1. No seu artigo 102.º, alínea c) do n.º 2, estabelece a Constituição da República Portuguesa que o auxílio do Estado aos agricultores compreende a «socialização dos riscos resultantes dos acidentes climatéricos e fitopatológicos imprevisíveis ou incontroláveis».
Até ao presente, porém, não se concretizou qualquer tipo de protecção ou de seguro agrícola (com excepção dos ramos de incêndio e roubo), que, para estímulo e defesa de uma actividade económica tão importante, mas tão aleatória e insegura, como é a agricultura, há muito deveria estar instituído.
Na Madeira, apenas de algum modo, em pequena escala e deficientemente, há uma certa cobertura de riscos na pecuária, através do Fundo de Previdência Pecuária, que ainda funciona integrado na delegação da Junta Nacional dos Produtos Pecuários.
Mas não há dúvida de que para o desenvolvimento económico e social da agricultura regional importa criar já um sistema de protecção ou previdência agro-pecuária, relativamente extenso, com o fim de cobrir os principais riscos a que esta actividade está sujeita, mormente os provocados nas culturas e nos gados por agentes meteorológicos, doenças e pragas. Este sistema de protecção vai articular-se com outros instrumentos de política agrária que se procura desenvolver ou criar, nomeadamente os vários projectos ou programas de fomento, a fixação de preços, o crédito agrícola e a extensão rural.
2. Dado o desconhecimento que se tem dos efeitos, quantificados, dos acidentes climatéricos e dos ataques de pragas e doenças, imprevisíveis e incontroláveis, nas culturas e nos gados, há que proceder inicialmente com todo o cuidado, criando-se uma estrutura simples como campo de acção de certo modo limitado, mas com possibilidades de se desenvolver à custa da experiência que se irá adquirindo com o decorrer dos tempos.
O Fundo de Previdência Agro-pecuária, que se institui na órbita da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas, não é criado com carácter definitivo, abrangendo todas as culturas, todos os gados e animais de capoeira e todos os riscos a que está sujeita a actividade agrícola, para que, por excesso de ambição, não fracasse e sirva de elemento de frustração entre os agricultores; está concebido com prudência, mas com a necessária dinâmica evolutiva para que pouco a pouco se consolidem os seus alicerces e se alargue a sua acção.
Seleccionados os riscos, as culturas agrícolas e os gados, de acordo com o que se conhece do meio madeirense e as necessidades e os interesses regionais mais prementes, a área de acção do Fundo de Previdência abrangerá, não obstante, a maior parte da produção agrícola e pecuária da região e quase toda a população do sector. Assim sendo, vai englobar o actual âmbito de acção do Fundo que tem vindo a funcionar na delegação da Junta Nacional dos Produtos Pecuários e que foi criado em 1942 na extinta Junta dos Lacticínios da Madeira; por isso se prevê a sua integração no actual Fundo de Previdência Agro-pecuária.
3. Os custos da actividade do Fundo de Previdência Agro-pecuária serão suportados não só por contribuições dos agricultores, senão também por taxas e dotações governamentais, ou seja, por toda a comunidade. Assim se reafirma, como em outros países e regiões, o interesse social da agricultura, que no caso da Madeira mais avulta pelo papel preponderante que esta actividade desempenha na protecção da Natureza, no combate à erosão e na defesa da paisagem.
Assim, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 229.º da Constituição e da alínea b) do artigo 22.º do Decreto-Lei 318-D/76, de 30 de Abril, a Assembleia Regional decreta o seguinte:
Artigo 1.º É criado o Fundo de Previdência Agro-Pecuária (FPA), dotado de autonomia administrativa e financeira, que funciona na dependência do Secretário Regional de Agricultura e Pescas.
Art. 2.º É aprovado o Estatuto do FPA, que figura em anexo ao presente diploma e dele faz parte integrante.
Art. 3.º O FPA reger-se-á ainda por outras disposições legais que vierem a ser publicadas posteriormente por iniciativa do Secretário Regional de Agricultura e Pescas, ouvido, sempre que esteja em causa matéria financeira, o Secretário Regional do Planeamento e Finanças.
Art. 4.º - 1 - Fica a cargo do FPA a administração e o desenvolvimento do sistema de previdência agro-pecuária, pelo qual serão protegidos os agricultores contra riscos ainda não cobertos pelo seguro e resultantes de acidentes, nomeadamente provocados por agentes meteorológicos, doenças e pragas não controláveis, através de esquemas de compensação de prejuízos sofridos pelas culturas e pelo gado.
2 - A acção do FPA estender-se-á por toda a área da Região Autónoma da Madeira e incidirá sobre as culturas, espécies pecuárias e riscos determinados no Estatuto do FPA, os quais podem, posteriormente, ser alterados.
Art. 5.º O Secretário Regional de Agricultura e Pescas providenciará para que o Fundo de Previdência Pecuária, a que se refere o Decreto-Lei 31570, de 13 de Outubro de 1941, criado na extinta Junta dos Lacticínios da Madeira, com regulamento aprovado por despacho ministerial de 6 de Junho de 1942, seja integrado no FPA, com respeito absoluto pelos direitos dos funcionários que prestam serviço naquele Fundo de Previdência.
Art. 6.º O Secretário Regional de Agricultura e Pescas providenciará para que os serviços dependentes da Secretaria que dirige prestem ao FPA a necessária colaboração e assistência em todas as acções de estudo, implementação e desenvolvimento do sistema de protecção.
Art. 7.º - 1 - O conselho administrativo do FPA pode recrutar o pessoal indispensável à execução dos seus serviços, competindo ao Secretário Regional de Agricultura e Pescas, sob proposta do mesmo conselho, fixar por portaria o respectivo quadro e remunerações, de acordo com as disposições legais em vigor.
2 - O Secretário Regional de Agricultura e Pescas pode autorizar que pessoal da sua Secretaria seja destacado para prestar serviço no FPA, continuando, consequentemente, os vencimentos e outros abonos deste pessoal a serem pagos pelos serviços de origem, ou requisitado, ficando, neste caso, o respectivo vencimento e outros abonos a cargo do FPA.
3 - Em caso de requisição, o tempo de serviço prestado no FPA conta para todos os efeitos legais como prestado ao serviço de origem, podendo o respectivo lugar ser provido interinamente.
Art. 8.º O FPA terá como receitas:
a) A contribuição dos beneficiários da previdência agro-pecuária, a deduzir no preço da comercialização dos produtos ou por eles paga, em termos a regulamentar;
b) Taxas a incidir sobre mercadorias importadas ou outras, a estabelecer pelo Governo Regional;
c) As dotações para o efeito inscritas, em cada ano, no Orçamento do Governo Regional;
d) Outras receitas e rendimentos que lhe venham a ser consignados ou afectos.
Art. 9.º São despesas do FPA as que resultarem do exercício das funções a que se destina e as emergentes da sua administração.
Art. 10.º Logo que seja criado o seguro agrícola a nível nacional, o Secretário Regional de Agricultura e Pescas providenciará no sentido da revisão ou adaptação da legislação do FPA às normas legais de índole geral que forem estabelecidas.
Art. 11.º O disposto no presente diploma e no Estatuto que dele faz parte integrante terá natureza transitória durante o prazo de três anos, a contar do início da sua vigência, findo o qual será revisto à luz da experiência entretanto recolhida.
Art. 12.º O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Aprovado em sessão plenária de 18 de Julho de 1979.
O Presidente da Assembleia Regional, Emanuel do Nascimento dos Santos Rodrigues.
Assinado em 6 de Agosto de 1979.
O Ministro da República, Lino Dias Miguel.
Fundo de Previdência Agro-Pecuária
ESTATUTO CAPÍTULO I
Natureza, fins e objecto
Artigo 1.º O Fundo de Previdência Agro-Pecuária (FPA), dotado de autonomia administrativa e financeira, funciona na dependência da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas, sob tutela do respectivo Secretário.Art. 2.º O FPA tem a sua sede na cidade do Funchal e exercerá a sua actividade em toda a área da Região Autónoma da Madeira.
Art. 3.º - 1 - O FPA tem por objectivo principal assegurar a protecção dos agricultores contra riscos ainda não cobertos pelo seguro e resultantes de acidentes, nomeadamente provocados por agentes meteorológicos, doenças e pragas não controláveis, através de um esquema de compensação dos prejuízos sofridos pelas culturas e pelo gado.
2 - O FPA, numa primeira fase, abrange somente as culturas de vinha, banana, cana-de-açúcar, batata (semilha), batata-doce, tomate e as culturas hortícolas sob coberto e o gado bovino (de leite e carne), mas visará o alargamento progressivo do sistema de protecção ou de previdência agro-pecuária através da realização de estudos e da criação das condições necessárias.
3 - Os riscos a cobrir pelo FPA são, para as culturas, os de granizo, inundações, trombas de água e ventos fortes que ultrapassem determinado grau da escala de Beaufort, a fixar em regulamento interno, e para o gado, os de morte por doença ou acidente e incapacidade funcional, nos termos que vierem a ser estabelecidos também em regulamento interno.
Art. 4.º - 1 - O FPA indemnizará directamente os agricultores na base de uma percentagem de 70% dos prejuízos apurados nas culturas relativamente aos riscos cobertos ou de 70% do valor dos animais sinistrados.
2 - O direito dos agricultores à indemnização depende não só da sua inscrição no FPA, onde deverá ser feito o registo das culturas e ou dos animais anteriormente à ocorrência do sinistro, mas também da verificação dos pressupostos legais e factuais do mesmo direito.
Art. 5.º O FPA poderá ainda compensar, se para tal for superiormente decidido, os agricultores inscritos pelos prejuízos sofridos pelas suas culturas, mesmo que não incluídas no n.º 2 do artigo 3.º, em consequência de riscos resultantes de causas não consideradas no n.º 3 do artigo 3.º, nomeadamente doenças, pragas e outros acidentes, desde que esses prejuízos tenham um carácter imprevisível e generalizado.
CAPÍTULO II
Órgão de gestão
Art. 6.º O órgão de gestão do FPA é o conselho administrativo.Art. 7.º - 1 - O conselho administrativo é constituído por três membros, nomeados por três anos, em comissão de serviço, por despacho do Secretário Regional de Agricultura e Pescas, podendo o mandato ser renovado por iguais períodos.
2 - De entre esses membros o Secretário Regional de Agricultura e Pescas designará o presidente.
3 - O funcionamento do conselho administrativo, as remunerações e demais condições do exercício doa cargos pelos seus membros serão definidos em decreto regulamentar do Governo Regional.
Art. 8.º Para a prossecução dos fins do FPA compete ao conselho administrativo:
a) Elaborar, anualmente, o orçamento da receita e da despesa do FPA para o ano seguinte e submetê-lo à aprovação do Secretário Regional da tutela;
b) Elaborar o relatório anual da actividade do FPA e a conta de gerência do ano anterior, que serão aprovados pelo Secretário Regional da tutela e pelo Secretário Regional do Planeamento e Finanças;
c) Elaborar os regulamentos internos necessários à organização e ao funcionamento do FPA, nos termos legais;
d) Propor ao Secretário Regional de Agricultura e Pescas o alargamento da cobertura proporcionada pelo sistema de previdência a novos riscos, culturas e espécies animais;
e) Exercer a gestão corrente do FPA.
Art. 9.º - 1 - O presidente do conselho administrativo é substituído, nas suas faltas e impedimentos, por outro membro do conselho, segundo nomeação do Secretário Regional de Agricultura e Pescas.
2 - Verificando-se o impedimento definitivo, bem como a renúncia ou destituição de qualquer membro do conselho administrativo, será nomeado novo membro pelo Secretário Regional de Agricultura e Pescas.
Art. 10.º - 1 - Para a movimentação das contas bancárias do FPA é necessária a assinatura conjunta de dois membros do conselho administrativo.
2 - Para actos de mero expediente basta a assinatura de um membro do conselho administrativo.
CAPÍTULO III
Regime financeiro
Art. 11.º Constituem receitas do FPA as mencionadas no artigo 8.º do decreto regional que o criou, devendo as referidas nas alíneas a) e b) ser estabelecidas por decreto regulamentar do Governo Regional.Art. 12.º O FPA procederá à liquidação das quantias correspondentes às taxas que forem criadas de acordo com normas e instruções a publicar em portaria conjunta do Secretário Regional do Planeamento e Finanças, de Agricultura e Pescas e da Economia.
Art. 13.º - 1 - As receitas do FPA serão entregues na tesouraria do Governo Regional como receita deste, mediante guia passada pelo mesmo Fundo, e serão escrituradas em rubrica própria, consignadas às despesas previstas por este diploma.
2 - O Governo Regional providenciará para que o excedente num ano económico das receitas a que se refere o número anterior e que não haja sido utilizado pelo FPA seja escriturado como receita do ano seguinte.
Art. 14.º - 1 - Constituem despesas do FPA:
a) As indemnizações ou subsídios de compensação;
b) As despesas administrativas de funcionamento.
2 - Para o caso de o montante das indemnizações ultrapassar as verbas disponíveis, o Governo Regional deverá possibilitar ao FPA os meios necessários para solver os seus compromissos.
Art. 15.º O pagamento das despesas do FPA será normalmente feito por meio de cheques passados à ordem dos interessados.
CAPÍTULO IV
Indemnizações ou subsídios de compensação
Art. 16.º - 1 - As indemnizações ou subsídios de compensação aos agricultores só serão processados após avaliação dos prejuízos sofridos feita pelo pessoal técnico do FPA ou dos serviços da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas, de acordo com normas a definir pelo conselho administrativo e aprovadas pelo Secretário Regional de Agricultura e Pescas.
2 - No caso de discordância sobre o montante dessas indemnizações ou subsídios de compensação por parte dos agricultores beneficiários, a questão será decidida pelo Secretário Regional de Agricultura e Pescas.
Art. 17.º Os subsídios de compensação a que se refere o artigo 5.º deste Estatuto, relativamente a culturas não previstas ou a riscos não abrangidos, serão fixados, em cada caso, pelo Governo Regional.