de 24 de Agosto
A venda ambulante é uma actividade tradicional prevista na legislação geral e em posturas municipais.Não pode efectivamente deixar de se reconhecer o aspecto positivo que esta actividade ainda hoje apresenta, desde que legalmente praticada, não só porque faz chegar determinados produtos, géneros e mercadorias a certas regiões e camadas populacionais, como também porque exerce uma função moderadora nos preços de venda ao público, fomentando uma salutar concorrência com o comércio fixo.
Há meses a esta parte tem-se verificado no nosso país, por circunstâncias de ordem diversa, um surto indisciplinado da venda ambulante, principalmente nos grandes centros urbanos.
A indisciplina na referida actividade causa graves problemas, a que urge pôr cobro, entre os quais avultam os que se relacionam com a saúde pública, com o trânsito de viaturas e peões, com a estética e limpeza dos locais do seu exercício, e bem assim, a concorrência desordenada em relação a certas actividades comerciais.
O presente diploma visa estabelecer preceitos que disciplinem a venda ambulante e traçar as linhas gerais que permitam aos órgãos da Administração Central e local enfrentar os problemas que ora se suscitam, em ordem a suprir quer as carências das disposições gerais, quer as que se referem às normas camarárias sobre a matéria.
Nestes termos, usando da faculdade conferida pelo n.º 1, 3.º, do artigo 16.º da Lei Constitucional 3/74, de 14 de Maio, o Governo Provisório decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. Os indivíduos que exerçam a venda ambulante devem observar as normas do presente diploma, bem como aquelas que em sua execução se publiquem.
2. Consideram-se vendedores ambulantes, para efeito deste diploma, os indivíduos que, transportando a mercadoria por si ou por qualquer outro meio adequado, a transaccionem pelos lugares do seu trânsito e em zonas que para o efeito não forem interditas pelas câmaras municipais.
3. A distribuição domiciliária efectuada por conta de comerciantes com estabelecimento fixo, bem como a venda de jornais, outras publicações periódicas e lotarias, não ficam sujeitas às disposições do presente diploma.
Art. 2.º - 1. Na exposição e venda ambulante dos produtos do seu comércio cada vendedor não poderá utilizar um tabuleiro com dimensões superiores a 1 m x 1,20 m.
2. Os produtos expostos para venda nunca poderão estar a menos de 0,40 m do solo.
3. Compete às câmaras municipais dispensar o cumprimento do estabelecido nos n.os 1 e 2 do presente artigo relativamente a produtos ou géneros cuja venda ambulante se revista de características especiais.
Art. 3.º É interdito aos vendedores ambulantes:
a) Formar filas duplas de exposição de artigos para venda;
b) Impedir ou dificultar por qualquer forma o trânsito nos locais destinados à circulação de veículos ou de pessoas;
c) Impedir ou dificultar o acesso aos meios de transportes públicos e às paragens dos respectivos veículos;
d) Lançar no solo quaisquer desperdícios, restos, lixos ou outros objectos susceptíveis de conspurcar a via pública.
Art. 4.º - 1. Os tabuleiros utilizados na venda deverão conter, em local bem visível, o nome e morada do respectivo vendedor.
2. Os tabuleiros para a exposição, venda ou arrumação dos produtos alimentares serão em material resistente a traços ou sulcos e facilmente laváveis.
3. Os tabuleiros, como todo o material de arrumação, exposição e venda, deverão ser mantidos em rigoroso estado de asseio e higiene.
Art. 5.º - 1. Os indivíduos que intervenham no acondicionamento, transporte ou venda de produtos alimentares, serão, obrigatoriamente, portadores de boletim de sanidade, nos termos da legislação em vigor.
2. Sempre que se verifiquem dúvidas quanto ao estado de sanidade do vendedor, deverá este ser notificado a apresentar-se à autoridade sanitária da respectiva área.
3. Os vendedores ambulantes deverão comportar-se com civismo nas suas relações com o público.
Art. 6.º - 1. No transporte, arrumação e exposição dos produtos é obrigatório separar os produtos alimentares dos de natureza diferente, bem como, dentro de cada categoria, os que de algum modo possam ser afectados pela proximidade de outros.
2. Quando fora da venda, os produtos alimentares devem ser guardados em lugares adequados à preservação do seu estado, bem como em condições hígio-sanitárias que os protejam de poeiras, contaminações ou contactos que, de qualquer modo, possam afectar a saúde dos consumidores.
3. O vendedor, sempre que lhe seja exigido, terá de declarar às entidades competentes para a fiscalização o lugar onde guarda a sua mercadoria, facultando o respectivo acesso.
4. Na embalagem ou empacotamento dos produtos alimentares só pode ser usado papel ou outro material que ainda não tenha sido utilizado e não contenha desenhos, pinturas ou dizeres impressos na parte interior.
Art. 7.º Não são permitidas como meio de sugestionar aquisições pelo público falsas descrições ou informações sobre a natureza, qualidade ou utilidade dos produtos expostos à venda.
Art. 8.º - 1. Os preços terão de praticar-se em conformidade com a legislação em vigor.
2. É obrigatória a afixação, por forma bem visível, de tabelas, letreiros ou etiquetas, indicando o preço dos produtos, géneros e artigos expostos.
Art. 9.º - 1. O Secretário de Estado do Abastecimento e Preços pode, por portaria, fixar as normas que se mostrem necessárias à execução do disposto neste diploma na matéria da sua competência.
2. Quando as matérias caibam também na competência de outros Ministérios ou Secretarias de Estado, deverá a portaria ser emitida conjuntamente.
3. Para efeitos deste diploma, a competência atribuída no Decreto-Lei 48261, de 23 de Fevereiro de 1968, à Corporação do Comércio é transferida para a Direcção-Geral do Comércio Interno.
Art. 10.º - 1. O vendedor ambulante deverá fazer-se acompanhar, para apresentação imediata às entidades competentes para a fiscalização, devidamente actualizados, do título oficial de autorização para o exercício da sua actividade, dos documentos comprovativos do cumprimento das suas obrigações tributárias, do bilhete de identidade e do cartão ou guia a que se refere o artigo 12.º do presente diploma, sem prejuízo de outros documentos que, pela natureza do seu comércio, deva possuir.
2. Exceptuam-se do cumprimento das obrigações mencionadas no n.º 1 do presente artigo, salvo no que se refere à exibição do bilhete de identidade, os vendedores ambulantes que vendam produtos de sua propriedade ou por eles explorados e géneros com que lhes tenham sido pagas quaisquer rendas.
3. Poderá ser exigida a apresentação das facturas ou documentos equivalentes comprovativos da aquisição dos produtos para venda ao público, contendo os seguintes elementos:
a) Os nomes ou denominações sociais e a sede ou domicílio do comprador, produtor, grossista, retalhista, leiloeiro ou indicação dos serviços alfandegários ou de outros fornecedores onde foi feita a aquisição e a data da respectiva transacção;
b) A especificação das mercadorias, com indicação das quantidades, preços e valores ilíquidos, descontos, abatimentos ou bónus concedidos, bem como a sua marca, referência e número de série, quando for caso disso.
Art. 11.º - 1. As câmaras municipais podem, ao abrigo deste diploma e legislação complementar, restringir, condicionar ou proibir a venda de géneros alimentícios e produtos de outra natureza, tendo em atenção os aspectos hígio-sanitários, estético e comodidade do público.
2. Compete-lhe ainda, com base nos fundamentos estabelecidos no número anterior, e atendendo igualmente às necessidades de segurança e de trânsito de pessoas e veículos, interditar zonas ao exercício da sua actividade.
3. Em casos especiais podem ainda fixar zonas para ocupação dos ambulantes e permitir nessas e noutras zonas a instalação de unidades automóveis de venda ambulante.
4. A delimitação das zonas ou locais livres, fixos ou interditos será feita de modo genérico, podendo, no entanto, as câmaras municipais estabelecer zonas especiais para certas categorias de produtos e artigos.
Art. 12.º - 1. As câmaras municipais deverão organizar um registo dos vendedores ambulantes no respectivo concelho que se encontrem legalmente autorizados a exercer a sua actividade.
2. As câmaras municipais, a requerimento dos interessados, deverão passar um cartão de modelo anexo a este diploma, que será válido em qualquer localidade.
3. O cartão será concedido depois de os interessados exibirem os documentos comprovativos da sua legalização previstos neste diploma.
4. A guia comprovativa da entrega do requerimento na respectiva câmara substituirá o cartão até este ser emitido.
Art. 13.º - 1. A prevenção e acção correctiva sobre as infracções das normas constantes do presente diploma, bem como da respectiva regulamentação e legislação conexa, são da competência da Direcção-Geral de Fiscalização Económica, da Polícia de Segurança Pública, da Guarda Nacional Republicana, da Guarda Fiscal, das autoridades sanitárias e das demais entidades policiais, administrativas e fiscais.
2. Sempre que, no exercício das funções referidas no número anterior, o agente fiscalizador tome conhecimento de infracções cuja fiscalização seja da competência específica de outra autoridade, deverá participar a esta a respectiva ocorrência.
3. Cabe às entidades referidas no n.º 1 uma acção educativa e esclarecedora dos interessados, podendo fixar prazos para a regularização das situações anómalas, cuja inobservância constituirá infracção punível.
Art. 14.º - 1. As infracções ao disposto neste diploma e normas regulamentares que venham a ser publicadas em sua execução serão puníveis com a multa de 100$00 a 2500$00, segundo graduação a definir pelas câmaras municipais através de postura, se outra pena mais elevada não for aplicável nos termos da lei geral ou especial.
2. As câmaras municipais deverão fixar os casos de apreensão dos instrumentos da contravenção, móveis ou semoventes, os quais caucionarão a responsabilidade do contraventor.
3. Para a correcção das situações anómalas que tenham sido objecto de transgressão será fixado prazo não superior a vinte dias.
4. Considera-se legalizada a situação anómala quando, dentro do prazo fixado pela autoridade fiscalizadora, o interessado se apresenta na sede ou posto indicado na intimação com os documentos ou objectos em conformidade com a norma violada.
Art. 15.º - 1. A instrução preparatória e julgamento das infracções a que se refere este diploma, bem como a graduação da responsabilidade dos arguidos e o destino das respectivas multas, regem-se pelo disposto no Decreto-Lei 41204, de 24 de Julho de 1957, e legislação complementar.
2. Nas cidades de Lisboa e Porto a competência para julgamento das infracções às normas regulamentares emanadas das respectivas câmaras municipais pertence aos tribunais municipais.
Art. 16.º Deverão as câmaras municipais, no prazo máximo de trinta dias, contados a partir da data da publicação do presente decreto-lei, regulamentar as matérias constantes deste diploma, no âmbito da sua competência.
Art. 17.º As dúvidas que se suscitem na aplicação das disposições deste diploma serão resolvidas por despacho do Ministro da Administração Interna, ou por despacho conjunto, quando as matérias respeitem a outros departamentos estaduais.
Art. 18.º Este decreto-lei entra imediatamente em vigor, sem prejuízo de as situações que não se integrem no presente diploma deverem ser regularizadas no prazo de trinta dias.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Vasco dos Santos Gonçalves - Manuel da Costa Brás - Emílio Rui da Veiga Peixoto Vilar.
Promulgado em 16 de Agosto de 1974.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO DE SPÍNOLA.
Anexo ao Decreto-Lei 383/74
(ver documento original) O Ministro da Administração Interna, Manuel da Costa Brás - O Ministro da Economia, Emílio Rui da Veiga Peixoto Vilar.