de 6 de Novembro
O presente diploma transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 85/374/CEE, do Conselho, de 25 de Julho de 1985, relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados membros em matéria da responsabilidade decorrente de produtos defeituosos.No artigo 1.º consagra-se o princípio fundamental de responsabilidade objectiva do produtor, desenvolvido nas normas sucessivas. É a solução preconizada pela doutrina como a mais adequada à protecção do consumidor na produção técnica moderna, em que perpassa o propósito de alcançar uma justa repartição de riscos e um correspondente equilíbrio de interesses entre o lesado e o produtor.
A tutela eficaz do lesado justifica:
a) A noção ampla de produtor;
b) A solidariedade de vários responsáveis;
c) A não diminuição da responsabilidade do produtor pela intervenção de terceiro que tenha contribuído para causar o dano;
d) A inderrogabilidade do regime da responsabilidade;
e) A preservação da responsabilidade decorrente de outras disposições legais.
O intuito de não agravar demasiado a posição do produtor leva a que a responsabilidade objectiva não seja absoluta e explica:
a) O elenco de causas de exclusão da responsabilidade, de que faz parte o estado dos conhecimentos científicos e técnicos, não se tendo usado da faculdade concedida pela directiva de introduzir a responsabilidade pelos chamados riscos do desenvolvimento;
b) O limite máximo da responsabilidade global pelos danos pessoais em série, de acordo com a nossa tradição jurídica, num montante equivalente ao mínimo consentido pela directiva, e apesar de esta não admitir um limite ao ressarcimento de cada lesado;
c) O prazo de prescrição de três anos, bem como o prazo de caducidade de 10 anos.
Saliente-se, por último, que este diploma não se aplica aos produtos agrícolas naturais que não tenham sofrido qualquer transformação, aos acidentes nucleares e aos produtos postos em circulação antes da sua entrada em vigor.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Responsabilidade objectiva do produtor
O produtor é responsável, independentemente de culpa, pelos danos causados por defeitos dos produtos que põe em circulação.
Artigo 2.º
Produtor
1 - Produtor é o fabricante do produto acabado, de uma parte componente ou de matéria-prima, e ainda quem se apresente como tal pela aposição no produto do seu nome, marca ou outro sinal distintivo.2 - Considera-se também produtor:
a) Aquele que, na Comunidade Económica Europeia e no exercício da sua actividade comercial, importe do exterior da mesma produtos para venda, aluguer, locação financeira ou outra qualquer forma de distribuição;
b) Qualquer fornecedor de produto cujo produtor comunitário ou importador não esteja identificado, salvo se, notificado por escrito, comunicar ao lesado no prazo de três meses, igualmente por escrito, a identidade de um ou outro, ou a de algum fornecedor precedente.
Artigo 3.º
Produto
1 - Entende-se por produto qualquer coisa móvel, ainda que incorporada noutra coisa móvel ou imóvel.2 - Exceptuam-se os produtos do solo, da pecuária, da pesca e da caça, quando não tenham sofrido qualquer transformação.
Artigo 4.º
Defeito
1 - Um produto é defeituoso quando não oferece a segurança com que legitimamente se pode contar, tendo em atenção todas as circunstâncias, designadamente a sua apresentação, a utilização que dele razoavelmente possa ser feita e o momento da sua entrada em circulação.2 - Não se considera defeituoso um produto pelo simples facto de posteriormente ser posto em circulação outro mais aperfeiçoado.
Artigo 5.º
Exclusão de responsabilidade
O produtor não é responsável se provar:a) Que não pôs o produto em circulação;
b) Que, tendo em conta as circunstâncias, se pode razoavelmente admitir a inexistência do defeito no momento da entrada do produto em circulação;
c) Que não fabricou o produto para venda ou qualquer outra forma de distribuição com um objectivo económico, nem o produziu ou distribuiu no âmbito da sua actividade profissional;
d) Que o defeito é devido à conformidade do produto com normas imperativas estabelecidas pelas autoridades públicas;
e) Que o estado dos conhecimentos científicos e técnicos, no momento em que pôs o produto em circulação, não permitia detectar a existência do defeito;
f) Que, no caso de parte componente, o defeito é imputável à concepção do produto em que foi incorporada ou às instruções dadas pelo fabricante do mesmo.
Artigo 6.º
Responsabilidade solidária
1 - Se várias pessoas forem responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade.2 - Nas relações internas, deve atender-se às circunstâncias, em especial ao risco criado por cada responsável, à gravidade da culpa com que eventualmente tenha agido e à sua contribuição para o dano.
3 - Em caso de dúvida, a repartição da responsabilidade faz-se em partes iguais.
Artigo 7.º
Concurso do lesado e de terceiro
1 - Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para o dano, pode o tribunal, tendo em conta todas as circunstâncias, reduzir ou excluir a indemnização.2 - Sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo anterior, a responsabilidade do produtor não é reduzida quando a intervenção de um terceiro tiver concorrido para o dano.
Artigo 8.º
Danos ressarcíveis
1 - São ressarcíveis os danos resultantes de morte ou lesão pessoal e os danos em coisa diversa do produto defeituoso, desde que seja normalmente destinada ao uso ou consumo privado e o lesado lhe tenha dado principalmente este destino.2 - Os danos causados em coisas só são indemnizáveis na medida em que excedam a verba de 70000$00.
Artigo 9.º
Limite máximo
1 - No caso de morte ou lesão de várias pessoas causada por produtos idênticos que apresentem o mesmo defeito, o ressarcimento total não pode ultrapassar o montante de 10000 milhões de escudos.2 - O juiz pode fixar uma reparação de montante provisório a cada um dos lesados, tendo em conta a eventualidade de novas lesões causadas pelo mesmo facto virem a ser deduzidas em juízo.
Artigo 10.º
Inderrogabilidade
Não pode ser excluída ou limitada a responsabilidade perante o lesado, tendo-se por não escritas as estipulações em contrário.
Artigo 11.º
Prescrição
O direito ao ressarcimento prescreve no prazo de três anos a contar da data em que o lesado teve ou deveria ter tido conhecimento do dano, do defeito e da identidade do produtor.
Artigo 12.º
Caducidade
Decorridos 10 anos sobre a data em que o produtor pôs em circulação o produto causador do dano, caduca o direito ao ressarcimento, salvo se estiver pendente acção intentada pelo lesado.
Artigo 13.º
Outras disposições legais
O presente diploma não afasta a responsabilidade decorrente de outras disposições legais.
Artigo 14.º
Acidentes nucleares
Aos danos provenientes de acidentes nucleares regulados por convenções internacionais vigentes no Estado Português não são aplicáveis as disposições do presente diploma.
Artigo 15.º
Norma transitória
Este diploma não se aplica aos danos causados por produtos postos em circulação antes da sua entrada em vigor.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 7 de Setembro de 1989. - Aníbal António Cavaco Silva - Luís Francisco Valente de Oliveira - Joaquim Fernando Nogueira - Luís Fernando Mira Amaral - Licínio Alberto de Almeida Cunha.
Promulgado em 5 de Outubro de 1989.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 8 de Outubro de 1989.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.