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Acórdão 597/2005/T, de 20 de Dezembro

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Texto do documento

Acórdão 597/2005/T. Const. - Processo 474/2005. - Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - 1 - Por decisão de 7 de Fevereiro de 2005, a Comissão Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional decidiu aplicar a um jogador do Sporting Clube de Braga - Futebol, S. A. D., dois jogos de suspensão e uma multa de Euro 700 por infracção cometida na 18.ª jornada da Superliga Galp Energia 2004/2005.

O dito clube apresentou recurso para o Conselho Superior de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol, que entendeu notificar aquela Comissão Disciplinar para "contestar, querendo, as alegações de recurso oportunamente apresentadas", fixando-lhe, ao abrigo do disposto na alínea e) do artigo 9.º do Regimento do Conselho de Justiça, um "prazo de vinte e quatro horas".

Pouco após o decurso deste, a Comissão Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional dirigiu ao presidente do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol um requerimento arguindo a nulidade do despacho de fixação desse prazo e suscitando a inconstitucionalidade de tal normativo por violação dos "princípios constitucionais da igualdade, do acesso ao direito e à justiça", considerando que "face à exiguidade do prazo fixado para a contestação a recorrida vê-se impossibilitada de exercer o seu direito de defesa".

Na decisão do recurso, em 17 de Fevereiro de 2005, o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol ponderou, como questão prévia, a invocada nulidade, decidindo no sentido da sua inexistência, "já que este Conselho se limitou a dar aplicação a normativo, que não enferma de inconstitucionalidade, existente no seu Regimento.".

De tal decisão pretendeu a Comissão Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional recorrer para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, mas o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol, por Acórdão de 7 de Abril de 2005, não o admitiu, com os seguintes fundamentos:

"De acordo com o estabelecido no n.º 2 do mesmo preceito legal, o recurso só será admissível se a decisão recorrida não admitir recurso ordinário por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso couberem.

Assim sendo, não há recurso para o Tribunal Constitucional.

Antes do mais, porque o recurso só é admissível relativamente a decisões dos tribunais - n.º 1 do referido artigo 70.º

Acresce que, nos termos do disposto no artigo 47.º, n.os 1 e 2, da Lei 30/2004, de 21 de Julho, não são susceptíveis de recurso fora das instâncias competentes na ordem desportiva as decisões e deliberações emergentes da aplicação dos regulamentos."

2 - Inconformada, apresentou a Comissão Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional reclamação dirigida ao Tribunal Constitucional, que encerrou deste modo:

"56 - O Tribunal Constitucional foi erigido pela Constituição, o vértice do sistema de controlo da constitucionalidade das normas e da legalidade das leis, constituindo esta realidade o fundamento basilar da integração do modelo português nos sistemas concentrados. Na verdade, no que concerne ao julgamento da ilegitimidade dos actos normativos com base nas duas relações de desvalor acabadas de mencionar, o Tribunal Constitucional é, em fiscalização concreta, a última instância de decisão (e instância obrigatória no julgamento de recurso de decisões de inconstitucionalidade e ilegalidade) - cf. Carlos Blanco de Morais, Justiça Constitucional, t. I, p. 348.

57 - Em conclusão, o Acórdão do Conselho de Justiça da FPF é susceptível de ser sindicado pelo Tribunal Constitucional, a tanto não obstando a circunstância de, constituindo (ela, decisão) a última palavra dentro da ordem jurisdicional a que aquele Conselho pertence, não ser passível de recurso ordinário.

58 - Acresce que, ainda quando se entendesse caber recurso ordinário daquela decisão - o que não se aceita - sempre seria admissível recurso, restrito à questão da constitucionalidade, directamente para o Tribunal Constitucional.

59 - Com efeito, 'não era muito lógico que tendo o recurso como objecto exclusivo a questão da inconstitucionalidade esta devesse ser obrigatoriamente apreciada por outros tribunais (embora superiores) não competentes para decidir, a título principal, problemas de inconstitucionalidade. O regime actual é um regime mais consentâneo com a natureza incidental da questão de inconstitucionalidade e com a própria razão de ser do controlo concentrado com a base num controlo difuso concreto (cf., artigos 70.º e seguintes da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do TC [LTC]) [...] As partes poderão, se o regime processual o permitir, esgotar os recursos (para os quais deverão ter outros fundamentos que não apenas a questão da inconstitucionalidade) e recorrer, finalmente, para o Tribunal Constitucional, mas também poderão optar por considerar a questão da constitucionalidade como o problema principal e decisivo e recorrer logo para o Tribunal Constitucional' - Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 3.ª ed., p. 709.

60 - Para além de que, à luz do regime constante do n.º 4 do artigo 70.º da LTC, na redacção introduzida pela Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro, o conceito de esgotamento ou exaustão dos recursos ordinários passou a abranger as hipóteses de renúncia, decurso do prazo sem efectiva interposição e impossibilidade de prosseguimento por razões de ordem processual, assim se consagrando a orientação de uma das correntes de opinião em que se dividia o Tribunal Constitucional, e que está expressa, v. g., nos Acórdãos n.os 8/88 (Boletim do Ministério da Justiça, n.º 376, p. 166) e 377/96 ( Boletim do Ministério da Justiça, n.º 455, p. 111)."

Ouvido o Ministério Público junto deste Tribunal, veio este pugnar pela improcedência da reclamação:

"A presente reclamação é, a nosso ver, improcedente por duas razões:

a) Em primeiro lugar, não nos parece que a questão controvertida pela entidade recorrente se possa configurar como 'questão estritamente desportiva', tal como é definido no n.º 2 do artigo 47.º da Lei 30/2004, de 21 de Julho - reportada a matérias de natureza disciplinar, abrangendo as infracções 'cometidas no decurso da competição, enquanto questões de facto e de direito emergente da aplicação das leis do jogo, dos regulamentos e das regras de organização das respectivas provas': no caso dos autos, está em causa a aplicação de uma norma de cariz procedimental, atinente à definição do prazo para o exercício do contraditório pelo recorrido, o que extravasa o elenco das matérias enumeradas no referido n.º 2 do artigo 47.º, nada obstando a que tivesse sido exercida a possibilidade de 'impugnação, nos termos gerais de direito', conferido pelo artigo 46.º da mesma lei (cf., uma perspectiva análoga, os Acórdãos n.os 437/98 e 488/98);

b) Daqui decorre que - não estando esgotados, à data da interposição do recurso de fiscalização concreta, fundado na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, os 'recursos ordinários possíveis' - falta um pressuposto de admissibilidade do recurso de constitucionalidade interposto pela entidade reclamante;

c) Acresce que - a nosso ver - o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol não pode configurar-se, em termos jurídico-constitucionais, como 'tribunal', face ao elenco tipificado no artigo 209.º da CRP, de modo que as suas decisões definitivas, em matéria desportiva, possam ser objecto idóneo do controlo da constitucionalidade, exercido por este Tribunal Constitucional.

Perante a enumeração constitucional das 'categorias de tribunais', a única possibilidade de operar tal qualificação seria a de configurar o dito Conselho de Justiça como 'tribunal arbitral': ora, o artigo 49.º da Lei de Bases do Desporto delimita o âmbito da 'arbitragem desportiva' em termos de a diferenciar e autonomizar claramente da mera utilização dos 'meios jurisdicionais federativos' - e sendo certo que a circunstância de determinado órgão federativo dirimir um 'conflito desportivo puro', desenvolvido, como tal, à margem do direito, desprovido - pela sua natureza - de vocação para encontrar uma solução jurisdicional, o não transfigura em verdadeiro órgão judicial."

Cumpre agora apreciar e decidir.

II - Fundamentos. - 3 - Nos termos do artigo 70.º, n.os 2 e 5, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, o recurso previsto na alínea b) do n.º 1 desse artigo só cabe de "decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam", entendendo-se que se acham esgotados todos os recursos ordinários "quando tenha havido renúncia, haja decorrido o respectivo prazo sem a sua interposição ou os recursos interpostos não possam ter seguimento por razões de ordem processual".

Pode discutir-se a possibilidade de reconduzir o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol a um tribunal, para efeitos de recurso para o Tribunal Constitucional (o que, em caso de resposta negativa, tornaria indispensável o recurso ordinário a que a reclamante pretendeu ter renunciado). Tal fundamento foi invocado na decisão recorrida e também explicado na posição assumida pelo procurador-geral-adjunto em funções neste Tribunal: sem pronúncia de um tribunal, que a entidade reclamada não é, não poderia haver recurso para o Tribunal Constitucional, que só sindica as decisões dos tribunais que apliquem norma arguida de inconstitucionalidade, ou a desapliquem com esse fundamento.

Seja como for, existem outras razões só por si bastantes para que o recurso para o Tribunal Constitucional não pudesse ser admitido.

Na verdade, como é referido na decisão reclamada, e explicado neste Tribunal pelo Ministério Público, à data da interposição do recurso de constitucionalidade não estavam ainda esgotados os recursos ordinários a que a decisão do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol podia estar sujeita. É que no presente caso discute-se a aplicabilidade de uma norma que define um prazo para o exercício do contraditório num procedimento, previsto no Regimento do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol. Ora, tal questão não é de considerar "questão estritamente desportiva", tal como é definida no n.º 2 do artigo 47.º da Lei 30/2004, de 21 de Julho - reportada a matérias de natureza disciplinar, abrangendo as infracções "cometidas no decurso da competição, enquanto questões de facto e de direito emergente da aplicação das leis do jogo, dos regulamentos e das regras de organização das respectivas provas". Não sendo incluída no elenco destas matérias, nada obstava a que tivesse sido exercida a possibilidade de impugnação "nos termos gerais de direito", conferida pelo artigo 46.º do mesmo diploma (cf. os Acórdão n.os 437/98 e 488/98, deste Tribunal).

E, ao contrário do invocado pela ora reclamante (e mesmo supondo que estaríamos então perante uma decisão de um tribunal), nada no processo indicava, à data, qualquer renúncia a esses recursos ou um decurso do respectivo prazo sem a sua interposição, nem o facto de a questão objecto de recurso ser unicamente de constitucionalidade permitia - na ausência dessa renúncia ou desse decurso do prazo - dispensar a intervenção do tribunal competente para julgar o recurso ordinário (aliás, o trecho do manual de Direito Constitucional, edição de 1983, que a reclamante invoca em seu abono diz respeito ao confronto do regime originário da Constituição de 1976, onde o esgotamento prévio dos recursos era condição necessária em todos os casos, e da Lei Constitucional 1/82, em resultado da qual as decisões de desaplicação de normas com fundamento em inconstitucionalidade passaram a ser directamente recorríveis para o Tribunal Constitucional).

Conclui-se, pois, que não merece censura a decisão de não admissão do recurso de constitucionalidade.

III - Decisão. - Pelos fundamentos expostos decide-se indeferir a presente reclamação.

Custas pela reclamante, com 20 unidades de conta de taxa de justiça.

Lisboa, 2 de Novembro de 2005. - Paulo Mota Pinto - Maria Fernanda Palma - Benjamim Rodrigues - Mário José de Araújo Torres (votei o indeferimento da reclamação exclusivamente por considerar não ter o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol a natureza de tribunal) - Rui Manuel Moura Ramos.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2361979.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-09-30 - Lei Constitucional 1/82 - Assembleia da República

    Aprova a primeira revisão Constitucional, determinando a sua entrada em vigor no trigésimo dia posterior ao da publicação no diário da república, bem como publicação conjunta da Constituição da República Portuguesa de 2 de Abril de 1976, no seu novo texto.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1998-02-26 - Lei 13-A/98 - Assembleia da República

    Altera a lei orgânica sobre a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 2004-07-21 - Lei 30/2004 - Assembleia da República

    Aprova a Lei de Bases do Desporto.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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