Assento
Certidão
António Henriques de Freitas, escrivão-adjunto na 3.ª Secção deste Supremo Tribunal de Justiça:
Certifica que, nesta Secção, se encontram pendentes uns autos do tribunal pleno registados sob o n.º 37245, em que são recorrente o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto do Tribunal da Relação de Coimbra e recorridos Manuel Dias Martins, casado, comerciante, residente em Armadouro, Pampilhosa da Serra, e outro.
Mais certifica que de fl. 14 a fl. 17 se encontra o acórdão recorrido, datado de 25 de Maio de 1983, e de fl. 20 a fl. 21 v.º o Acórdão de 27 de Abril de 1983, que se lhe encontra em oposição, proferidos ambos no Tribunal da Relação de Coimbra, respectivamente sob os processos n.os 30635 e 10682/30534.
Certifica ainda que a fls. 69 e seguintes dos autos do tribunal pleno acima identificados foi proferido acórdão com data de 26 de Novembro de 1985, no qual foi proferido o seguinte:
Assento
Requerida a instrução contraditória pelo arguido, tem o respectivo imposto de justiça de ser pago no prazo de 7 dias, a contar da data da apresentação do requerimento, sob pena de este se considerar sem efeito, nos termos do n.º 1 do artigo 192.º do Código das Custas Judiciais.
Finalmente, certifica que o douto acórdão supra transitou em julgado no dia 6 de Dezembro de 1985, pelas 17 horas, não tendo sido apresentada até ao dia 11 do mesmo mês de Dezembro qualquer reclamação.
É quanto me cumpre certificar em face dos próprios autos a que me reporto e do que nos mesmos consta.
Lisboa, 12 de Dezembro de 1985. - O Escrivão-Adjunto, António Henriques de Freitas.
Acórdão da Relação de Coimbra
Arguido: Manuel Dias Martins, casado, comerciante, residente em Armadouro, Pampilhosa da Serra.
O arguido veio requerer a abertura de instrução contraditória; decorrido o prazo de 5 dias e, como não tivesse sido pago o imposto de justiça, o Sr. Juiz considerou sem efeito esse requerimento, nos termos do artigo 192.º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais.
É desse despacho que vem interposto este recurso, no qual o requerente alega que não existe qualquer disposição legal que exija, para que se defira ao requerimento, o pagamento de imposto de justiça em 5 dias a contar da sua apresentação; o artigo 185.º refere-se aos limites a fixar na decisão final, ou então terá de haver um despacho a fixar os respectivos montantes de entre os limites indicados, sendo a partir dele que se conta o prazo de 5 dias.
O Sr. Juiz sustentou o seu despacho, referindo, nomeadamente, que esse imposto reveste a natureza de preparo e que a questão foi enunciada e tratada, nesse sentido, por Barros Mouro, no seu Código de Custas Judiciais.
Nesta Relação o Sr. Procurador da República é de parecer que o recurso não merece provimento, que não é denegado o direito de requerer a instrução contraditória por insuficiência de meios e que a própria lei prevê que os impostos pagos no decurso do processo sejam incluídos nas indemnizações a cargo dos vencidos.
Corridos os vistos, cumpre decidir:
Pelo artigo 36.º do Decreto 35007 havia instrução contraditória em processo de querela e, nas outras formas de processo, excepto sumários ou de transgressão, podia havê-la a requerimento do Ministério Público ou do arguido - artigos 34.º, 35.º e 36.º
Funcionava, na respectiva regulamentação tributária, o artigo 185.º, que referia que, no incidente de instrução contraditória, «quando não seja oficiosamente admitida», é devido um imposto de 200$00 a 1000$00.
Barros Mouro, no seu Código e na anotação a este artigo (p. 195), escreve a este propósito:
Tem-se suscitado dúvida sobre se o imposto devido pela instrução contraditória requerida pelos arguidos tem a função de preparo que deve ser pago no prazo de 5 dias, a contar da apresentação do requerimento, sob pena de ficar sem efeito (n.º 1 do artigo 192.º), ou é imposto a final, a fixar no despacho que decide o incidente. A redacção da alínea b), «pela instrução contraditória», e o facto de ser variável o seu montante podem induzir a pensar que se trata de um imposto final. Mas não é, pois se o fosse não deixaria o legislador de o incluir no artigo anterior, que trata exactamente de impostos a aplicar em decisões finais. Já assim era no Código de 1940, como pode ver-se do comentário feito no Código Anotado, por José Osório e Justino Cruz, p. 108 [...] Há quem entenda que, sendo necessário fixar o imposto, deve a secretaria notificar o requerente para o pagamento, mas tal prática não é correcta, pois contraria o disposto no n.º 1 do artigo 192.º, que, em relação ao artigo 167.º do Código de 1940, que lhe corresponde, aditou a expressão «independentemente de despacho».
Presentemente, pelas redacções dadas aos artigos 327.º e 328.º do Código de Processo Penal, a situação é idêntica quanto à legitimidade e prazo para requerer a instrução contraditória; a única nota importante que se poderá apontar será a de ela ser uma fase mais normal do processo correccional, na medida em que se transforma na reacção do arguido ao simples requerimento para julgamento do arguido, com base nos elementos de prova recolhidos no simples inquérito preliminar.
Estas alterações vieram assim como que tornar mais natural e frequente o requerimento de instrução contraditória, como resposta do arguido a um simples requerimento do ofendido para julgamento.
Assim, a alteração processual pouca influência terá na interpretação do regime tributário, embora a tendência tenha de ser no sentido de facilitar o requerimento.
A argumentação de Barros Mouro atrás referida assenta, como se viu, em duas razões: trata-se de preparo, porque não está indicado no artigo 184.º como imposto a pagar a final e, sendo preparo, porque estes têm de ser pagos, independentemente de despacho, conforme o artigo 192.º, sofre as consequências aí indicadas, no caso de falta de pagamento.
Ora, não nos parece convincente tal argumentação.
Em primeiro lugar, porque não existe na parte criminal do nosso Código de Custas qualquer preparo, mas apenas imposto-preparo, em certos casos. Já assim era no Código de 1940, como refere o Dr. Arala Chaves (p. 235, no seu Código, ed. de 1967).
Depois, porque não se vê como pode existir um preparo variável sem que seja indicado qualquer critério para a sua determinação no momento de pagamento. Mesmo no caso de constituição de assistente, apesar de se poder considerar um imposto-preparo, a lei é expressa em referir os critérios de determinação do respectivo montante, no artigo 177.º
Em terceiro lugar, porque no mesmo preceito e sujeito ao mesmo regime encontra-se o caso de prestação de termo de identidade, com imposto variável de 100$00 a 500$00; ora, é sabido que, nos termos da anterior redacção do artigo 291.º, a prestação de termo de identidade não dependia de requerimento sujeito a qualquer preparo, mas de despacho que concedia a sua fixação em substituição da prisão, com indicação do respectivo montante dentro daqueles limites.
Aliás, no Código de 1940 o imposto para a instrução contraditória estava regulamentado com o de constituição de assistente, com o devido por conservação de processo parado ou por terminação antes da acusação, com o do termo de identidade e com o de qualquer outro incidente (artigo 158.º).
Desde que o imposto seja variável, tem de haver uma condenação a fixá-lo no montante certo a pagar. Por isso mesmo, no Código de 1940, no artigo 167.º, que deu origem, pelo seu § único, ao actual artigo 192.º, a distinção que se fazia era entre «haver condenação» e «não haver condenação».
Se não houver condenação, o pagamento a fazer, independentemente de despacho, terá de ser feito em relação a quantia fixa; se a quantia for variável, apenas a condenação irá determinar o quantitativo a pagar.
Resulta daqui que a distinção de regimes que se quer ver entre os artigos 184.º e 185.º, considerando o primeiro para impostos e o segundo para preparos, não tem qualquer razão de ser. Essa distinção já vinha do Código de 1940 (artigos 157.º e 158.º) e refere-se a impostos a pagar em decisão final e sem ser em decisão final do processo. O legislador considerou, evidentemente, que no processo penal haverá uma decisão final, que é o seu objectivo, e, para além dela, pode haver outras, que não são finais, que não são a sentença, mas que implicam da mesma forma uma decisão. Ora, é a estas que se refere o artigo 185.º
Donde, desde logo, a convicção de que a alternativa entre os artigos 184.º e 185.º não é da natureza imposto, imposto-preparo, mas apenas do momento em que qualquer dos impostos neles referidos deve ser fixado.
Porque não são casos de fixação na decisão final, o legislador vem chamar incidentes aos casos do artigo 185.º
Ora, sendo assim, deixa, evidentemente, de ter aplicação o artigo 192.º
Este preceito tem campo de aplicação próprio, para os casos de «imposto que seja condição de seguimento de recurso ou incidente ou da prática de qualquer acto»; e, evidentemente, esses recursos ou incidentes são os referidos nos artigos 187.º e 190.º, esses sim, de imposto fixo, e que pode ser pago no prazo de 5 dias.
O artigo 185.º refere-se nitidamente a um imposto devido por toda a actividade desenvolvida pela instrução contraditória, e não pelo simples facto de ela ser requerida; os termos da lei são expressos nesse sentido, ao dizerem que o imposto é devido pela instrução contraditória, e não pelo seu requerimento, condição de ela vir a ser realizada.
Chegados aqui, dúvidas não temos de que não é a melhor a posição tomada no despacho recorrido; apesar disso, é de considerar outra questão, ou seja, a do momento em que o imposto deve ser pago.
Esse momento conta-se a partir do despacho que aceita o requerimento de instrução contraditória e defere às diligências ou no final dela, na pronúncia ou não pronúncia?
O imposto a pagar, evidentemente, deverá variar conforme a natureza do processo, volume de actividade desenvolvida e possibilidades do responsável. Por outro lado, no caso de não ser pago, a consequência não será, evidentemente, a não realização da instrução contraditória, mas a normal para o caso de não pagamento de qualquer imposto de justiça.
Aliás, desta forma, o sistema integra-se coerentemente no nosso espírito constitucional, expresso no artigo 20.º, n.º 1, ao prescrever que a justiça não deve ser denegada por insuficiência de meios económicos.
A instrução contraditória será, normalmente, uma necessidade para a pessoa que vê requerido contra si um julgamento e quer evitar a situação vexatória e incómoda de ser julgado em audiência pública. Por isso, não poderá haver entraves de qualquer natureza à sua realização, especialmente de natureza económica.
Sendo assim, indiferente para a cobrança será que ele seja liquidado no momento em que é ordenada a diligência ou que o seja a final; e, considerando os pressupostos para a sua determinação, tudo aconselha a que seja mesmo a final do incidente.
Nestes termos, estão reunidos todos os elementos para a tomada de posição, no sentido de revogação do despacho recorrido, embora reconhecendo as razões válidas que o motivaram.
Por isso, acorda-se em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar o despacho recorrido, que deverá ser substituído por outro que defira ao requerimento para instrução contraditória, independentemente do pagamento das guias passadas, que não deveriam ter sido emitidas.
Sem imposto.
Lisboa, 25 de Maio de 1983. - (Assinaturas ilegíveis) - Lucílio Vicente Pinto [vencido, dado o disposto nos artigos 185.º, alínea b), e 192.º, ambos do Código das Custas Judiciais].
Recebimento em 25 de Maio de 1983. - (Assinatura ilegível.)
Acordam na Secção de Jurisdição Criminal da Relação de Coimbra:
1 - Os assistentes José Ribeiro Amorim e mulher, Elisa Bernardes Cardoso, requereram, na comarca de Condeixa-a-Nova, o julgamento, em processo correccional, de António Simões e esposa, Soledade Ribeiro, por autoria de injúrias, crime então previsto e punido pelo artigo 410.º do Código Penal de 1886.
Vieram os arguidos em tempo pedir se abrisse a instrução contraditória, para o que articularam os factos a provar.
Ocorrida, assim, a caducidade do despacho que designara dia para julgamento, foram os autos remetidos ao Tribunal de Instrução Criminal de Coimbra.
Mas, como os acusados não tinham pago o imposto de justiça pertinente àquela fase processual, o Mmo. Juiz declarou «sem efeito o requerimento de abertura de instrução contraditória [...]».
Desse despacho recorrem os acusados.
A subsequente alegação tem, essencialmente, as seguintes conclusões:
1.ª O despacho recorrido deve ser «anulado» e deferido o requerimento dos arguidos; e
2.ª O respectivo imposto de justiça deverá ser fixado a final.
Nas instâncias, defende o Ministério Público que o recurso improcede.
Observou-se o disposto no artigo 630.º do Código de Processo Penal.
Passemos a decidir.
2 - Advirta-se, antes de mais, que os recorrentes insistentemente argumentam com os artigos 185.º e 192.º do Código de Processo Penal, quando tudo leva a supor que pretendiam apelar para esses artigos mas do Código das Custas Judiciais.
Posto isto, dúvida não há de que, requerida oportunamente a abertura da instrução contraditória e feita em Condeixa-a-Nova a liquidação do imposto devido (220$00 para cada arguido), nem o António Simões, nem a consorte, pagaram aquela importância.
Mais precisamente: notificados os arguidos da acusação em 4 de Janeiro de 1983, requereram no dia seguinte a abertura da instrução contraditória, nesse dia 5 liquidou-se o devido e em 13 do mesmo mês juntaram-se as guias que os interessados não pagaram - fls. 14, 17, 18 e 18 v.º
3 - De há muito que, face à lei e aos seus comentadores, ninguém discute que, nos casos de instrução contraditória facultativa requerida pelos arguidos, a tributação necessariamente precede a realização das pretendidas diligências.
Para não ir mais longe, antes até do Código das Custas Judiciais de 1940 se definira jurisprudência no sentido do prévio pagamento do imposto de justiça em hipóteses como a sub judice, ou seja, de instrução contraditória facultativa movida pelos acusados (entre muitos, o Acórdão da Relação de Lisboa de 8 de Novembro de 1930, Gaz. Rel. Lisboa, 44.º, 252, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Março de 1931, no Dir., 64.º, 170, na Gaz. Rel. de Lisboa, 45.º, 14, e na Rev. Just., 16.º, 215, e Acórdão da Relação do Porto de 25 de Julho de 1936, na Rev. Trib., 55.º, 11).
Sem hesitações, tanto Luís Osório como José Mourisca afirmam que a instrução contraditória apenas se considera iniciada com o pagamento do imposto de justiça (respectivamente, no Com. ao CCP Português, 4.º vol., p. 361, e no CCP Anotado, 3.º vol., pp. 127 e 128).
Na vigência do Código das Custas de 1940, em anotações aos artigos 158.º, alínea c) - imposto devido nos incidentes de instrução contraditória -, e 167.º, § único - pagamento no prazo de 5 dias após o requerimento -, escrevem José Osório e Justino Cruz que se trata de imposto a pagar antes do acto a que respeita e no citado prazo (Código das Custas Judiciais Anotado, ed. da Livraria Cruz, Braga, 1940, pp. 108 e 112).
Ora, dentro de uma tradição tributária inteiramente pacífica, veio o actual Código das Custas impor no artigo 185.º, alínea b), o pagamento de imposto de justiça-pagamento esse prévio, isto é, no prazo de 5 dias «a contar da apresentação do requerimento na secretaria [...]», como estabelece o artigo 192.º, n.º 1.
E, obviamente, pagamento a efectuar pelo interessado na abertura da instrução contraditória.
Em resumo: os recorrentes tinham de pagar o imposto, liquidado pelo mínimo, no prazo de 5 dias, a contar de 5 de Janeiro de 1983 (data em que o requerimento deu entrada na secretaria), e, como o não fizeram, bem se decidiu ao declarar sem efeito o pedido de abertura da instrução contraditória.
4 - Demonstrado que o recurso improcede, por infundadas as duas conclusões da alegação, e cabendo salientar que não se conhece questão semelhante suscitada judicialmente nas últimas décadas, terminaremos com duas breves reflexões.
A primeira, no sentido de que, se acaso os requerentes são economicamente débeis, deveriam lançar mão da assistência judiciária, aplicável aos processos criminais (v. g., base V, n.º 4, da Lei 7/70, de 9 de Junho; a Resolução 56/82, Diário da República, de 3 de Abril de 1982, versa hipótese diferente).
E, a segunda, a advertir que no sistema jurídico existem mecanismos aptos ao ressarcimento dos cidadãos que reprovavelmente tenham sido submetidos a julgamento por acção dos assistentes (v. g., artigo 453.º do Código de Processo Penal; cf. ainda o seu artigo 535.º, actual redacção).
5 - Pelo exposto, negam provimento ao recurso e condenam cada recorrente em 1000$00 de imposto de justiça e, solidariamente, em 1000$00 de procuradoria.
Coimbra, 27 de Abril de 1983. - (Assinaturas ilegíveis.)
Processo 37245 - 3.ª Secção - N.º 10/84
Alegação do Ministério Público
(Artigos 669.º, § único, e 668.º, § único, do Código de Processo Penal e 767.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.)
Exmos. Srs. Juízes Conselheiros:
I
Posição do problema
1 - O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto Distrital de Coimbra interpôs, ao abrigo do disposto no artigo 669.º do Código de Processo Penal, recurso extraordinário, para o pleno deste Supremo Tribunal de Justiça, do Acórdão de 25 de Maio de 1983, que aquela Relação proferiu no processo registado sob o n.º 10706/30635, por, diz, estar em oposição, quanto à mesma questão de direito, com o que essa Relação proferira em 27 de Abril anterior, no processo registado sob o n.º 10682/30534.
Alegando que ocorrem também os restantes requisitos legais, quis significar que os acórdãos em oposição foram proferidos em processos diferentes, que o de 27 de Abril transitou em julgado (trânsito que aliás se presume), que não é admissível recurso ordinário dos acórdãos retro (artigo 646.º, n.º 6.º, do Código de Processo Penal, na redacção dada pelo Decreto-Lei 402/82, de 23 de Setembro) e que o Ministério Público tem legitimidade e juntou fotocópias das decisões em causa (cf. fl. 14 a fl. 17 e fl. 20 a fl. 21).
2 - Nos termos do artigo 766.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, relativamente ao julgamento da questão preliminar, a Secção decidiu, no douto acórdão de fl. 39 a fl. 40, existir oposição que serve de fundamento ao recurso.
3 - Mas, porque o pleno não está vinculado a esse aresto (n.º 3 do referido artigo 766.º), haverá, antes de versar a questão de fundo, que demonstrar a existência da oposição.
II
Oposição de decisões
1 - Há, pois, que, de novo, apreciar e decidir a aludida questão preliminar, que é a de saber se existirá, efectivamente, oposição entre as decisões indicadas pelo Exmo. Recorrente.
2 - Segundo o artigo 669.º do Código de Processo Penal, «se qualquer relação proferir um acórdão que esteja em oposição com outro dessa ou de diversa relação sobre a mesma matéria de direito e dele não puder interpor-se recurso ordinário para o Supremo Tribunal de Justiça, deverá o procurador da República junto de qualquer delas, oficiosamente ou a requerimento da acusação ou da defesa, recorrer extraordinariamente para o Supremo Tribunal de Justiça, a fim de se fixar a jurisprudência».
É, assim, condição primeira para que possa lançar-se mão daquele recurso que dos acórdãos apontados como estando em oposição se não possa interpor recurso ordinário.
Não obstante o artigo 669.º não ser expresso no sentido de ambas as decisões serem irrecorríveis, é jurisprudência corrente deste Tribunal Supremo que o recurso extraordinário só é admissível desde que essa condição se verifique (v., por todos, os Acs. de 19 de Julho de 1978, 1, 1 e 22 de Fevereiro de 1984, o primeiro no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 279, p. 108, e os demais proferidos nos processos n.os 37115, 37171 e 37214, respectivamente).
Ora, tal condição verifica-se no caso dos autos.
Com efeito, tanto o Acórdão de 25 de Maio (recorrido) como o de 27 de Abril, ambos de 1983, eram insusceptíveis de recurso ordinário para este Supremo Tribunal, tendo sido proferidos, um e outro, em processo correccional, sendo certo que nenhum deles é condenatório ou pôs termo ao respectivo processo (artigo 646.º, n.º 6.º, do Código de Processo Penal, citada redacção).
3 - Em segundo lugar, necessário é ainda que os dois acórdãos tenham sido proferidos «em processos diferentes ou em incidentes do mesmo processo» e que o acórdão anterior apontado em oposição tenha transitado, trânsito que, aliás, se presume desde que não seja posto em causa (como o não foi no caso dos autos), nos termos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 763.º, já antes citado.
Condições que, face aos elementos que os autos fornecem, se mostram também satisfeitos.
4 - Mas será que os acórdãos em causa versaram a mesma questão fundamental de direito, dando-lhes soluções opostas?
Em ambos os casos a questão posta era a de saber se, havendo um arguido pedido, em processo correccional, a abertura da instrução contraditória, tem o mesmo (arguido) de pagar o respectivo imposto de justiça no prazo de 5 dias após o requerimento, independentemente de despacho e sob pena de tal requerimento ficar sem efeito.
Ora bem:
Decidiram essa questão, afirmativamente, o Acórdão de 27 de Abril e, negativamente, o de 25 de Maio, sustentando o último que o artigo 192.º do Código das Custas Judiciais não é aplicável ao pedido de instrução contraditória.
É, assim, manifesto que os acórdãos em causa deram soluções opostas à mesma questão fundamental de direito.
O que acontece, não obstante a legislação onde ambos os arestos se firmaram ser a mesma e a situação de facto não divergir.
5 - Verifica-se, pois, entre os ditos acórdãos oposição que serve de fundamento ao recurso extraordinário interposto para o tribunal pleno, a fim de se fixar a jurisprudência.
III
Questão de fundo
a) Posição que se assume:
Requerida pelo arguido, em processo correccional, a realização de instrução contraditória, tem o respectivo imposto de justiça de ser pago no prazo de 5 dias a contar da data da apresentação daquele requerimento, sem o que ficará sem efeito o pedido formulado.
b) Razões que se apresentam:
1 - De há muito que, face à lei e aos seus comentadores, ninguém discutia que, nos casos de instrução contraditória facultativa requerida pelo arguido, a tributação antecede, necessariamente, a realização das pretendidas diligências.
2 - Já antes do Código das Custas Judiciais de 1940 se definira jurisprudência no sentido do prévio pagamento do imposto de justiça em hipótese como a sub judice, ou seja, de instrução contraditória facultativa movida pelos acusados (cf., por todos, Acórdãos deste Supremo Tribunal de 13 de Março de 1931, no Dir., 64.º, 170, Gaz. Rel. de Lisboa, 45.º, 14, e Rev. Just., 16.º, 215, e das Relações de Lisboa de 8 de Novembro de 1930, na Gaz. Rel. de Lisboa, 44.º, 252, e do Porto de 25 de Julho de 1936, na Rev. Trib., 55.º, 11).
3 - Também, quer Luís Osório, quer José Mourisca, afirmam, e sem hesitações, que a instrução contraditória apenas se considera iniciada com o pagamento do imposto de justiça (v. Com. ao Código de Processo Penal, 4.º vol., p. 361, e Código de Processo Penal Anotado, 3.º vol., pp. 127 e 128, respectivamente).
4 - Na vigência do Código das Custas Judiciais de 1940, em anotações aos artigos 158.º, alínea c) - imposto devido nos incidentes de instrução contraditória -, e 167.º, § único - pagamento no prazo de 5 dias após o requerimento -, escrevem, por sua vez, José Osório e Justino Cruz que se trata de imposto a pagar antes do acto a que respeita e na citado prazo (Código das Custas Judiciais Anotado, ed. da Livraria Cruz, Braga, 1940, pp. 108 e 112).
5 - Ora, é dentro de uma tradição tributária inteiramente pacífica que o actual Código das Custas Judiciais veio impor, no artigo 185.º, alínea b) - na redacção dada pelo artigo 1.º, alínea a), do Decreto-Lei 223/83, de 27 de Maio -, o pagamento de imposto de justiça - pagamento esse prévio, isto é, no prazo de 5 dias «a contar da apresentação do requerimento na secretaria [...]», como estabelece o artigo 192.º, n.º 1.
É, obviamente, pagamento a efectuar pelo interessado na abertura da instrução contraditória.
6 - O imposto de justiça devido pelo incidente da abertura (não oficiosa) da instrução contraditória reveste, pois, a natureza não de imposto final (artigo 184.º do Código das Custas Judiciais), mas antes a de imposto-preparo [artigo 185.º, alínea b), hoje alínea a), do Código supra], cujo regime de pagamento e cominação correspondente é, por isso mesmo, o constante do artigo 192.º, n.º 1, citado (v. Fernando Bernardes de Miranda e Augusto Tinoco, Anotações ao Código das Custas Judiciais, p. 340; Manuel Barros Mouro, Código das Custas Judiciais Anotado, 3.ª ed., 1981, pp. 230 e 231).
7 - E não se diga, como pretende o acórdão recorrido, que Arala Chaves defende orientação oposta à que vinha a ser trilhada.
Com efeito, aquele ilustre jurista, em anotação ao artigo 185.º do Código das Custas Judiciais, ed. de 1967, p. 255, escreve, na parte que aqui interessa:
O artigo 185.º reproduz em parte o artigo 158.º do Código de 1940.
O Decreto-Lei 35007, de 13 de Outubro de 1945, veio estabelecer a obrigatoriedade da instrução contraditória nos processos de querela, impondo ao Ministério Público articular factos e requerer diligências se para tanto tiver elementos, ou, em caso de os não ter, pedir simplesmente que se declare aberta essa fase do processo.
Claro que, requerendo o réu instrução contraditória não obstante havê-lo já feito o Ministério Público, o imposto atribuído a essa fase pela alínea c) do artigo 158.º do Código de 1940 era devido.
Mas levantou-se dúvida sobre se era também devido imposto pelo réu no caso de, aberta a fase da instrução contraditória a requerimento do Ministério Público, nela ter indicado factos a provar e provas a produzir.
A opinião melhor fundamentada excluía do encargo da alínea c) do artigo 158.º as instruções contraditórias declaradas por lei obrigatórias (Boletim, n.º 1.º, p. 17).
E é esse entendimento que a alínea b) da actual disposição expressamente perfilha.
O silêncio sobre o problema em análise, conhecendo Arala Chaves melhor que ninguém que havia toda uma jurisprudência pacífica formada em determinado sentido, com o apoio dos comentadores especialistas na matéria, só pode ter um significado, o de que com ela se identificava, não se justificando, por isso, qualquer comentário particular.
Se outro fosse o seu entendimento, não deixaria, por certo, de se manifestar no local próprio, precisamente o artigo 185.º
8 - E não se diga, a título de parêntesis, que a solução preconizada, tradicional, de resto, prejudica os economicamente débeis. Assim não sucede. Estes sempre podem lançar mão do mecanismo da assistência judiciária, aplicável aos processos criminais (v. g. base V, n.º 4, da Lei 7/70, de 9 de Junho - a Resolução 56/82, de 18 de Março, publicada no Diário da República, de 3 de Abril, versa hipótese diferente).
Parece ainda oportuno realçar que no nosso ordenamento jurídico existem mecanismos aptos ao ressarcimento dos cidadãos que reprovavelmente tenham sido submetidos a julgamento por acção dos assistentes (v. g. artigos 453.º e 535.º do Código de Processo Penal).
IV
Conclusão
Em face do exposto e sem prejuízo de outras razões do douto suprimento de VV. Exas., deve o conflito de jurisprudência entre os Acórdãos da Relação de Coimbra de 27 de Abril de 1983 (fl. 20 a fl. 21) e de 25 de Maio do mesmo ano (fl. 14 a fl. 17) resolver-se por assento, para o que se propõe a seguinte fórmula:
Requerida pelo arguido, em processo correccional, a realização de instrução contraditória, tem o respectivo imposto de justiça de ser pago no prazo de 5 dias, a contar da data da apresentação daquele requerimento, sem o que ficará sem efeito o pedido formulado.
O Procurador-Geral-Adjunto, José Sarmento da Silva Reis.
Acordam, em sessão plenária, no Supremo Tribunal de Justiça:
O Exmo. Representante do Ministério Público junto da Relação de Coimbra, invocando o disposto no artigo 669.º do Código de Processo Penal, interpôs recurso extraordinário para o tribunal pleno do Acórdão daquela Relação de 25 de Maio de 1983, por estar em oposição, quanto à mesma questão de direito, com o Acórdão da mesma Relação de 27 de Abril do mesmo ano, pois, segundo afirma, no primeiro decidiu-se que, requerida pelo arguido a abertura de instrução contraditória (facultativa), não é condição do deferimento desse requerimento o pagamento do respectivo imposto de justiça, que apenas deverá ser liquidado a final, enquanto no segundo se decidiu que o pagamento do imposto é condição sine qua non do deferimento de tal requerimento.
O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto em exercício na Secção Criminal deste Supremo Tribunal alegou oportunamente.
Na sua douta alegação este magistrado sustenta a doutrina do Acórdão de 27 de Abril de 1983 e, consequentemente, propõe que se tire assento no sentido de que, «requerida pelo arguido, em processo correccional, a realização de instrução contraditória, tem o respectivo imposto de justiça de ser pago no prazo de 5 dias, a contar da data da apresentação daquele requerimento, sem o que ficará sem efeito o pedido formulado».
Colhidos os vistos, cumpre decidir:
1 - A Secção Criminal deste Supremo Tribunal, no seu acórdão a fl. 39, decidiu que se verifica a alegada oposição de acórdãos, pelo que mandou prosseguir o recurso.
Porém, esta decisão não vincula o tribunal pleno (artigo 766.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).
Só que, no caso sub judice, a oposição entre os apontados acórdãos é manifesta e, consequentemente, há que passar, de imediato, ao conhecimento do mérito.
2 - A instrução contraditória, que é obrigatoriamente aberta nos processos de querela, pode ainda ter lugar:
a) A requerimento do Ministério Público, nos processos correccionais, quando, decorrido o prazo da instrução preparatória sem que haja prova bastante para acusar, seja de presumir que se complete a prova judiciária contra o arguido com uma investigação mais completa ou um mais amplo esclarecimento (n.º 1.º do § único do artigo 327.º do Código de Processo Penal);
b) A requerimento do arguido, em todas as formas de processo, com excepção do processo sumário e de transgressão (n.º 2.º do § único do citado artigo 327.º);
c) Por decisão do juiz, em todas as formas de processo.
Dos casos apontados só está aqui em causa o da instrução requerida pelo arguido e, mesmo assim, num aspecto muito restrito: o da sua tributação.
3 - A instrução contraditória a requerimento do arguido é fundamentalmente um meio de defesa do arguido.
Como é natural, a finalidade de defesa preclude sempre ao juiz a denegação da instrução contraditória requerida pelo arguido (cf. o artigo 388.º, n.º 2, do Código de Processo Penal).
Mas daí não se segue que tal instrução contraditória não seja objecto de tributação. Pelo contrário: a instrução contraditória requerida pelo arguido é um acto tributável.
Com efeito, é devido imposto de justiça pela instrução contraditória, «quando não seja oficiosamente admitida» [alínea a) do artigo 185.º do Código das Custas Judiciais].
Resta saber qual o momento em que deve ser pago esse imposto de justiça.
4 - Como vimos, o Acórdão da Relação de Coimbra de 25 de Maio de 1983 decidiu que, nos casos de instrução contraditória requerida pelo arguido, o respectivo imposto de justiça só deve ser pago a final.
Argumenta-se no acórdão:
O imposto a pagar «deverá variar conforme a natureza do processo, volume de actividade desenvolvida e possibilidades do responsável. Por outro lado, no caso de não ser pago, a consequência não será, evidentemente, a não realização da instrução contraditória, mas a normal para o caso de não pagamento de qualquer imposto de justiça».
«Aliás, desta forma, o sistema integra-se coerentemente no nosso espírito constitucional, expresso no artigo 20.º, n.º 1 (da Constituição, antes da sua revisão), ao prescrever que a justiça não deve ser denegada por insuficiência de meios económicos.»
Será assim?
5 - Como se sabe, a actividade dos tribunais não é exercida gratuitamente.
Na realidade, os processos cíveis estão sujeitos a custas, salvo se forem excepcionalmente isentos por lei (artigo 1.º do Código das Custas).
As custas são encargos que as partes têm de satisfazer pelos actos processuais que são sua causa.
O Estado procura garantir o seu pagamento mediante a exigência de preparos.
Mas, é claro, a tributação não impende exclusivamente sobre os processos cíveis: também os processos penais estão a ela sujeitos.
Só que o imposto de justiça crime é pago normalmente depois de realizados os actos pelos quais é devido.
Mais: o normal é que o pagamento do imposto só tenha lugar depois de concluído o processo.
Mas isso não quer dizer que excepcionalmente não possa exigir-se prévio pagamento de imposto como condição da prática de certos actos processuais.
Efectivamente, casos há em que o pagamento do imposto é pressuposto de admissibilidade de certos actos processuais (Fenech, Derecho Procesal Penal, 2.ª ed., 2.º vol., p. 583).
6 - Dispõe o artigo 192.º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais que «o imposto que seja condição do seguimento de recurso ou incidente ou da prática de qualquer acto deve ser pago no prazo de 7 dias [5 antes do Decreto-Lei 223/83, de 27 de Maio], a contar da apresentação do requerimento na secretaria ou da sua formulação no processo, independentemente de despacho e sob pena de o pedido ser considerado sem efeito».
Trata-se precisamente de casos em que o imposto tem de ser pago antes de realizado o acto processual.
7 - Mas será que, tendo o arguido requerido instrução contraditória estamos, realmente, perante um incidente cujo seguimento depende de prévio pagamento de imposto de justiça?
Parece que a resposta não pode deixar de ser afirmativa.
Se não, vejamos:
Antes da publicação do Código das Custas de 1940 entendia-se que o seguimento do pedido de instrução contraditória dependia do pagamento do respectivo imposto de justiça.
Ninguém punha isso em dúvida - cf. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Março de 1931. in Col., Of., ano 30.º, 64, onde se lê: «[...] embora se tenha fixado o imposto de justiça indispensável para o seu seguimento ['seu' dele, requerimento de instrução contraditória].»
Este entendimento manteve-se em face do artigo 158.º do referido Código, nos termos do qual «será também devido imposto nos casos e termos seguintes: [...] c) nos incidentes de instrução contraditória 200$00 a 1000$00».
Em anotação a este artigo, José Osório e Justino Cruz sustentam que, nos casos das alíneas b) e c), se trata de impostos «a pagar antes dos actos a que respeitam» (Código das Custas Judiciais Anotado 1940, 108).
Posteriormente, José Osório, num estudo publicado no Boletim do Ministério da Justiça (n.os 1, 16 e 17), ao referir-se às razões que levaram o legislador a declarar obrigatória a instrução contraditória em certos casos, não deixa de mencionar a intenção de «facilitar a actuação das partes, libertando-as, designadamente o arguido, dos encargos que acompanham o requerimento do contraditório» (itálico nosso).
Ora, o artigo 185.º do actual Código das Custas nada inovou nesta matéria.
Com efeito, preceitua-se no artigo em causa (na redacção do Decreto-Lei 223/83, de 27 de Maio):
Nos incidentes é devido imposto de justiça nos termos seguintes:
a) Pela instrução contraditória, quando não seja oficiosamente admitida - 2000$00 a 20000$00;
b) Por quaisquer outros incidentes estranhos ao andamento normal do processo - 1000$00 a 2500$00.
Daí que não haja razão para que não continue a entender-se que o seguimento do pedido de instrução contraditória depende do pagamento do respectivo imposto de justiça.
Na realidade, os incidentes cujo seguimento depende do prévio pagamento de imposto só podem ser os mencionados no artigo 185.º; os não mencionados não são sequer passíveis de tributação (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Junho de 1958, Boletim n.º 78, p. 300).
E não se diga que só os incidentes estranhos ao andamento normal do processo (e não também os de instrução contraditória) estão sujeitos ao prévio pagamento do imposto devido, pois a lei não distingue.
8 - É claro que este entendimento não colide com o preceituado no artigo 20.º, n.º 2, da Constituição, nos termos do qual a justiça não pode ser denegada «por insuficiência de meios económicos».
Se o arguido não tem meios económicos suficientes para poder pagar o imposto de justiça devido pela instrução contraditória, requer a assistência judiciária, aplicável na jurisdição criminal (base V, n.º 4, da Lei 7/70, de 9 de Junho).
9 - Mais séria (pelo menos aparentemente) parece ser a objecção baseada no facto de ser variável o montante do imposto a pagar.
Não será isto a prova de que se trata de um imposto final?
A verdade é que a variabilidade do imposto está longe de ser impeditiva de se considerar aplicável o artigo 192.º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais.
Se se tratasse de imposto final, o legislador não teria deixado de o incluir no artigo anterior, que precisamente se refere ao imposto de justiça a aplicar nas decisões finais (Barros Mouro, Código das Custas Judiciais, 4.ª ed., 1984, 221).
Claro que se torna necessário fixar o imposto, mas a sua fixação não é obstáculo intransponível.
Como o pagamento do imposto tem lugar antes da realização das diligencias, há que atender fundamentalmente à situação económica do requerente (cf. Barros Mouro, ob. e lug. cits.).
10 - Mas quem é que deve fixar o montante do imposto devido pela instrução contraditória?
Como se sabe, na parte cível do Código das Custas prevêem-se casos em que o montante dos preparos é fixado: ou pelo escrivão (n.º 1 do artigo 98.º) ou pelo juiz [alínea b) do artigo 99.º, cuja aplicação se encontra suspensa, em face do artigo 46.º do Decreto-Lei 49213, de 29 de Agosto de 1969].
Simplesmente, o artigo 185.º é omisso a tal respeito e daí que seja legítima a dúvida sobre quem deve fixar o imposto devido pela instrução contraditória.
Quanto a este ponto, há quem entenda que a fixação do imposto cabe à secção do processo.
Cremos, porém, que este entendimento não é de perfilhar.
Com efeito, pela natureza dos factores a que tem de atender-se (simplicidade ou complexidade do incidente, situação económica do arguido ...), a fixação do imposto deve ser feita pelo juiz.
E não se objecte que, deste modo, vamos contrariar o disposto no n.º 1 do artigo 192.º, nos termos do qual o imposto deve ser pago «independentemente de despacho».
Segundo esta disposição legal, não há lugar a despacho a ordenar o pagamento do imposto, não tendo a secretaria de notificar o requerente para efectuar esse pagamento.
Mas não se proíbe que o juiz profira despacho a fixar o imposto.
São coisas distintas.
11 - Portanto e resumindo:
O imposto de justiça devido pelo incidente da instrução contraditória requerida pelo arguido reveste a natureza de imposto-preparo, e não a de imposto final, devendo ser pago no prazo de 7 dias, a contar da apresentação do requerimento, sob pena de este ficar sem efeito (n.º 1 do artigo 192.º do Código das Custas).
12 - Nestes termos, formulam o seguinte assento:
Requerida instrução contraditória pelo arguido, tem o respectivo imposto de justiça de ser pago no prazo de 7 dias, a contar da data da apresentação do requerimento, sob pena de este se considerar sem efeito, nos termos do n.º 1 do artigo 192.º do Código das Custas Judiciais.
Não é devido imposto de justiça.
Lisboa, 26 de Novembro de 1985. - Orlando de Paiva Vasconcelos de Carvalho - Manuel dos Santos Carvalho - Manuel Batista Dias da Fonseca - Silvino Alberto Villa-Nova - António Júdice de Magalhães Barros Baião - António Carlos Vidal Almeida Ribeiro - Licínio Adalberto Vieira Castro Caseiro - João de Sá Alves Cortez - Américo Goes Pinheiro - Alberto Gomes Senra Malgueiro - António Miguel Caeiro - João Augusto Pacheco e Melo Franco - João Solano Viana - José Fernando Quesada Pastor - João Mendes Correia de Paiva - Frederico Carvalho de Almeida Batista - Júlio Carlos Gomes dos Santos - Américo Fernando Campos Costa (vencido só na parte em que entendo que o recurso para o tribunal pleno é inconstitucional) - Pedro Augusto Lisboa de Lima Cluny (vencido. Teria votado no sentido do «assento» se nele se tivesse esclarecido que o imposto-preparo só teria de ser pago pelo mínimo. De contrário, então o imposto só poderá ser devido a final, por a respectiva fixação estar dependente da natureza do processo, do volume da actividade desenvolvida e de outras circunstâncias atendíveis) - Antero Pereira Leitão (com a declaração de voto que apresenta) - Augusto Tinoco de Almeida (vencido, pelos mesmos fundamentos do Exmo. Colega Antero Leitão) - Rui de Matos Corte Real (vencido, pois entendo que o disposto no artigo 192.º do Código das Custas Judiciais é uma disposição excepcional e que só funciona nos casos em que a própria lei condicione o acto requerido ao prévio pagamento do imposto de justiça, como sucede com o seu artigo 187.º
Ora, o artigo 185.º do Código das Custas Judiciais não condiciona o requerimento da instrução contraditória ao pagamento prévio do imposto de justiça, até porque, sendo variável, entre 2000$00 e 20000$00, só no final se pode ajuizar, com fundamento, o montante a fixar, dado só nessa altura se poder avaliar a complexidade da instrução contraditória. Mesmo fixado pelo juiz, como pretende o acórdão, ele na altura do requerimento só arbitrariamente o poderá fazer.
Depois, quer segundo o artigo 184.º, quer segundo o artigo 185.º do Código das Custas Judiciais, o imposto só é aplicável a final, no primeiro em função da natureza do processo e do seu termo e no segundo respeita apenas aos incidentes, em qualquer tipo de processo. O artigo 184.º é uma sequência do artigo 185.º
E nos tribunais superiores os incidentes são também tributados a final, como bem resulta do artigo 188.º do Código das Custas Judiciais.
A lei tributária, quando quer aplicar o regime do artigo 192.º, logo põe esse pagamento do imposto como condição do requerimento do acto por que é devido.
Entendo, pois, que se deve lavrar assento, negando a aplicação do artigo 192.º aos casos do artigo 185.º do Código das Custas Judiciais) - Amílcar Moreira da Silva (vencido, pelas razões expostas no precedente voto do colega Corte Real) - António Pereira de Miranda (vencido, pelas razões expostas pelo colega Corte Real).
Declaração de voto
Votei o assento, mas, quanto aos seus fundamentos, devo fazer as seguintes observações:
Sendo o imposto devido pelo incidente da instrução contraditória variável em função da sua simplicidade ou complexidade, da situação económica do arguido-requerente, e porventura de outros factores, não pode a sua fixação deixar de ser feita pelo juiz. Mas, como o seu pagamento deve também ser efectuado nos 7 dias imediatos à apresentação do pertinente requerimento, e independentemente de despacho, sob pena de o mesmo ficar sem efeito, altura em que aqueles elementos ainda não são conhecidos, só se apresenta como conciliável com estes princípios a prática de ser feito imediatamente esse pagamento pelo seu mínimo legal, nessa conformidade se devendo passar as guias correspondentes e ficando a sua fixação definitiva relegada para a decisão que se pronunciar sobre o seu mérito e respectivos efeitos processuais.
Dessa maneira ficará também ultrapassada a dificuldade de ordem prática consistente em saber qual o magistrado competente para efectuar essa fixação, se o juiz da comarca onde o processo corre e o requerimento é apresentado ou o da instrução criminal, que terá de presidir ao dito incidente (artigo 330.º do Código de Processo Penal).
Antero Pereira Leitão.