Decreto-Lei 45685
Os abalos sísmicos violentos ocorridos recentemente na ilha de S. Jorge ocasionaram estragos muito importantes nas edificações situadas na parte ocidental da ilha, do concelho das Velas, e criaram perturbação grave na vida económica e social da população.
Assim, o número das habitações danificadas pelos sismos é superior a 900. Destas, cerca de 400, na sua grande maioria pertencentes a trabalhadores rurais, podem considerar-se destruídas; e mais de 250 carecem de grandes reparações para poderem voltar a ser utilizadas.
Por outro lado, foram muitos os edifícios públicos e de interesse público, sobretudo na vila das Velas, que sofreram grandes prejuízos, que em vários casos implicam a reconstrução total. Verificaram-se ainda estragos de alguma importância nas vias de comunicação e serviços de abastecimento público.
A par destes danos materiais, há que referir a profunda desorganização da vida social resultante da paralisação dos serviços públicos e da forçada deslocação de uma parte importante da população para outras áreas da ilha e para a Terceira, como única maneira de alojar, em condições de segurança e de conforto satisfatórias as famílias cujas habitações foram mais rudemente atingidas.
Em presença da extensão dos prejuízos, reconheceu o Governo a necessidade de providências especiais e urgentes, com o fim de restabelecer o mais ràpidamente possível as condições normais da vida das populações atingidas, habilitando ao mesmo tempo as autoridades locais a prolongar, enquanto for necessário, as medidas de emergência diligentemente empreendidas desde o primeiro momento em benefício daquelas populações.
É para este efeito aprovado pelo presente diploma um plano de acção imediata, para cuja execução são assegurados os meios financeiros indispensáveis e estabelecidas as demais disposições especiais que se mostram convenientes.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º Fica o Governo autorizado a despender até ao montante de 21250000$00 com a execução das medidas necessárias para ocorrer aos estragos e prejuízos causados pelos abalos sísmicos na ilha de S. Jorge, em conformidade com o plano enunciado no artigo seguinte e nos termos das demais disposições do presente diploma.
Art. 2.º O plano a que se refere o artigo 1.º compreende:
a) Edificação e urbanização:
Reconstrução, grande reparação e beneficiação dos edifícios públicos e de interesse público, bem como das habitações rurais e outras, quando se prove que os seus proprietários não se encontram em condições económicas de por si próprios custearem as obras ou de recorrer aos subsídios reembolsáveis previstos no artigo 10.º
Execução dos trabalhos de urbanização necessários.
b) Obras públicas:
Reparação de estradas e caminhos, incluindo a reconstrução e reparação de obras de arte e de muros.
Reparação de redes de abastecimento de água e outras instalações do serviço público.
Construção de pavilhões desmontáveis para alojamento imediato das populações sinistradas e para substituição provisória das escolas primárias destruídas.
c) Recuperação económica:
Fornecimento de forragens, rações e medicamentos para o gado nas áreas devastadas. Prestação de assistência técnica aos agricultores para a reconstituição das culturas destruídas, incluindo cedência do equipamento mecânico e fornecimento de adubos.
d) Assistência:
Fornecimento de alimentos, medicamentos, roupas e artigos de vestuário, artigos de equipamento doméstico e outras modalidades de assistência às populações sinistradas, incluindo o alojamento provisório e o transporte para os locais de trabalho das famílias cujas habitações ficaram inutilizáveis.
Art. 3.º A execução dos trabalhos compreendidos na alínea a) do plano será confiada a uma delegação da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, com sede na ilha de S. Jorge.
§ 1.º A delegação será constituída por pessoal destacado dos serviços do Ministério das Obras Públicas ou requisitado a outros serviços do Estado, das juntas gerais dos distritos autónomos e das respectivas câmaras municipais, ou ainda por pessoal contratado ou assalariado nas condições que forem estabelecidas pelo Ministro das Obras Públicas.
§ 2.º Os funcionários destacados ou requisitados considerar-se-ão em comissão de serviço pelo tempo que for fixado por despacho do Ministro das Obras Públicas ou por despacho conjunto dos Ministros competentes, quando se trate de requisição. O serviço prestado na delegação será contado, para todos os efeitos legais, como se nos respectivos quadros de origem se mantivessem.
§ 3.º Ao chefe da delegação e ao restante pessoal destacado ou requisitado serão abonadas gratificações a fixar pelo Ministro das Obras Públicas, com a aprovação do Ministro das Finanças.
§ 4.º A delegação requisitará mensalmente as dotações que forem necessárias para o regular andamento dos trabalhos de harmonia com os programas aprovados, sendo-lhe atribuído um fundo permanente correspondente a dois duodécimos.
§ 5.º As importâncias processadas a favor da delegação serão depositadas, à sua ordem, na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, na cidade de Angra do Heroísmo.
Todos os documentos relativos a levantamento de fundos, recebimentos e pagamentos serão assinados pelo chefe e pelo encarregado da contabilidade da delegação.
§ 6.º O chefe da delegação e o encarregado da contabilidade, como responsáveis pela administração, prestarão contas da sua gerência ao Tribunal de Contas, através da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização.
§ 7.º Os saldos resultantes das dotações que não forem totalmente gastas em cada ano transitarão para o ano seguinte.
§ 8.º Poderá o chefe da delegação autorizar despesas com obras ou com aquisição de material até 100000$00, com dispensa de quaisquer formalidades legais.
Art. 4.º A execução dos trabalhos abrangidos pela alínea b) do plano será assegurada pela Junta Geral do Distrito Autónomo de Angra do Heroísmo, com a colaboração da Câmara Municipal de Velas no que respeitar a trabalhos municipais.
Art. 5.º A execução das medidas a que se refere a alínea c) do plano, no âmbito dos recursos atribuídos por este diploma, será assegurada pelos serviços competentes do Ministério da Economia com o concurso da Junta Geral do Distrito Autónomo de Angra do Heroísmo que for julgado conveniente.
Art. 6.º Fica a cargo do governador do distrito autónomo de Angra do Heroísmo a execução das medidas incluídas na alínea d) do plano.
§ 1.º Os serviços do Ministério da Saúde e Assistência prestarão ao governador toda a possível colaboração, nos termos das instruções que receberem do respectivo Ministro.
§ 2.º O pessoal dos serviços do Ministério da Saúde e Assistência que for deslocado para efeitos do disposto neste artigo terá direito às ajudas de custo estabelecidas na lei, durante todo o tempo em que se encontrar deslocado.
Art. 7.º Ao pessoal a contratar ou assalariado para os fins do presente diploma que à data do contrato ou assalariamento não resida na ilha de S. Jorge serão satisfeitas as competentes despesas de transporte desde o local de embarque. Este pessoal e o destacado ou requisitado ao abrigo do § 1.º do artigo 3.º e § 1.º do artigo 6.º beneficiarão do disposto no Decreto-Lei 44932, de 25 de Março de 1963.
Art. 8.º As despesas gerais inerentes à execução das diferentes alíneas do plano serão suportadas pelas dotações a este destinadas, mas não poderão exceder para cada alínea 10 por cento do respectivo total efectivamente despendido.
Art. 9.º A distribuição da importância global fixada no artigo 1.º pelas diferentes alíneas do plano e o escalonamento das respectivas anuidades obedecerão ao estabelecido pelo seguinte mapa:
(ver documento original)
§ 1.º As anuidades das dotações consignadas às alíneas a) e b) do plano serão inscritas, sob rubricas especiais, no capítulo destinado a "Outros investimentos» do orçamento da despesa extraordinária do Ministério das Obras Públicas, para serem utilizadas em conformidade com o disposto nos artigos 3.º e 4.º, mediante programas e projectos a aprovar pelo Ministro das Obras Públicas.
A dotação a que se refere a alínea b) será posta à disposição da Junta Geral do Distrito Autónomo de Angra do Heroísmo, como subsídio não reembolsável, mediante simples despacho do Ministro das Obras Públicas, que fixará o respectivo programa de aplicação, através de folha processada pela Secretaria-Geral do Ministério.
A Junta Geral entregará à Câmara Municipal de Velas as importâncias correspondentes à parte do programa que lhe competir.
§ 2.º A dotação relativa à alínea c) do plano será inscrita no orçamento da despesa extraordinária do Ministério da Economia, para ser utilizada de harmonia com as condições que forem estabelecidas pelo Secretário de Estado da Agricultura.
§ 3.º A dotação correspondente à alínea d) do plano será utilizada sob a forma de subsídio não reembolsável custeado pelo Fundo do Socorro Social, que será posto à disposição do governador do distrito autónomo de Angra do Heroísmo, mediante simples despacho do Ministro do Interior, pelas verbas afectas ao seu Ministério e na parte correspondente a 1000 contos, e do Ministro da Saúde e Assistência, quanto ao restante.
Desta dotação serão destinados 600 contos à cobertura dos encargos com a construção dos pavilhões desmontáveis incluídos na alínea b) do plano a que se refere o artigo 2.º
§ 4.º Serão igualmente entregues ao governador do distrito autónomo de Angra do Heroísmo, para os fins constantes da alínea d) do plano, os produtos dos donativos e subsídios de quaisquer entidades consignados à assistência às famílias sinistradas da ilha de S. Jorge.
O respectivo saldo, se o houver, reverterá a favor das restantes alíneas do plano em benefício da intervenção do Tesouro e do Fundo de Desemprego, na proporção adequada, respeitadas as condições que tiverem sido impostas pelas entidades doadoras.
Art. 10.º Independentemente do disposto nos artigos anteriores, fica o Ministro das Obras Públicas autorizado a conceder pelo Fundo de Desemprego, por intermédio do governador do distrito autónomo de Angra do Heroísmo, subsídios reembolsáveis até ao montante global de 5000 contos aos proprietários das edificações danificadas pelos sismos não abrangidas pela alínea a) do plano a que se refere o artigo 2.º e cuja situação económica justifique esta modalidade de assistência do Estado.
§ 1.º O montante global indicado no corpo deste artigo poderá ser eventualmente reforçado com os saldos que se verificarem na dotação consignada à alínea a) do plano.
§ 2.º Para poderem beneficiar do subsídio reembolsável nos termos deste artigo, os proprietários deverão formular a sua pretensão no prazo máximo de 90 dias, a partir da data do presente diploma, em requerimento dirigido ao governador do distrito autónomo de Angra do Heroísmo.
Os respectivos processos individuais, devidamente instruídos, serão submetidos à decisão do governador do distrito autónomo de Angra do Heroísmo, depois de sobre eles prestar a sua informação técnica a delegação da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, e de se encontrar junto o inquérito social realizado pelo Instituto de Assistência à Família.
§ 3.º Os proprietários beneficiários das disposições deste artigo ficam sujeitos às condições que forem fixadas no despacho que conceder o subsídio e à fiscalização técnica da delegação da Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, variando o prazo de reembolso em função da situação económica dos beneficiários.
§ 4.º A câmara municipal procederá nos termos das disposições aplicáveis do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei 38382, de 7 de Agosto de 1951, relativamente às construções cujas obras de reparação dos estragos causados pelos sismos não forem iniciadas e concluídas em prazo conveniente.
§ 5.º O Ministro do Interior, ouvidos os Ministros das Obras Públicas e da Saúde e Assistência no que se relacionar com as atribuições de um e de outro, estabelecerá as disposições regulamentares que forem necessárias para a satisfatória aplicação do disposto neste artigo.
Art. 11.º O encargo do Fundo do Desemprego resultante do disposto no artigo anterior não excederá o montante de 2000 contos em cada um dos anos de 1964 e 1965 e o de 1000 contos em 1966 acrescido do saldo verificado nos anos anteriores.
Art. 12.º As benfeitorias realizadas ao abrigo deste diploma em prédios de arrendamento não poderão ser consideradas para efeito de actualização do montante das rendas, nos termos da respectiva legislação, salvo quando o proprietário tiver indemnizado o Estado da quantia por ele despendida ou amortizado a dívida contraída ao abrigo do artigo anterior.
§ único. Para os efeitos do disposto no corpo deste artigo, serão averbados na Conservatória do Registo Predial o montante e a natureza do subsídio do Estado e, no caso de este ser reembolsável, o respectivo prazo de reembolso.
Este averbamento será cancelado mediante simples apresentação do documento comprovativo de estarem realizadas as condições referidas no final do corpo deste artigo.
Art. 13.º Os encargos do Tesouro com a execução do plano a que se refere o presente diploma, no montante de 5000 contos em cada um dos anos de 1964, 1965 e 1966, poderão ser custeados pelas disponibilidades existentes em saldos de contas de anos económicos findos.
§ único. O Fundo do Desemprego entrará nos cofres do Estado com as importâncias de 1500, 2000 e 1500 contos, respectivamente nos anos de 1964, 1965 e 1966, como comparticipação nas despesas das alíneas a) e b) do plano a que se refere o artigo 2.º
Art. 14.º É concedida isenção de direitos, nos termos da legislação aplicável, dos emolumentos gerais dos artigos 11.º, 12.º, 14.º e 19.º da tabela II anexa à Reforma Aduaneira; aprovada pelo Decreto-Lei 31665, de 22 de Novembro de 1941, e bem assim de quaisquer operações de natureza aduaneira ou outras cobradas pela autoridade portuária do local de desembarque, aos materiais, máquinas, utensílios ou viaturas de qualquer procedência que sejam adquiridos para os fins do presente diploma.
Quando tais produtos sejam de origem estrangeira a aplicação do disposto neste artigo é condicionada à impossibilidade da sua aquisição na indústria nacional em razoáveis condições de preço e qualidade ou dentro dos prazos previstos para a sua entrega.
§ 1.º Os serviços interessados enviarão à Direcção-Geral das Alfândegas listas, em quadruplicado, discriminativas do material de cada remessa, acompanhadas de informação que mencione o contrato ou a autorização ministerial ao abrigo dos quais é feita a importação e confirme que aquele material se destina aos fins deste decreto-lei.
§ 2.º É concedida a isenção das taxas e impostos municipais relativas às obras a realizar para a execução do plano a que se refere o artigo 2.º
Art. 15.º É declarada, sem mais formalidades, a utilidade pública urgente das expropriações necessárias à execução do presente diploma.
Art. 16.º Este diploma entra imediatamente em vigor.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 27 de Abril de 1964. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira - Manuel Gomes de Araújo - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior - João de Matos Antunes Varela - António Manuel Pinto Barbosa - Joaquim da Luz Cunha - Fernando Quintanilha Mendonça Dias - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - Eduardo de Arantes e Oliveira - António Augusto Peixoto Correia - Inocêncio Galvão Teles - Luís Maria Teixeira Pinto - Carlos Gomes da Silva Ribeiro - José João Gonçalves de Proença - Francisco Pereira Neto de Carvalho - Luís Le Cocq de Albuquerque de Azevedo Coutinho.