Considerando ainda que, nas zonas de alto mar atrás referidas, a base V da Lei 2130 reconhece ao Estado Português a faculdade de regulamentar o exercício da pesca e fazer respeitar tal regulamentação, se desta não resultar discriminação contra embarcações estrangeiras com direito a pescar nessa zona;
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º Os espaços marítimos em que o Estado Português exerce jurisdição exclusiva em matéria de pesca, tal como são definidos na Lei 2130, designam-se por «águas jurisdicionais de pesca».
Art. 2.º - 1. É proibido às embarcações estrangeiras pescar, estar em preparativos de pesca ou cometer actos prejudiciais ao exercício da pesca nas águas jurisdicionais de pesca.
2. São considerados preparativos de pesca, para os efeitos deste decreto-lei, fundear, amarrar, estacionar ou pairar nos locais de pesca, quando isso não tenha sido motivado por caso de força maior, como avarias, mau tempo, fortes correntes ou outra causa independente da vontade do capitão, mestre, patrão ou arrais da embarcação.
3. São considerados actos prejudiciais ao exercício da pesca, para os efeitos deste decreto-lei, bater águas, empregar quaisquer outros processos de afugentar o peixe ou usar qualquer manobra ou meio com intenção manifesta de prejudicar o exercício da pesca.
Art. 3.º - 1. A proibição estabelecida no artigo 2.º não impede o Estado Português de conceder a embarcações estrangeiras, nos termos de convenções e outros acordos internacionais ou com base em títulos históricos aceites pelo Estado Português, o direito de pescar permanentemente ou em período de tempo negociado em todas ou em parte das águas jurisdicionais de pesca.
2. Compete ao Ministro da Marinha, na metrópole, ouvido o Ministro dos Negócios Estrangeiros, ou ao Ministro do Ultramar, no ultramar, ouvidos os Ministros da Marinha e dos Negócios Estrangeiros, determinar, por meio de portarias, quais as embarcações estrangeiras que estão autorizadas a pescar nas águas jurisdicionais de pesca, fixando, segundo as circunstâncias, as áreas e os sistemas de pesca utilizáveis, as espécies ou grupos de espécies capturáveis, os contingentes de pesca e os períodos de tempo em que aquelas embarcações podem exercer a sua actividade, competindo-lhes ainda alterar ou revogar a autorização concedida.
3. As embarcações estrangeiras autorizadas a pescar nas águas jurisdicionais de pesca devem respeitar a regulamentação aplicável às embarcações nacionais que exerçam a mesma pesca nas mesmas áreas e ficam sujeitas às mesmas penalidades, embora seguindo a forma processual estabelecida neste diploma. Para estes efeitos, a suspensão do direito de pescar e a retenção das cartas do capitão, mestre ou arrais serão substituídas pela cassação à embarcação, pelo mesmo período de tempo, da autorização da pesca nas águas jurisdicionais de pesca.
Art. 4.º - 1. Qualquer embarcação estrangeira que for encontrada dentro das águas jurisdicionais de pesca, a pescar, ou em preparativos de pesca; numa área, uma espécie, ou com um sistema de pesca para que não esteja legalmente autorizada, ou a prejudicar o exercício da pesca, será retida com todos os respectivos apetrechos, pertences, redes, artes, aparelhos e embarcações auxiliares e com o pescado nela existente, sendo a embarcação, e tudo nela retido, entregues, pela autoridade que efectuar a retenção, na capitania do primeiro porto em que entrar em seguida à retenção.
2. O proprietário, armador, capitão, mestre, patrão ou arrais da embarcação retida incorre na pena de multa de 30000$00 a 300000$00, que será graduada conforme as circunstâncias e de acordo com o tamanho da embarcação, e na perda do pescado.
Quando se trate de embarcação de arqueação bruta inferior a 10 t, os limites mínimo e máximo da multa são reduzidos, respectivamente, para 10000$00 e 30000$00.
Art. 5.º - 1. O proprietário, armador, capitão, mestre, patrão ou arrais de embarcação estrangeira encontrada nas circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 4.º que violar, além disso, a regulamentação estabelecida para a pesca na mesma área por embarcações nacionais, incorre, por esta infracção, na pena de multa de 30000$00 a 300000$00, graduada conforme as circunstâncias e de acordo com o tamanho da embarcação, e perderá a favor do Estado todas as artes ilegais. Quando se trate de embarcação de arqueação bruta inferior a 10 t, os limites mínimo e máximo da multa serão reduzidos, respectivamente, para 10000$00 e 30000$00.
2. Os limites máximo e mínimo da multa previstos no número anterior serão elevados para a dobro quando a infracção se verificar em local que diste menos de seis milhas da linha de base do mar territorial, ou quando a mesma tiver por objecto a captura de lagostas ou espécies afins durante o período do defeso em qualquer ponto das águas jurisdicionais de pesca, considerando-se circunstância agravante a existência a bordo de lavagantes e lagostas de tamanho inferior ao mínimo legal ou ovados ou em muda.
3. Os mesmos limites serão triplicados no caso de utilização na pesca de explosivos ou substâncias nocivas.
Art. 6.º - 1. O pessoal de equipagem da embarcação que desobedecer ou resistir à acção da fiscalização é responsável criminal e civilmente por tais actos, nos termos da lei geral, sendo retida a embarcação.
2. Neste caso, o proprietário, armador, capitão, mestre, patrão ou arrais da embarcação fica ainda sujeito ao pagamento das despesas que a fiscalização tiver feito por motivo dos actos de desobediência ou resistência.
3. A cobrança coerciva das despesas referidas no número anterior, que serão discriminadas pelo agente que efectuou a retenção, será feita pela forma prescrita neste diploma para a cobrança das multas, custas, selos e demais despesas.
Art. 7.º - 1. São competentes para efectuar a retenção das embarcações estrangeiras os comandantes das unidades de fiscalização de pesca, e bem assim todas as autoridades e mais agentes encarregados da polícia de pesca.
2. Da transgressão e da retenção será sempre lavrado auto circunstanciado, que fará inteira fé até prova em contrário, e será entregue, pelo agente que efectuou a retenção, na capitania onde entregou a embarcação retida.
Art. 8.º Ao capitão do porto onde foi entregue a embarcação cumpre tomar imediatamente as seguintes medidas:
a) Ordenar a venda em hasta pública do pescado existente na embarcação que julgue susceptível de se deteriorar, mandando depositar à sua ordem, num dos estabelecimentos referidos no artigo 21.º, o produto da venda;
b) Avisar da ocorrência o agente consular do Estado cuja bandeira a embarcação arvora;
c) Designar dia e hora para o julgamento.
Art. 9.º - 1. A embarcação retida, e todo o material retido com ela, à excepção do pescado, respondem pelo integral pagamento da multa ou multas, e despesas, custas e selos devidos.
2. Enquanto a embarcação se conservar retida é permitido ao seu proprietário beneficiá-la, bem como o material retido com ela, sob a vigilância da autoridade marítima, não sendo, todavia, esta jamais responsável pelos prejuízos que da falta de conveniente beneficiamento possam resultar.
Art. 10.º - 1. O capitão do porto procederá a julgamento com observância das formalidades prescritas para o julgamento dos transgressores nacionais.
2. A não comparência, por qualquer circunstância, do agente consular que tenha sido devidamente avisado não determina o adiamento do julgamento, o qual, neste caso, se fará na presença de duas testemunhas idóneas, que assinarão a respectiva acta.
3. Não comparecendo o agente consular, se o transgressor não tiver advogado constituído e não confessar totalmente a transgressão, o capitão do porto nomear-lhe-á defensor oficioso, que será um advogado ou, na falta deste, uma pessoa idónea.
4. Se o capitão do porto julgar necessária a realização de diligência essencial para a descoberta da verdade, adiará o julgamento, designando logo novo dia.
Na realização de tais diligências não poderá exceder-se o prazo de quinze dias.
Art. 11.º - 1. Transitada em julgado a decisão, observar-se-á o seguinte:
a) Se for absolutória, será entregue ao proprietário, armador, capitão, mestre, patrão ou arrais a embarcação e todo o material retido, bem como, em escudos, o produto da venda do pescado, ordenada nos termos da alínea a) do artigo 8.º, não sendo o Estado responsável pelos prejuízos ou lucros cessantes que resultem quer da venda, quer da retenção;
b) Se for condenatória e o pagamento das quantias em que o infractor foi condenado não for efectuado no prazo de dez dias a contar do trânsito, uma certidão da sentença e da conta será enviada ao agente do Ministério Público junto do tribunal da comarca onde a capitania tem a sua sede ou, nas comarcas de Lisboa e Porto, ao agente do Ministério Público junto dos juízes de polícia para que este requeira a execução.
2. A execução seguirá os termos das execuções por custas reguladas no Código das Custas Judiciais, devendo a penhora incidir sobre os bens retidos.
3. Será dado conhecimento por ofício ao capitão do porto da sentença que julgar extinta a execução por pagamento.
Art. 12.º As importâncias da multa ou multas, despesas, custas e selos da capitania, bem como das custas da execução, sairão precípuas do produto dos bens liquidados.
Art. 13.º - 1. Cabe recurso da sentença do capitão do porto quando a multa ou multas aplicadas forem superiores a 40000$00.
2. O recurso só pode ser interposto se o transgressor declarar, antes do interrogatório, que dele não prescinde, cumprindo ao julgador adverti-lo desta circunstância.
3. O recurso não suspende a medida de detenção efectuada ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 4.º 4. O recurso será interposto para o juiz de direito da comarca onde a capitania tem a sua sede ou, nas comarcas de Lisboa e Porto, para o juiz do tribunal de polícia, por meio de requerimento em papel selado entregue na capitania do porto, no qual o recorrente exporá os fundamentos do recurso e indicará as disposições legais violadas.
5. O prazo para a interposição do recurso é de oito dias, contados da data da publicação da sentença.
6. É obrigatória a constituição do advogado para a interposição do recurso.
7. Junto o requerimento ao processo, será imediatamente indeferido quando a decisão não admitir recurso, ou quando não se observou o disposto nos n.os 4, 5 e 6 deste artigo.
8. Recebido o recurso, ao requerente será logo passada guia para dentro do prazo de dois dias depositar à ordem do capitão do porto, num dos estabelecimentos referidos no artigo 21.º, a importância das despesas, custas e selos devidos e mais a quantia referida no n.º 9, que constituirá receita do Estado, no caso de ser confirmada, total ou parcialmente, a sentença.
9. O depósito para o recurso será de 3000$00 quando a multa aplicada não exceder 60000$00; 6000$00 quando estiver compreendida entre 60000$00 e 120000$00;
9000$00 quando estiver compreendida entre 120000$00 e 300000$00; e 15000$00 quando for superior a 300000$00.
10. Efectuados e comprovados os depósitos, o capitão do porto enviará o processo ao tribunal judicial competente, sendo-lhe permitido esclarecer os fundamentos da sua decisão.
11. Não efectuado qualquer dos depósitos referidos nos n.os 8 e 9, o capitão do porto julgará deserto o recurso.
Art. 14.º - 1. Autuado o recurso, será o processo concluso ao juiz, que o mandará com vista ao Ministério Público, por sete dias, para alegar ou requerer o que tiver por conveniente, proferindo seguidamente a sentença no prazo de catorze dias.
2. Se de o juiz entender que não pode tomar conhecimento, exporá sucintamente as suas razões e mandará ouvir cada uma das partes, decidindo, em seguida; no prazo de dois dias, a questão prévia.
3. Se no processo houver acto ou omissão que ofereça dúvida e que possa influir na decisão do recurso, ordenará o juiz as providências necessárias para o seu suprimento e, feito este, se procederá de conformidade com o preceituado no n.º 1.
4. Da sentença do juiz cabe apenas recurso para o tribunal da relação do distrito que será processado e julgada coma os recursos em processo penal.
5. Os recursos estão isentos do imposto de justiça e custas.
Art. 15.º Efectuado o pagamento da multa ou multas e demais quantias em dívida, a embarcação, os respectivos apetrechos, pertences, redes, artes, aparelhos e embarcações auxiliares que estiverem retidos serão entregues ao seu proprietário, armador, capitão, mestre, arrais ou patrão, mediante requerimento.
Art. 16.º Em caso de condenação definitiva, proceder-se-á à venda do pescado que ainda estiver retido, pela forma que melhor convenha.
Art. 17.º O produto da venda do pescado e das multas reverte, em partes iguais, para o Tesouro Público e para o Fundo Comum das Casas dos Pescadores.
Art. 18.º O produto da venda dos bens liquidados que exceda o necessário para o pagamento das quantias em dívida prescreverá a favor do Fundo Comum das Casas dos Pescadores se não for requerido o seu levantamento no prazo de um ano, contado a partir da data em que transitou em julgado a decisão que julgou extinta a execução.
Art. 19.º Salvo disposição em contrário resultante de convenção, acordo ou convénio internacional, as redes, aparelhos e outras artes de pesca encontrados em abandono em águas jurisdicionais de pesca serão considerados arrojos do mar e entregues às instâncias fiscais, quando se verifique não pertencerem a pescadores nacionais:
Art. 20.º - 1. Quando nas águas jurisdicionais de pesca embarcações estrangeiras causarem avarias em qualquer rede, aparelho ou outra arte de pesca ficarão responsáveis pelo pagamento dos valores dessas avarias, seguindo-se, na forma e trâmites do processo, o que está determinado para as embarcações portuguesas, salvo se convenções ou outros acordos internacionais de que o Estado Português for parte contratante estabelecerem diferente procedimento.
2. Sempre que possível, aquelas embarcações serão retidas com os respectivos apetrechos, pertences, redes, aparelhos e embarcações auxiliares, respondendo as embarcações e todo o material com elas retido pelo integral pagamento do valor das avarias causadas, independentemente da responsabilidade criminal ou civil em que adicionalmente incorrem os respectivos proprietários, armadores e pessoal de equipagem.
Art. 21.º Os depósitos à ordem do capitão do porto e os pagamentos feitos por motivo de condenação, segundo o disposto neste decreto-lei, serão feitos na Caixa Geral de Depósitos ou sua delegação e, na falta de uma ou outra, na tesouraria da Fazenda Pública ou na delegação desta.
Art. 22.º Nos casos omissos serão aplicáveis nas águas jurisdicionais de pesca e no restante território nacional as disposições do Regulamento Geral das Capitanias e demais leis especiais que o alteram e, na falta delas, a lei geral.
Art. 23.º Ficam revogados par este diploma a Lei 1514, de 18 de Dezembro de 1923, e o Decreto 27560, de 11 de Março de 1937.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 18 de Setembro de 1967. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - António Jorge Martins da Mota Veiga - Manuel Gomes de Araújo - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior- João de Matos Antunes Varela - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Joaquim da Luz Cunha - Fernando Quintanilha Mendonça Dias - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - José Albino Machado Vaz - Joaquim Moreira da Silva Cunha - Inocêncio Galvão Teles - José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira - Carlos Gomes da Silva Ribeiro - José João Gonçalves Proença - Francisco Pereira Neto de Carvalho.
Para ser publicado na Boletim Oficial de todas as províncias ultramarinas. - J. da Silva Cunha.