificação jurídica do artigo 358.º n.º 3 do CPP foi previsto e tem aplicação já após a discussão da causa, após produção de prova.

Na verdade, a alteração da qualificação jurídica poderá ocorrer em duas situações: no decurso de uma alteração dos factos (não substancial); e no caso em que, não obstante os factos resultantes da prova produzida em julgamento serem coincidentes com os da acusação ou pronúncia, o tribunal discorda dessa qualificação jurídica.

Ora, considerando que o referido n.º 3 é uma norma integrada no contexto global do mecanismo da "alteração não substancial dos factos", prevista no artigo 358.º CPP, e que a alteração dos factos (n.º 1) só pode ocorrer, necessariamente, após produção de prova, estabelecendo o n.º 3 que aquele n.º 1 "é correspondentemente aplicável" à alteração da qualificação jurídica, não faria sentido que a alteração da qualificação jurídica pudesse ocorrer em momento processual diferente.

[...] Ora, considerando que a acusação, definidora do objecto do processo, integra, para além dos factos, as disposições legais aplicáveis, ou seja, a qualificação jurídica (um dos requisitos obrigatórios da acusação cuja omissão acarreta rejeição - artigo 283.º, n.º 3, alínea c), do CPP), a alteração da qualificação efectuada pelo juiz de julgamento mais não é do que um proibido controlo substantivo da acusação.

De resto, se a indicação das disposições legais não integrasse a parte substantiva da acusação, certamente que o legislador não teria atribuído à sua omissão uma consequência tão grave como a rejeição.

É verdade que o despacho judicial que procedeu à alteração da qualificação, não se fundamentou em diferente apreciação da prova, antes decidindo perante o próprio texto da acusação.

No entanto, ao enquadrar os factos da acusação numa determinada qualificação jurídica, está a formular um juízo acerca do conteúdo substantivo da referida acusação.

Em conclusão, recebida a acusação e designado dia para julgamento, a qualificação jurídica feita pelo Ministério Público, merecedora ou não da concordância do juiz, traduz-se na posição que o Ministério Público assume no processo, como órgão de justiça, que goza de estatuto próprio e de autonomia movendo-se exclusivamente por critérios de legalidade e de objectividade.

Questão bem diferente é a da acusação conter um manifesto lapso ou erro, passível de correcção, o que não se confunde com a divergência do juiz sobre a subsunção jurídica dos factos.

Por último, saliente-se que a tese do acórdão recorrido conduz a uma solução, a nosso ver, inadmissível, pois a qualificação jurídica feita pelo Ministério Público seria mero exercício anódino. O juiz, previamente ao julgamento do mérito, passaria a poder ingerir-se em competências alheias, estruturando substancialmente a acusação, elegendo e impondo aos sujeitos do processo a qualificação correcta, que nenhum previamente (na fase própria) contestara.

Daí que, sob pena de subversão do processo, de se criar a desordem, a incerteza, cada autoridade judiciária terá que actuar no momento processual que lhe compete. E sendo indiscutível que o Tribunal é totalmente livre de qualificar os factos pelos quais condena o arguido, certo é que o momento próprio para o fazer ocorre após haver produção de prova, isto é, quando está a julgar o mérito do caso concreto."

A razão está pois do lado do acórdão fundamento.

Termos em que IX - Decidindo:

Acordam em fixar a seguinte jurisprudência:

«A alteração, em audiência de discussão e julgamento, da qualificação jurídica dos factos constantes da acusação, ou da pronúncia, não pode ocorrer sem que haja produção de prova, de harmonia com o disposto no artigo 358.º n.os 1 e 3 do CPP» Em consequência, ordenam o reenvio do processo para o Tribunal da Relação de Guimarães, para aplicação da jurisprudência fixada - artigo 445.º n.º 2 do CPP.

Cumpra-se o artigo 444.º n.º 1 do CPP.

Lisboa, 12 de junho de 2013. - António Pires Henriques da Graça (relator) - Raul Eduardo do Vale Raposo Borges - Isabel Celeste Alves Pais Martins - Manuel Joaquim Braz (vencido, nos termos da declaração de voto que junto) - António Pereira Madeira - José Vaz dos Santos Carvalho - António Silva Henriques Gaspar - António Artur Rodrigues da Costa - Arménio Augusto Malheiro de Castro Sottomayor - José António Henriques dos Santos Cabral - António Jorge Fernandes de Oliveira Mendes - José Adriano Machado Souto de Moura - Eduardo Maia Figueira da Costa - Luís António Noronha Nascimento.

Declaração de voto

Em regra, o tribunal, depois de designada data para a audiência, só decide sobre a qualificação jurídica dos factos na sentença. Nessa altura, os factos a qualificar juridicamente serão os que se tiverem provado, que podem ou não ser os constantes da acusação ou da pronúncia, quando exista.

Mas, em momento anterior a esse, no início da audiência, nos termos do artigo 338.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), «o tribunal conhece e decide das nulidades e de quaisquer outras questões prévias ou incidentais susceptíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar». E para decidir sobre essas nulidades e outras questões prévias ou incidentais pode ter que conhecer da qualificação jurídica dos factos, que, nesse momento, são os descritos na acusação ou na pronúncia, se existir.

Pense-se no seguinte exemplo: O Ministério Público (MP), não fazendo uso da faculdade prevista no artigo 16.º, n.º 3, deduz acusação contra o arguido por factos que integram um crime cujo julgamento é da competência do tribunal colectivo, mas erradamente qualifica esses factos como crime cujo julgamento é da competência do tribunal singular, sendo o processo apresentado a juiz deste último tribunal, que recebe a acusação pelos factos e qualificação jurídica indicados pelo MP, designando data para a audiência.

Num tal caso, o juiz do tribunal singular, apercebendo-se do erro no início da audiência, deve, ao abrigo do artigo 338.º, declarar a incompetência material do tribunal, em função da correcta qualificação jurídica dos factos, remetendo o processo para o tribunal colectivo. Prosseguir com a audiência, para, no final, se declarar o tribunal incompetente, não acautelaria qualquer valor do processo penal e violaria os princípios da economia e da celeridade processual, com a prática de actos inúteis e o arrastamento do processo na sede errada.

No mesmo plano está a situação verificada nos acórdãos em conflito: Em ambos o MP deduziu acusação contra o arguido por factos que qualificou como um crime de ofensa à integridade física qualificada previsto no artigo 145.º, n.os 1, alínea a), e 2, do CP, sendo a acusação recebida nesses termos pelo juiz do julgamento, que designou data para a audiência. No início desta, o tribunal considerou que os factos constantes da acusação preenchiam apenas o crime de ofensa à integridade física simples do artigo 143.º, n.º 1, do CP, e não o de ofensa à integridade física qualificada, por não estar descrito qualquer facto integrador do elemento «especial censurabilidade ou perversidade do agente», exigido pelo tipo qualificado. E porque o ofendido desistira da queixa, sendo a desistência relevante em relação ao crime do artigo 143.º e não havendo oposição do arguido, homologou-a, pondo termo ao procedimento.

Feito este juízo sobre a qualificação jurídica dos factos, o tribunal, pelas razões já apontadas, não tinha outro caminho que não fosse o de decidir em conformidade, homologando a desistência da queixa e pondo termo ao processo.

E não é de verificação impossível o caso seguinte: O MP deduz acusação contra o arguido por factos que integram um crime de furto simples, mas erradamente qualifica-os como um crime de furto qualificado do artigo 204.º, n.º 2, do CP, sendo designada data para a audiência por esses factos e qualificação jurídica. Entre esse momento e o início da audiência, é ordenada e executada a prisão preventiva do arguido. Este vem ao processo requerer a revogação da medida, ao abrigo do artigo 212.º, n.º 1, alínea a), do CPP, com o fundamento de que os factos imputados na acusação integram, não o crime de furto qualificado, mas um crime de furto simples, que não admite prisão preventiva. Não vejo como nessa situação o juiz, em função da correcção da qualificação jurídica dos factos, pode deixar de revogar imediatamente a prisão preventiva, no cumprimento daquela norma (cf. acórdão de fixação de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/96, de 24/01/1996, publicado no DR, 1.ª série-A, de 14/03/1996).

Em casos como os apontados, não tem qualquer sentido esperar pela produção da prova para decidir, pois os factos que nessa fase processual relevam são os descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver. O que então importa acautelar é a justeza da decisão, e isso é conseguido com a possibilidade de dela se interpor recurso.

Podendo a alteração da qualificação jurídica decorrer de uma modificação dos factos submetidos a julgamento ou suscitar-se relativamente aos factos da acusação ou da pronúncia, quando exista, só a primeira tem necessariamente lugar após a produção da prova.

Em conclusão: entre o despacho que designa dia para a audiência e a sentença, o tribunal pode corrigir a qualificação jurídica dos factos constantes da acusação ou da pronúncia, havendo-a, se a correcção for instrumental de qualquer outra decisão que lhe caiba proferir, designadamente no momento previsto no artigo 338.º do CPP. Foi o que fez o acórdão recorrido, que, por isso, a meu ver, decidiu correctamente. - Manuel Joaquim Braz.

(1) V. Acórdão deste Supremo de 10-01-2007, Proc. n.º 4042/06 - 3.ª Secção.

(2) Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 4.ª edição, actualizada, Universidade Católica Editora, p. 872, nota 1.

(3) Manuel Lopes de Maia Gonçalves, Código de Processo Penal, anotado - Legislação Complementar, 17.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, p. 778, notas 2 e 3.

(4) DR 179/97 SÉRIE I-A, de 1997-08-05.

(5) DR/I 1995.07.06.

(6) No domínio do Código de Processo Penal de 1929, dispunha o artigo 447.º (Convolação para infracção diversa):

«O tribunal poderá condenar por infracção diversa daquela por que o réu foi acusado, ainda que seja mais grave, desde que os seus elementos constitutivos sejam factos que constem do despacho de pronúncia ou equivalente.

§§ 1º e 2º [...]» Este normativo era aplicado em recurso, por força do artigo 667.º, § 1.º, 1.º, do mesmo Código que, a propósito, explicitava:

«Artigo 667.º (Proibição de reformatio in pejus) Interposto recurso ordinário de uma sentença ou acórdão somente pelo réu [...], o tribunal superior não pode, em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrente:

1.º Aplicar pena que, pela sua espécie ou medida, deva considerar-se mais grave do que a constante da decisão recorrida;

4.º Modificar, de qualquer modo, a pena aplicada pela decisão recorrida.

§ 1.º A proibição estabelecida neste artigo não se verifica:

1.º Quando o tribunal superior qualificar diversamente os factos, nos termos do artigo 447.º [...], quer a qualificação respeite à incriminação, quer a circunstâncias modificativas da pena.» Mas como referia o acórdão do tribunal Constitucional n.º 22/96 de 16 de Janeiro de 1996, "Eduardo Correia (Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, Coimbra, 1948, páginas 140 e seguintes), subscrevendo, embora, as considerações feitas por Beleza dos Santos a respeito do artigo 447.º, escrevia, no entanto, que "toda a actividade defensiva e contraditória olha os factos nas suas relações com aquelas qualificações jurídicas em que se enquadram na acusação". E acrescentava: "Deste modo, qualquer alteração do ponto de vista jurídico pode vir a reflectir-se na importância que tenha sido atribuída na prova e na defesa a determinados elementos de facto, e, portanto, a prejudicar o arguido". E, a seguir, ponderava: "É verdade que o defensor deve conhecer o direito e organizar a sua contestação considerando todas as possíveis qualificações de que os factos acusados podem ser objecto. Mas também é certo que o natural é ele partir do rigor da subsunção jurídica feita na pronúncia e que com base nela organize a sua defesa. Mas assim, a modificação da qualificação jurídica importará, ou poderá importar, um desfavor para o réu Justamente por isso o § 265.º do Código de Processo Penal alemão dispõe que "não pode ter lugar uma condenação com base num preceito legal diferente do apontado no despacho de pronúncia, sem que o arguido seja prevenido da modificação do ponto de vista jurídico e lhe seja dada oportunidade de defesa"".

Por sua vez, o artigo 448.º do mesmo Código admitia que:

O tribunal poderá condenar por infracção diversa daquela por que o réu foi acusado, com fundamento nos factos alegados pela defesa ou dos que resultem da discussão da causa, se, neste último caso, tiver por efeito diminuir a pena.

(7) www.tribunalconstitucional.pt/ (8) DR 35 SÉRIE I-A, de 2000-02-11.

(9) A doutrina fixada implica, necessariamente, a reformulação da decisão final proferida no processo originário, que neste Supremo teve o n.º 42 222 e na 1.ª instância tem o n.º 98/90 da 2.ª Secção do 2.º Juízo do Funchal, por forma a possibilitar-se o exercício do direito de defesa do arguido em relação à apontada alteração da qualificação jurídica dos factos, para o que se anula a correspondente decisão quanto ao arguido Nóbrega e se determina a anulação do decidido, quanto a ele, na 1.ª instância de modo que, antes de encerrada a respectiva audiência, se providencie pela possibilidade de lhe ser dada a apontada oportunidade de defesa contra a alteração da qualificação jurídica que o tribunal entenda dever verificar-se"

(10) DR 146 SÉRIE I de 2008-07-30.

(11) www.tribunalconstitucional.pt/ (12) www.tribunalconstitucional.pt/ (13) Ibidem, p. 998, nota 2, último período.

(14) J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição revista, p. 522.

(15) Teresa Pizarro Beleza, com a colaboração de Frederico Isasca e Rui Sá Gomes, Apontamentos de Direito Processual Penal, pp. 51 e 52.

(16) Clássicos Jurídicos, Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1.ª edição, 1974, reimpressão, 2004, p. 150.

(17) Livros & Temas, Considerações Sobre o Objecto do Processo Penal, pelo Dr. Mário Paulo da Silva Tenreiro, p. 1002.

(18) Ibidem, p. 1017.

(19) Ibidem, p. 1924.

(20) Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Primeiro Volume, 1974, 145.

(21) Ibidem, pp. 1031 e 1032.

(22) Ac. 226/2008, de 21 de Abril de 2008, in www.tribunalconstitucional.pt/ (23) Citado Ac. 226/2008, de 21 de Abril de 2008, in www.tribunalconstitucional.pt/ (24) Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 4, fasc. 3, Julho Setembro de 1994, Aequitas Editorial Notícias, Frederico Isasca, p. 380.

(25) Ibidem, p. 100.

(26) Ibidem, p. 104.

(27) Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, I, 5.ª edição revista e actualizada, Editorial Verbo, 2008, 374, que em nota 1 acrescenta:

1 - Note-se que já perante o direito anterior o Prof. Castanheira Neves considerava que «os possíveis pontos de vista incriminatórios não poderão ser diferentes daqueles que estejam em congruência com o sentido jurídico-criminal problematicamente constitutivo do caso concreto», ob. cit., p.

262. Só então se satisfaria a exigência de limites para a convolação já que sem esses limites o réu poderia ser surpreendido por uma incriminação contra a qual não era exigível que preparasse a sua defesa, podendo, assim, vir a ser de todo ineficaz para essa nova incriminação, embora menos grave, quando já poderia ser porventura eficaz relativamente à primitiva incriminação, ainda que mais grave», ob. cit., p. 265.

(28) Ibidem, p. 375 e segs.

(29) Ibidem, p. 382.

(30) Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 4.ª edição actualizada, Universidade Católica Portuguesa, p. 875, nota 8, art.º 339.º (31) idem, ibidem, p. 824, nota 12.

(32) Idem, Ibidem, p. 873, nota 4.

(33) Ibidem, nota 5.

(34) Processo 357/1, 2.ª Secção.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2013/07/19/plain-310573.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/310573.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1929-02-15 - Decreto 16489 - Ministério da Justiça e dos Cultos - Direcção Geral da Justiça e dos Cultos

    APROVA O CODIGO DE PROCESSO PENAL.

  • Tem documento Em vigor 1985-07-30 - Lei 21/85 - Assembleia da República

    Aprova o Estatuto dos Magistrados Judiciais.

  • Tem documento Em vigor 1987-03-17 - Acórdão 54/87 - Tribunal Constitucional

    Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do n.º 2 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 437/75, de 16 de Agosto, na parte em que estabelece a ordem de intervenção do extraditando e do Ministério Público para alegações, por violação dos n.os 1 e 5 do artigo 32.º da Constituição.

  • Tem documento Em vigor 1995-07-06 - Acórdão 4/95 - Supremo Tribunal de Justiça

    O TRIBUNAL SUPERIOR PODE, EM RECURSO, ALTERAR OFICIOSAMENTE A QUALIFICAÇÃO JURIDICO-PENAL EFECTUADA PELO TRIBUNAL RECORRIDO, MESMO QUE PARA CRIME MAIS GRAVE, SEM PREJUÍZO, POREM, DA PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS. (PROC NUMERO 47407 - TERCEIRA SECCAO)

  • Tem documento Em vigor 1998-08-25 - Lei 59/98 - Assembleia da República

    Altera o Código do Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87 de 17 de Fevereiro, na redacção introduzida pelos Decretos-Leis 387-E/87, de 29 de Dezembro, 212/89, de 30 de Junho e 317/95, de 28 de Novembro. Republicado na integra, o referido código, com as alterações resultantes deste diploma.

  • Tem documento Em vigor 2000-02-11 - Assento 3/2000 - Supremo Tribunal de Justiça

    Na vigência do regime dos Códigos de Processo Penal de 1987 e de 1995, o tribunal, ao enquadrar juridicamente os factos constantes da acusação ou da pronúncia, quando esta existisse, podia proceder a uma alteração do correspondente enquadramento, ainda que em figura criminal mais grave, desde que previamente desse conhecimento e, se requerido, prazo ao arguido da possibilidade de tal ocorrência, para que o mesmo pudesse organizar a respectiva defesa. Proc. nº 43073.

  • Tem documento Em vigor 2007-08-29 - Lei 48/2007 - Assembleia da República

    Altera (15.º alteração) e republica o Código de Processo Penal.

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