Acórdão 567/2005/T. Const. - Processo 812/2005. - Acordam em plenário do Tribunal Constitucional:
1 - Por requerimento entrado neste Tribunal em 17 de Outubro de 2005, o cidadão Joaquim Pereira Tavares veio interpor recurso da eleição, pelo plenário de cidadãos eleitores da freguesia de Mareco, do presidente da junta daquela freguesia, com os seguintes fundamentos:
"Joaquim Pereira Tavares, casado, reformado, recenseado na freguesia de Mareco com o n.º 219, residente e presidente da Junta de Freguesia de Mareco, concelho de Penalva do Castelo, vem interpor recurso a V. Ex.ª contra o plenário dos cidadãos eleitores da freguesia de Mareco ocorrida ontem dia 16 de Outubro de 2005, pelos seguintes motivos:
Convoquei o plenário para as 10 horas do referido dia, para o qual concorreram duas listas.
A lista A, a que correspondia a minha pessoa, Joaquim Pereira Tavares, e a lista B, correspondente a um eleitor recenseado na freguesia de Ínsua, concelho de Penalva do Castelo, com o n.º 2217, José Manuel Tavares Almeida Lopes.
A votação ocorreu com toda a normalidade, vindo a ganhar a lista B, com 57 votos.
Acontece que a lista B, composta pelo eleitor José Manuel Tavares Almeida Lopes, não podia concorrer ao plenário nos termos do artigo 21.º da Lei 169/99, de 18 de Setembro, pois o mesmo não se encontra recenseado na freguesia de Mareco.
Em face do exposto solicito a V. Ex.ª para que mande anular aquela candidatura, atribuindo portanto a vitória à única lista com legitimidade para ser eleita em plenário.
Junto fotocópia da acta de apuramento."
Em 19 de Outubro de 2005, o recorrente apresentou o original da documentação anteriormente enviada, a saber: o requerimento de interposição de recurso e a acta relativa à reunião do plenário de cidadãos eleitores que teve lugar a 16 de Outubro de 2005.
Esta acta de apuramento dá conta do encerramento da secção de voto, pelas 17 horas do dia 16 de Outubro de 2005, e da contagem dos votos, a qual apurou 48 votos a favor da lista A, 57 a favor da lista B, 1 voto em branco e 2 votos nulos. Registaram-se ainda 28 abstenções. A acta não dá conta da apresentação de qualquer reclamação ou protesto no decurso do acto eleitoral.
Solicitado, por despacho de 20 de Outubro de 2005, a prestar informação relativa à existência do apuramento geral, incluindo a freguesia de Mareco, e à data de afixação do edital respectivo, o presidente da Câmara Municipal de Penalva do Castelo veio esclarecer que o município "nada tem a ver com a realização do plenário e que, aquando da realização da assembleia de apuramento geral relativa às eleições para os órgãos autárquicos de 2005, ainda não tinha sido efectuado o plenário da freguesia de Mareco".
2 - No caso em apreço, pretende-se recorrer para o Tribunal Constitucional do acto implícito de admissão de candidaturas revelado através da submissão a votação, pelo plenário de cidadãos eleitores da freguesia de Mareco, das listas A e B. A irregularidade de que enfermaria este acto traduzir-se-ia no facto de a mesa do plenário dos cidadãos eleitores ter admitido ao sufrágio, concorrendo para presidente da Junta de Freguesia um cidadão (José Manuel Tavares Almeida Lopes) que, no entender do recorrente, a ele alegadamente não se poderia apresentar por não se encontrar recenseado na freguesia de Mareco.
A irregularidade em questão pode ser qualificada, como o admitiu este Tribunal no seu Acórdão 12/98 (in Diário da República, 2.ª série, de 12 de Fevereiro de 1998), como irregularidade ocorrida no acto de votação. Nestes termos, e para que fosse possível o recurso perante o Tribunal Constitucional, o recorrente deveria ter protestado ou reclamado, perante o plenário de cidadãos eleitores, daquela decisão. Na verdade, o artigo 156.º, n.º 1, parte final, da lei eleitoral dos órgãos das autarquias locais, aprovada pela Lei Orgânica 1/2001(de ora em diante citada como Lei 1/2001), prescreve que "as irregularidades ocorridas no decurso da votação e no apuramento local ou geral podem ser apreciadas em recurso contencioso, desde que hajam sido objecto de reclamação ou protesto apresentado no acto em que se verificaram" (itálico acrescentado). E o certo é que a jurisprudência uniforme deste Tribunal não tem isentado os plenários de cidadãos eleitores da aplicação das disposições sobre contencioso eleitoral, constantes do Decreto-Lei 701-B/76, de 29 de Setembro (actualmente na Lei Orgânica 1/2001, de 14 de Agosto) (cf. os Acórdãos n.os 25/90 e 6/94, in Diário da República, 2.ª série, de 4 de Julho de 1990 e de 13 de Maio de 1994, respectivamente). Aí se inscreve, naturalmente, a norma do artigo 156.º, n.º 1, da Lei 1/2001.
E o mesmo se diga se se entender, como o Tribunal o entendeu, ainda que para uma hipótese diversa, no Acórdão 6/94 (in Diário da República, 2.ª série, de 13 de Maio de 1994), que a questão posta pelo recorrente não respeita ao âmbito específico do contencioso da votação e do apuramento - que abrange as irregularidades ocorridas no decurso da votação e no apuramento dos respectivos resultados -, mas antes a decisões preparatórias da eleição, tomadas por um "órgão" de administração eleitoral, concretamente o presidente da mesa do plenário dos cidadãos eleitores.
Para poder interpor recurso contencioso perante o Tribunal Constitucional, o recorrente deveria igualmente ter reclamado daquele acto (de admissão da candidatura impugnada) perante o próprio plenário de cidadãos eleitores, tal como resulta do artigo 10.º-A, n.º 3, da Lei 169/99, de 18 de Setembro, na redacção da Lei 5-A/2002, de 11 de Janeiro, aplicável ex vi do artigo 22.º da mesma lei.
Na verdade, constitui princípio do direito eleitoral português o da obrigatoriedade de reclamação prévia ao recurso contencioso de acto relativo ao processo eleitoral entendido em sentido amplo. O acolhimento de tal princípio revela-se, no que ao contencioso de apresentação de candidaturas diz respeito, no disposto no capítulo II do título II da Lei 1/2001.
Ora, não só a acta não refere a existência de qualquer reclamação ou protesto, como o próprio recorrente não alega qualquer facto do qual se possa intuir a existência desse momento processualmente necessário. Pelo contrário, no próprio requerimento de recurso, a referência à "normalidade" com que terá decorrido a votação parece, em conjunto com o aludido silêncio da acta a este propósito, confirmar a inexistência de qualquer reclamação.
Deste modo, a ausência de qualquer reclamação ou protesto perante o plenário de cidadãos eleitores do acto da respectiva mesa, funcionando enquanto "órgão" de administração eleitoral para efeitos de admissão de candidaturas, inviabiliza o conhecimento, por este Tribunal, do presente recurso.
3 - Ante o exposto, decide-se não tomar conhecimento do recurso.
Lisboa, 24 de Outubro de 2005. - Rui Manuel Moura Ramos (relator) - Gil Galvão - Bravo Serra - Maria Helena Brito - Paulo Mota Pinto - Pamplona de Oliveira - Maria João Antunes - Maria Fernanda Palma - Mário Torres - Vítor Gomes - Benjamim Rodrigues - Artur Maurício.