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Acórdão 680/2015, de 28 de Abril

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Sumário

Não julga inconstitucional a norma contida no artigo 772.º, n.º 2, do anterior Código de Processo Civil, na parte em que estabelece um prazo de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, e cujo decurso preclude a interposição do recurso extraordinário de revisão, com o sentido de «excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal»

Texto do documento

Acórdão 680/2015

Processo 681/14

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I - Relatório

1 - Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto (TRP), em que é recorrente o Ministério Público e recorrido António Colaço Pinto, o primeiro interpôs recurso, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a) e 72.º n.os 1, alínea a) e 3, da Lei 28/82, de 15 de novembro (LTC), do acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20 de maio de 2014 (de fls. 165-182) que, não aplicando a norma do n.º 2 do artigo 772.º do Código de Processo Civil (versão anterior ao aprovado pela Lei 41/2013, de 26 de junho), julgou procedente o recurso interposto, pelo ora recorrido, do despacho (de 22/10/2012) que não admitiu o recurso de revisão, por si interposto, de sentença proferida em primeira instância (em 25/06/1990) que, em acção de investigação da paternidade, declarou o ora recorrido pai biológico do então menor C… - assim revogando a decisão então recorrida e determinando a prolação de despacho que admita liminarmente o recurso de revisão e o prosseguimento dos autos.

2 - Com interesse para o caso sub judice, resulta dos autos o que de seguida se enuncia.

2.1 - Em 26 de junho de 1990, foi proferida sentença a declarar que o, então menor, C…, é filho do ora recorrido.

De tal decisão não foi então interposto recurso, tendo a mesma transitado em julgado.

A decisão sobre a matéria de facto aí proferida fundamentou-se nas declarações da mãe do menor e no depoimento das testemunhas indicadas por aquela.

A paternidade do réu foi aí declarada com fundamento na manutenção de relações sexuais com a mãe do menor durante o período legal de conceção e na exclusividade de tais relações.

2.2 - O pedido de interposição de recurso de revisão, daquela decisão de 26/06/1990, formulado pelo ora recorrido, deu entrada no Tribunal da Relação do Porto por requerimento enviado por via eletrónica a 10 de outubro de 2012.

Nesse recurso, o ora recorrido veio alegar que:

nunca foi pai biológico de C…, motivo pelo qual contestou aquela ação; durante estes anos todos, nunca reconheceu, de facto, tal paternidade, nem nunca privou ou manteve qualquer contato com C…ou com a mãe do mesmo; na referida ação nunca foi feito qualquer teste científico para apuramento da paternidade, nomeadamente testes sanguíneos de paternidade ABO/ RH ou testes de ADN; a prova produzida foi reduzida somente aos depoimentos da mãe daquele e de alguns familiares chegados; o respeito pela verdade biológica impõe a imprescritibilidade não só do direito de investigar, como do de impugnar; pretende demonstrar que os factos que serviram de fundamento à decisão não ocorreram e são incompatíveis com aqueles que emergirão do resultado dos exames que se pretende sejam realizados; fundamentou o recurso no disposto na alínea b) do artigo 771.º do Código de Processo Civil e na interpretação extensiva do disposto na alínea c), da referida norma.

O recurso não foi admitido pelo juiz a quo, nos termos do despacho proferido em 22/10/2012 (cf. fls. 16):

«

B…veio interpor recurso de revisão da sentença proferida em 25/06/1990 e da qual não foi interposto recurso ordinário, tendo, por isso, transitado em julgado.

Com a interposição do recurso deve o requerente alegar os factos constitutivos do fundamento do recurso, que são exclusivamente os elencados no artigo 771.º do Código de Processo Civil (cf., artigo 773.º do mesmo diploma legal).

O tribunal a que for dirigido o recurso indefere-o quando não tenha sido instruído nos termos do artigo 773.º ou quando reconheça, de imediato, que não motivo para revisão.

Ora, neste caso, vistos os fundamentos do recurso invocados pelo recorrente, logo se constata que os mesmos não se enquadram no elenco do artigo 771.º do Código de Processo Civil, pelo que se conclui que o recurso não foi devidamente instruído nos termos estipulados pelo artigo 773.º do mesmo diploma, não existindo motivo para revisão.

Pelo exposto, ao abrigo do previsto no artigo 774.º, n.º 1, do CPC, indefere-se o requerimento de recurso interposto.

»

2.3 - Inconformado com tal decisão, o recorrente interpôs recurso de apelação da mesma, concluindo a respetiva motivação com as seguintes conclusões (cf. fls. 18-25):

«

1 - O que interessa é a verdade biológica e não a interpretação formalista levada a cabo pelo Juiz, que violou o disposto nos arts. 771.º, als. b) e c) e 773.º do CPC.

2 - Já que ao tempo não era possível a realização de testes e exames científicos quer de exclusão de paternidade quer de fixação de paternidade como hoje em dia há.

3 - E nem os então existentes, testes ou exames de exclusão de paternidade foram feitos. O M.P. não os requereu e o Recorrente, por ignorância e manifesta insuficiência económica, também não.

4 - O que colocou a decisão de atribuir a paternidade ao recorrente na análise da prova testemunhal, indireta.

5 - Deve pois proceder o presente recurso e ser ordenada a realização de exames de sangue e quaisquer outros métodos cientificamente comprovados a fim de ser estabelecida, com rigor, a paternidade, ou não do recorrente.

6 - Se assim não for entendido, desde já o recorrente suscita a inconstitucionalidade do artigo 771.º, als. b) e c), do CPC, por violação do disposto ns. ns. 1 e 4, do artigo 20.º da CRP.

»

Citados o filho do recorrente e o Ministério Público, apenas este apresentou contraalegações, defendendo a manutenção da decisão, invocando ainda a extemporaneidade do recurso de revisão.

Convidado pelo juiz relator a pronunciar-se sobre a questão da caducidade do direito de interpor recurso de revisão, o Apelante veio invocar a inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 772.º do CPC, por violação do disposto nos arts. 18.º, n.º 3, 26.º, n.º 1 e 36.º da CRP.

O Tribunal da Relação do Porto, decidindo o recurso de apelação deduzido contra o despacho de não admissão do recurso de revisão interposto pelo ora recorrido, julgou procedente o recurso, revogando a decisão então recorrida e determinando que fosse proferido despacho a admitir liminarmente o recurso, prosseguindo os autos nos termos previstos no n.º 2 do artigo 774.º do [anterior] CPC.

Para o efeito, concluíram os Juízes que

«

[...] no caso em apreço, não é de negar ao recorrente o direito de efetuar esta “prova dos nove”, quanto à paternidade em causa, apenas porque decorreram mais de cinco anos desde o trânsito em julgado da decisão que o declarou como pai, considerando-se que os interesses em jogo - confronto entre bens constitutivos da personalidade e a garantia da segurança jurídica - justificam [...], no caso em apreço, a recusa da aplicação de tal prazo de caducidade [previsto no n.º 2 do artigo 772.º, do [anterior CPC], por violação do princípio fundamental à identidade pessoal contido no artigo 26.º da CRP em conjugação com os arts. 16.º, n.º 1, 18.º, n.º 1, e 36.º, n.º 1, todos da CRP

»

.

3 - É este o teor do Acórdão do TRP, de 20 de maio de 2014, ora recorrido para este Tribunal (cf. fls. 165-182 e, em especial, fls. 167 e ss.):

«

[...]

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso - cf., artºs. 684.º, n.º 3 e 685.º-A, do Código de Processo Civil[1], [1 Tratando-se de decisão proferida antes da entrada em vigor do novo código, aprovado pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, em ação instaurada depois de 1 de Janeiro de 2008, aplicar-se-á o regime de recursos vigente à data da sua prolação - cf., neste sentido, António Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina 2013, pág. 15, e João Correia, Paulo Pimenta e Sérgio Castanheira, “Introdução ao Estudo e à Aplicação do Código de Processo Civil de 2013”, Almedina, pág. 118.] as questões a decidir são as seguintes:

1 - Se se verificam os pressupostos de interposição do recurso de revisão.

2 - Caducidade do direito de interpor recurso de revisão - Inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 772.º do CPC.

III - APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

[...] 1 - Pressupostos de interposição do recurso de revisão. O recorrente interpôs o presente recurso de revisão da sentença transitada em julgado que o declarou pai biológico do então menor, C…, ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 771.º do CPC e na interpretação extensiva da alínea c) da citada norma, alegando, em síntese, que o registo da paternidade não corresponde à verdade biológica, tendo a decisão assentado unicamente em prova indireta - no depoimento da mãe e de alguns familiares chegados-, requerendo agora a realização de exames científicos de paternidade.

O Juiz a quo indeferiu liminarmente o recurso, com fundamento em que o mesmo não preenche qualquer um dos fundamentos previstos no artigo 771.º do CPC, não se encontrando devidamente instruído nos termos estipulados no artigo 773.º O recurso extraordinário de revisão visa anular uma decisão com fundamento em vícios próprios ou do respetivo procedimento, comportando-se como uma verdadeira ação com um duplo objetivo:

o primeiro, de verificar a existência de qualquer vício na decisão transitada ou no processo a ela conducente - juízo rescindente; o segundo, de substituir a decisão proferida através da repetição da instrução e julgamento da ação - juízo rescisório.

No recurso extraordinário de revisão, do que se trata é de apurar se algum fundamento justifica a destruição da decisão transitada em julgado e, em caso afirmativo, de refazer a decisão impugnada.

Segundo o artigo 771.º, do CPC, a decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão nos casos aí taxativamente previstos, entre os quais se destacam os seguintes:

[...] b) Se verifique a falsidade de documento ou ato judicial, de depoimento ou das declarações de peritos ou árbitros, que possam em qualquer dos casos, ter determinado a decisão a rever, não tendo a matéria sido objeto de discussão no processo em que foi proferida. c) Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, só por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

[...].

Enquanto na alínea b) se aponta a falsidade (do ato judicial, ou do depoimento de alguma testemunha) como fundamento da revisão, a alínea c), apresenta como fundamento a apresentação de documento superveniente.

Quanto à falsidade, com o DL 38/2003, de 8 de março, deixou de se exigir a propositura de uma ação autónoma para verificar a falsidade do meio de prova ou ato judicial ou para declarar a nulidade ou anular a confissão, desistência ou transação em que a sentença se tivesse fundado. Ao contrário do que antes acontecia, deixou de ser necessário que qualquer das falsidades seja atestada por sentença prévia, podendo a prova de tal falsidade ser feita na fase rescindente do recurso de revisão (arts. 774.º, n.º 2, e 775.º, n.º 2)[2]. [2 Cfr., quanto a tal questão, José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 3.º, 2.ª ed. Coimbra Editora 2008, pág. 221, Luís Filipe Brites Lameiras, “Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil”, Almedina, pág. 196.] Como salienta Fernando Amâncio Ferreira[3], [3 “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 9.ª ed., Almedina, pág. 334.] não é suficiente a verificação de uma qualquer das quatro falsidades mencionadas para que possa haver revisão. É ainda condição essencial que haja um nexo de causalidade entre a peça falsa e a decisão revidenda; quer dizer, é necessário que a decisão se baseie na prova viciada, ou que ela tenha determinado a decisão que se pretende rever.

O documento superveniente - que se formou ulteriormente ao trânsito em julgado da decisão revidenda, ou de que a parte não tivesse conhecimento ou não pudesse ter feito uso no processo onde foi proferida a decisão - que se junte para alicerçar a revisão, terá de fazer prova plena e inabalável do facto relevante, só por si suficiente para modificar a decisão transitada em julgado. Como refere Luís Lameiras, estamos no patamar da prova legal vinculada - da prova plena - à qual é, em absoluto alheio, qualquer tipo de julgamento de facto produzido pelo julgador à luz da sua liberdade de apreciação (artigo 655.º):

o julgamento - quanto ao pertinente documento - se bem que com reflexo no facto, é de direito, produzido pela própria lei.

No caso em apreço, alegando que a decisão recorrida assentou unicamente no depoimento da mãe e de alguns familiares, o autor pretende no presente recurso fazer uso de um meio de prova não utilizado na instrução da causa que deu azo a tal decisão, respeitando o fundamento do recurso à formação do material instrutório.

Assim, e relativamente ao fundamento previsto na alínea c) do artigo 771.º, o caso em apreço apresenta duas particularidades:

Por um lado, encontra-se em causa, não um documento, mas um exame e, por outro lado, trata-se de um meio de prova ainda não existente, mas a produzir[4], [4 Se o Recorrente tivesse já o resultado dos exames em sua posse, por os ter realizado extrajudicialmente, não teríamos qualquer dúvida em enquadrar o recurso em apreço no fundamento previsto na alínea c) do artigo 771.º do CPC, tal como foi já decidido por este tribunal da Relação do Porto de 31.10.2006, disponível in CJ Ano XXXI, Tomo IV, pág. 187.] fundando-se o requerimento de interposição do recurso unicamente na convicção do autor de que não é o pai biológico da criança e ainda no argumento de que, face aos avanços da técnica, tal realidade irá ser seguramente comprovada pela realização de exames genéticos de paternidade.

Afirma o autor que, embora seja verdade que namorou com a mãe do menor durante alguns meses, tal como foi dado como provado na referida sentença, o autor pôs fim ao namoro por descobrir que esta acompanhava dia e noite com outros homens com quem esta se relacionava, vivendo inquieto e atormentado desde então, por ter consciência de que está reconhecido como pai de alguém que entende desde sempre que não pode ser seu filho.

Assim sendo, embora o recorrente não alegue expressamente que os depoimentos, da mãe e das testemunhas, em que se baseou o tribunal para a declaração de paternidade, sejam falsos, dos factos por si alegados resulta necessariamente a falsidade de tais depoimentos, pelo menos relativamente ao depoimento prestado pela mãe. Com efeito, o tribunal reconheceu a paternidade do aqui recorrente a partir dos seguintes factos, que deu como provados:

“4. Entre o princípio de Setembro de 1986 e meados de Junho de

1987, o Réu namorou com a I...

5 - Durante esse namoro, por diversas vezes, o réu manteve relações sexuais com a J…, nomeadamente nos primeiros cento e vinte dias dos trezentos que antecederam o nascimento do menor.

6 - Neste último período, a J…não manteve relações sexuais com outro homem que não o réu.”

Ora, se os dois primeiros factos são compatíveis com uma eventual exclusão da paternidade do réu - o réu pode ter namorado e mantido relações sexuais com a mãe do menor durante o referido período e o filho não ser dele-, o último facto - ausência de relações sexuais com outro homem - é incompatível com a profunda convicção aqui manifestada pelo Apelante, de que o filho não é dele.

Como tal, poderá o autor efetuar a prova da falsidade das declarações da mãe e das testemunhas, que levaram o tribunal que proferiu a sentença revidenda a dar como provado que a mãe não manteve relações sexuais com outro homem durante o período legal da conceção, mediante a realização de exames a efetuar nos presentes autos, recaindo a situação, não na alínea c), mas, sim, na alínea b), do citado artigo 771.º, do CPC.

Face a tal enquadramento, o recorrente não tinha, assim, que, com o requerimento de interposição de recurso, apresentar de imediato prova de tal falsidade[5]. [5 No sentido de que, atualmente, aprova da falsidade pode ser feita na própria fase rescindente do recurso de revisão se pronuncia, entre outros, Luís Brites Lameiras, “Notas Práticas ao Regime dos Recursos Em Processo Civil”, Almedina, pág. 196.] Com efeito, o n.º 2 do artigo 773.º do CPC, apenas nos casos de revisão com fundamento nas alíneas a), c), f) e g) do artigo 771.º, exige que o requerimento de interposição de recurso tenha de ser instruído com certidão da sentença ou do documento em que se funda o pedido. Por outro lado, se o CPC de 1939 exigia ao recorrente a apresentação de prova sumária da veracidade do fundamento invocado em situações que não pressupunham uma decisão judicial prévia, tal norma foi eliminada na revisão de 1967.

Como refere José Lebre de Freitas[6], [6 Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 3.º, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, pág. 236.] nos casos não previstos no n.º 2 do art. 773, o recorrente alega, com o requerimento de interposição, os factos de que recorre a falsidade da prova (alínea b), a nulidade ou anulabilidade do negócio de auto composição do (alínea d), ou a falta ou nulidade da citação (alínea e), podendo reservar a propositura da prova a produzir para a audiência preliminar ou para o momento do art 512.º (art. 775, n.º 2).

Quando o fundamento do recurso seja umas das falsidades previstas na al. b), do artigo 771.º, não só a verificação de tal falsidade tem lugar na própria instância de recurso, como o n.º 2, do artigo 775.º, prevê que, em tal caso, após a resposta dos recorridos ou o decurso do prazo respetivo, se sigam os termos do processo sumário.

Note-se que, encontrandonos ainda perante o despacho liminar a que se refere o artigo 774.º, o despacho que admita o recurso, nesta fase, não garante desde logo a revisão da sentença impugnada, mas, tão só, a oportunidade de realização de exames ao sangue sendo que, caso os mesmos se venham a mostrar inconclusivos ou confirmem a paternidade, o recurso de revisão, aí sim, será julgado necessariamente improcedente; apenas no caso de o resultado de tal exames excluir claramente a paternidade do autor, aí sim, se imporá a procedência do recurso, com a consequente quebra do caso julgado e anulação da sentença revidenda, dando início à abertura da instrução na ação de impugnação (artigo 776.º, n.º 1, alínea c) do CPC).

Pelo exposto, entende-se que o recurso de revisão em apreço tem cabimento no âmbito do fundamento previsto na al. b), do artigo 771.º do CPC, não tendo de ser instruído com a prova da falsidade dos depoimentos em que o tribunal se baseou para declarar a paternidade, prova esta que poderá ser produzida na fase rescindente do recurso, precisamente mediante a realização dos exames requeridos pelo Apelante.

2 - Caducidade do direito de interpor recurso de revisão O recurso extraordinário de revisão interpõe-se de decisões transitadas em julgado, e só pode ser interposto se não tiverem decorrido mais de cinco anos do respetivo trânsito - n.º 2 do artigo 772.º do CPC-, tendo por função reparar anomalias processuais de especial gravidade, taxativamente enunciadas no artigo 771.º do CPC.

Tendo a sentença revidenda sido proferida em 26.06.90, levanta-se a questão da caducidade do direito de interpor recurso de revisão, por há muito ter decorrido o referido prazo de cinco anos sobre o seu trânsito em julgado.

Invoca o Apelante a inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 772.º do CPC, quando interpretado no sentido de que já não pode ser interposto recurso de revisão de sentença proferida em processo de investigação de paternidade, por violação do disposto nos arts. 18.º, n.º 3, 26.º, n.º 1 e 36.º, n.º 1, da Constituição, defendendo a imprescritibilidade pura e simples, de tal direito.

Com a previsão de tal recurso extraordinário, por via do qual se admite a reabertura de um processo extinto, abre a lei exceções ao caso julgado, razão pela qual se compreende que o mesmo se encontre sujeito a apertados limites, quer quando aos seus fundamentos, quer quanto ao prazo durante o qual pode ser deduzido.

Para uma correta ponderação dos interesses em jogo, atenderemos aos juízos de valor que vem sendo formulados pelo Tribunal constitucional nas inúmeras decisões são em que teve de colocar na balança os dois grandes interesses aqui em confronto:

por um lado, a certeza e a segurança jurídica - a recomendar a fixação de prazos para revisão - e, do outro lado, o respeito pela justiça material e, em especial, pela verdade biológica - a apontar no sentido do apuramento desta sem limites temporais.

Como o tribunal constitucional tem vindo a salientar, para avaliar se a limitação temporal - imposição de um prazo de caducidade de cinco anos para a interposição do recurso de revisão - é adequada, necessária e proporcional ao conteúdo dos interesses ou valores em confronto, “não pode prescindir-se de encarar a situação concreta que originou o caso julgado”.

No Acórdão 209/2004 [7], [7 Disponível in www.tribunalcons-titucional.pt/tcacordaos/20040209.html.] citado pelo Apelante, o tribunal constitucional apreciou e concluiu pela inconstitucionalidade do prazo de cinco anos previsto no n.º 2 do n.º 2 do artigo 772.º do CPC, restringindo-se, embora, tal declaração ao recurso de revisão de uma sentença proferida numa ação oficiosa de paternidade, cujo fundamento era a falta ou nulidade da citação. Aí se entendeu que a solução normativa consagrada na citada norma, quando aplicável aos casos em que, tendo ocorrido à revelia a ação em que foi proferida a decisão cuja decisão é requerida, seja alegada como fundamento da revisão, precisamente, a falta ou a nulidade da citação para aquela ação, é efetivamente inconstitucional, por ofensa do princípio do contraditório, em que se integra a proibição da indefesa contida no artigo 20.º da Constituição.

Contudo, apesar de se encontrar em discussão o mesmo prazo de caducidade de interposição do recurso de revisão, reportado, em ambos os casos, a uma ação de investigação de paternidade, a diversidade do fundamento aqui invocado para o recurso de revisão - existência de meios científicos que hoje garantem a verdade biológica - levará a que o princípio fundamental afetado seja, não já o princípio do contraditório, mas sim o direito à identidade pessoal e o direito ao desenvolvimento da personalidade (um direito de conformação da própria vida, um direito geral de liberdade de ação cujas restrições tem de ser constitucionalmente justificadas, necessárias e proporcionais), consagrado no n.º 1 do artigo 26.º da CRP, direitos estes que podem ser invocados tanto pelo pretenso filho como pelo suposto pai.

No entender de Cura Mariano[8], [8 Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 626/2009, disponível in www.tribunalconstitucional. pt/tcacordaos/20090626.html.] este direito fundamental pode ser visto numa perspetiva estática - onde avultam a identificação genética, a identificação física, o nome e a imagem - e numa perspetiva dinâmica - onde interessa cuidar da verdade biográfica e da relação com o indivíduo ao longo dos tempos.

A evolução da sociedade tem levado a uma crescente valorização do direito de cada um a saber das suas origens genéticas e raízes familiares e culturais, o denominado “direito à historicidade pessoal[9]”. [9 Nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira, “Constituição da Republica Portuguesa Anotada”, I Vol., 4.ª ed., 2007, pág. 462.] O direito à identidade pessoal, integrando uma dimensão fundamental da personalidade, abrange o direito a saber quem é o pai ou a mãe biológicos.

Como decorrência do referido direito à identidade pessoal, tem vindo a ser discutida a inconstitucionalidade do prazo de caducidade previsto art.1817.º do Código Civil, por impor restrições ao direito fundamental de investigar a paternidade.

Assim, enquanto o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/2006, relatado por Mota Pinto, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do prazo de dois anos a contar da maioridade ou emancipação previsto no n.º 1 do artigo 1817.º do CPC, na redação da Lei 21/98, de 12.05, o Acórdão do Plenário n.º 401/2011, de 22.09.2011, relatado por Cura Mariano (com sete votos a favor e cinco votos contra), decidiu pela não inconstitucionalidade da norma do n.º 1 do artigo 1817.º, do CC, na redação da Lei 14/2009, de 1 de Abril, na parte em que, aplicando-se às ações de paternidade, por força do artigo 1873.º, do CC, prevê um prazo de 10 anos para a propositura de tal ação, contado da maioridade ou emancipação do investigante.

Contudo, o referido acórdão do Plenário do TC não pôs fim à questão em torno de saber se o direito de investigar a paternidade (ou de a impugnar) deve estar sujeito a um prazo de caducidade ou se é imprescritível[10], [10 Atentar-se-á em que, no Código Civil de 1867, as ações de investigação podiam ser intentadas a todo o tempo, não existindo prazo de caducidade, prazo que só veio a ser fixado pelo legislador com o Código Civil de 1966, restrição que assentou em três razões básicas, segurança jurídica, envelhecimento das provas e o receio da “caça às fortunas”, sendo que estas duas últimas se mostram ultrapassadas pelos avanços da ciência quanto à fidelidade dos testes de paternidade. Com relevo nos surge igualmente o facto de Portugal se afastar dos regimes jurídicos de matriz romanista que consideram imprescritível o direito de investigação de paternidade, entre os quais se destacam o direito espanhol, italiano, alemão e brasileiro (cf., neste sentido, Cristina Dias, em anotação ao citado acórdão do STJ de 09.04.2012, “Investigação da paternidade e abuso de direito. Das consequências jurídicas do reconhecimento da pater-nidade”, in Cadernos de Direito privado n.º 45 Janeiro/Março 2014, págs. 32 e ss.).] continuando sujeito a aceso debate, como se pode ver pelo Acórdão do STJ de 09-04-2013, com um voto de vencido de Salazar Casanova a propor a alteração, ao nível constitucional, considerando-se a inconstitucionalidade da fixação de qualquer prazo de caducidade para a propositura da ação de investigação.

No caso em apreço, discutindo-se o prazo de caducidade previsto no n.º 2 do artigo 772.º do CPC, temos no prato da balança, como já referimos, por um lado, a garantia da certeza e da segurança jurídica, que justifica a imposição de um limite temporal ao exercício do direito de sentença possa vir a ser alterada, e o princípio da justiça material, que dá prevalência à verdade sobre a forma.

Sendo a causa de pedir, nas ações de investigação ou reconhecimento da paternidade, constituída pelo facto naturalístico da procriação biológica do filho pelo réu a quem a paternidade é imputada, o referido facto da procriação biológica podia ser demonstrado por via direta, através dos “exames de sangue e quaisquer outros métodos cientificamente comprovados”, a que se refere o artigo 1801.º, do Código Civil, ou indiretamente, através do recurso a alguma das presunções legais de paternidade previstas nas als. a), b), c) e d), do artigo 1871.º do CC, ou, ainda, através do recurso a presunções naturais ou judiciais, alicerçadas em máximas da experiência, nos termos do artigo 351.º; é o que sucedia, então, na generalidade das causas em que não houvesse lugar à realização de exames de sangue concludentes e em que não ocorresse alguma das situações de facto que servem de substrato às aludidas presunções legais de paternidade, constantes das alíneas a) a d) do artigo 1871.º, incumbindo então naturalmente ao autor demonstrar que houve relações de sexo entre a mãe e o pretenso pai no período legal de conceção do filho e que tais relações foram exclusivas [11]. [11 Cfr., neste sentido, Carlos Lopes do Rego, “O ónus da prova nas acções de investigação de paternidade:

prova directa e indirecta do vínculo da filiação”, in Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1997”, Vol. I, “Direito da Família e das Sucessões”, Coimbra Editora, pág. 781].

A situação em apreço inseriu-se precisamente nesta última hipótese:

a paternidade foi reconhecida unicamente pela demonstração no processo de que as relações de sexo que a autora manteve com o réu podiam ser a causa adequada da gravidez e do subsequente nascimento e de que a mãe do menor apenas as manteve com o aí réu, sendo a partir destes dois factos que as máximas da experiência apontaram o réu como o autor da fecundação.

Com o presente recurso, pretende o autor, não só, por em causa o referido facto indiciário da exclusividade das relações com o réu no período legal da conceção, atestado em audiência de julgamento pelos depoimentos da mãe e das referidas testemunhas, como ainda, e essencialmente, efetuar prova direta de que não é ele o pai.

A redação introduzida pelo DL 496/77, de 25 de Novembro, ao artigo 1801.º do CC, ao consagrar expressamente a realização de exames científicos, veio privilegiar o princípio da verdade biológica, cientificamente comprovada e que faça coincidir o estatuto de filho com a realidade do correspondente vínculo de derivação biológica[12]. [12 Como refere José da Costa Pimenta, a ideia mestra da Reforma de 1977 foi, sem dúvida, a abertura à verdade biológica. Se os laços jurídicos não corresponderem a laços sanguíneos, deve poder-se declarar-se isso, e investigar-se, sem entraves, no sentido de estabelecer a correspondência, dando como exemplo do maior peso que vem sendo dado à verdade biológica, o alargamento das possibilidades de afastamento da presunção derivada do casamento (pater is est) - “Filiação”, Coimbra Editora, 1986, pags. 21 e 22.] Ora, se à data em que foi proferida a sentença a rever era ainda esporádico o recurso à realização de exames de sangue para o estabelecimento da paternidade, constituindo então um meio de prova pouco seguro, servindo as mais das vezes unicamente para efeitos de exclusão da paternidade[13] [13 Como é expressamente reconhecido por José da Costa Pimenta, na citada obra, págs. 43 e 44.], no atual estado da ciência os exames de ADN (ou DNA) propiciam um elevado grau de segurança (com probabilidades bioestatísticas superiores a 99,5 %), constituindo a forma mais fiável de estabelecimento do vínculo bioló-gico[14]. [14 Como se refere no citado Acórdão do STJ de 09.04.2013, nos últimos anos, foram descobertas técnicas, pelos cientistas, James Watson, americano e Francis Crik, Inglês, que utilizam o DNA como marcador da individualidade biológica, que têm tornado possível excluir ou admitir a paternidade, em 100 % dos casos.] E se existem atualmente meios que conseguem diretamente demostrar o fenómeno biológico da procriação, através de prova científica concludente, que permita considerar demonstrada, com o grau de certeza pratica e socialmente exigível, a procriação biológica, parecenos que a descoberta da verdade biológica se deve sobrepor à necessidade de segurança que está por detrás da fixação do prazo de cinco anos para a propositura do recurso de revisão.

Com efeito, se apesar da declaração de paternidade efetuada em tal processo, e decorridos cerca de 18 anos, o declarado pai continua convencido de que não o é, o facto de se lhe conceder a possibilidade de proceder a exames de sangue, que com um grau de probabilidade próximo da certeza, lhe dirá se ele é, efetivamente, ou não, o pai biológico, contribuirá para uma pacificação de todos os interessados:

se o teste confirmar que ele é o pai, o recurso de revisão será julgado improcedente; se o teste excluir a sua paternidade, confirmando a profunda convicção do autor, então, ter-se-á por justificada a reabertura do processo de investigação de paternidade, a fim de se fazer coincidir a verdade registral com a verdade biológica.

Assim sendo, perguntamos nós, qual o interesse, para os envolvidos, em manter um estado de coisas em que, encontrando-se estabelecido no registo que determinado indivíduo é pai de outro, continuando aquele convicto de que o não é, tal reconhecimento jurídico acaba por não tem qualquer correspondência na relação interpessoal entre ambos? (eventuais interesses patrimoniais do filho na manutenção de tal situação não são por nós considerados dignos de tutela, ou pelo menos, não deverão prevalecer).

Note-se, que, no caso em apreço, citado o declarado filho (que entretanto atingiu a menoridade), na sequência do recurso interposto do despacho de indeferimento liminar do recurso de revisão para os termos do recurso e da causa, o mesmo nem sequer deduziu oposição ao requerido, tendo-se remetido ao silêncio.

Como se salienta no citado Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/2006, não podemos ignorar que “os exames biológicos conducentes à determinação da filiação, podem ser realizados fora dos processos judiciais, e a pedido dos particulares, sem qualquer limitação temporal, pelos próprios serviços do Instituto de Medicina Legal”, pelo que aceitar, em termos absolutos, a limitação temporal dos cinco[s] anos para a revisão das sentenças em que a paternidade haja sido declarada sem recurso a exames científicos, pode levar a situações melindrosas de existência de uma paternidade reconhecida no registo que se saiba não corresponder à verdade biológica por a mesma ter sido excluída por exames de sangue.

A tal respeito, afirma-se ainda no Acórdão deste Tribunal de 31.10.2006 [15] [15 Acórdão relatado por Emído Costa, disponível na CJ Ano XXXI, Tomo IV, pág. 187.], a propósito de um recurso de revisão que teve como fundamento um exame sanguíneo realizado ao menor à mãe e ao pretenso pai pelo IML, que excluía a paternidade do menor:

“Se é do interesse da menor e da sociedade em geral que ela tenha um nome no lugar destinado ao pai no seu assento de nascimento, não é menos certo que tal nome deve corresponder ao do seu verdadeiro pai biológico. Outro nome que não esse falseia a realidade”.

Como é salientado pelo Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 401/2001, a constituição e a determinação integral do vínculo da filiação, abrangendo ambos os progenitores, corresponde a um interesse geral de ordem pública, a um relevante princípio de organização jurídicosocial. Dar eficácia jurídica ao vínculo genético da filiação, propiciando a localização perfeita do individuo na zona nuclear mais do sistema das relações de parentesco, não se repercute apenas nas relações paifilho, tendo projeções externas a essa relação (v.g., em tema de impedimentos matrimoniais).

Como vem sendo reconhecido pela nossa doutrina e jurisprudência, o impulso científico e social para o conhecimento das origens e o desenvolvimento da genética e a generalização dos testes genéticos de elevada fiabilidade, não deixa incólume o equilíbrio de interesses e direitos constitucionalmente protegidos, aquando da análise de restrições impostas ao direito de investigar ou de impugnar livremente a paternidade, como o são os prazos de caducidade respeitantes à interposição das ações correspondentes[16], [16 Cfr., neste sentido, Guilherme de Oliveira, “Curso de Direito da Família”, Vol. II, Direito da Filiação, Tomo I, Coimbra Editora 2006, pág. 247 a 253.] ou de rever uma sentença que declarou a paternidade unicamente com base em prova indireta.

O referido prazo de cinco anos, ao excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal, acarreta uma diminuição do alcance do conteúdo essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou da maternidade, conflituando com o interesse público na correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica.

Concluindo, entende-se que, no caso em apreço, não é de negar ao recorrente o direito de efetuar esta “prova dos nove”, quanto à paternidade em causa, apenas porque decorreram mais de cinco anos desde o trânsito em julgado da decisão que o declarou como pai, considerando-se que os interesses em jogo - confronto entre bens constitutivos da personalidade e a garantia da segurança jurídica - justificam[17], [17 A avaliação de interesses aqui efetuada manter-se-á inteiramente válida no caso de ser o filho a pretender por em causa a paternidade reconhecida por sentença transitada em julgado.] no caso em apreço, a recusa da aplicação de tal prazo de caducidade, por violação do princípio fundamental à identidade pessoal contido no artigo 26.º da CRP em conjugação com os arts. 16.º, n.º 1, 18.º, n.º 1, e 36.º, n.º 1, todos da CRP.

A decisão recorrida deverá ser substituída por outra que admita o recurso, notificando-se a parte contrária para responder, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 774.º, do CPC.

IV - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em julgar procedente o recurso, revogando-se a decisão recorrida, determinando-se que seja proferido despacho a admitir liminarmente o recurso, prosseguindo os autos nos termos previstos no n.º 2 do artigo 774.º do CPC [...]

»

Ao acórdão recorrido foi aposto voto de vencido nos seguintes termos:

«

Com todo o respeito pela opinião que fez vencimento, considero que o caso julgado não deve ceder à veracidade da filiação através da realização de exames de sangue agora solicitados dado que resulta dos autos que o recorrente foi parte interveniente no processo com a possibilidade de apresentar as suas razões de facto e de direito, de oferecer as suas provas e controlar as provas do adversário, bem como tomar posição sobre o resultado de umas e outras, ou seja, de exercer plenamente o princípio do contraditório e o princípio do direito à prova testemunhal e pericial, sendo que esta última já constava do nosso Código Civil - artigo 1801 na redação dada pelo D-L n.º 496/77 -, pelo que, neste caso concreto, declararia extinto, por caducidade, o direito de interpor o presente recurso de revisão.

»

4 - É deste Acórdão do TRP de 20 de maio de 2015 que o Ministério Público interpôs recurso de constitucionalidade, nos termos seguintes (cf. fls. 186):

«

Vem o Ministério Público interpor recurso para o Tribunal Constitucional do douto acórdão proferido em 20 de Maio de 2014 e constante de fls. 165 a 182, nos termos dos artigos 280.º, n.os 1-a), e 3, da Constituição da República Portuguesa - CRP, 70.º, n.º 1-a) e 72.º n.os 1-a) e 3, da Lei 28/82, de 15 de Novembro, uma vez que, no mesmo, não foi aplicada a norma do artigo 772.º n.º 2, do (anterior) Código de Processo Civil, com fundamento na sua inconstitucionalidade, por violação do direito à identidade pessoal, e às disposições conjugadas dos artigos 16.º n.º l, 18.º n.º l, 26.º n.º 1, e 36.º n.º l, todos da Constituição da República Portuguesa.

No acórdão recorrido decidiu-se que essa norma é inconstitucional ao “excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal”, por “acarretar uma diminuição do alcance do conteúdo essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou da maternidade, conflituando com o interesse público na correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica”.

»

.

5 - O recurso de constitucionalidade foi admitido por despacho proferido pelo Tribunal a quo em 27/05/2014 (cf. fls. 187).

6 - Prosseguindo os autos neste tribunal e notificadas as partes para, querendo, produzirem alegações, o Ministério Público apresentou alegações (fls. 193-304), concluindo no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso por si interposto, nos termos seguintes (cf. fls. 288-304):

«

[...] 1)

«

O não reconhecimento de dignidade constitucional autónoma ao princípio da verdade biológica não invalida que o apuramento da paternidade biológica seja uma dimensão do direito fundamental à identidade pessoal (artigo 26.º, n.º 1, da CRP)

»

(cf. supra n.º 43 das presentes alegações);

2)

«

E o Tribunal tem entendido que tal direito

« não atua só em sentido positivo, como direito de cada um a conhecer e a ver juridicamente reconhecido aquilo que é, mas também em sentido negativo, como direito de cada indivíduo de excluir, como fator conformador da identidade própria, aquilo que não é »

(Acórdão 446/2010)

»

(cf. supra n.º 43 das presentes alegações);

3)

«

E por isso este parâmetro tem sido mobilizado na apreciação de normas relativas à investigação da paternidade (Acórdão 401/2011), bem como em matéria de ação de impugnação da paternidade presumida, seja ela intentada pelo filho ou pelo marido da mãe (Acórdãos n.os 609/2007 e 279/2008 e 589/2007, 179/2010 e 446/2010, respetivamente)

»

(cf. supra n.º 43 das presentes alega-ções);

4) o direito fundamental à identidade pessoal

« abrange um direito à historicidade pessoal, um direito ao conhecimento e ao reconhecimento da identidade dos progenitores, mas compreende também um
« direito à verdade pessoal »

, no sentido de que

« da pessoa não se afirme o que não seja verdade, mesmo que honroso »

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

5)

«

O direito à verdade pessoal envolve também uma dimensão relacional específica que o concretiza como direito à verdade perante o filho quanto ao vínculo familiar que os une

»

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

6)

«

O direito de impugnação da paternidade está, assim, apenas, na disponibilidade direta dos membros da família, no sentido de que só o marido, a mãe e o filho é que se encontram autonomamente legitimados a intentar a ação. E não está, por isso, excluído que a situação de discrepância entre a paternidade presumida e a realidade biológica se mantenha sempre que não haja interesse concreto por parte dos interessados na destruição da paternidade presumida

»

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

7)

«

Mas não são apenas interesses gerais ou valores de organização social, em torno da instituição familiar, que podem justificar a consolidação definitiva, na ordem jurídica, a partir de determinado limite temporal, de uma paternidade não correspondente à realidade biológica

»

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

8)

«

Também quanto às posições subjetivas em jogo, na ação de impugnação de paternidade, se deteta uma relevante diferença em relação às que se confrontam numa ação de investigação de paternidade. Nesta, o eventual interesse do investigado em não assumir um vínculo de paternidade correspondente à realidade biológica não é merecedor de tutela, pelo menos do ponto de vista do direito à identidade pessoal e à autoconformação da personalidade, não devendo ser reconhecida “uma faculdade de o pai biológico se eximir à responsabilidade jurídica correspondente” (Guilherme de Oliveira,“Caducidade das ações de investigação”, Lex Familiae, Revista Portuguesa de Direito de Família, 2004, págs. 7 s., 11)

»

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

9)

«

Já o eventual interesse daquele que é tido como filho em manter esse estatuto não pode ser inteiramente desconsiderado (como seria com um regime de imprescritibilidade). Sobretudo quando o vínculo jurídico tem tradução consistente no “mundo da vida” familiar e social, gerando, como é normal, laços afetivos, a destruição retrospetiva desse vínculo acarreta (ou agrava) a perda de sentido de uma componente nuclear da memória e da historicidade pessoais, da autorepresentação de si, por parte de quem é filho. Valores também situados na esfera da identidade pessoal podem ser invocados em tutela do interesse do outro sujeito da relação paternofilial em ver como definitivamente adquirido o estatuto de que goza, após o decurso de um certo prazo em que o pai teve efetiva oportunidade de o impugnar judicialmente

»

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

10)

«

O direito à identidade pessoal do próprio filho pesa, de facto, no sentido da

« proteção da verdade estabelecida pelo Direito, como forma de preservação de uma certa representação do ‘eu’ [perante si mesmo e perante os outros] que não pode ficar permanentemente sob ‘condição resolutiva’ »

(declaração de voto aposta ao Acórdão 589/2007). Ao estabelecimento do prazo em questão é associada a

« vantagem de tutelar os interesses do próprio filho em não ver indefinidamente pendente o risco de afastamento da presunção legal de paternidade »

(Acórdão 609/2007)

»

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

11)

«

Em suma, a imprescritibilidade da ação de impugnação da paternidade presumida do marido não é imposta pelo direito à identidade pessoal da mãe. O interesse da proteção da família constituída (artigo 67.º da CRP) e o direito à identidade pessoal do próprio filho (artigo 26.º, n.º 1, da CRP) pesam no sentido da estabilização do vínculo paternofilial após o decurso de um certo prazo, em que é dada à mãe a oportunidade de o contrariar (impugnando a paternidade presumida e, antes disso, obstando a que constasse do registo de nascimento)

»

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

12)

«

O Tribunal já se pronunciou sobre o prazo legalmente estabelecido para o pai intentar ação de impugnação da paternidade presumida (artigo 1842.º, n.º 1, alínea a), do CC) e entendeu que o prazo então previsto (dois anos contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade) e o agora vigente (três anos contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade)

« parece ser um prazo razoável e adequado à ponderação do interesse acerca do exercício do direito de impugnar e que permitirá avaliar todos os fatores que podem condicionar a decisão »

, um prazo

« suficiente para garantir a viabilidade prática do exercício do direito de impugnar a paternidade, não o impedindo ou dificultando gravemente »

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

13)

«

E concluiu, por isso, que

« não parece que a fixação de um prazo de caducidade para a impugnação de paternidade pelo pai presumido, nos termos em que se encontra previsto na referida norma do artigo 1842.º, n.º 1, alínea a), do Código Civil, represente uma intolerável restrição [...], quando é certo que a preclusão do exercício do direito de impugnar pode justamente ter correspondido a uma opção que o interessado considerou ser em dado momento mais consentâneo com o seu interesse concreto e o seu condicionalismo de vida »

(Acórdãos n.os 589/2007 e 446/2010) (cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

14)

«

Há que concluir que não há qualquer imposição constitucional no sentido da imprescritibilidade da ação de impugnação da paternidade presumida do marido, não obstante ser de reconhecer o direito fundamental à identidade pessoal da mãe (artigo 26.º, n.º 1, da CRP). E que o estabelecimento do prazo de três anos, contados a partir do nascimento do filho, traduz-se numa afetação negativa deste direito, necessária à salvaguarda do direito à identidade pessoal do filho e ao interesse da proteção da família constituída (artigos 26.º, n.º 1, 67.º e 18.º, n.º 2, da CRP) (cf. supra n.º 44 das presentes alegações);

15)

«

O Plenário do Tribunal Constitucional, face a posições divergentes na jurisprudência das suas Secções, conheceu da matéria relativa à imprescritibilidade do prazo de propositura de acção sobre investigação de paternidade no Acórdão 401/2011. Concluiu, nesse aresto, que

« a norma do artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, na redacção da Lei 14/2009, de 1 de Abril, na parte em que, aplicando-se às acções de investigação de paternidade, por força do artigo 1873.º, do mesmo Código, prevê um prazo de dez anos para a propositura da acção, contado da maioridade ou emancipação do investigante, não se afigura desproporcional, não violando os direitos constitucionais ao conhecimento da paternidade biológica e ao estabelecimento do respectivo vínculo jurídico, abrangidos pelo direitos fundamentais à identidade pessoal, previsto no artigo 26.º, n.º 1, e o direito a constituir família, previsto no artigo 36.º, n.º 1, ambos da Constituição »

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações);

16)

«

…a questão relativa à conformidade constitucional da imposição de prazos de caducidade nas acções de investigação de paternidade ou de maternidade pode colocar-se em termos semelhantes nas acções de impugnação de paternidade ou maternidade

»

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações);

17)

«

A relação paternofilial seria necessariamente posta em crise, se colocada numa situação de permanente precariedade e incerteza, por sujeita a ser abolida por acção, exercitável a todo o tempo, sem qualquer preclusão, do pai presumido

»

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações);

18)

«

São aqui inteiramente válidas as considerações expendidas no Acórdão 626/2009, a propósito do prazo, também subjectivo, do n.º 3 do artigo 1817.º, no sentido de que

« tendo o titular deste direito conhecimento dos factos que lhe permitem exercêlo é legítimo que o legislador estabeleça um prazo para a propositura da respectiva acção, após esse conhecimento, de modo a que o interesse da segurança jurídica não possa ser posto em causa por uma atitude desinteressada daquele »

. Em matéria que contende com o estado civil de um outro, estando em causa um vínculo estabelecido, constitutivo da personalidade, não só do impugnante, como também do filho, não é injustificado nem excessivo fazer recair sobre o pai um ónus de diligência quanto à iniciativa processual para apuramento definitivo da filiação (para o que hoje existem meios peremptoriamente concludentes), não fazendo prolongar, através de um regime de imprescritibilidade, uma situação de incerteza indesejável

»

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações);

19)

«

Essa tem sido também a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que, no caso Rasmussen contra Dinamarca, em sentença de 28 de Novembro de 1984, decidiu que, em acções de impugnação, “a fixação de prazos de caducidade tem uma justificação objectiva e razoável”. Essa posição foi mantida, mais recentemente, na sentença de 12 de Janeiro de 2006 (Mizzi contra Malta)

»

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações);

20)

«

Apurado que um regime de caducidade da acção de impugnação de paternidade, com prazo a contar desde o conhecimento, pelo marido da mãe, “de circunstâncias de que possa concluir-se a não paternidade” não enferma, em si mesmo, de qualquer inconstitucionalidade, resta ajuizar da conformidade constitucional da duração concretamente estabelecida

»

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações);

21) Prazo de 2 anos para a impugnação -

«

Este parece ser um prazo razoável e adequado à ponderação dos interesses acerca do exercício do direito de impugnar e que permitirá avaliar todos os factores que podem condicionar a decisão

»

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações);

22)

«

É de manter este juízo, cuja validade sai reforçada com o alongamento do prazo. Ainda que a decisão de avançar com um processo de impugnação exija um período de maturação e de reflexão que não se coaduna com a pressão de um prazo excessivamente curto, pela natureza dos interesses envolvidos e pelas implicações, qualquer que seja o resultado, que advêm de uma tal decisão, cremos que o prazo de três anos é suficiente para garantir a viabilidade prática do exercício do direito de impugnar a paternidade, não o impedindo ou dificultando gravemente

»

(cf. supra n.º 45 das pre-sentes alegações);

23)

«

A tese sustentada na decisão recorrida é a de que os interesses que anteriormente justificavam a fixação de prazos de caducidade revelam-se, numa observação actualizada, insubsistentes, pelo que deixaram de ter uma eficácia contrabalanceadora, capaz de justificar a previsão de limites temporais à instauração da acção de investigação da paternidade

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

24) A caducidade enquanto figura extintiva de direitos, pelo seu não exercício em determinado prazo, procura satisfazer os interesses da certeza e estabilidade das relações jurídicas, os quais exigem a sua rápida definição, impulsionando os titulares dos direitos em jogo a exercêlos num espaço de tempo considerado razoável, sob a cominação da sua extinção

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

25)

«

Apesar dos decisivos progressos científicos no domínio da determinação da filiação biológica, conjugados com a evolução verificada nos valores dominantes no âmbito da filiação, terem determinado uma significativa desvalorização dos interesses que presidiam ao estabelecimento de prazos de caducidade para a propositura das acções de investigação da paternidade, alguns desses interesses não deixaram de manter um peso atendível pelo legislador nas suas opções de definição do regime da constituição da filiação

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

26)

«

Mas, já num plano geral, não é possível ignorar que a constituição e a determinação integral do vínculo de filiação, abrangendo ambos os progenitores, corresponde a um interesse de ordem pública, a um relevante princípio de organização jurídicosocial. O dar eficácia jurídica ao vínculo genético da filiação, propiciando a localização perfeita do sujeito na zona mais nuclear do sistema das relações de parentesco, não se repercute apenas na relação paifilho, tendo projecções externas a essa relação (v.g. em tema de impedimentos matrimoniais). É do interesse da ordem jurídica que o estado pessoal de alguém não esteja amputado desse dado essencial. Daí, além do mais, a consagração da averiguação oficiosa de paternidade (artigos 1864.º e seguintes). E importa que esse objectivo seja alcançado o mais rápido possível, numa fase ainda precoce da vida do filho, evitando-se um prolongamento injustificado de uma situação de indefinição na constituição jurídica da relação de filiação. É do interesse público que se estabeleça o mais breve que seja possível a correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica, fazendo funcionar o estatuto jurídico da filiação com todos os seus efeitos, duma forma estável e que acompanhe durante o maior tempo possível a vida dos seus sujeitos

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

27)

«

Ora, o meio, por excelência, para tutelar estes interesses atendíveis públicos e privados ligados à segurança jurídica, é precisamente a consagração de prazos de caducidade para o exercício do direito em causa. Esses prazos funcionam como um meio de induzir o titular do direito inerte ou relutante a exercêlo com brevidade, não permitindo um prolongamento injustificado duma situação de indefinição, tendo deste modo uma função compulsória, pelo que são adequados à protecção dos apontados interesses, os quais também se fazem sentir nas relações de conteúdo pessoal, as quais, aliás, têm muitas vezes, como sucede na relação de filiação, importantes efeitos patrimoniais

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

28)

«

Apesar da inexistência de qualquer prazo de caducidade para as acções de investigação da paternidade, permitindo que alguém exerça numa fase tardia da sua vida um direito que anteriormente negligenciou, poder corresponder a um nível de protecção máximo do direito à identidade pessoal, isso não significa que essa tutela optimizada corresponda ao constitucionalmente exigido

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

29)

«

Como já vimos, o direito ao estabelecimento do vínculo da filiação não é um direito absoluto que não possa ser harmonizado com outros valores confituantes, incumbindo ao legislador a escolha das formas de concretização do direito que, dentro das que se apre-sentem como respeitadoras da Constituição, se afigure mais adequada ao seu programa legislativo. Assim o impõe a margem de liberdade que a actividade do legislador democrático reclama. Caberá, assim, nessa margem de liberdade do legislador determinar se se pretende atingir esse maximalismo, protegendo em absoluto o referido direito, ou se se opta por conceder protecção simultânea a outros valores constitucionalmente relevantes, diminuindo proporcionalmente a protecção conferida aos direitos à identidade pessoal e da constituição da família

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

30)

«

Ao ter optado por proteger simultaneamente outros valores relevantes da vida jurídica através da consagração de prazos de caducidade, o legislador não desrespeitou, as fronteiras da suficiência da tutela, uma vez que essa limitação não impede o titular do direito de o exercer, impondolhe apenas o ónus de o exercer num determinado prazo

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

31)

«

É legítimo que o legislador estabeleça prazos para a propositura da respectiva acção de investigação da paternidade, de modo a que o interesse da segurança jurídica não possa ser posto em causa por uma atitude desinteressada do investigante, não sendo injustificado nem excessivo fazer recair sobre o titular do direito um ónus de diligência quanto à iniciativa processual para apuramento definitivo da filiação, não fazendo prolongar, através de um regime de imprescritibilidade, uma situação de incerteza indesejável

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

32)

«

Necessário é que esse prazo, pelas suas características, não impossibilite ou dificulte excessivamente o exercício maduro e ponderado do direito ao estabelecimento da paternidade biológica

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

33)

«

Por isso, o que incumbe ao Tribunal Constitucional verificar é se, na modelação desses prazos, o legislador ultrapassou a margem de conformação que lhe cabe

»

(cf. supra n.º 46 das presentes alegações);

34) O prazo de 10 anos após a maioridade ou emancipação, consagrado no artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, revela-se, pois, como suficiente para assegurar que não opera qualquer prazo de caducidade para a instauração pelo filho duma acção de investigação da paternidade, durante a fase da vida deste em que ele poderá ainda não ter a maturidade, a experiência de vida e a autonomia suficientes para sobre esse assunto tomar uma decisão suficientemente consolidada

»

(cf. supra n.º 47 das presentes alegações);

35)

«

Em geral, tem o Tribunal entendido que as normas de direito ordinário que estabelecem prazos para a interposição de ações em tribunal não infringem qualquer norma ou princípio constitucional, na medida em que apenas revelam escolhas legítimas do legislador quanto aos vários modos pelos quais podem ser prosseguidos os diferentes valores constitucionais inscritos, em última análise, no artigo 20.º da CRP

»

(cf. supra n.º 49 das presentes alegações);

36)

«

O mesmo sucedeu (ainda por exemplo) no caso do Acórdão 310/2005, em que estava em juízo norma do Código de Processo Civil que impunha um prazo de cinco anos, contados desde o trânsito em julgado da decisão, para interposição de recurso de revisão. Também neste caso se emitiu juízo de não inconstitucionalidade, por se entender que a conformação legislativa de prazos [aqui, para a interposição de recurso], não afetando por si mesma, e de forma negativa, qualquer posição jurídica subjectiva constitucionalmente tutelada, e sendo antes concretização do princípio de segurança que justifica a proteção constitucional do caso julgado, se inscrevia ainda na liberdade que o legislador detém para ordenar de forma côngrua o decurso de processos perante os tribunais

»

(cf. supra n.º 49 das presentes alegações);

37)

«

A circunstância de a lei prever um certo prazo para a caducidade da ação de investigação pode ter como consequência a impossibilidade, para o investigante, de vir a constituir o vínculo de paternidade ao qual aspira. Assim sendo, não restam dúvidas que a fixação, em si mesma, desse prazo se traduzirá sempre em uma certa afetação negativa de posições jurídicas subjectivas que a CRP, em vários lugares (nomeadamente, nos artigos 26.º ou 36.º), protege

»

(cf. supra n.º 49 das presentes alegações);

38)

«

Tal não significa que essa afetação negativa seja constitucionalmente censurável. Pode muito bem não o ser. Visto que cabe ao legislador encontrar soluções através das quais se harmonizem diferentes, e por vezes conflituantes, direitos e interesses constitucionalmente protegidos, cabelhe também decidir se, e em que circunstâncias, se justifica a diminuição do alcance ou da proteção de um desses direitos ou interesses, em ordem à promoção equilibrada ou proporcionada de aqueles outros que com os primeiros conflituem. São, por isso, coisas diferentes, a “simples” afetação negativa de direitos fundamentais e a afetação inconstitucional de direitos fundamentais

»

(cf. supra n.º 49 das presentes alegações);

56.º

Ora, no caso dos presentes autos, o ora Recorrente interveio na acção oficiosa de investigação de paternidade, tendo tido oportunidade de se defender, como achou adequado.

Na ocasião, não requereu, sequer, a realização de nenhum tipo de exames, que pudessem infirmar a paternidade que lhe era atribuída. Conformou-se, também, na altura, com a sentença proferida, tanto que dela não recorreu.

Será, então, lícito admitir que, 24 anos passados, sob a invocação de

« angústia e incerteza »

, « constante dúvida

» e o sentir-se
« inquieto e atormentado » quanto à paternidade que foi judicialmente fixada, venha requerer a revisão da sentença de investigação de paternidade, tendo em vista a realização de exames que atestem (dir-se-á, rectius, que afastem) essa paternidade?

Exames, esses, que, naturalmente, vão carecer do acordo e da adesão do indivíduo que foi declarado seu filho, que muito dificilmente, em face do comportamento totalmente ausente do seu pai, ao longo de todos estes anos, vai ter interesse em acolher uma tal iniciativa? E o seu filho se recusar em colaborar? Poderá o tribunal valorar negativamente a sua conduta? Quando, a bem dizer, o que está em causa é uma acção dissimulada de impugnação de paternidade, sem a devida obediência aos requisitos legalmente estabelecidos para o efeito? 57.º Crê-se, sinceramente, não ser esta a melhor solução, nem, aliás, a jurisprudência constitucional citada permite acolher uma tal posição.

Com efeito, como se viu, este Tribunal já considerou constitucionalmente conforme o estabelecimento do prazo de 2 e 3 anos, para o marido da mãe intentar acção de impugnação de paternidade presumida, considerando não haver

« qualquer imposição constitucional no sentido da imprescritibilidade da ação de impugnação da paternidade presumida do marido, não obstante ser de reconhecer o direito fundamental à identidade pessoal da mãe (artigo 26.º, n.º 1, da CRP) »

(cf. supra n.º 44 das presentes alegações).

Este Tribunal julgou, por isso, « não inconstitucional a norma do artigo 1842.º, n.º 1, alínea a), do Código Civil, na redacção dada pela Lei 14/2009, de 1 de Abril, que estabelece que a acção da impugnação da paternidade pode ser intentada pelo marido da mãe, no prazo de três anos contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade

»

.

58.º

Conheceu, do mesmo modo

« da matéria relativa à imprescritibilidade do prazo de propositura de acção sobre investigação de paternidade no Acórdão 401/2011 »

.

A este propósito, concluiu que

« a norma do artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, na redacção da Lei 14/2009, de 1 de Abril, na parte em que, aplicando-se às acções de investigação de paternidade, por força do artigo 1873.º, do mesmo Código, prevê um prazo de dez anos para a propositura da acção, contado da maioridade ou emancipação do investigante, não se afigura desproporcional, não violando os direitos constitucionais ao conhecimento da paternidade biológica e ao estabelecimento do respectivo vínculo jurídico, abrangidos pelo direitos fundamentais à identidade pessoal, previsto no artigo 26.º, n.º 1, e o direito a constituir família, previsto no artigo 36.º, n.º 1, ambos da Constituição »

(cf. supra n.º 45 das presentes alegações).

E este Tribunal Constitucional afirmou, também, claramente (cf. supra n.º 46 das presentes alegações):

59.º

“Como já vimos, o direito ao estabelecimento do vínculo da filiação não é um direito absoluto que não possa ser harmonizado com outros valores confituantes, incumbindo ao legislador a escolha das formas de concretização do direito que, dentro das que se apresentem como respeitadoras da Constituição, se afigure mais adequada ao seu programa legislativo. Assim o impõe a margem de liberdade que a actividade do legislador democrático reclama. Caberá, assim, nessa margem de liberdade do legislador determinar se se pretende atingir esse maximalismo, protegendo em absoluto o referido direito, ou se se opta por conceder protecção simultânea a outros valores constitucionalmente relevantes, diminuindo proporcionalmente a protecção conferida aos direitos à identidade pessoal e da constituição da família.

Ao ter optado por proteger simultaneamente outros valores relevantes da vida jurídica através da consagração de prazos de caducidade, o legislador não desrespeitou, as fronteiras da suficiência da tutela, uma vez que essa limitação não impede o titular do direito de o exercer, impondolhe apenas o ónus de o exercer num determinado prazo.

É legítimo que o legislador estabeleça prazos para a propositura da respectiva acção de investigação da paternidade, de modo a que o interesse da segurança jurídica não possa ser posto em causa por uma atitude desinteressada do investigante, não sendo injustificado nem excessivo fazer recair sobre o titular do direito um ónus de diligência quanto à iniciativa processual para apuramento definitivo da filiação, não fazendo prolongar, através de um regime de imprescritibilidade, uma situação de incerteza indesejável.

Necessário é que esse prazo, pelas suas características, não impossibilite ou dificulte excessivamente o exercício maduro e ponderado do direito ao estabelecimento da paternidade biológica.”

60.º

A acolher-se a tese sufragada pelo Acórdão recorrido, do Tribunal da Relação do Porto, desde que se verifique a descoberta, sempre possível, de novos e mais perfeitos exames, poderá intentar-se recurso de revisão de acções de investigação de paternidade, pelo que a noção de caso julgado deixará, pura e simplesmente de fazer sentido.

Numa área, sobretudo, em que a estabilidade do vínculo familiar, e o princípio da segurança jurídica, queira-se ou não, fazem seguramente sentido, pelo menos para alguns dos membros da família em causa.

61.º

Assim, ao contrário do defendido no Acórdão recorrido, julga-se que o prazo de 5 anos, previsto no artigo 772.º, n.º 2 do anterior Código de Processo Civil se afigura como um prazo razoável, decorrente da liberdade conformação do legislador, que ponderou devidamente os interesses em conflito e que se destina a dar prevalência ao princípio da segurança jurídica, numa área tão sensível quanto o da definição da paternidade.

Por todas as razões anteriormente invocadas, julga-se que o Tribunal Constitucional deverá, assim:

62.º

a) conceder provimento ao recurso obrigatório interposto pelo Ministério Público nos presentes autos;

b) considerar, como constitucionalmente conforme, a norma do artigo 772.º, n.º 2 do anterior Código de Processo Civil, ao

« excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal »

, por tal norma não

« acarretar uma diminuição do alcance do conteúdo essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou da maternidade, conflituando com o interesse público na correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica »;

c) determinar, em consequência, a revogação do Acórdão recorrido, de 20 de Maio de 2014, do Tribunal da Relação do Porto.

»

.

7 - Em sede de alegações de recurso, o recorrido concluiu pela improcedência do recurso do seguinte modo (cf. fls. 306-312):

«

ANTONIO COLAÇO PINTO, vem apresentar as suas Alegações, Não obstante bem cuidada e elaborada a peça apresentada pelo Exmo. Senhor ProcuradorGeral Adjunto, certo é que as conclusões a que chegou não podem nem deverão proceder Vejamos:

Tomando como ponto de partida o sumário, elaborado nos termos do disposto no artg.º 713.º, n.º, 7 do CPCivil, constante no acórdão recorrido, temos como certo, que a questão a dilucidar e esclarecer é só uma e só uma:

“… 3 - O prazo de caducidade de cinco anos previsto no n.º 2 do artg.º 772°, do CPC, ao excluir a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade de unicamente com base em prova testemunhal, surge como inconstitucional por violação do direito fundamental à identidade pessoal e às disposições conjugadas dos artgs.º, 16.º, n.º 1;

18.º, n.º 1;

26.º, n.º 1 e 36.º, n.º 1 todos da CRP…”

Está certa esta afirmação? Ou estará errada? A resposta tem que ser dada a esta questão com objetividade e razoabilidade.

O acórdão recorrido foi crítico, incisivo e objetivo ao invés das doutas considerações expendidas pelo Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto que se esquivaram à concludência de uma resposta concordante com o ali consignado.

Como bem se salientou ali, o TC tem vindo a salientar que, para se avaliar se a limitação temporal, i.e., imposição de um prazo de caducidade de cinco anos para a interposição do recurso de revisão, é adequada, necessária e proporcional ao conteúdo dos interesses ou valores em confronto, “não pode prescindir-se de encarar a situação concreta que originou o caso julgado”.

Na decisão que originou caso julgado no presente processo, não existiam os meios técnicos e científicos que hoje garantem a verdade biológica, motivo que levou a que nunca tivesse sido feito qualquer teste científico para apuramento da paternidade, máxime testes sanguíneos de exclusão de paternidade ABO/RH ou testes de ADN. Ora e tal como se sublinhou no recorrido acórdão, tal facto afeta princípios fundamentais constitucionalmente consagrados como o direito à identidade pessoal e o direito ao desenvolvimento da personalidade (“um direito de conformação da própria vida, um direito geral de liberdade de ação cujas restrições tem de ser constitucionalmente justificadas, necessárias e proporcionais”), aclamados no artg.º 26.º, n.º 1 da CRP.

E tal é a importância destes direitos constitucionais que, no decorrer dos últimos anos, a inconstitucionalidade do prazo de caducidade do artgo. 1817.º do CC tem vindo a ser discutida, pelo mesmo motivo que hoje pugnamos:

por impor restrições ao direito fundamental de investigar a paternidade.

Porém, acreditamos na bondade do acórdão recorrido que, porque o vemos sábio e justo, nos atrevemos ora a reproduzir parcialmente, na parte que julgamos fundamental:

“… Sendo a causa de pedir, nas ações de investigação ou reconhecimento da paternidade, constituída pelo facto naturalístico da procriação biológica do filho pelo réu a quem a paternidade é imputada, o referido facto da procriação biológica podia ser demonstrado por via direta, através dos “exames de sangue e quaisquer outros métodos científicos comprovados”, a que se refere o artg.º 1801.º, do Código Civil, ou indiretamente, através do recurso a alguma das presunções legais de paternidade previstas nas als. a), b), c) e d), do artg.º 1871°. do CC, ou, ainda, através do recurso a presunções naturais ou judiciais, alicerçadas em máximas da experiência, nos termos do artg.º 351.º., é o que sucedia, então, na generalidade das causas em que não houvesse lugar à realização de exames de sangue concludentes e em que não ocorresse alguma das situações de facto que servem de substrato às aludidas presunções legais de paternidade, constantes das alíneas a) a d) do artg.º 1871.º, incumbindo então naturalmente ao autor demonstrar que houve relações de sexo entre mãe e o pretenso pai no período legal de conceção do filho e que tais relações foram exclusivas.

A situação em apreço inseriu-se precisamente nesta última hipótese:

a paternidade foi reconhecida unicamente pela demonstração no processo de que as relações de sexo que a autora manteve com o réu podiam ser a causa adequada da gravidez e do subsequente nascimento e de que a mãe do menor apenas as manteve com o aí réu, sendo a partir destes dois factos que as máximas da experiência apontaram o réu como o autor da fecundação.

Com o presente recurso, pretende o autor, não só, por em causa o referido facto indiciário da exclusividade das relações com o réu no período legal da conceção, atestado em audiência de julgamento pelos depoimentos da mãe e das referidas testemunhas, como ainda, e essencialmente, efetuar prova direta de que não é ele o pai.

A redação introduzida pelo DL. 496/77, de 25 de Novembro, ao artigo 1801.º, do CC, ao consagrar expressamente a realização de exames científicos, veio privilegiar o princípio da verdade biológica, cientificamente comprovada e que, faça coincidir o estatuto de filho com a realidade do correspondente vínculo de derivação biológica.

Ora, se à data em que foi proferida a sentença a rever era ainda esporádico o recurso à realização de exames de sangue para o estabelecimento da paternidade, constituindo então um meio de prova pouco seguro, servindo as mais das vezes unicamente para efeitos de exclusão da paternidade, no atual estado da ciência os exames de ADN (ou DNA) propiciam um elevado grau de segurança (com probabilidades bioestatísticas superiores a 99,5,), constituindo a forma mais fiável de estabelecimento do vínculo biológico.

E se existem atualmente meios que conseguem diretamente demonstrar o fenómeno biológico da procriação, através de prova científica concludente, que permita considerar demonstrada, com grau de certeza pratica e socialmente exigível, a procriação biológica, perecenos que a descoberta da verdade biológica se deve sobrepor à necessidade de segurança que está por detrás da fixação do prazo de cinco anos para a propositura do recurso de revisão.

Com efeito, se apesar da declaração de paternidade efetuada em tal processo, e decorridos cerca de 18 anos, o declarado pai continua convencido de que não o é, o facto de se lhe conceder a possibilidade de proceder a exames de sangue, que com um grau de probabilidade próximo da certeza, lhe dirá se ele é, efetivamente, ou não, o pai biológico, contribuirá para uma pacificação de todos os interessados:

se o teste confirmar que ele é o pai, o recurso de revisão será julgado improcedente; se o teste excluir a sua paternidade, confirmando a profunda convicção do autor, então, ter-se-á por justificada a reabertura do processo de investigação de paternidade, a fim de se fazer coincidir a verdade registral com a verdade biológica.

Assim sendo, perguntamos nós, qual o interesse, para os envolvidos, em manter um estado de coisas em que, encontrando-se estabelecido no registo que determinado individuo é pai de outro, continuando aquele convicto de que o não é, tal reconhecimento jurídico acaba por não ter qualquer correspondência na relação interpessoal entre ambos? Note-se, que, no caso em apreço, citado o declarado filho (que entretanto atingiu a maioridade), na sequência do recurso interposto do despacho de indeferimento liminar do recurso de revisão para os termos do recurso e da causa, o mesmo nem sequer deduziu oposição ao requerido, tendo-se remetido ao silêncio.

Como se salienta no citado Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/2006, não podemos ignorar que “os exames biológicos conducentes à determinação da filiação, podem ser realizados fora dos processos judiciais, e a pedido dos particulares, sem qualquer limitação temporal, pelos próprios serviços do Instituto de Medicina Lega!”, pelo que aceitar, em termos absolutos, a limitação temporal dos cinco anos para a revisão das sentenças em que a paternidade haja sido declarada sem recurso a exames científicos, pode levar a situações melindrosas de existência de uma paternidade reconhecida no registo que se saiba não corresponder à verdade biológica por a mesma ter sido excluída por exames de sangue.

A tal respeito, afirma-se ainda no Acórdão deste Tribunal de 31.10.2006, a propósito de um recurso de revisão que teve como fundamento um exame sanguíneo realizado ao menor, à mãe e ao pretenso pai pelo IML, que excluía a paternidade do menor:

“Se é do interesse da menor e da sociedade em geral que ela tenha um nome no lugar destinado ao pai no seu assento de nascimento, não é menos certo que tal nome deve corresponder ao do seu verdadeiro pai biológico. Outro nome que não esse falseia a realidade”.

Como é salientado pelo Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 401/2001, a constituição e a determinação integral do vínculo da filiação, abrangendo ambos os progenitores, corresponde a um interesse geral de ordem pública, a um relevante princípio de organização jurídicosocial. Dar eficácia jurídica ao vínculo genético da filiação, propiciando a localização perfeita do individuo na zona nuclear mais do sistema das relações de parentesco, não se repercute apenas nas relações paifilho, tendo projeções externas a essa relação (v.g., em tema de impedimentos matrimoniais).

Como vem sendo reconhecido pela nossa doutrina e jurisprudência, o impulso científico e social para o conhecimento das origens e o desenvolvimento da genética e a generalização dos testes genéticos de elevada fiabilidade, não deixa incólume o equilíbrio de interesses e direitos constitucionais protegidos, aquando da análise de restrições impostas ao direito de investigar ou de impugnar livremente a paternidade, como o são os prazos de caducidade respeitantes à interposição das ações correspondentes, ou de rever uma sentença que declarou a paternidade unicamente com base em prova indireta.

O referido prazo de cinco anos, ao excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal, acarreta uma diminuição do alcance do conteúdo essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou da maternidade, conflituando com o interesse público na correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica.

Concluindo, entende-se que, no caso em apreço, não é de negar ao recorrente o direito de efetuar esta “prova dos nove”, quanto à paternidade em causa, apenas porque decorreram mais de cinco anos desde o trânsito em julgado da decisão que o declarou como pai, considerando-se que os interesses em jogo - confronto entre bens constitutivos da personalidade e a garantia da segurança jurídicajustificam, no caso em apreço, a recusa da aplicação de tal prazo de caducidade, por violação do principio fundamental à identidade pessoal contido no artg.º 26.º da CRP em conjugação com os artgs.º 16.º, n.º 1, 18°., n.º 1, e 36.º, n.º 1 todos da CRP.” (bold nosso) A ser assim, como é, dúvidas não temos! E, por essa razão, acreditamos que improcedendo o recurso interposto e sendo decidido que e em CONCLUSÃO:

“O prazo de caducidade de cinco anos previsto no n.os, 2 do artg.º, 772°, do CPC, ao excluir a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade unicamente com base em prova testemunhal, surge como inconstitucional por violação ao direito fundamental à identidade pessoal e às disposições conjugadas dos artgs.º 16.º, n.º 1, 18°., n.º 1, 26.º, n.º 1 e 36.º, n.º 1 todos da CRP.”

»

.

Cumpre apreciar e decidir.

II - Fundamentação

8 - Importa desde logo proceder à explicitação do objeto do presente recurso no confronto do pedido com o teor da decisão ora recorrida (cf. supra I, 4 e 3).

8.1 - A norma em juízo no caso concreto é a que consta do artigo 772.º, n.º 2, do anterior Código de Processo Civil (CPC) - versão anterior ao CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26 de junho - na parte em que estabelece um prazo peremptório de cinco anos cujo decurso preclude a interposição do recurso extraordinário de revisão de decisões judiciais transitadas em julgado.

Assim dispunha o artigo 772.º do CPC, que se inseria em secção própria (Secção V), dedicada ao recurso de Revisão, do Capítulo VI (Dos recursos), ambos inseridos no Livro III (Do Processo), Título II (Do Processo de declaração), Subtítulo I (Do processo ordinário), do CPC:

«
Artigo 772.º

Prazo para a interposição

1 - O recurso é interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever.

2 - O recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão e o prazo para a interposição é de 60 dias, contados:

a) No caso da alínea a) do artigo 771.º, do trânsito em julgado da sentença em que se funda a revisão;

b) No caso da alínea f) do artigo 771.º, desde que a decisão em que se funda a revisão se tornou definitiva;

c) No caso da alínea g) do artigo 771.º, desde que o recorrente teve conhecimento da sentença;

d) Nos outros casos, desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão.

3 - Nos casos previstos na segunda parte do n.º 3 do artigo 680.º, o prazo previsto no n.º 2 não finda antes de decorrido um ano sobre a aquisição da capacidade por parte do incapaz ou sobre a mudança do seu representante legal.

4 - Se, porém, devido a demora anormal na tramitação da causa em que se funda a revisão existir risco de caducidade, pode o interessado interpor recurso mesmo antes de naquela ser proferida decisão, requerendo logo a suspensão da instância no recurso, até que essa decisão transite em julgado.

5 - As decisões proferidas no processo de revisão admitem os recursos ordinários a que estariam originariamente sujeitas no decurso da acção em que foi proferida a sentença a rever.

»

Para o Tribunal da Relação do Porto, no acórdão ora recorrido, « o referido prazo de cinco anos, ao excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal, acarreta uma diminuição do alcance do conteúdo essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou da maternidade, conflituando com o interesse público na correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica

»

, entendendo o mesmo Tribunal que não deve aquele prazo de cinco anos - in casu há muito decorrido - obstar à interposição do recurso extraordinário de revisão da sentença, já que:

«

[...] no caso em apreço, não é de negar ao recorrente o direito de efetuar esta “prova dos nove”, quanto à paternidade em causa, apenas porque decorreram mais de cinco anos desde o trânsito em julgado da decisão que o declarou como pai, considerando-se que os interesses em jogo - confronto entre bens constitutivos da personalidade e a garantia da segurança jurídica - justificam [...], no caso em apreço, a recusa da aplicação de tal prazo de caducidade, por violação do princípio fundamental à identidade pessoal contido no artigo 26.º da CRP em conjugação com os arts. 16.º, n.º 1, 18.º, n.º 1, e 36.º, n.º 1, todos da CRP

»

(cf. Acórdão do TRP de 20/05/2014, ora recorrido, fls. 180).

Dirigindo-se a norma em apreço a todos os recursos extraordinários de revisão, em processo cível - independentemente do tipo de ação em que foi proferida a sentença a rever - verifica-se que a decisão recorrida fundamenta a recusa de aplicação da norma -

« de tal prazo de caduci-dade »

(nela previsto) - por razões de inconstitucionalidade que se têm por verificadas especificamente na situação dos autos - pretendendo o declarado pai rever a sentença que estabeleceu a sua paternidade, decorridos 22 anos sobre a data da sua prolação, em recurso de revisão que o Tribunal ora recorrido admite, enquadrando-o no fundamento previsto na alínea b) do artigo 771.º também do CPC anterior (e não também no fundamento previsto na alínea c) da mesma disposição legal, como pretendido pelo então recorrente e ora recorrido).

Assim dispunha, na parte relevante, o artigo 771.º do anterior CPC, igualmente inserido na secção dedicada ao recurso de Revisão:

«
Artigo 771.º

Fundamentos do recurso

A decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão quando:

a) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . b) Se verifique a falsidade de documento ou acto judicial, de depoimento ou das declarações de peritos ou árbitros, que possam, em qualquer dos casos, ter determinado a decisão a rever, não tendo a matéria sido objecto de discussão no processo em que foi proferida;

c) Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida;

[...]

»

.

Assim, quanto ao fundamentos do recurso, do teor da decisão ora recorrida decorre que, tendo o recorrente interposto

«

[...] recurso de revisão da sentença transitada em julgado que o declarou pai biológico do então menor, C…, ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 771.º do CPC e na interpretação extensiva da alínea c) da citada norma, alegando, em síntese, que o registo da paternidade não corresponde à verdade biológica, tendo a decisão assentado unicamente em prova indireta - no depoimento da mãe e de alguns familiares chegados -, requerendo agora a realização de exames científicos de paternidade

»

, entenderam os Juízes não se ter por verificado o fundamento previsto na alínea c) do referido artigo 771.º do CPC - já que

«

[...] por um lado, encontra-se em causa, não um documento, mas um exame e, por outro lado, trata-se de um meio de prova ainda não existente, mas a produzir[...], fundando-se o requerimento de interposição do recurso unicamente na convicção do autor de que não é o pai biológico da criança e ainda no argumento de que, face aos avanços da técnica, tal realidade irá ser seguramente comprovada pela realização de exames genéticos de paternidade

»

- mas sim na alínea b) da mesma disposição, destinando-se o recurso a demonstrar a falsidade dos depoimentos das testemunhas que atestaram a exclusividade da relação da mãe do então menor com o réu. Isto, já que, nas palavras do acórdão recorrido:

«

[...] poderá o autor efetuar a prova da falsidade das declarações da mãe e das testemunhas, que levaram o tribunal que proferiu a sentença revidenda a dar como provado que a mãe não manteve relações sexuais com outro homem durante o período legal da conceção, mediante a realização de exames a efetuar nos presentes autos, recaindo a situação, não na alínea c), mas, sim, na alínea b), do citado artigo 771.º, do CPC.

»

A questão de constitucionalidade a ser apreciada nos presentes autos refere-se, assim, à norma contida no artigo 772.º, n.º 2, do anterior Código de Processo Civil, na parte em que estabelece um prazo de cinco anos, sobre o trânsito em julgado da decisão, e cujo decurso preclude a interposição do recurso extraordinário de revisão, com o sentido de

« ao excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal”. Entende o recorrente, em conformidade com a decisão recorrida que tal “acarreta uma diminuição do alcance do conteúdo essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou da maternidade, conflituando com o interesse público na correspondência entre a paternidade biológica e a paternidade jurídica »

.

8.2 - Do exposto resulta que em causa não está, portanto, em termos gerais, a previsão de um prazo peremptório de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão a rever e cujo decurso preclude a interposição do recurso de revisão, mas sim a previsão desse prazo, absolutamente preclusivo, em relação às hipóteses em que a ação na qual foi proferida a decisão cuja revisão é requerida foi uma ação oficiosa de investigação de paternidade, na qual a paternidade do réu foi declarada com base em prova testemunhal, sendo alegado, para fundamentar o pedido de revisão, a necessidade de realização de exames científicos - que possam apurar

« com um grau de probabilidade próximo da certeza » a paternidade biológica - com vista a infirmar a prova (testemunhal) produzida.

Depois há de se ter em conta também que o juízo de desvalor que recaiu sobre o prazo em causa, determinando a desaplicação da norma contida no artigo 772.º, n.º 2, do anterior CPC, nessa parte, pelo Tribunal ora recorrido - e assim não considerando o decurso do prazo ali estabelecido e o seu efeito preclusivo-, não se dirigiu a qualquer aspeto normativo particular desse prazo, seja quanto ao limite temporal concretamente estabelecido, seja quanto ao modo da sua contagem, designadamente quanto à determinação do seu termo inicial.

9 - Assim explicitado o objeto do recurso, deve começar-se por explicitar o ponto de partida da análise jusconstitucional da questão colocada a este Tribunal.

9.1 - Afigura-se, prima facie, que a norma (dimensão normativa) em causa, que se apresenta como um dado a este Tribunal, se reporta, ainda, ao Direito da Filiação - relevando a modalidade da filiação biológica, que tem por objeto a relação de parentesco que decorre da procriação-, resultando do direito infraconstitucional a pluralidade de formas e regimes de constituição do vínculo filial, em especial quanto ao estabelecimento da paternidade.

O Código Civil regula os vários modos de estabelecimento da paternidade, classicamente repartidos em três:

a presunção de paternidade relativamente ao marido da mãe, que opera na determinação da paternidade dos filhos nascidos ou concebidos na constância do casamento da mãe; a perfilhação (ato voluntário, pessoal, livre, solene e irrevogável do perfilhante) e o reconhecimento judicial (por decisão judicial), que operam na determinação da paternidade dos filhos nascidos ou concebidos fora do matrimónio ou nos casos em que aquela presunção seja afastada, como decorre do disposto no artigo 1796.º, n.º 2, do Código Civil, e, sucessivamente, nos seus artigos 1826.º a 1846.º (que regulam a presunção de paternidade) e 1847.º a 1873.º (que regulam o reconhecimento da paternidade, seja por perfilhação, seja por reconhecimento judicial).

A causa de pedir nas ações de investigação da paternidade - a ação em causa no caso em apreço - é a procriação biológica do filho pelo réu a quem a paternidade é imputada. Explica JORGE DUARTE PINHEIRO que

«

[...] a prova da procriação pode ser feita alternativamente com base em testes de ADN (artigo 1801.º), em presunções legais não ilididas pelo réu (artigo 1871.º) ou pela demonstração de que o pretenso pai teve relações sexuais com a mãe durante o período legal de concepção e que dessas relações resultou o nascimento do investigante

»

(Direito da Família e das Sucessões, Volume II - Direito da Filiação, Proteção de crianças, jovens e idosos, 2.ª edição, AAFDL, Lisboa, 2006, p. 60).

A prova da procriação - para efeitos de estabelecimento da paternidade biológica - pode assim ser feita em tribunal por recurso a exames periciais, como os testes de ADN ou exames hematológicos, com a ressalva de o entendimento doutrinal e jurisprudencial maioritário afastar a possibilidade da sua realização coerciva.

A sentença pode também ser proferida quando haja recurso às presunções legais previstas no artigo 1871.º, do Código Civil (tendo a presunção constante da alínea e) do n.º 1 apenas sido introduzida por via da Lei 21/98, de 12 de maio), que assim dispõe:

«
Artigo 1871.º

(Presunção)

1 - A paternidade presume-se:

a) Quando o filho houver sido reputado e tratado como tal pelo pretenso pai e reputado como filho também pelo público;

b) Quando exista carta ou outro escrito no qual o pretenso pai declare inequivocamente a sua paternidade;

c) Quando, durante o período legal da concepção, tenha existido comunhão duradoura de vida em condições análogas às dos cônjuges ou concubinato duradouro entre a mãe e o pretenso pai;

d) Quando o pretenso pai tenha seduzido a mãe, no período legal da concepção, se esta era virgem e menor no momento em que foi seduzida, ou se o consentimento dela foi obtido por meio de promessa de casamento, abuso de confiança ou abuso de autoridade.

e) Quando se prove que o pretenso pai teve relações sexuais com a mãe durante o período legal de concepção.

2 - A presunção considera-se ilidida quando existam dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado.

»

A invocação, pelo investigante (ou quem o represente), de uma destas presunções faz inverter o ónus da prova na ação de investigação da paternidade, cabendo então ao investigado ilidir a presunção, a ocorrer quando existam dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado.

Não havendo lugar às citadas presunções, a prova da paternidade cabe ao autor da ação de investigação de paternidade. Poderá, assim, a paternidade ser determinada pelo tribunal quando, em juízo, o autor faça prova da designada

« coabitação causal »

, isto é, demonstre que durante o período de conceção a mãe manteve relações sexuais com o pretenso pai e que essas relações foram exclusivas, como ocorreu in casu. Com efeito, no caso dos autos, a paternidade foi estabelecida por sentença judicial proferida no âmbito de uma ação de investigação da paternidade em 26/06/1990, com base na prova então produzida.

Como escreve, a propósito, Carlos Lopes do Rego, « [...] na verdade, demonstrado que, no período temporal em que as relações de sexo poderiam ser causa adequada da gravidez e do subsequente nascimento, a mãe do menor apenas com o pretenso pai as manteve, naturalmente que as

« máximas da experiência » conduzem inelutavelmente a apontar o réu como autor da fecundação …
»

(cf.

«

Relevância dos exames de sangue nas ações de investigação da paternidade - Recusa de cooperação do réu e inversão do ónus da prova (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Junho de 1993) - Comentário

»

, in Revista do Ministério Público, Ano 15.º, abril/junho 1994, n.º 58, pp. 157-173, p. 167).

9.2 - Assim, reitere-se, é da decisão de reconhecimento judicial da paternidade exarada em sentença datada de 26/06/1990, transitada em julgado, que o ora recorrido, em 10/10/2012, interpôs recurso extraordinário de revisão (cf. supra 2.2.), o qual foi admitido pelo acórdão do TRP, não obstante decorrido o prazo legalmente estabelecido para o efeito - no artigo 772.º, n.º 2, do anterior CPC, o qual se teve por inaplicável à situação dos autos por razões de inconstitucionalidade. Com efeito, o acórdão ora recorrido desaplicou a norma do artigo 772.º, n.º 2, do CPC por inconstitucionalidade, ao concluir que o preceito, fixando um prazo de caducidade, viola o direito fundamental à identidade pessoal decorrente do artigo 26.º, n.º 1, da Constituição, compaginado com o direito a constituir família (previsto no artigo 36.º, CRP), entendendo aquele prazo para a interposição dos recursos extraordinários de revisão como uma restrição intolerável aos direitos assinalados.

Deve desde já sublinhar-se que o prazo de caducidade em causa, que se reporta ao instituto de revisão extraordinária de sentença com força de caso julgado, é distinto dos prazos de caducidade que se reportam às acções de investigação e de impugnação da paternidade com vista, respectivamente, ao estabelecimento ou à impugnação do vínculo de filiação biológica - pelo que é no quadro daquele (e não destas acções) que a questão submetida a este Tribunal deve ser apreciada.

Assim, atenta a norma do CPC cuja aplicação foi afastada pela decisão ora recorrida - o artigo 772.º, n.º 2, do (anterior) CPC -, a questão jurídicoconstitucional a apreciar deve reportar-se, em última análise, ao instituto jurídico em causa - revisão de sentenças - no quadro mais amplo da função jurisdicional no âmbito do Estado de Direito.

10 - No quadro do Estado de Direito, a função jurisdicional caracteriza-se pela estabilidade e definitividade das suas decisões - neste ponto se distinguindo da função legislativa, que se caracteriza pela autorevisibilidade pelo legislador ordinário, a qualquer tempo, ainda que sujeita à observância da Constituição e dos princípios constitucionais aplicáveis nela consagrados.

Se é certo que a função jurisdicional implica, em Estado de Direito, que as decisões jurisdicionais não possam, em princípio, ser postas em causa - visando a certeza e a segurança, ínsitos naquele, na regulação definitiva das relações jurídicas intersubjectivas-, é igualmente certo que a expressão da função jurisdicional do Estado não se encontra imune ao erro, assim justificando institutos jurídicos dirigidos à reparação dos efeitos do mesmo (como é o caso do instituto da responsabilidade civil do Estado por erro imputável ao Estado-Juiz) ou, excepcionalmente, à modificação da própria sentença - como é o caso do instituto de revisão de sentença, em causa quanto à norma ora sindicada.

Sublinhe-se que ao direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais para

« defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos » consagrado no artigo 20.º da Constituição compreende, além do mais, o
« direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável [...] »

(cf. n.º 4, 1.ª parte) - e tal

« decisão » judicial, na concretização pelo legislador ordinário, reporta-se expressamente a uma decisão judicial
« que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo [...] »

(cf. artigo 2.º, n.º 1, do NCPC, que corresponde ao mesmo artigo e número do anterior CPC).

O Tribunal Constitucional por diversas vezes reconheceu a proteção constitucional do caso julgado, alicerçando-a, quer no disposto no n.º 3 do artigo 282.º da Constituição, quer nos princípios da confiança e da segurança jurídicas, decorrentes da própria ideia de Estado de Direito Democrático (artigo 2.º da Constituição). Como, a este propósito, se lê no Acórdão 301/2006, « [a] estabilidade das decisões judiciais exprime o valor do Direito e a subordinação do Estado e da sociedade ao seu Direito, diferentemente do que caracteriza o Estado autoritário que historicamente sempre concebeu instrumentos de anulação das sentenças (cf., por exemplo, FRIEDRICH CHRISTIAN SCHROEDER, Strafprozessrecht, 2.ª ed., 1997, p. 217)

»

.

No Acórdão 108/2012 pode ler-se, atendendo especialmente ao regime consagrado no artigo 282.º da Constituição da República Portuguesa em matéria de intangibilidade do caso julgado face aos efeitos da declaração de inconstitucionalidade (ou de ilegalidade) com força obrigatória geral:

«

[...] 6 - A razão que justifica esta segunda exceção [caso julgado] encontra-se no princípio da segurança jurídica, que decorre do princípio mais vasto de Estado de direito, consagrado no artigo 2.º da CRP. O Estado de direito é, também, um Estado de segurança. Por isso, dificilmente se conceberia o ordenamento de um Estado como este que não garantisse a estabilidade das decisões dos seus tribunais. Ao contrário da função legislativa, que, pela sua própria natureza, tem como característica essencial a autorrevisibilidade dos seus atos (nos limites da Constituição), a função jurisdicional, que o artigo 202.º da CRP define como sendo aquela que se destina a “assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”, a “reprimir a violação da legalidade democrática” e a “dirimir os conflitos de interesses públicos e privados”, não pode deixar de ter como principal característica a tendencial estabilidade das suas decisões, esteio da paz jurídica. Por esse motivo, o artigo 282.º ressalvou, como derrogação à regra da eficácia ex tunc das declarações de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, a intangibilidade do caso julgado, opondo assim ao valor negativo da inconstitucionalidade o valor positivo da questão já decidida pelo tribunal.

Ao estabelecer esta oposição, fazendo nela prevalecer a força vinculativa do caso julgado, o legislador constituinte revelou a forma como procedeu à ponderação de dois bens ou valores:

entre a garantia da normatividade da constituição, e a consequente forte censura dos atos inconstitucionais, e a garantia da estabilidade das decisões judiciais, especialmente exigida pelo Estado de direito, a constituição optou em princípio pela segunda, salvos os casos, impostos pelo princípio do favor rei, previstos na segunda parte do n.º 3 do artigo 282.º

E especificamente da consideração dos valores inerentes ao caso julgado - desde logo, a razão de certeza ou segurança jurídicas - parte o Acórdão 310/2005, recordando as palavras de Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, nova edição revista e atualizada pelo Dr. Herculano Esteves, Coimbra, 1976, pp. 305/306):

«

Sem o caso julgado material estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica (instabilidade das relações jurídicas) verdadeiramente desastrosa - fonte perene de injustiças e paralisadora de todas as iniciativas. Seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu; que nem sequer a estes bens pudesse chamar seus, nesta base organizando os seus planos de vida; que tivesse constantemente que defendêlos em juízo contra reiteradas investidas da outra parte, e para mais com a possibilidade de nalgum dos novos processos eles lhe serem negados pela respectiva sentença. Não se trata propriamente de a lei ter como verdadeiro o juízo - a operação intelectual - que a sentença pressupõe. O caso julgado material não assenta numa ficção ou presunção absoluta de verdade, por força da qual, como diziam os antigos, a sentença faça do branco preto e do quadrado redondo (

« facit de albo nigrum,... aequat quadrata rotundis... »

) ou transforme o falso em verdadeiro (falsumque mutat in vero). Trata-se antes de que, por uma fundamental exigência de segurança, a lei atribui força vinculante infrangível ao acto de vontade do juiz, que definiu em dados termos certa relação jurídica, e portanto os bens (materiais ou morais) nela coenvolvidos. Este caso fica para sempre julgado. Fica assente qual seja, quanto a ele, a vontade concreta da lei (Chiovenda). O bem reconhecido ou negado pela pronuntiatio judicis torna-se incontestável.

Vê-se, portanto, que a finalidade do processo não é apenas a justiça - a realização do direito objectivo ou a actuação dos direitos subjectivos privados correspondentes. É também a segurança - a paz social (Schönke)

»

.

Na síntese do Acórdão 151/2015:

«

O princípio da segurança e certeza jurídica, inerente ao modelo do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição, no âmbito dos atos jurisdicionais, justifica o instituto do caso julgado, o qual se baseia na necessidade da estabilidade definitiva das decisões judiciais transitadas em julgado. Daí que seja reconhecida, enquanto subprincípio, a intangibilidade do caso julgado, revelado em preceitos constitucionais como o artigo 29.º, n.º 4, e 282.º, n.º 3, [...]

»

Decorrendo o princípio da intangibilidade do caso julgado do princípio da segurança e certeza jurídica inerente ao Estado de Direito, o mesmo não afasta, excepcionalmente, a revisibilidade de decisões judiciais transitadas em julgado.

Ora, o recurso extraordinário de revisão de sentença constitui uma limitação ao caso julgado, ao permitir, em certos termos, a revisibilidade de decisões judiciais transitadas em julgado. Assim se compreende que o legislador, na conformação normativa deste tipo de recurso (aqui apenas relevando o recurso de revisão em matéria cível), estabeleça fundamentos precisos e taxativos para a respetiva interposição (assim o artigo 771.º, do anterior CPC) e limites temporais para o respetivo exercício (assim o artigo 772.º, idem), de modo a respeitar, na essência, o princípio da imodificabilidade das decisões dos tribunais insuscetíveis de recurso ordinário.

Com efeito, reconhecendo-se ao caso julgado um valor constitucionalmente relevante - assim a jurisprudência constitucional exarada no Acórdão 310/2005 e a nele citada - não lhe pode ser negado

«

[...] algum grau de protecção (de intangibilidade), em termos da sua ultrapassagem só ser aceitável dentro de uma lógica de balanceamento ou ponderação com outros interesses dotados, também eles, de tutela constitucional

»

(Acórdão 310/2005), dispondo o legislador de uma considerável margem de liberdade na configuração dos pressupostos e limites do recurso extraordinário de revisão (em matéria cível).

E entre esses limites se compreende o estabelecimento de um prazo de caducidade para efeitos da revisibilidade das decisões judiciais transitadas em julgado - assim se garantindo a estabilização e definitividade das decisões judiciais, como decorre da própria função exercida. Ainda do acórdão agora citado:

«

[...] ora, um dos modos que pode revestir essa configuração traduz-se precisamente no estabelecimento de um limite temporal à possibilidade de desencadear o meio de impugnação do caso julgado. É este o sentido do prazo de cinco anos previsto no artigo 772.º, n.º 2 do CPC. Face a tal limite, a respectiva indagação de conformidade constitucional implicará, também ela, que o valor de caso julgado seja posicionado face ao outro valor expresso pela situação relativamente à qual a ultrapassagem daquele é requerida

»

.

Se a essência da função jurisdicional em Estado de Direito encerra a tendencial estabilidade das decisões judiciais vertida na especial força de caso julgado que lhes é atribuída - igualmente concretizando o direito de acesso à justiça e aos tribunais (artigo 20.º da CRP) - a consagração do instituto de revisão de sentença (que, como afirmado no Acórdão 310/2005

« cumpre igualmente um objectivo dotado de relevância constitucional (que decorre do artigo 20.º da CRP) » e com expresso assento constitucional em matéria de sentença penal injusta, no artigo 29.º, n.º 6, da CRP), enquanto exceção à referida especial força de caso julgado, não pode ser entendido de molde a desvirtuar a essência da expressão da função jurisdicional do Estado vertida numa decisão transitada em julgado.

A natureza do recurso de revisão, assente no vício da prova constituída e, assim, na invalidade da prova produzida no âmbito do processo que findou com a prolação de decisão com trânsito em julgado, não é de molde a permitir a quebra do mesmo para dar continuidade a um processo já findo para nele se continuar a produzir - nova ou, como sucede in casu, melhor - prova que a final permita confirmar ou infirmar a prova produzida, ou seja, cujo resultado à partida se desconhece, ainda que possam estar em causa, em última análise, direitos fundamentais constitucionalmente consagrados. Dito de outro modo, não se pode, por via do instituto de revisão de sentença e sob a sua égide, desvirtuar a sua natureza excepcional, colocando a particular força de uma sentença transitada em julgado, enquanto emanação da função jurisdicional na regulação definitiva das relações jurídicas intersubjectivas, na dependência de uma condição (in casu futura e incerta, pelas razões expostas) de prevalência de um direito fundamental (ainda que de enorme relevância, como sucede em relação ao direito invocado pela decisão recorrida, que se integra nos direitos pessoais).

Atenta a natureza do recurso de revisão - invariável em razão da natureza da acção no qual foi proferida, em cada caso, a sentença revidenda-, não se afigura bastar a invocação de direitos fundamentais - mesmo os invocados direitos nos presentes autos - para se concluir pela prevalência destes em qualquer caso em detrimento do peso do caso julgado. Não resulta esse balanceamento da própria Constituição, pelo contrário:

dados normativos relevantes, designadamente os constantes do artigo 282.º, n.º 3 da CRP, apontam no sentido da preferencial intangibilidade do caso julgado.

Como se explica no Acórdão 108/2012:

«

[...] A uma ponderação de bens feita pelo próprio legislador constituinte, e em cujo resultado se inscreve a prevalência nítida de um dos bens ou valores em conflito, não pode o intérprete contrapor a sua própria ponderação.

No caso, invoca o recorrente o maior peso que certos direitos fundamentais (como aqueles que, constantes do n.º 1 do artigo 26.º da CRP, são atuados através das ações de investigação da paternidade) terão sobre o princípio da força vinculativa do caso julgado, partindo da ideia segundo a qual este segundo princípio deve ceder perante o imperativo de garantia da Constituição. É por isso que sustenta que, uma vez declarada, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma do Código Civil que previa um prazo de dois anos para a interposição das ações de investigação da paternidade, terá o autor de ação interposta em momento anterior ao da declaração de inconstitucionalidade o direito a interpor nova ação, direito esse conferido por uma leitura restritiva da norma de direito processual civil que define o âmbito e o alcance da exceção dilatória do caso julgado. Engana-se, porém, ao defender que tal interpretação restritiva é imposta pela Constituição. Não o é. A ponderação, feita pelo próprio legislador constituinte no n.º 3 do artigo 282.º da CRP, entre censura da inconstitucionalidade por um lado e proteção do caso julgado por outro - com prevalência deste último sobre o primeiro-, ao ser reveladora do peso que detém, no sistema constitucional, o princípio da segurança jurídica, é também reveladora da opção de princípio que, neste domínio, o legislador constituinte tomou:

a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral de qualquer norma de direito ordinário (e quaisquer que sejam os valores constitucionais que esta última tenha ofendido), se, por regra, apaga os efeitos que a norma ilícita produziu, não apaga as situações em que tal norma tenha sido aplicada em casos definitivamente decididos pelos tribunais.

Sendo esta a opção de princípio que o legislador constituinte tomou, claro se torna que não resulta da Constituição o dever de interpretar restritivamente as normas do Código de Processo Civil que definem o âmbito e o alcance da exceção dilatória do caso julgado. Não há, face à Constituição, o dever de interpretar essas normas de forma a excluir do seu âmbito de aplicação as ações não oficiosas de investigação da paternidade, pese embora a especial repercussão jusfundamental que detém o regime comum dessas ações

»

.

E tal juízo - de que não basta a mera invocação de um direito fundamental, in casu o direito à identidade pessoal - não é infirmado pelo modo como o legislador infraconstitucional configura, em cada momento temporal, o instituto do recurso (extraordinário) de revisão, no caso em processo civil.

Se a modelação do instituto de revisão, incluindo quando à configuração de um prazo de caducidade, encerra uma considerável margem de conformação por parte do legislador, essa conformação não pode, em geral, ser de molde a desvirtuar a essência da função jurisdicional em Estado de Direito, garantida por especial força de caso julgado.

E igualmente a conformação pelo legislador ordinário do recurso de revisão quanto ao momento da prova dos fundamentos de revisão - ab initio com o pedido de revisão ou posteriormente, depois da sua admissão - não pode condicionar o juízo sobre a conformidade constitucional sobre a norma ora sindicada por não constituir parâmetro do mesmo.

E, em especial, o modo como o legislador, no novo CPC de 2013 (NCPC), ao estabelecer o mesmo prazo (de cinco anos) de caducidade do exercício do direito de revisão de decisões transitadas em julgado, vem excecionar os recursos que respeitem a direitos de personalidade (cf. artigo 697.º, n.º 2 do novo Código de Processo Civil), também não infirma aquela conclusão. Desde logo, porque a ‘exceção’ prevista no NCPC não altera a natureza do recurso de revisão assente no referido vício da prova constituída (invalidade da prova); depois, porque traduzindo-se tal ‘ex-ceção’ na desconsideração do prazo de interposição quando estejam em causa direitos de personalidade e, assim, na possibilidade de lançar mão do instituto para além do prazo de caducidade de cinco anos fixado pelo legislador, tal não significa uma quebra ‘automática’ do caso julgado, não ficando o requerente dispensado da prova dos fundamentos da revisão e, assim, ainda reportados ao vício da prova constituída; por último, porque tal opção do legislador não corresponde a uma estrita exigência derivada da Constituição, em termos de se dever afirmar a invalidade constitucional de solução diversa que previsse o estabelecimento de um prazo, antes decorre da sua margem de ponderação.

Se a invocação de um direito fundamental, ainda que de particular relevância como o direito à identidade pessoal, não justifica de per si a cedência do valor do caso julgado e um juízo de desconformidade constitucional da configuração dos pressupostos e limites do instituto da revisão, em particular do limite temporal vertido num prazo de caducidade, muito menos o justificará a invocação de uma afectação meramente ‘virtual’ desse direito. É que o fundamento do pedido de revisão baseia-se numa mera convicção de que a nova prova pericial com recurso a meios técnicos supervenientes de determinação da paternidade - e a produzir - infirmará a coincidência entre o vínculo de filiação judicialmente estabelecido e a paternidade biológica.

Por essa razão não tem sequer aplicação in casu a reflexão contida no Acórdão 310/05 a partir do direito comparado e do caso alemão (cf. II - Fundamentação, 2.4.1):

«

[...] Outro argumento, desta feita de direito comparado, também ele apontando no sentido da especificidade das acções em que se investiga a maternidade ou paternidade, no confronto com outro tipo de acções, pode extrair-se da análise da legislação adjectiva alemã. Nesta, com efeito, o recurso de revisão, denominado

« acção de restituição »

(Restitutionsklage:

restituição tem aqui o sentido de retorno à situação anterior), regulada nos §§ 580.º e seguintes do Código de Processo Civil Alemão [a Zivilprozeβordnung (ZPO), cujo texto pode ser encontrado em http:

//dejure.org/gesetze/ZPO], está igualmente sujeita a um prazo de cinco anos (§ 586.º:

[...] 2. [...]. Decorridos cinco anos, contados do trânsito da sentença, as acções são improcedentes [...]”).

Existe, porém, um regime especial, traduzido na não aplicação deste prazo, relativamente ao caso julgado que decidiu uma questão de paternidade [§ 641.º I:

1. A acção de restituição contra uma sentença transitada na qual se decidiu sobre a paternidade, procede, além das situações previstas no § 580.º, se a parte apresenta um novo relatório pericial sobre a paternidade que, por si ou em conjunto com as provas produzidas no processo anterior, teria conduzido a uma decisão diferente. [...] 4. O § 586.º não se aplica.” (do § 580.º constam os fundamentos da revisão, equivalendo este, no essencial, ao nosso artigo 771.º). Tal opção do legislador germânico teve lugar em 1969 (com o acrescento do § 641.º I da ZPO) e ocorreu no quadro do debate relativo à repercussão de novos meios científicos de prova da paternidade no caso julgado preexistente (v. Guilherme de Oliveira, A Lei e o Laboratório, in

«

Temas de Direito da Família

»

, 2.ª ed., Coimbra, 2001, págs. 92/93; v., defendendo que no confronto entre os valores constitucionais respeitantes ao caso julgado e à veracidade no estabelecimento da filiação, aqueles devem ceder face a estes, Vladimir Brega Filho, A Relativização da Coisa Julgada nas Acções de Investigação de Paternidade; disponível em:

http:

//orbita. starmedia.com/jurifran/ajreinpat.html). [...]

»

.)

11 - Por último, é ainda de questionar se, ainda que se tenha concluído pela não prevalência da invocação de um direito fundamental no quadro do instituto da revisão de sentenças para a invalidação do estabelecimento de um prazo para o efeito - em termos constitucionalmente não censuráveis - se subsistiria alguma outra razão que pudesse levar a juízo diverso, por se reportar a vícios inerentes ao próprio exercício da função jurisdicional em termos passíveis de afectar o direito fundamental de acesso à justiça e aos tribunais (artigo 20.º da CRP) e determinar o sacrifício do caso julgado e a revisão de sentença transitada.

Afigura-se não ser esse o caso, não sendo transponível para a situação sub judice a jurisprudência exarada nos Acórdãos n.º 209/2004 e n.º 200/2009 - aquele mencionado pela decisão ora recorrida. Com efeito, não obstante estar em causa a aplicação do prazo previsto no n.º 2 do artigo 772.º do anterior CPC, as dimensões normativas julgadas inconstitucionais por este Tribunal reportavam-se a caso em que, tendo a acção oficiosa de investigação da paternidade corrido à revelia, se mostrou ofendido o princípio do contraditório, em que se integra a proibição da indefesa. Ora tal entendimento não encontra aplicação no caso sub judice.

12 - De quanto fica exposto, verifica-se que não existem razões que, em ponderação, justifiquem um sacrifício dos valores de segurança e certeza inerentes ao caso julgado, aqui concretizado na fixação de limites temporais para o recurso à revisão extraordinária de sentença transitada em julgado que, em ação de investigação de paternidade, estabeleceu o vínculo de filiação com base em prova testemunhal. Assim, considera-se não ser constitucionalmente desconforme a norma sindicada perante este Tribunal.

III - Decisão

13 - Pelos fundamentos expostos, decide-se:

a) Não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 772.º, n.º 2, do anterior Código de Processo Civil, na parte em que estabelece um prazo de cinco anos, sobre o trânsito em julgado da decisão, e cujo decurso preclude a interposição do recurso extraordinário de revisão, com o sentido de

« ao excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal” e, em consequência, b) Conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, consequentemente, ordenar a reforma da decisão recorrida em conformidade com o precedente juízo de não inconstitucionalidade.

Sem custas, por não serem legalmente devidas. Lisboa, 10 de dezembro de 2015 - Maria José Rangel de Mesquita - Carlos Fernandes Cadilha - Lino Rodrigues Ribeiro (com declaração de voto) - Catarina Sarmento e Castro (vencida, nos termos da declaração de voto junta) - Maria Lúcia Amaral.

Declaração de voto Não acompanho a pronúncia de não inconstitucionalidade da norma do n.º 1 do artigo 772.º do anterior Código de Processo Civil, quando aplicada às ações de investigação de paternidade, por entender que, no plano constitucional, o caso julgado nesse tipo de ações cede perante a veracidade no estabelecimento da filiação.

O que está em causa no processo é apenas o prazo perentório de cinco anos para a propositura de uma ação de revisão da decisão jurisdicional que foi tomada numa ação de investigação de paternidade, tendo por fundamento a disponibilidade de um novo meio de prova - teste de ADN - capaz de determinar com segurança a paternidade biológica.

As demais condições de admissibilidade da revisão, enunciadas nas várias alíneas do artigo 771.º do mesmo código, foram dadas por verificadas na decisão recorrida e, independentemente do acerto dessa decisão, não fazem parte do objeto do recurso de fiscalização. Portanto, a questão de saber se a revisão de sentença é o meio adequado para obter o novo meio de prova, que foi resolvida em sentido positivo pelo acórdão recorrido, é um problema que não interfere na decisão sobre a constitucionalidade do prazo de caducidade daquela ação.

O caso julgado, com as suas características de decisão judicial final, trânsito em julgado e imutabilidade, é um valor protegido pela Constituição (artigos 282.º, 3, 29.º, n.os 5 e 6, 110.º, n.º 1, 111.º n.º 2 e 205.º, n.º 2). Todavia, o princípio da imutabilidade implicitamente reconhecido nessas disposições não é um princípio de natureza absoluta, até porque é a própria Constituição que admite a revisão com fundamento em norma declarada inconstitucional ou quando ocorra uma condenação injusta. Por outro lado, a relativização do caso julgado também pode decorrer do confronto com outros princípios constitucionais. Como se refere no Acórdão 310/2005

« a aceitação da relevância constitucional do caso julgado, não significa uma total intangibilidade deste:

o caso julgado sempre poderá ser colocado em confronto com outros princípios constitucionais e, nessa operação de ponderação de interesses, ceder, ou não, consoante a natureza dos valores em presença

»

. Por exemplo, é a tutela jurisdicional efetiva consagrada no artigo 20.º da CRP que justifica a revisão da sentença transitada em julgado nos casos previstos no artigo 771.º do anterior CPC (atual artigo 696.º), apesar da Constituição apenas se referir à revisão dos casos julgados inconstitucionais e das condenações injustas.

A consagração constitucional do princípio da imutabilidade do caso julgado não obsta a que o legislador ordinário disponha de um apreciável grau de liberdade na definição dos pressupostos necessários para a formação desse instituto, incluindo a previsão de meios processuais que permitam ultrapassálo quando outros interesses, dotado de tutela constitucional, imponham a existência de tais meios. Nesse exercício, o legislador pode e deve fixar, em termos genéricos, um prazo de impugnação do caso julgado, como acontece como a norma do n.º 1 do artigo 772.º Mas em decisões judiciais tomadas em certo tipo de ações, com acontece com as ações de estado, o valor do caso julgado pode não prevalecer sobre os valores e interesses que são atuados nesses processos.

O caso julgado enquanto instrumento de garantia à segurança jurídica pode ceder quando fatores externos ao processo judicial tenham impossibilitado ou comprometido o exercício da função jurisdicional do Estado. Nessas hipóteses, a decisão judicial viciada acaba por constituir uma violação excessiva da tutela jurisdicional efetiva, o que legitima a revisão do caso julgado ilegal. Mas a intolerância da decisão viciada ou errada não significa que haja impedimento constitucional à fixação de limites temporais ao uso desse meio processual. Apenas em situações de maior prejuízo aos princípios constitucionais, como o da dignidade da pessoa humana ou outros princípios fundamentais, é que a exigência de justiça pode sacrificar irremediavelmente a estabilidade da decisão judicial.

Assim acontece nas ações de investigação de paternidade que envolvem direitos de personalidade, designadamente o direito à identidade pessoal, que inclui os vínculos de filiação. O que está em causa neste tipo de ações é o direito fundamental ao conhecimento e reconhecimento da paternidade (Acórdãos n.os 486/04 e 11/05). Trata-se de um direito que

« postula um princípio de verdade pessoal »

, pois

« ninguém deve ser obrigado a viver em discordância com aquilo que pessoalmente e identitariamente é »

(cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª ed. pág. 609). De modo que não se pode impor a alguém que seja pai para sempre, se não é nem pai biológico nem tem qualquer vínculo de convivência com o filho que a justiça lhe impõe. A certeza da paternidade é um dos elementos da dignidade pessoa humana que relativiza o caso julgado, em termos de permitir a revisão a todo o tempo da sentença proferida numa ação que não possibilitou a descoberta da verdade biológica através do exame de ADN. A fixação de um limite temporal para a revisão da sentença proferida num processo em que não foi feita prova pericial que permite determinar plenamente a origem biológica de um indivíduo é excessivamente desproporcional ao objetivo pretendido com tal limite.

A anterior jurisprudência do Tribunal Constitucional respeitante à questão da relevância do caso julgado faz uma “ponderação autónoma” das ações de investigação de paternidade para efeitos de aplicação do prazo de cinco anos estabelecido no artigo 772.º do anterior CPC. Com efeito, nos Acórdãos n.os 209/04, 200/09 e 310/05 aponta-se para a inconstitucionalidade desse prazo quando aplicado a este tipo de ações, por envolverem uma

« situação particular de tutela de direitos de natureza estritamente pessoal ou de personalidade, expressos na relação de paternidade ou de filiação, que constituem emanação do direito à identidade pessoal previsto no artigo 26.º, n.º 1 da CRP »

. Tendo em atenção os valores em presença, a limitação temporal da revisão da sentença proferida num processo de averiguação da paternidade em que, por razões várias, não foi possível efetuar o exame de ADN consubstanciaria uma

« cedência manifestamente desproporcional às exigências de certeza e segurança jurídicas que estão na base da solução subjacente ao disposto no artigo 772.º, n.º 2, do CPC »

. - Lino Rodrigues Ribeiro.

DECLARAÇÃO DE VOTO

Fiquei vencida, já que votei no sentido da inconstitucionalidade da norma do n.º 2 do artigo 772.º do (anterior) Código de Processo Civil (CPP), na parte em que estabelece um prazo absolutamente perentório de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, e cujo decurso preclude a interposição do recurso extraordinário de revisão, com o sentido de “excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal”.

Útil a esta apreciação será começar por relembrar que a norma cuja constitucionalidade vem questionada - que na fiscalização concreta é, para o Tribunal Constitucional, um dado - foi desaplicada num contexto em que o tribunal a quo deu por verificados os (demais) fundamentos da interposição do recurso extraordinário de revisão, não cabendo ao Tribunal Constitucional questionar a concreta aplicação do Direito por aquele realizada, mas tão só julgar acerca da (in)constitucionalidade da norma com o sentido que lhe foi atribuído no julgamento da causa.

Por ser assim, consideramos que nunca se poderá afirmar que a defesa da inconstitucionalidade desta norma no caso em apreço poria em causa os atuais contornos do recurso extraordinário revisão - o Tribunal da Relação deu por verificados os (restantes) pressupostos firmados na lei (incluindo os previstos no artigo 771.º da anterior versão do CPP) e não cabe ao Tribunal Constitucional aferir da boa aplicação do direito ao caso concreto.

Por outro lado, devendo o juízo do Tribunal Constitucional recair sobre a norma tal como foi delimitada na decisão recorrida, fica claro que o âmbito da restrição ao caso julgado que a defesa da inconstitucionalidade da norma carrega consigo sempre se cingiria a um muito específico tipo de ações, no caso, ações de estado, relativas ao estabelecimento do vínculo jurídico da paternidade, não abrindo, sem critério, o recurso extraordinário de revisão, para além do prazo estabelecido, em quaisquer circunstâncias, nem, sequer, no caso da norma em apreciação, em todos os casos de direitos de personalidade (como veio, em versão posterior, a estabelecer o legislador), mas apenas quando está em causa o direito à identidade pessoal na relação com o direito ao conhecimento/reconhe-cimento da paternidade ou da maternidade.

O juízo que fazemos para chegar à inconstitucionalidade da norma (sufragando a desaplicação dela feita pelo tribunal a quo), se bem que não totalmente coincidente quanto à sua fundamentação, não pode ser desligado do juízo e argumentos empreendido nos Acórdãos em que, anteriormente, nos pronunciámos acerca da imprescritibilidade do direito de propor uma ação de investigação da paternidade que, em parte, têm aqui cabimento. De um dos lados da ponderação que importa neste caso fazer encontra-se também, como ali, um direito à verdade biológica e à historicidade pessoal, um direito à identidade pessoal, ao conhecimento/reconhecimento da maternidade, e o interesse público da coincidência da paternidade biológica e a paternidade juridicamente fixada, valendo, no caso, muitas das considerações que então avançámos, ou para as quais, então, remetemos, nas declarações de voto aos Acórdãos n.os 164/2011, 411/2011 e 24/2012. E, como resulta da posição ali defendida, propendemos, então, para fazer prevalecer estes direitos e interesses, em detrimento dos valores da certeza e segurança jurídicas entendidos de forma absoluta.

É certo que, ali, a certeza, segurança e estabilidade das relações jurídicas eram garantidas pelo estabelecimento de um prazo findo o qual se tornava inimpugnável uma determinada situação jurídica. Agora, está em causa a certeza e segurança jurídicas resultantes da estabilidade das decisões judiciais, que “tem como ideia central a da indiscutibilidade judicial” (MENDES, João Castro, Limites objetivos do caso julgado em processo civil, Lisboa, 1968, p. 18), importando saber se também aqui deve ainda prevalecer a verdade biológica, o direito à identidade pessoal e ao (re)conhecimento da paternidade/maternidade, ou se estes devem ceder em face da força do instituto do caso julgado.

Sem esquecer a dignidade constitucional do caso julgado (artigo 282.º, da CRP), relembre-se, contudo, que a própria Constituição admite a sua limitação (artigo 282.º, n.º 3, da CRP) - de que a revisão de sentenças é concretização. A Lei Fundamental, que consagra a indispensabilidade do caso julgado, na sua (tendencial) intangibilidade, que vem indissociavelmente ligada à natureza da função jurisdicional (v.g., Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 644/98, ou, na doutrina, OTERO, Paulo, Ensaio sobre o caso julgado inconstitucional, Lisboa, 1993, p. 50;

MEDEIROS, Rui, A decisão de inconstitucionalidade, Lisboa, 1999, p. 548 e ss.), ainda assim, não toleraria uma ordem jurídica que prescindisse do instituto de revisão de sentença (Veja-se sobre o assunto o que escreveu ALEXANDRE, Isabel, “O caso julgado na jurisprudência constitucional portuguesa”, Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra, 2003, p. 61 e 62; bem como, v.g., os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 184/98, 644/98 e, em especial 310/2005).

Sendo o caso julgado um valor constitucionalmente protegido, mas, também, aceite que a revisão de sentenças deve ser prevista em determinados casos - como efetivamente o é - a ponderação que importa fazer é a de saber se existirão circunstâncias em que, estabelecido tal recurso, o prazo fixado para o acionar, que garante a estabilidade do caso julgado, deve poder ser afastado.

Ora, no balanceamento ou ponderação da garantia do caso julgado com os interesses em causa na norma em apreço, de natureza estritamente pessoal ou de personalidade, mais especificamente, relativos ao estabelecimento da relação de paternidade (filiação), igualmente dotados de forte proteção constitucional, enquanto emanação do direito à identidade (e verdade) pessoal (artigo 26.º, n.º 1, da CRP), a resposta, a nosso ver, não poderia deixar de ser afirmativa, desde logo se olharmos para o específico sentido da norma.

Nos casos em que, como na norma em apreciação, está em causa a revisão de uma sentença que definiu a situação jurídica relativa à paternidade, determinada por mera prova testemunhal, quando atualmente testes científicos de ADN permitem fixar, com certeza, a verdade biológica, e, como aqui, nunca existiu tratamento como filho (o que não cabe ao Tribunal Constitucional questionar), a fixação de um limite temporal à possibilidade de desencadear o meio de impugnação do caso julgado deve ceder, fazendo-se prevalecer o direito fundamental à identidade pessoal, traduzido no direito à verdade material relativa à paternidade.

Como refere o Acórdão recorrido, “aceitar, em termos absolutos, a limitação temporal dos cinco anos para a revisão das sentenças em que a paternidade haja sido declarada sem recurso a exames científicos, pode levar a situações melindrosas de existência de uma paternidade reconhecida no registo que se saiba não corresponder à verdade biológica por a mesma ter sido excluída por exames de sangue”. O próprio Tribunal Constitucional reconhecia, já em 2006, que “os exames biológicos conducentes à determinação da filiação, podem ser realizados fora dos processos judiciais”, sem limite temporal (Acórdão 23/2006). E no Acórdão 310/2005 o Tribunal deu conta da especificidade dos casos em que estivesse em causa o direito à identidade pessoal, quando relativos a relações de paternidade ou de filiação, para efeito da limitação temporal da possibilidade de utilização do meio de impugnação do caso julgado, especificidade tida em conta nos Acórdãos n.os 209/2004 e 200/09. A mesma especificidade salientou na doutrina Miguel Teixeira de Sousa (Estudos sobre o novo processo civil, 2.ª Edição, Lisboa, 1996, p. 570), bem como Vladimir Brega Filho (A relativização da coisa julgada nas ações de investigação de paternidade:

http:

//seer.uenp.edu. br/index.php/argumenta/article/view/6).

Também nós cremos que não deve ser inapelavelmente sujeito às consequências de uma decisão judicial que regulou a questão da paternidade, aquele que viu firmada a sua situação jurídica, com base em mera prova testemunhal, podendo, agora, nas atuais condições de desenvolvimento científico, ver esclarecida a verdade relativamente ao vínculo da paternidade, tanto mais que, nas circunstâncias da norma, aquele que foi juridicamente firmado como pai nunca tratou como filho aquele cuja paternidade quer (re)questionar, nem com ele se relacionou (o que nos liberta de outras ponderações).

Entendemos que mesmo em nome da estabilidade do caso julgado - determinado, afinal, nos casos da norma, por eventual erro externo à decisão, que ao tempo não podia ser esclarecido com a fiabilidade científica atual dos testes de ADNnão deve este forçar a irrevisibilidade das situações em que está em causa o direito fundamental à identidade pessoal com os contornos definidos na norma em análise.

Em suma, considerei que no concreto caso da norma em questão deve o caso julgado, firmado com base em prova testemunhal e sem recurso a exames biológicos, ceder perante a verdade da paternidade biológica, que pode agora ser cientificamente estabelecida, e perante o interesse público, da correspondência com aquela, da paternidade jurídica, assim havendo defendido a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 772.º, n.º 2, do anterior Código de Processo Civil, na parte em que estabelece um prazo de 5 anos sobre o trânsito em julgado da decisão, e cujo decurso preclude a interposição do recurso extraordinário de revisão, com o sentido de “excluir totalmente a possibilidade de, através da realização de exames científicos, se obter a revisão de uma sentença que declarou a paternidade do réu com recurso a mera prova testemunhal”. - Catarina Sarmento e Castro.

209524112

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE SINTRA

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2580222.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1998-05-12 - Lei 21/98 - Assembleia da República

    Altera o Código Civil, aprovado pelo Dec Lei 47344, de 25-Nov de 1966.

  • Tem documento Em vigor 2006-02-08 - Acórdão 23/2006 - Tribunal Constitucional

    Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código, na medida em que prevê, para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de dois anos a partir da maioridade do investigante.

  • Tem documento Em vigor 2009-04-01 - Lei 14/2009 - Assembleia da República

    Altera os artigos 1817.º e 1842.º do Código Civil sobre investigação de paternidade e maternidade.

  • Tem documento Em vigor 2013-06-26 - Lei 41/2013 - Assembleia da República

    Aprova em anexo à presente lei, que dela faz parte integrante, o Código de Processo Civil.

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