Decreto-Lei 279/82
de 21 de Julho
Consignou o Governo no seu Programa o objectivo de restituir às empresas públicas a sua verdadeira face empresarial e aos seus dirigentes a plena vocação e responsabilidade de gestores, para o que se propôs reconduzir progressivamente o regime de tutela em vigor a um sistema de controle orçamental de gestão baseado em objectivos quantificados à partida e no acompanhamento e correcção oportuna dos desvios verificados.
Sem prejuízo de tal modificação no relacionamento entre o Estado e as empresas públicas apenas se afigurar possível em toda a sua extensão nas empresas que se situam em zonas de concorrência e que não constituem instrumentos directos da política sectorial, considera-se que o exercício da tutela financeira deverá em qualquer caso reconduzir-se ao exercício do referido controle orçamental, assim se eliminando progressivamente a aleatoriedade de uma tutela exercida casuisticamente.
Para o efeito é indispensável prever um mecanismo de discussão e negociação efectiva dos orçamentos das empresas públicas, através de uma estrutura adequada para o efeito, capaz de em seguida acompanhar a execução orçamental e informar com fundamento as decisões a tomar no domínio das relações financeiras entre o Estado e as empresas públicas.
O Instituto agora criado visa preencher esta lacuna na orgânica da administração financeira do Estado, sendo-lhe igualmente confiadas tarefas no domínio da consolidação financeira do sector empresarial do Estado, as quais se revelam indispensáveis para a compreensão exacta da natureza e dimensão das relações económico-financeiras entre o Estado e as empresas públicas.
Para além disto, desde já se assegura a possibilidade de virem a ser delegados no Instituto poderes de tutela financeira ou inclusivamente não financeira sempre que a natureza da empresa e o seu posicionamento na política sectorial o aconselhe.
Desta forma se concretizará, por etapas sucessivas, o princípio segundo o qual a administração do sector empresarial do Estado se deverá reconduzir à gestão consolidada de um universo de empresas que o Estado participa através de mecanismos de direito público.
O quadro normativo actual, no que concerne às empresas públicas, terá de ser profundamente modificado, pondo-se termo à multiplicidade de autorizações e aprovações prevista na lei, nos estatutos das empresas públicas e nos diplomas e resoluções relativos ao Plano e ao PISEE. Sem prejuízo dessa modificação, considera-se oportuno dar desde já um passo concreto com vista à racionalização do exercício da tutela financeira sobre as empresas públicas, que poderá conduzir ao estabelecimento e funcionamento eficaz de mecanismos de controle de gestão que venham a dispensar a tutela casuística actualmente estabelecida.
Através da implementação destes princípios, pretende-se assegurar o uso mais eficiente dos recursos colocados à disposição das empresas públicas, evitando a introdução de medidas que distorçam a racionalidade económica das empresas ou afectem os termos de concorrência no mercado em que as mesmas operam e procurando alcançar rácios de eficiência e produtividade internacionalmente aceites, através da identificação dos indicadores adequados e sua comparação não só com os exercícios anteriores, mas com empresas congéneres de outros países. A identificação desses indicadores e a quantificação dos objectivos a alcançar permitirá a definição de fórmulas de interessamento dos trabalhadores na gestão, designadamente através de participação nos seus resultados.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 210.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º É criado o Instituto de Gestão Financeira das Empresas Públicas, adiante designado como Instituto, dotado de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira.
Art. 2.º - 1 - O Instituto rege-se pelas normas em vigor para os institutos públicos e pelo respectivo estatuto, cujo projecto será elaborado pela comissão instaladora no prazo de 60 dias a partir da data da sua entrada em funções.
2 - O Instituto disporá de plena capacidade jurídica para praticar os actos e negócios jurídicos de direito privado necessários à prossecução das suas atribuições.
Art. 3.º - 1 - Constitui atribuição genérica do Instituto colaborar no exercício da tutela financeira sobre as empresas públicas nacionalizadas e equiparadas (doravante designadas como empresas públicas), com vista a racionalizar o seu exercício e a optimizar a rentabilidade do sector.
2 - O Instituto tem como atribuições específicas:
a) Colaborar na definição e implementação de uma política de controle orçamental de gestão das empresas públicas;
b) Colaborar na definição e implementação de uma política de gestão financeira consolidada do sector empresarial do Estado.
3 - O Instituto poderá ainda contribuir por quaisquer outros meios de que seja encarregado pelo Governo para assegurar maior rigor e eficiência na gestão das empresas públicas e do próprio sistema, privilegiando a autonomia empresarial e a responsabilidade dos gestores, mas salvaguardando a rentabilidade dos fundos públicos investidos e a coordenação da actividade da empresa com os imperativos do Plano.
Art. 4.º - 1 - Com vista ao desempenho das atribuições que lhe são cometidas no quadro definido pelo artigo 3.º será o Instituto mandatado para as seguintes tarefas:
a) Discutir e promover a aprovação dos orçamentos de exploração;
b) Discutir e promover a aprovação dos planos plurianuais de actividade;
c) Acompanhar periodicamente a gestão através da análise de balanços e contas de exploração trimestrais e mapas demonstrativos e justificativos de desvios orçamentais;
d) Pronunciar-se sobre os programas de investimento, na perspectiva da sua viabilidade microeconómica e respectiva cobertura financeira;
e) Preparar o balanço, orçamento e conta de resultados e consolidados do sector empresarial do Estado;
f) Apreciar as necessidades anuais de capitais próprios e colaborar na definição e procura das respectivas fontes de cobertura;
g) Analisar as propostas relativas aos níveis das indemnizações compensatórias e dos eventuais subsídios à exploração e submetê-las a aprovação superior;
h) Apreciar os balanços e contas anuais de exploração, em função dos orçamentos aprovados, e dar parecer sobre o mérito de gestão desenvolvida e sobre a proposta de distribuição de resultados;
i) Representar o Ministério das Finanças e do Plano na apreciação e negociação dos acordos de reequilíbrio ou saneamento económico-financeiro das empresas públicas e acompanhar a sua execução e revisão;
j) Dar parecer sobre operações que tenham de ser autorizadas ao abrigo da tutela financeira;
l) Emitir parecer sobre as condições de exercício de funções pelos gestores e demais representantes do Estado nos órgãos das empresas públicas e sua revisão e propor no âmbito da discussão dos orçamentos a atribuição de prémios de gestão, a suportar como custos pelas empresas face ao cumprimento efectivo dos objectivos traçados e da dificuldade na sua consecução.
2 - Na definição de áreas e empresas sobre que incidirá o mandato referido no número anterior poderá atender-se à especificidade do sector em causa e à existência de entidades a quem possa caber mais adequadamente o efectivo desempenho da totalidade ou parte das tarefas objecto de mandato.
3 - Poderá o Instituto ser também encarregado de prestar informações e emitir pareceres sobre a situação económica e financeira das empresas públicas e respectiva viabilidade e propor em qualquer caso as medidas adequadas à salvaguarda dos interesses públicos em jogo, colaborando na sua ulterior implementação.
4 - Relativamente a cada empresa pública ou grupo de empresas públicas, podem ser delegados pelo Ministério das Finanças e do Plano no órgão de gestão do Instituto a totalidade ou parte dos poderes de tutela financeira previstos no estatuto tipo das empresas públicas (Decreto-Lei 260/76 e legislação complementar) e no estatuto das respectivas empresas.
5 - Poderão igualmente ser delegados no Instituto poderes de tutela não financeira, no caso de o ministro que exercer a tutela sectorial considerar conveniente tal procedimento.
Art. 5.º - 1 - Sem prejuízo das alterações de estruturas que venham a revelar-se necessárias e, nomeadamente, de integração no Instituto de serviços já existentes, serão devidamente articuladas a acção do Instituto com organismos dependentes do Ministério das Finanças e do Plano e com intervenção no mesmo domínio.
2 - As informações prestadas regularmente pelas comissões de fiscalização das empresas públicas ao Ministério das Finanças e do Plano poderão ser prestadas directamente ao Instituto.
Art. 6.º Os órgãos de gestão, o quadro e o regime jurídico do pessoal serão definidos pelo estatuto.
Art. 7.º O Instituto é criado na dependência orgânica directa do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano, sem prejuízo da dependência funcional emergente dos mandatos e delegações de poderes que lhe sejam conferidos.
Art. 8.º Constituem receitas do Instituto:
a) As comissões pagas pelas empresas submetidas ao controle de gestão do Instituto, calculadas através da aplicação de uma taxa a definir anualmente por despacho do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano, sobre proposta do Instituto, em função da dimensão das empresas ou do seu volume de actividade;
b) As dotações do OGE que eventualmente venham a ser inscritas a favor do Instituto para cobertura de despesas que não sejam de manutenção ou funcionamento normal;
c) Os rendimentos provenientes da aplicação das suas disponibilidades.
Art. 9.º - 1 - É criada a comissão instaladora do Instituto, composta por 1 presidente, 1 vice-presidente e 3 vogais, nomeados pelo Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano, a quem cabe:
a) Submeter no prazo de 60 dias à aprovação do Governo projecto do estatuto do Instituto;
b) Assegurar a gestão e prosseguir as atribuições do Instituto ao abrigo do presente diploma e dos mandatos e delegações subsequentes até à data da publicação do estatuto e à entrada em funções dos órgãos nele previstos;
c) Propor o recrutamento do pessoal necessário ao serviço do Instituto, designadamente pela via da requisição, destacamento ou comissão de serviço e sem prejuízo das normas genéricas aplicáveis à admissão de pessoal na função pública;
d) Contratar a execução das tarefas necessárias ao bom desempenho das atribuições do Instituto.
2 - Os membros da comissão instaladora poderão exercer o seu cargo em acumulação com outras funções públicas ou com o exercício de funções de gestor público, sendo-lhes atribuída nesse caso uma gratificação a fixar por despacho do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano.
Art. 10.º A comissão funcionará junto do Gabinete do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano, a quem competirá assegurar o apoio administrativo e as dotações necessárias.
Art. 11.º As dúvidas suscitadas pelo presente diploma serão resolvidas por despacho do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano.
Art. 12.º Este decreto-lei entra em vigor na data da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministro de 16 de Abril de 1982. - Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Promulgado em 9 de Julho de 1982.
Publique-se.
O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.