de 13 de Agosto
Lei sobre a Investigação Científica e Desenvolvimento Tecnológico
A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 81.º, alínea m), 164.º, alínea d), e 169.º, n.º 2, da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
Prioridades
A investigação científica e desenvolvimento tecnológico, adiante abreviadamente designada por I&D, são prioridades nacionais envolvendo a participação activa dos sectores público, privado e cooperativo.
Artigo 2.º
Política nacional de I&D
1 - A política nacional de I&D é um dos garantes da modernização e desenvolvimento económico, social e cultural do País, constituindo parte integrante da estratégia nacional de aproveitamento e valorização do conjunto dos recursos nacionais de todos os tipos, da promoção da inovação e da expansão do saber.2 - A política nacional de I&D expressa-se nomeadamente por:
a) O incremento da investigação fundamental, designadamente nos estabelecimentos do ensino superior, através do apoio aos programas de investigação e em particular à intensificação da formação de investigadores e ao reapetrechamento de laboratórios e centros de documentação;
b) O apoio ao desenvolvimento dos actuais e à criação de novos laboratórios e institutos nacionais de I&D e outras instituições especializadas;
c) O fomento da investigação nas empresas públicas, privadas e cooperativas;
d) O apoio à investigação em instituições e fundações privadas sem fins lucrativos.
Artigo 3.º
Objectivos gerais da política de I&D
1 - A política nacional de I&D tem como objectivos gerais:
a) O aumento e aprofundamento dos conhecimentos, a valorização dos resultados da investigação e o aperfeiçoamento da administração da mesma;
b) A transferência dos avanços da investigação científica e das suas aplicações nas empresas públicas, privadas e cooperativas em tudo o que contribua para o progresso da sociedade;
c) O aumento significativo dos efectivos da comunidade científica através da formação para e pela investigação, da criação das estruturas necessárias a esta finalidade e do recrutamento de jovens investigadores;
d) A melhoria das formações científicas inicial e contínua;
e) A difusão da cultura científica e técnica junto de toda a população e em particular entre os jovens;
f) O reforço da capacidade e autonomia científico-tecnológica nacional.
Artigo 4.º
Prioridades de I&D
1 - As prioridades de I&D serão estabelecidas tomando em consideração:a) As necessidades económicas, sociais, culturais e de defesa do País;
b) A dotação dos programas de I&D com os meios humanos, materiais e financeiros adequados;
c) A necessidade de desenvolver capacidades científicas e tecnológicas próprias e a melhoria das existentes;
d) O intercâmbio e a transferência de tecnologias adequadas;
e) A contribuição do País para o esforço científico e tecnológico internacional;
f) A cooperação entre instituições científicas-empresas e organismos públicos-instituições financeiras.
Artigo 5.º
Articulação da política de I&D
Com vista ao desenvolvimento da política de I&D e à sua harmonização com as restantes políticas sectoriais o Governo ouvirá a comunidade científica e os órgãos adequados para o efeito.
Artigo 6.º
Planeamento plurianual
1 - A política de I&D será definida em conjugação com os objectivos económicos, sociais e culturais da estratégia nacional de modernização e desenvolvimento, sendo instrumento dessa política um planeamento plurianual de base deslizante, a incluir nas Grandes Opções do Plano, que constituirá a base fundamental da política e acções do Estado a favor do desenvolvimento científico e tecnológico nacional.2 - Para efeitos da prossecução do disposto no número anterior, o Governo elaborará:
a) A perspectiva estratégica, com horizonte de uma década, da contribuição da ciência e tecnologia para o desenvolvimento;
b) As grandes linhas programáticas trienais contendo as políticas e acções de I&D a prosseguir em articulação com a perspectiva estratégica a que se refere a alínea a).
3 - A perspectiva estratégica decenal e as grandes linhas programáticas trienais, a fim de permitir a respectiva aprovação pela Assembleia da República, deverão ser acompanhadas de relatórios justificativos.
Artigo 7.º
Objectivos do planeamento
O planeamento plurianual terá por fim promover o progresso naqueles aspectos que no seu âmbito se prendem como o aproveitamento e valorização dos recursos nacionais e da capacidade intelectual e cultural do País, tendo em vista o desenvolvimento da sociedade portuguesa e a sua contribuição para o progresso da humanidade.1 - No que se refere ao aproveitamento e valorização dos recursos nacionais:
a) O desenvolvimento dos sectores dos serviços, da indústria, da agricultura e das pescas;
b) O desenvolvimento do sector da construção, urbanismo, transportes e comunicações;
c) A conservação, enriquecimento e uso eficiente dos recursos biológicos, minerais e energéticos;
d) O estudo e aproveitamento da zona económica exclusiva;
e) O estudo, defesa e conservação do património artístico, cultural e histórico;
f) O aproveitamento da rede das relações internacionais nos seus aspectos políticos, culturais e económicos.
2 - No que se refere ao aproveitamento da capacidade intelectual e cultural do País:
a) O melhoramento da qualidade do ensino, tendo nomeadamente em vista garantir a igualdade de oportunidade na educação;
b) O apoio à criação intelectual e artística e o enriquecimento da cultura portuguesa em todos os domínios;
c) O aproveitamento das ciências, tecnologias e recursos de informatização.
3 - No que se refere ao desenvolvimento da sociedade portuguesa:
a) O crescimento económico, o fomento do emprego e a melhoria das condições de trabalho;
b) A melhoria dos serviços públicos, em especial dos ligados à qualidade de vida, à saúde e ao bem-estar social;
c) O fortalecimento da defesa nacional.
Artigo 8.º
Conteúdo das grandes linhas programáticas
1 - As grandes linhas programáticas trienais deverão ser organizadas por objectivos, articulando-se de preferência em programas de I&D, integrando medidas de política e incluindo designadamente intenções respeitantes:
a) Ao apoio à investigação fundamental;
b) Ao fomento de investigação aplicada e do desenvolvimento tecnológico a definir pelo Governo em áreas consideradas prioritárias de interesse económico, social e cultural;
c) Ao recrutamento, formação e valorização profissional dos investigadores;
d) Ao equipamento dos centros de investigação e das instalações que lhe estão afectadas e ainda à criação de novos centros de investigação;
e) Ao desenvolvimento tecnológico relativo a objectivos de modernização sectorial ou de difusão tecnológica em benefício de actividades específicas;
f) À investigação e ao desenvolvimento no sector público;
g) Ao apoio à actividade de difusão da cultura científica e tecnológica;
h) Ao desenvolvimento de outras actividades científicas e tecnológicas.
2 - O Governo estimará o nível do esforço financeiro de I&D e as metas para o desenvolvimento dos recursos humanos apropriados a cada linha.
Artigo 9.º
Avaliação
1 - A avaliação das actividades de I&D é considerada um princípio fundamental.2 - Para cada programa e instituição incluídos nas grandes linhas programáticas trienais de I&D serão especificados os objectivos e indicadores de avaliação que permitirão estabelecer o nível de eficiência interna dos recursos que lhe estão afectos e o seu impacte económico, social e cultural.
3 - Serão igualmente fixados critérios de escolha dos avaliadores, nomeadamente no que se refere à participação de peritos internacionais.
4 - Os critérios de avaliação tomarão em consideração designadamente os seguintes aspectos:
a) Missão ou finalidade;
b) Utilização dos recursos financeiros e materiais;
c) Formação e utilização de recursos humanos;
d) Capacidade de organização e gestão científica e tecnológica;
e) Capacidade de gerar efeitos multiplicadores directa ou indirectamente;
f) Contribuição para obtenção dos objectivos qualitativos e quantitativos em causa e o seu impacte sobre as actividades económicas, sociais e culturais.
Artigo 10.º
Despesa nacional e recursos humanos
1 - O crescimento anual da despesa nacional de I&D será programado de modo a que no prazo de dez anos aquela atinja 2,5% do PIB, devendo o Governo equacionar nesta perspectiva a parte que cabe às despesas públicas.2 - O crescimento dos efectivos do sector de I&D será programado de modo a acompanhar o crescimento anual da despesa nacional referida no número anterior.
Artigo 11.º
1 - No quadro da política da regionalização será feita uma descentralização e uma distribuição dos laboratórios, estruturas e serviços de investigação científica e tecnológica com vista à optimização dos recursos humanos e do equipamento do todo nacional e de acordo com as capacidades e necessidades de desenvolvimento económico, social e cultural das diversas regiões.2 - Serão criados incentivos à descentralização das actividades de formação, de investigação científica e desenvolvimento tecnológico.
Artigo 12.º
Previsões orçamentais
1 - As previsões orçamentais e os elementos plurianuais indispensáveis à apreciação e da execução dos programas e dos respectivos projectos constarão do Orçamento do Estado em rubricas próprias.2 - A Lei do Orçamento estabelecerá os benefícios fiscais, aduaneiros e financeiros que visem estimular as actividades de I&D.
Artigo 13.º
Cooperação instituições científicas-empresas
Para efeitos de concretização da alínea f) do artigo 4.º, serão promovidos, designadamente:
a) Contratos de I&D que envolvam instituições de ensino superior e laboratórios ou outros centros públicos de investigação entre si, ou estes e empresas públicas ou privadas, ou ainda que envolvam centros de investigação privados sem fins lucrativos;
b) Acordos de intercâmbio e mobilidade de pessoal qualificado;
c) Acordos de prestação de assistência científica, tecnológica e financeira;
d) Utilização comum de equipamentos e instalações;
e) Estabelecimento de mecanismos de transferência e difusão de tecnologias.
Artigo 14.º
Mobilidade do pessoal de I&D
1 - Os contratos de I&D devem favorecer a mobilidade de docentes do ensino superior e de investigadores.2 - Poderão ser autorizados o destacamento ou a requisição de investigadores e docentes entre as instituições públicas de investigação e entre estas e as empresas associadas num contrato I&D, por um máximo que não exceda o tempo da sua execução.
3 - A prestação de serviços pelo pessoal referido nos números anteriores em empresas ou instituições associadas num contrato de I&D não deverá conduzir à perda de quaisquer direitos ou regalias desse pessoal, nomeadamente em matéria de remunerações, antiguidade e segurança social.
Artigo 15.º
Cooperação
1 - O Governo definirá uma política geral de cooperação internacional científica e tecnológica, designadamente com os países de expressão oficial portuguesa e no âmbito das Comunidades Europeias.2 - O Governo organizará a coordenação das participações nacionais nos programas de investigação e desenvolvimento das Comunidades Europeias, procurando assegurar a adequada apropriação nacional dos benefícios proporcionados por esses programas.
3 - A cooperação com os países de expressão portuguesa deverá ser privilegiada de acordo com prioridades fixadas, tendo em atenção:
a) O inventário dos conhecimentos, experiências e materiais existentes em Portugal referente a esses países;
b) A hierarquização de futuros desenvolvimentos dos elementos acima referidos em relação com a perspectiva estratégica definida ao abrigo do artigo 7.º;
c) A valorização social, cultural e económica dos projectos de cooperação.
Artigo 16.º
Reorganização dos órgãos, quadros e estruturas de investigação
1 - No prazo máximo de um ano a partir da data da publicação da presente lei, o Governo, através de decreto-lei, promoverá as reorganizações necessárias dos órgãos, quadros e estruturas de investigação do sector público de modo a que sejam facilitados o planeamento, coordenação, desenvolvimento e gestão das actividades de I&D.
2 - As carreiras dos investigadores e demais pessoal de investigação serão objecto de estatuto próprio.
3 - Os quadros de pessoal das instituições públicas de I&D serão objecto de regulamentação própria.
Artigo 17.º
Difusão da cultura científica e técnica
1 - A educação escolar, o ensino superior, a formação contínua a todos os níveis e os meios de comunicação social devem favorecer o espírito de investigação, inovação e criatividade e contribuir para a difusão da cultura científica e técnica.
2 - Com a mesma finalidade deve ser apoiada a política editorial das instituições de investigação, assim como a criação de museus, a realização de exposições e a instituição de prémios, além de outros estímulos adequados.
3 - Deverá ser fomentado o uso e difusão da língua portuguesa como instrumento de acesso ao conhecimento e de comunicação científica.
Artigo 18.º
Articulação com a política de inovação
A aplicação desse diploma deverá ser devidamente conjugada com legislação adoptada ou a adoptar para apoio à inovação tecnológica.
Aprovada em 21 de Junho de 1988.
O Presidente da Assembleia da República, Vítor Pereira Crespo.
Promulgada em 27 de Julho de 1988.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendada em 29 de Julho de 1988.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.