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Acórdão 253/2011, de 7 de Junho

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Sumário

Decide anular deliberação da Comissão Nacional de Eleições [no âmbito da requisição das instalações do Teatro Circo de Braga, para realização de uma sessão de campanha eleitoral da CDU - Coligação Democrática Unitária (PCP-PEV)] por incidir sobre um acto que não é susceptível de recurso. (Processo nº 413/11)

Texto do documento

Acórdão 253/2011

Processo 413/11

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I. Relatório

1 - O Governador Civil de Braga impugna, ao abrigo do artigo 102.º-B da Lei 28/82, de 15 de Novembro, com as alterações subsequentes (Lei do Tribunal Constitucional - LTC), a deliberação da Comissão Nacional de Eleições (CNE) de 17 de Maio de 2011 que, concedendo provimento a recurso interposto pela CDU - Coligação Democrática Unitária (PCP-PEV), lhe determinou que procedesse em conformidade com o disposto no artigo 65.º da Lei 14/79, de 16 de Maio (Lei Eleitoral da Assembleia da República - LEAR). O recurso havia sido interposto de

ofício com o seguinte teor:

"Relativamente ao pedido de cedência do Teatro Circo para realização de uma sessão de campanha eleitoral para a Assembleia da República, no próximo dia 2 de Junho, informo V. Exa. que a Administração do Teatro Circo comunicou a este Governo Civil não se encontrar o referido espaço disponível para fins de campanha eleitoral e eventos político-partidários. Mais comunicou a referida Administração que a Programação do Teatro Circo para o quadrimestre Abril/Julho está definida e publicada, com espectáculos a 2 e 3 de Junho em vários espaços do Teatro Circo."

O recorrente pede a declaração de nulidade da deliberação impugnada, sustentando o

seguinte:

"1.º O meu ofício n.º 1452, de 04-05-2011, de cujo teor a CDU - Coligação Democrática Unitária recorreu para a Comissão Nacional de Eleições contém apenas mera informação sobre a disponibilização das instalações do Teatro-Circo para

conhecimento da mesma CDU.

2º. Não contém, por isso, aquela comunicação qualquer decisão minha sobre o pedido apresentado pela CDU para a utilização daquelas instalações no dia 2 de Junho de

2011 no âmbito da campanha eleitoral,

3º, Nem poderia conter qualquer decisão, uma vez que nem sequer fora efectuada a reunião para a audição dos mandatários das listas que obrigatoriamente antecede a indicação pelo governador civil dos dias, horas e locais, conforme se determina no n.º 2 do artº. 65º. da Lei Eleitoral para a Assembleia da República.

4º, A reunião para a audição dos mandatários das listas foi convocada através de ofício datado de 10.5.20 11, anexado como doc. n.º 1, e teve lugar no passado dia 16 do

mês corrente.

5º, Só após aquela reunião, procedi à indicação dos locais, dias e horas atribuídas a

cada partido e coligação.

6º. Não transmitindo o meu oficio n.º 1452, de 04.05.2011 qualquer conteúdo decisório, mas apenas informativo e preliminar à aludida reunião com os mandatários das listas, o recurso da CDU e a deliberação da Comissão Nacional de Eleições tomada na reunião de 17 de Maio corrente são de objecto impossível, por não se poder anular o que não existe, incorrendo a deliberação da CNE em nulidade nos termos do artº. 133º. do Código de Procedimento Administrativo.

7º Através do n.º 1725, de 18.05.2011, doc. 2, comuniquei ao Mandatário da CDU que, face à comunicação da Administração do Teatro-Circo e atendendo a que por ela foi transmitida programação para o mesmo Teatro-Circo nos dias 2 e 3 de Junho e tendo ainda em consideração a inexistência de carência de salas e recintos de normal utilização pública nesta cidade de Braga não se encontram reunidos os requisitas que a lei prevê para alicerçar o accionamento do mecanismo legal de requisição tendo em vista a disponibilização daquela sala de espectáculos para iniciativas de campanha eleitoral, tendo-lhe sido indicados oito recintos de normal utilização pública localizados nesta cidade de Braga susceptíveis de serem utilizados na campanha eleitoral.

8º. Não há carência de recintos de normal utilização pública, conforme se comprova da lista indicada à CDU e existe programação publicitada para o Teatro-Circo a levar a efeito no dia 2 de Junho, incompatível com a realização naquele recinto de outra actividade durante o mesmo dia, como decorre da comunicação de 19.05.2011 da Administração do Teatro-Circo, anexa como doc. n.º 3.

9.º Ora, havendo outras salas de espectáculos e outros recintos de normal utilização pública na cidade de Braga, conforme foi já indicado à CDU, forçoso é concluir não haver carência de salas de espectáculos ou de outros recintos de normal utilização pública nesta cidade e, nesta ordem de ideias, não considerar necessária e indispensável à campanha eleitoral a sala de espectáculo solicitada.

10.º Assim, para que o Governador Civil possa accionar uma requisição, no quadro do regime do artº. 65º. da LEAR, não é suficiente a existência apenas de um pedido formal de uma força política para aceder àqueles espaços.

11.º Da letra daquele normativo resulta clara a intenção do legislador de só disponibilizar o recurso excepcional do poder de requisição nas localidades onde não existam outras salas e recintos de normal utilização pública que levem o Governador Civil ou Ministro da República a considerar necessários à campanha eleitoral, sempre sem prejuízo da actividade normal e programada para os mesmos. Se impendesse sobre o Governador Civil a obrigação de requisitar uma sala de espectáculos ou um recinto de normal utilização pública por mero pedido formal de uma força política, tal implicaria para as salas de espectáculos, na maioria dos casos de propriedade privada, um regime mais gravoso que o previsto no artº. 68º. da LEAR para os edifícios e recintos pertencentes ao Estado e outras pessoas colectivas de direito público, o que

não faria qualquer sentido.

12º. Ora, da doutrina administrativa colhemos que a requisição é um acto administrativo pelo qual um órgão competente impõe a um particular, verificadas as circunstâncias previstas na lei e mediante indemnização, a obrigação de prestar serviços, ceder coisas móveis ou consentir na utilização temporária de quaisquer bens que sejam necessários à realização do interesse público, tendo subjacente a concorrência de alguns requisitos,

nomeadamente:

Necessidade imperiosa de bens;

Destino a fim de interesse público;

Impossibilidade de obter os bens ou serviços por meios ordinários;

Justa indemnização;

Lei que autorize;

Forma escrita.

13.º Na verdade, o legislador no regime aplicável às salas de espectáculos, constante do artº. 65º. da LEAR, faz depender a requisição destas da verificação das seguintes

circunstâncias:

Falta de declaração do proprietário da sala de espectáculo ou de recinto de normal

utilização pública;

Comprovada carência de salas de espectáculos ou de recintos de normal utilização

pública;

Avaliação pelo Governador Civil ou Ministro da República da sua necessidade para a

campanha eleitoral.

14.º Como decorre do que vimos de expender deste articulado nenhuma destas circunstâncias se verifica: existe declaração, existe programação para aquele dia, não há carência de salas de espectáculos ou recintos de normal utilização pública na cidade de Braga e o Governador Civil não considera necessária aquela sala de espectáculos para

a campanha eleitoral.

15º. Não se entende, assim, que não se encontrando reunidas as circunstâncias de que a lei faz depender a requisição, a Comissão Nacional de Eleições tenha tomado a deliberação sub judice, incorrendo ipso factu na violação do disposto do artº. 65.º da

LEAR.

16º. Não posso, aliás, deixar de referir que, ao decidir não proceder à requisição da sala de espectáculos solicitada, estava seguro de que tal acto em nada prejudicaria a campanha eleitoral por existirem outros locais adequados à realização de iniciativas

pelas diversas forças políticas."

2 - Ao abrigo do n.º 4 do artigo 102.º-B da LTC, a CDU-Coligação Democrática Unitária foi ouvida sobre a matéria do recurso, tendo alegado o seguinte:

"Relativamente ao recurso de deliberação da Comissão Nacional de Eleições sobre o recurso interposto pela CDU - Coligação Democrática Unitária para a utilização do Teatro Circo, em Braga, considera a CDU - Coligação Democrática Unitária que não tem razão o Senhor Governador Civil do Distrito de Braga, porquanto:

1 - A CDU - Coligação Democrática Unitária (adiante designada por CDU) dirigiu-se à Comissão Nacional de Eleições no dia 16 de Maio, contestando o teor do ofício de dia 4 de Maio, mas apenas recebido a 9 de Maio, em que o Senhor Governador Civil do Distrito de Braga (adiante designado por Governador Civil) informa a CDU de 'não se encontrar o referido espaço disponível para fins de campanha eleitoral e eventos político-partidários', acompanhando assim os argumentos da Administração do Teatro

Circo de Braga.

2 - Ora a CDU, em ofício datado de 21 de Abril solicitou ao Governador Civil que garantisse a disponibilização da sala principal do Teatro Circo, pelo que, tal resposta só poderia ser entendida como uma recusa de garantir essa utilização.

3 - Esse entendimento ficou claro, pela voz do representante do Governador Civil, na reunião a que este alude no ponto 4.º do Recurso ora em apreciação, tendo mesmo aquele adiantado algumas alternativas para a realização do Comício da CDU.

4 - O que, de resto, se confirma pelo ofício n.º 1725, de 18-05-2011, em que o Governador Civil reafirma os mesmos argumentos, e informa mais que considera que 'não se encontram reunidos os requisitos que a lei prevê para alicerçar o accionamento do mecanismo legal da requisição tendo em vista a disponibilização daquela sala de espectáculos para iniciativas de campanha eleitoral'.

5 - Tal ofício, não adianta novos argumentos nem conteúdos, à excepção da indicação dos lugares que o Governador Civil considera alternativos para a realização do

Comício da CDU.

6 - Conforme afirma a CNE na sua deliberação, 'a campanha eleitoral é um período especialmente destinado ao esclarecimento e à mobilização eleitoral e caracteriza-se por um regime especial de que gozam as candidaturas no que respeita a certos direitos e liberdades, designadamente no reforço do direito de reunião para fins eleitorais e no acesso a meios específicos para o prosseguimento de actividades de propaganda (como por exemplo, o direito de antena ou a utilização de salas de espectáculos e

edifícios ou recintos públicos).'

7 - E mais adianta que 'as entidades públicas referidas nos artigos 65.º e 68º estão obrigadas a respeitar e a dar satisfação aos direitos aí consignados, actuando de forma a permitir o exercício daqueles direitos por parte das forças políticas'.

8 - Logo, tem toda a razão o recurso da CDU e a deliberação posterior da Comissão Nacional de Eleições (adiante designada CNE).

9 - Quanto à questão de conteúdo, não tem igualmente razão o Governador Civil, acompanhando a CDU a argumentação invocada pela CNE.

10 - Pois não é verdade não haver carência de salas e recintos como refere o Governador Civil nos pontos 8.º e seguintes do recurso ora em apreciação.

11 - O Governador Civil indicou, um mês depois do pedido da CDU, no já referido oficio 1725, oito locais 'como susceptíveis de ser utilizados em iniciativas de campanha eleitoral', sabendo que eles não constituem, de facto, alternativa à pretensão da CDU.

12 - Desde logo porque cinco deles (Praça do Município; Avenida Central; Largo do Pópulo; Largo de Santiago; Espaço frente ao Convento do Pópulo, sito na Praça Conde de Agrolongo) são espaços ao ar livre, não podendo por isso ser considerados como alternativos a uma iniciativa que a CDU quer fazer em sala de espectáculos

fechada.

13 - Se assim não fosse, estariam todas as salas de espectáculos isentas do dever de cedência dos espaços, uma vez que existe, em todas as localidades praças e locais ao ar livre, de maior ou menor dimensão, onde as forças políticas podem realizar as

iniciativas que desejarem.

14 - Apenas por manifesta má fé, pode o Governador Civil fazer uma tal sugestão.

15 - Mas também porque os outros espaços são de dimensões significativamente diversas das pretendidas pela CDU. O Auditório do Parque de Exposições de Braga tem uma capacidade superior ao Teatro Circo em mais de 1/3; o Auditório Municipal Galécia tem uma lotação de 150 lugares e o Auditório da Juventude de Braga tem cerca de metade da lotação do Teatro Circo, não cumprindo, nenhum deles, minimamente os critérios desejados pela CDU.

16 - Ora cabe à CDU, e apenas à CDU, definir o tipo de iniciativa que se propõe desenvolver, e nenhum destes espaços fechados, repete-se, corresponde ao tipo de

iniciativa que a CDU quer realizar.

17 - Recorde-se a este propósito que o acórdão 476/09 do Tribunal Constitucional, relativamente a um pedido da CDU para esta mesma sala, considera que se admite 'que a inadequação de um espaço a uma acção de campanha eleitoral tanto possa resultar da insuficiente capacidade para a acção a desenvolver, como do manifesto excesso de capacidade do recinto. Quando a capacidade é inferior à afluência esperada a inadequação é óbvia. Mas também o manifesto excesso de capacidade pode considerar-se gerador de inadequação do recinto, visto que o excesso de espaço induz um efeito negativo na imagem da força política, gerando a impressão de que ficou

aquém dos seus propósitos.'

18 - Para a CDU a comprovada carência resulta de não haver no concelho de Braga, nenhuma outra sala fechada, com uma capacidade semelhante à do Auditório Principal do Teatro circo. Só este critério objectivo deve presidir à avaliação das entidades

competentes.

19 - Mais se contesta que exista razão atendível ao Governador Civil e ao Teatro Circo quanto à programação publicitada para o Teatro Circo.

20 - Desde logo porque resulta claro da resposta do Teatro Circo, enviada à CDU a 27 de Abril, que não é isso que está em causa.

21 - O Teatro Circo insiste, na sua resposta de 27 de Abril, na tese de que 'desde a sua reabertura, após o processo de renovação, tem sido orientação deste Conselho de Administração não ceder o equipamento para fins de campanha eleitoral ou eventos

político-partidários'.

22 - Tese que o Governador Civil repete no ofício 1725, no seu ponto 2, afirmando que a administração do Teatro Circo de Braga transmitiu a este Governo Civil o seu entendimento de que pela função e natureza do equipamento e não se verificando em Braga em caso de comprovada carência, não se encontrar o Teatro Circo abrangido pela possibilidade das entidades públicas requisitarem o espaço para campanha

eleitoral [...].'

23 - Ora aqui se percebe que o Teatro Circo insiste numa tese já derrotada pelo Tribunal Constitucional quando este afirma que 'dificilmente poderia aceitar-se a subtracção a tal dever (o dever de disponibilização das salas) com alegações semelhantes àquela que apresentou a entidade proprietária ou gestora do 'Theatro Circo' e que o ora recorrente parece ter tomado por boa ou com que se conformou, de não ceder o espaço para iniciativas político-partidárias por virtude de uma não explicitada 'natureza do equipamento' ou de 'num comício, ser praticamente impossível controlar a entrada de cidadãos para lá do número de lugares sentados'.

24 - Mais, o referido Acórdão refere explicitamente, no seu ponto 6, que 'os proprietários de salas de espectáculos ou de outros recintos de normal utilização pública que reúnam condições para serem utilizados na campanha eleitoral estão, assim, sujeitos não só ao dever de ceder esses espaços..., como ao dever acessório de comunicar as datas em que os seus espaços estarão disponíveis para tal finalidade, em ordem a permitir que a Administração (o Governador Civil ou o Representante da República) possa distribuir, atempada e concertadamente, esses espaços, de modo a assegurar a igualdade entre todas as forças políticas concorrentes.

Esse dever de disponibilização incide sobre todos os titulares de salas de espectáculos, sem prejuízo da actividade normal e programada para as mesmas, desde que os recintos reúnam condições para tais acções.' 25 - Mas percebe-se ainda mais que não é já o Governador Civil ou outra entidade competente, mas já uma parte interessada, neste caso em não ceder o espaço, a determinar se em Braga há ou não carência de espaços, o que se nos afigura

inaceitável.

26 - E a 27 de Abril, altura da primeira resposta da Teatro Circo, mesmo admitindo que tal resposta enforme num erro, como afirma no ofício enviado ao Governo Civil,

esta nada referiu sobre tal programação.

27 - Mas não é aceitável a justificação da programação publicitada ainda porque não basta, no entender da CDU, a referência abstracta a programação existente.

28 - De acordo com o Acórdão 467/09, do tribunal Constitucional, «não é atendível a Invocação de uma intensa agenda de actividades culturais do Centro Cultural de Vila Flor para fundamentar uma total indisponibilidade e afastar, ab initio, a utilização daquela sala de espectáculos, justamente porque o artigo 65.º coloca essa questão num momento posterior à requisição por parte do Governador Civil. Ou seja, a utilização de uma determinada sala de espectáculos não pode resultar em prejuízo da actividade normal e programada para a mesma (segmento final do n.º 1 do artigo 65.º), o que obriga, se for necessário, a conciliar a realização da acção da campanha pretendida

com os e ventos já programados.

Assim, o Theatro Circo de Braga e o Centro Cultural de Vila Flor, independentemente da comunicação de que não estão disponíveis para a campanha eleitoral, estão sujeitos à cedência do uso para fins de campanha eleitoral, desde que requisitados pelo

Governador Civil.»

29 - Atente-se ainda no entendimento da CNE sobre a matéria. Afirma a CNE, na decisão agora recorrida, que 'não procede a razão de que a programação do Teatro Circo para o quadrimestre Abril/Junho está definida e publicada, com espectáculos a 2 e 3 de Junho em vários espaços. Com efeito, consultada a página do Teatro Circo na lnternet, verifica-se que o único evento programado para o dia 2 de Junho - Histórias Magnéticas - se destina a crianças maiores de 6 anos. Logo, o horário do referido evento (apesar de não se encontrar ainda definido pelo Teatro Circo) não será incompatível com o da realização de um comício da CDU, o qual só terá afluência do

público em horário nobre.'

30 - Deveria então, a Administração do Teatro Circo clarificar em que é que tal espectáculo não é compatível com a realização do Comício da CDU.

31 - Na carta dirigida ao Governador Civil de Braga a 19 de Maio de 2011, portanto um dia depois da segunda comunicação do Governador Civil à CDU, e que este apresentou como prova no recurso, esta Administração acusa a CDU de não ter 'a mínima noção sobre a gestão dum espaço cultural' e de ter uma 'atitude preconceituosa' nos seus argumentos, ao contrário de 'um olhar profissional' do Teatro Circo.

32 - À parte a reveladora linguagem da Administração do Teatro Circo face a uma legítima pretensão de uma força política concorrente às eleições legislativas, aquela não fez qualquer contacto com a CDU, para conhecer as exigências técnicas do Comício no Teatro Circo para, em rigor, poder, de um ponto de vista profissional, decidir se as

duas iniciativas são ou não compatíveis;

33 - Aliás até se poderia afirmar que não seria a primeira vez que dois espectáculos se cruzam no Teatro Circo, como por exemplo nos dias 7 e 8 de Fevereiro deste ano, em que a peça 'O auto do inferno' e os filmes 'A coleccionadora' e 'O meu tio' foram apresentados no mesmo dia; ou no dia 23 de Março, em que a peça 'Frei Luís de Sousa' foi apresentada duas vezes e a peça 'Ultimo Acto', foi também apresentada nesse dia; ou no dia 24 de Março, em que, novamente 'Último Acto' foi apresentada e a peça 'Quem come a minha casinha' foi também apresentada duas vezes. Tudo isto de acordo com a agenda digital do Teatro Circo, disponível em http://www.theatrocirco.com/agenda/agendadigital.php. 34 - Como não diz em quê, em concreto é que elas são incompatíveis;

35 - Até porque continuamos apenas a conhecer que o espectáculo programado se destina a crianças de tenra idade, pelo que não é credível que se realize durante a noite, e que é limitado a uma lotação de trinta pessoas, pelo que não é credível que se realize no auditório principal que tem uma lotação de 900 lugares sentados.

36 - Donde, facilmente, se conclui que a invocação da programação é apenas uma forma de tentar impedir a realização do comício da CDU.

37 - A CDU sublinha que a 'violação de deveres dos proprietários de salas de espectáculos e dos que as exploram', é uma infracção relativa a campanha eleitoral, com pena de prisão até seis meses e multa, prevista no artigo 137.º da Lei Eleitoral da

Assembleia da República.

38 - Ao Governador Civil cabe assegurar os recintos necessários e adequados ao desenvolvimento normal da campanha dispondo, por isso mesmo, dos meios

adequados paro o efeito,

Pela exposto e por não terem fundamento legal, nem constitucional, as razões de não cedência do espaço requerido pela CDU, não deve ser dado provimento ao recurso interposto pelo Senhor Governador Civil."

3 - Consideram-se provados os factos seguintes, face ao que consta dos autos:

a) A CDU - Coligação Democrática Unitária, remeteu ao Governo Civil de Braga, no passado dia 21 de Abril, cópia do ofício enviado, no mesmo dia, ao Teatro Circo com o objectivo de pedir a disponibilização da sua sala principal para a realização, a 2 de Junho, de um comício integrado na campanha eleitoral para as eleições para a

Assembleia da República de 5 de Junho.

Em resposta datada de 27 de Abril, vem o Administrador Executivo do Theatro Circo, Rui Madeira, invocar ser "do conhecimento do Governo Civil e da CDU (em anteriores processos eleitorais) que, desde a sua reabertura, após o processo de renovação, tem sido orientação deste Conselho de Administração não ceder o equipamento para fins de campanha eleitoral ou eventos político-partidários." (doc. 1 em anexo).

E continua afirmando que a "programação do Teatro Circo para este quadrimestre (Abril/Junho) está definida e publicada, com espectáculos na data proposta (histórias magnéticas) espectáculos e ateliers, em vários espaços do Teatro Circo" (doc. 2).

Mais se acrescenta que a CDU insiste que não existem, na Cidade de Braga, espaços que constituam alternativa ao Teatro Circo de Braga.

Na data proposta está programado um espectáculo "Histórias magnéticas", mas, de acordo com a página internet do Teatro Circo (em http://www.Teatrocirco.com/agenda/evento.php?id=725), este realizar-se-á apenas a partir da meia-noite, e com um público-alvo limitado a 30 pessoas, pelo que não é de supor a utilização da sala principal do Teatro Circo.

b) O Governador Civil de Braga respondeu ao pedido informando que, por um lado, a Administração do Teatro Circo lhe havia comunicado que o espaço em questão não se encontrava disponível para fins de campanha eleitoral e eventos político-partidários e, por outro, que a programação do Teatro previa espectáculos, em vários espaços do

mesmo, nos dias 2 e 3 de Junho.

c) A CDU - Coligação Democrática Unitária interpôs recurso deste ofício do Governador - Civil de Braga para a Comissão Nacional de Eleições.

d) Em 17 de Maio de 2011, a CNE deliberou o seguinte sobre o recurso da CDU:

"No uso da competência estabelecida na alínea g) do n.º 1 do artigo 5.º da Lei 71/78, de 27 de Dezembro e nos termos e com os fundamentos constantes da presente Nota Informativa concede-se provimento ao recurso interposto pela CDU, nos termos e com os fundamentos constantes da presente Informação, determinando-se ao Senhor Governador Civil de Braga que proceda em conformidade com o disposto no artigo 65.º da Lei Eleitoral da Assembleia da República."

e) A "Nota Informativa" referida na deliberação da CNE é do seguinte teor:

"Exposição dos factos

No dia 16 de Maio p. p., a CDU apresentou recurso perante a CNE da decisão do Senhor Governador Civil de Braga por ter sido negada a cedência da sala principal do Teatro Circo de Braga para a realização de uma iniciativa de campanha eleitoral no âmbito da eleição da Assembleia da República nos termos e com os fundamentos que

se transcrevem:

A CDU - Coligação Democrática Unitária, remeteu ao Governo Civil de Braga, no passado dia 21 de Abril, cópia do ofício enviado, no mesmo dia, ao Teatro Circo com o objectivo de a disponibilização da sua sala principal para a realização, a 2 de Junho, de um Comício integrado na Campanha Eleitoral para as eleições para a Assembleia da

República de 5 de Junho.

Em resposta datada de 27 de Abril, vem o Administrador Executivo do Teatro Circo, Rui Madeira, invocar ser 'do conhecimento do Governo Civil e da CDU (em anteriores processos eleitorais) que, desde a sua reabertura, após o processo de renovação, tem sido orientação deste Conselho de Administração não ceder o equipamento para fins de campanha eleitoral ou eventos político-partidários' (doc. 1 em anexo).

E continua afirmando que a "programação do Teatro Circo para este quadrimestre (Abril/Junho) está definida e publicada, com espectáculos na data proposta (histórias magnéticas) espectáculos e ateliers, em vários espaços do Teatro Circo" (doc. 2).

Mais se acrescenta que a CDU insiste que não existem, na Cidade de Braga, espaços que constituam alternativa ao Teatro Circo de Braga...

Por outro lado, não colhe o argumento, agora adiantado, de que a programação do Teatro Circo está definida e publicada, uma vez que o pedido específico que foi dirigido foi para a sala principal que, é público, está disponível. De facto, na data proposta está programado um espectáculo "Histórias magnéticas", mas, de acordo com

a página internet do Teatro Circo (em

http://www.Teatrocirco.com/agenda/evento.php?id=725), este realizar-se-á apenas a partir da meia-noite, e com um público-alvo limitado a 30 pessoas, pelo que não é de supor a utilização da sala principal do Teatro Circo.

Entende o agora recorrente que não basta à Administração do Teatro Circo invocar um programa existente, sem comprovar que ele é, de facto, incompatível com a iniciativa

eleitoral a realizar.

Nem compreende como, havendo espectáculos previamente programados, a Administração não adiantou à partida essa justificação.

Tendo o Governador Civil respondido hoje, 9 de Maio, à CDU, acompanhando os argumentos da Administração do Teatro Circo, de "não se encontrar o referido espaço disponível para fins de campanha eleitoral e eventos político-partidários" (doc. 3), vem a CDU - Coligação Democrática Unitária, recorrer da decisão do Governador Civil de Braga de não garantir à CDU - como lhe compete, ao abrigo da Lei Eleitoral para a Assembleia da República, em vigor - a possibilidade de utilização da sala principal do Teatro Circo, em Braga, no próximo dia 2 de Junho, entre as 15h e as 24h, para a realização de um comício eleitoral integrado na campanha eleitoral para as Eleições para a Assembleia da República de 5 de Junho. (cf. anexo) Do ofício do Senhor Governador Civil, que vinha a instruir o recurso apresentado,

consta o seguinte:

Relativamente ao pedido de cedência do Teatro Circo para realização de uma sessão de campanha eleitoral para a Assembleia da República, no próximo dia 2 de Junho, informo que a Administração do Teatro Circo comunicou a este Governo Civil não se encontrar o referido espaço disponível para fins de campanha eleitoral e eventos

político-partidários.

Mais comunicou a referida Administração que a programação do Teatro Circo para o quadrimestre Abril/Julho está definida e publicada, com espectáculos a 2 e 3 de Junho

em vários espaços do Teatro Circo.

Enquadramento legal e análise jurídica

Em matéria de propaganda eleitoral, as leis eleitorais garantem às candidaturas recursos específicos de campanha, concedendo-lhes o direito à utilização de meios diversos e assegurando uma igualdade no acesso a condições de realização de propaganda.

De entre os vários meios, as candidaturas têm direito à utilização de edifícios e recintos públicos, bem como de salas de espectáculos ou de outros recintos de normal utilização pública, para os fins da campanha eleitoral, nos termos que se encontram definidos, respectivamente, nos artigos 68.º e 65º da LEAR.

No que se refere às salas de espectáculos ou de outros recintos de normal utilização pública, cabe, em primeira linha, aos proprietários dos mesmos declarar ao Governador Civil/Representante da República que reúnem condições para serem utilizados na campanha eleitoral. Na falta de declaração ou em caso de comprovada carência, podem as referidas entidades públicas requisitar as salas e os recintos que considerem necessários à campanha eleitoral (cf. n.º 1 do referido artigo 65.º).

Estas previsões legais são expressão das garantias acrescidas que o legislador atribui a todas as candidaturas durante o período de campanha eleitoral, criando condições para uma efectiva liberdade de propaganda e de igualdade de oportunidades e de tratamento das candidaturas, princípios com assento constitucional no n.º 3 do artigo 113.º da

CRP.

Com efeito, a campanha eleitoral é um período especialmente destinado ao esclarecimento e à mobilização eleitoral e caracteriza-se por um regime especial de que gozam as candidaturas no que respeita a certos direitos e liberdades, designadamente no reforço do direito de reunião para fins eleitorais e no acesso a meios específicos para o prosseguimento de actividades de propaganda (como por exemplo, o direito de antena ou a utilização de salas de espectáculos e edifícios ou recintos públicos).

Deste modo, as entidades públicas referidas nos artigos 65.º e 68º estão obrigadas a respeitar e a dar satisfação aos direitos aí consignados, actuando de forma a permitir o exercício daqueles direitos por parte das forças políticas.

No caso em análise, foi negada a cedência de um espaço para a realização de uma iniciativa de campanha eleitoral da CDU - a sala principal do Teatro Circo de Braga.

O Senhor Governador Civil de Braga fundamentou a decisão de não cedência em duas

razões:

No facto de a Administração do Teatro Circo ter comunicado ao Governo Civil que o espaço em causa não se encontra disponível para fins de campanha eleitoral e eventos

político-partidários;

Bem como, no facto da mesma entidade ter comunicado que em vários espaços do Teatro Circo estão agendados espectáculos para os dias 2 e 3 de Junho.

Ora, tais razões não são atendíveis.

A primeira não tem cobertura legal porquanto o artigo 65.º da LEAR destina-se a qualquer sala de espectáculo que, objectivamente, reúna as condições para ser utilizada na campanha eleitoral, o que afasta, desde logo, qualquer razão de índole subjectiva, como por exemplo, a de assumir uma posição de não cedência para fins

político-partidários.

Como refere o Tribunal Constitucional, no Acórdão proferido em 22 de Setembro de 2009 (Ac. n.º 467/09), o referido preceito legal é claro quando impõe um dever de declaração dos proprietários das salas de espectáculo ao Governador Civil, prevendo, na sua falta, a requisição por parte desta entidade pública, responsabilizando-o, de modo a promover o exercício do direito concedido às candidaturas.

E continua, esse dever de disponibilização incide sobre todos os titulares de salas de espectáculos, sem prejuízo da actividade normal e programada para as mesmas, desde que tais recintos reúnam condições para tais acções. Constitui um limite à liberdade contratual, justifica do pelo interesse público das campanhas eleitorais cujos princípios assumem foros de relevância constitucional (artigo 113.º da CRP). Assim, dificilmente poderia aceitar-se a subtracção a tal dever com alegações semelhantes àquela que apresentou a entidade proprietária ou gestora do "Teatro Circo" de não ceder o espaço para iniciativas político-partidárias... admitir tal tipo de escusa equivaleria a esvaziar praticamente o dever de cedência. Se tal tipo de justificação prosperasse, todas as salas de espectáculos poderiam ser subtraídas à disponibilização para acções de campanha porque a fórmula a todas poderia aplicar-se.

Do mesmo modo, não procede a razão de que a programação do Teatro Circo para o quadrimestre Abril/Junho está definida e publicada, com espectáculos a 2 e 3 de Junho

em vários espaços.

Com efeito, consultada a página do Teatro Circo na internet, verifica-se que o único evento programado para o dia 2 de Junho - Histórias Magnéticas - se destina a crianças maiores de 6 anos (cf. anexo 2). Logo, o horário do referido evento (apesar de não se encontrar ainda definido pelo Teatro Circo) não será incompatível com o da realização de um comício da CDU, o qual só terá afluência do público em horário

nocturno.

Acresce referir que o Teatro Circo é composto por vários espaços e equipamentos:

sala principal, pequeno auditório, salão nobre, foyer e outros. Ora, tratando-se aquele evento de um concerto, seguido de um atelier em que as crianças desenvolverão determinadas actividades, o mesmo não teria lugar na sala principal, encontrando-se, aliás, a indicação de que se realiza em "outros" espaços (cf. anexo 2).

Deste modo, não se conhecem, nem foram invocadas razões que possam demonstrar e fundamentar qualquer prejuízo da actividade normal e programada do Teatro Circo.

Aliás, se esse fosse o motivo invocado se o mesmo fosse devidamente comprovado, sempre se esperaria, pelo menos, a indicação de uma alternativa à realização da acção

de campanha da CDU.

Conclusão

Pelo exposto, conclui-se que a decisão do Senhor Governador Civil, nos termos dos artigos 124.º, 133º e 134º do Código do Procedimento Administrativo, é nula por falta

de fundamentação.

Pelo que se propõe ao Plenário que conceda provimento ao recurso apresentado pela CDU e determine ao Senhor Governador Civil que proceda em conformidade com a lei eleitoral, em especial com o disposto no artigo 65.º da Lei Eleitoral da Assembleia da

República."

II - Fundamentação

4 - Cumpre analisar o objecto do recurso contencioso. Compulsado o ofício do Governador Civil de Braga sobre que incidiu o recurso para a Comissão Nacional de Eleições, constata-se que o mesmo, em conformidade com o que vem alegado no recurso dirigido a este Tribunal não apresenta qualquer conteúdo decisório. Ao invés, limitou-se a comunicar à CDU as informações que lhe haviam sido prestadas pelo Administrador do Theatro Circo de Braga. Deste modo, não possuindo tal ofício um carácter injuntivo, antes revestindo um mero teor informativo, não constitui o mesmo um acto administrativo definitivo do Governador Civil, relativo à utilização da referida sala

de espectáculos.

Não constitui um acto administrativo materialmente definidor do exercício dos poderes que a lei confere ao Governador Civil com vista à utilização do aludido espaço cultural.

Assim, a deliberação da Comissão Nacional de Eleições que integra o objecto do presente recurso incide sobre um acto que não é susceptível de recurso, ao abrigo do artigo 5.º, n.º 1, alínea g) da Lei 71/78, de 27 de Dezembro, por falta de conteúdo decisório, restando ao Tribunal Constitucional decretar a respectiva anulação.

III - Decisão

5 - Pelo exposto decide-se conceder provimento ao presente recurso, anulando a

deliberação recorrida.

Lisboa, 24 de Maio de 2011. - José Borges Soeiro - Vítor Gomes - Maria Lúcia Amaral - João Cura Mariano - Carlos Pamplona de Oliveira - J. Cunha Barbosa - Catarina Sarmento e Castro - Carlos Fernandes Cadilha (vencido, por considerar que o ofício de 4 de Maio de 2011 do Governador Civil de Braga, embora aparentando constituir um acto de informação, representa o exercício da competência própria dessa entidade que lhe é conferida pelo artigo 65 n.º 1 da LEAR, devendo interpretar-se como uma efectiva recusa de cedência de um recinto para utilização em campanha eleitoral, corporizando um acto susceptível de recurso para a CNE ao abrigo da alínea g) do n.º 1 do Decreto-Lei 71/78, de 27 de Dezembro. Nestes termos, teria conhecido da matéria de fundo) - Gil Galvão.

204747057

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2011/06/07/plain-284387.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/284387.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1978-04-12 - Decreto-Lei 71/78 - Presidência do Conselho de Ministros

    Estabelece disposições relativas à designação do presidente da Comissão Organizadora das Comemorações do Dia da Liberdade e a competência para autorização de despesas previstas no Decreto Lei 39-A/78, de 2 de Março.

  • Tem documento Em vigor 1978-12-27 - Lei 71/78 - Assembleia da República

    Cria a Comissão Nacional de Eleições e estabelece a sua natureza, composição e competências.

  • Tem documento Em vigor 1979-05-16 - Lei 14/79 - Assembleia da República

    Aprova a lei eleitoral para a Assembleia da República.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

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